Da impossibilidade jurídica da aplicação das Medidas Educativas do Art. 28 da Lei nº 11.343/06 a adolescentes em conflito com a lei

29/06/2015 às 23:12
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Resumo: Este ensaio aborda de forma sucinta a impossibilidade jurídica de se aplicar as medidas educativas do art. 28 da Lei sobre Drogas a adolescentes em conflito com a Lei, considerando o princípio da especialidade do Estatuto da criança e adolescente.

Resumo: Este ensaio aborda de forma sucinta a impossibilidade jurídica de se aplicar as medidas educativas do artigo 28 da Lei sobre Drogas a adolescentes em conflito com a Lei, considerando o princípio da especialidade do Estatuto da criança e adolescente que trata inteiramente do assunto.


A Lei nº 11.343/06 prevê no artigo 28 condutas proibidas de posse de drogas ilícitas para uso pessoal, assim dispondo:

Art. 28.  Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

O novo regramento fez parte daquilo que se convencionou chamar no Brasil de justiça terapêutica ou medida de redução de danos em relação aos usuários de drogas.

Para o ilustre Professor Luiz Flávio Gomes houve a descriminalização da posse de droga para consumo pessoal, mas a conduta descrita no artigo 28 da Lei nº 11.343/06 continua sendo ilícita - uma infração, mas sem natureza penal, instituindo-se no Brasil o que se chama de infração sui generis.

Essas medidas podem ser aplicadas ao adolescente em conflito com a lei em caso de posse de drogas ilícitas para uso pessoal?

De início, oportuno salientar que as medidas que devem ser aplicadas ao adolescente em conflito com a lei são aquelas previstas no art. 112 da Lei nº 8.069/90, conforme descrição abaixo.

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I - advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

Mas é rol seria exaustivo? Não haveria possibilidade jurídica de se ampliar esse rol em benefício do adolescente infrator?

A princípio não se aplicam ao menor apreendido as medidas previstas no art. 28 da Lei nº 11.343/06.

A medida de ADVERTÊNCIA pode ser aplicada ao menor infrator, mas o fundamento legal é a do artigo 112, I, do Estatuto da Criança e do Adolescente e não da Lei Sobre Drogas, que prevê advertência sobre os efeitos da droga.

A medida de prestação de serviço à comunidade prevista na Lei Sobre Drogas não se pode aplicar ao menor infrator por ofensa ao art. 28 da Lei nº 11.343/06, pois o Estatuto Camata também existe medida semelhante prevista no artigo 112, III, lembrando que o Estatuto proíbe expressamente a prestação de serviço forçado.

Restou apenas analisar a possibilidade jurídica de se aplicar ao menor infrator a medida prevista no artigo 28, inciso III, da Lei nº 11.343/2006.

Destarte, quanto à medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo, acredito também que a Lei nº 8.069/90 possibilita a aplicação de medida semelhante, artigo 112, inciso VII c/c artigo 101, inciso VI, do ECA, que prevê a inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos.Como se sabe, a medida socioeducativa visa sempre o desenvolvimento da personalidade do menor, e por isso, pode ser modificada a qualquer momento, sempre em favor do desenvolvimento do menor.

Assim, também não entendo haver possibilidade jurídica de se aplicar ao infrator por posse ilegal de drogas, a teor do artigo 28, a medida de comparecimento a programa de orientação a drogados, pois tal implicação já existe como princípio  da proteção integral, inspiração da lei nº 8.069/90.

É bom lembrar que as medidas previstas no artigo 28 da Lei nº 11.343/06 não são consideradas penas nem a conduta de posse de drogas para uso pessoal é taxada de crime, conforme entendimento majoritário da doutrina brasileira, mas todas elas têm previsão idêntica na Lei nº 8.069/90.

Por fim, considerando a doutrina da proteção integral do menor infrator no Brasil, numa análise sistemática, e não havendo grandes construções doutrinárias acerca do assunto em pauta, acredito pela impossibilidade jurídica de se aplicar ao adolescente em conflito com a lei enquadrado no artigo 28, caput, da Lei nº 11.343/06, considerando que a medida educativa de comparecimento em programas ou curso educativo se aproxima daquela prevista no artigo 101, inciso VI, da Legislação Minoril.

Correto afirmar que todas as medidas previstas no artigo 28 da Lei nº 11.343/06 são contempladas pela Lei nº 8.069/90, e esta norma, em razão do princípio da especialidade é a que deve aplicar aos adolescentes em conflito com a lei, sobretudo, as medidas socioeducativas do artigo 112 do ECA.

Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Tema de interesse social e jurídico, sobretudo, pelo escasso enfrentamento do assunto na doutrina atual.

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