Resumo: Este ensaio aborda de forma sucinta a impossibilidade jurídica de se aplicar as medidas educativas do artigo 28 da Lei sobre Drogas a adolescentes em conflito com a Lei, considerando o princípio da especialidade do Estatuto da criança e adolescente que trata inteiramente do assunto.
A Lei nº 11.343/06 prevê no artigo 28 condutas proibidas de posse de drogas ilícitas para uso pessoal, assim dispondo:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
O novo regramento fez parte daquilo que se convencionou chamar no Brasil de justiça terapêutica ou medida de redução de danos em relação aos usuários de drogas.
Para o ilustre Professor Luiz Flávio Gomes houve a descriminalização da posse de droga para consumo pessoal, mas a conduta descrita no artigo 28 da Lei nº 11.343/06 continua sendo ilícita - uma infração, mas sem natureza penal, instituindo-se no Brasil o que se chama de infração sui generis.
Essas medidas podem ser aplicadas ao adolescente em conflito com a lei em caso de posse de drogas ilícitas para uso pessoal?
De início, oportuno salientar que as medidas que devem ser aplicadas ao adolescente em conflito com a lei são aquelas previstas no art. 112 da Lei nº 8.069/90, conforme descrição abaixo.
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
Mas é rol seria exaustivo? Não haveria possibilidade jurídica de se ampliar esse rol em benefício do adolescente infrator?
A princípio não se aplicam ao menor apreendido as medidas previstas no art. 28 da Lei nº 11.343/06.
A medida de ADVERTÊNCIA pode ser aplicada ao menor infrator, mas o fundamento legal é a do artigo 112, I, do Estatuto da Criança e do Adolescente e não da Lei Sobre Drogas, que prevê advertência sobre os efeitos da droga.
A medida de prestação de serviço à comunidade prevista na Lei Sobre Drogas não se pode aplicar ao menor infrator por ofensa ao art. 28 da Lei nº 11.343/06, pois o Estatuto Camata também existe medida semelhante prevista no artigo 112, III, lembrando que o Estatuto proíbe expressamente a prestação de serviço forçado.
Restou apenas analisar a possibilidade jurídica de se aplicar ao menor infrator a medida prevista no artigo 28, inciso III, da Lei nº 11.343/2006.
Destarte, quanto à medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo, acredito também que a Lei nº 8.069/90 possibilita a aplicação de medida semelhante, artigo 112, inciso VII c/c artigo 101, inciso VI, do ECA, que prevê a inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos.Como se sabe, a medida socioeducativa visa sempre o desenvolvimento da personalidade do menor, e por isso, pode ser modificada a qualquer momento, sempre em favor do desenvolvimento do menor.
Assim, também não entendo haver possibilidade jurídica de se aplicar ao infrator por posse ilegal de drogas, a teor do artigo 28, a medida de comparecimento a programa de orientação a drogados, pois tal implicação já existe como princípio da proteção integral, inspiração da lei nº 8.069/90.
É bom lembrar que as medidas previstas no artigo 28 da Lei nº 11.343/06 não são consideradas penas nem a conduta de posse de drogas para uso pessoal é taxada de crime, conforme entendimento majoritário da doutrina brasileira, mas todas elas têm previsão idêntica na Lei nº 8.069/90.
Por fim, considerando a doutrina da proteção integral do menor infrator no Brasil, numa análise sistemática, e não havendo grandes construções doutrinárias acerca do assunto em pauta, acredito pela impossibilidade jurídica de se aplicar ao adolescente em conflito com a lei enquadrado no artigo 28, caput, da Lei nº 11.343/06, considerando que a medida educativa de comparecimento em programas ou curso educativo se aproxima daquela prevista no artigo 101, inciso VI, da Legislação Minoril.
Correto afirmar que todas as medidas previstas no artigo 28 da Lei nº 11.343/06 são contempladas pela Lei nº 8.069/90, e esta norma, em razão do princípio da especialidade é a que deve aplicar aos adolescentes em conflito com a lei, sobretudo, as medidas socioeducativas do artigo 112 do ECA.