O processo de desconstrução da polícia civil no Brasil

02/07/2015 às 22:57
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Resumo: Este ensaio aborda a questão da desconstrução evolutiva da Polícia Civil no Brasil, com a supressão de atribuições próprias de polícia judiciária, e consequente legitimização de outros órgãos em funções típicas de agências investigativas.

O processo de desconstrução da polícia civil no Brasil


Resumo: Este ensaio aborda a questão da desconstrução evolutiva da Polícia Civil no Brasil, com a supressão de atribuições próprias de polícia judiciária, e consequente legitimização de outros órgãos em funções típicas de agências investigativas.

Palavras-Chave: Polícia Civil, delegação de atribuições, processo de desconstrução.

Atualmente, o Brasil passa por uma grave crise de identidade, com inversão de valores e atrofia no seu sistema de repartição de poderes.

A Suprema Corte parece que assumiu de vez o comando de algumas ações impróprias, exercendo atividades próprias de outros órgãos, legislando através das famigeradas súmulas vinculantes e resoluções, derramando uma enxurrada de críticas à Polícia, propondo corregedorias judiciárias de polícia, falando um monte de impropriedades sobre as interceptações telefônicas.

Na política, vem ocorrendo constantes tentativas de impedir o trabalho de investigação, com implantação de medidas restritivas, diminuindo o âmbito do poder investigatório, ou ampliando indevidamente a legitimidade do poder investigatório a outros órgãos que somente atuam sob as luzes de holofotes, certamente para atender a interesses da classe dominante.

 Querem de qualquer jeito e a todo custo desmantelar a Polícia investigativa do Brasil.

Primeiro com relação ao mandado de busca e apreensão que a autoridade policial tinha atribuição para expedição e que depois passou para a autoridade judiciária, artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal.

Em caso de urgência, dificilmente se consegue autorização para ingressar numa casa suspeita, e se for num final de semana, aí as coisas se complicam, pois achar um plantão forense disponível não é tarefa tão fácil.

Agora, estão batendo forte em matéria de concessão dos grampos telefônicos, chegando a ponto de um desavisado jurista dizer que a interceptação telefônica é o “pau-de-arara” de antigamente.

A interceptação telefônica é meio de prova eficiente para se chegar ao crime organizado. A Lei nº 9.296/96 disciplina com muita precisão a matéria, agora regulamentada pela Resolução nº 59 do CNJ.

O que se observa é que existe direito a intimidade, devidamente protegido pelo artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal e direito à segurança e liberdade, também previsto no mesmo dispositivo legal, entrando em cena o princípio da proporcionalidade. Numa tabela móvel de valores garantidos, a liberdade e a segurança devem prevalecer em razão da supremacia dos interesses da coletividade.

Acontece que censuram tanto a concessão de interceptação telefônica que a própria Justiça está com receio de conceder as autorizações às agências competentes, por pressões do Conselho Nacional de Justiça, e quem perde com isso é a sociedade, mesmo porque não se pode fechar os olhos para essa nova realidade, para esse novo instrumento do crime organizado.

Algumas Instituições policiais que legalmente não tem o papel investigativo, estão sendo legitimadas para a elaboração de Termos Circunstanciados de Ocorrência - TOC, ás vezes por meio de Acordos de Cooperação Técnica ou mediante Portarias de Autoridades Judiciárias referendando a ilegalidade e esses órgãos policiais ainda representam pelo medidas cautelares como mandado de busca e apreensão, mandados de prisões e outras atribuições próprias da Polícia Judiciária.

É possível afirmar que às vezes quem se ocupa de outras funções impróprias não tem tempo para desempenhar bem e com esmero as suas reais funções.

Com esta maneira equívoca de pensar segurança pública, a criminalidade só tende a aumentar no Brasil.

No estado democrático de direito o que se precisa para manter o criminoso preso é a solidez do sistema de provas que a policia judiciária produz durante as investigações. 

O que se lamenta é que as críticas da inoperância do sistema de justiça criminal são generalizadas e atingem a todos os profissionais da Segurança Pública.

E não deveria ser assim. A Polícia Civil não pode pagar sozinha um preço tão alto em função das arbitrariedades e do sistema de impunidade que ocorrem por este Brasil afora, mesmo porque no momento é possível afirmar que não existe no Brasil nenhuma Instituição totalmente  consolidada e todas, absolutamente todas,  possuem suas fragilidades e seus contratempos.

Alguém deve ter mesmo interesse por uma Polícia Civil fragilizada e incompetente.

Entrementes, é sabido que a maioria da população deseja uma polícia investigativa forte e atuante, dirigida por gestores comprometidos como os ideais de justiça, abraçados com os princípios da legalidade e moralidade, uma polícia estruturada com sentimento ético, com poder de proteção e autonomia para realizar investigação que aponte os responsáveis pelos delitos e que possa contribuir por uma justiça dinâmica, inconcussa, séria, e, sobretudo, que atenda eficazmente, os interesses sociais.   

Sobre o autor
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

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