A polêmica sobre a redução da maioridade penal

03/07/2015 às 15:38
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Poucos sabem, mas a verdadeira origem da polêmica sobre a redução da maioridade penal está na confusa redação conferida,  propositalmente, à PEC 171/93, vazada nos seguintes termos:

“Art. 1º. O art. 228 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido de parágrafo único e com a seguinte redação:

Art. 228 – São penalmente inimputáveis os menores de 16 anos, sujeitos às normas da legislação especial.

Art. 2º Esta Emenda entra em vigor na data de sua publicação”.

Essa confusa redação deve ser entendida como alteração parcial do art.  228 da CF para ler “16 anos” onde está escrito “18 anos”.

Não faz o menor sentido manter o caput em sua redação original (18 anos) para acrescentar o parágrafo único com a redução da maioridade para 16 anos, a menos que queira induzir o Constituinte Derivado a promover a redução da maioridade seletiva.

Temos razões para crer que essa PEC veio à luz para dar satisfação à opinião pública,  mas de forma a prejudicar a sua regular tramitação por conta da esperada confusão a ser lançada na Câmara Federal onde atuam 513 deputados de diversos partidos e com posicionamentos diferentes.

Iniciada a discussão dessa PEC na Câmara, favorecida pela sua dúbia redação original, houve proposta de reduzir a maioridade penal para 16 anos apenas em relação a crimes cometidos com violência ou grave ameaça, crimes hediondos (como estupro), homicídio doloso, lesão corporal grave ou lesão corporal seguida de morte, tráfico de drogas e roubo qualificado.

Essa proposta foi rejeitada no dia 1º de julho de 2015. No dia seguinte, o Presidente da Câmara colocou em votação um outro substitutivo que reduz a maioridade penal apenas para crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte, eliminando a alusão a outros crimes como tráfico de drogas e roubo qualificado. Esse substitutivo foi aprovado na madrugada do dia 2 de julho  por 323 votos contra 155 votos contrários e duas abstenções.

Inúmeros deputados,  bem como, vários setores da sociedade, inclusive, juristas respeitáveis, condenaram a manobra regimental do Presidente da Câmara ameaçando impetrar mandado de segurança perante o Supremo Tribunal Federal por violação do processo legislativo previsto no  § 5º, do art. 60 da CF, in verbis:

“A matéria constante da proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa”.

Esse dispositivo constitucional, sem embargo das respeitosas opiniões em contrário, não se aplica ao caso sob exame, pois a proposta de emenda, tal como prevista na PEC 171/93, ainda não foi apreciada pela Câmara que discutiu e rejeitou um substitutivo, seguida de discussão e aprovação de um outro substitutivo. A proposta original de redução da maioridade penal de 18 anos para 16 anos não foi objeto de discussão e deliberação pela Câmara dos Deputados. O que foi aprovado é o último substitutivo que estabelece uma redução seletiva da maioridade penal contrariando o fundamento básico da inimputabilidade do menor. A inimputabilidade não está ligada exclusivamente a pessoa de menor idade.

Penalmente inimputável é a pessoa doente mentalmente ou aquela pessoa que tem desenvolvimento retardado ou incompleto que a impede de entender o caráter ilícito do ato que está praticando.

Tanto a emenda rejeitada, como a emenda aprovada contrariam esse princípio lógico à medida que o menor de 18 anos teria plena consciência do que está fazendo em se tratando da prática de crimes graves, mas esse mesmo menor não teria menor ideia do que está fazendo em se tratando da prática de crime menos graves.

Impõe-se, pois, a apreciação da proposta original para desfazer esse equívoco em que incorreram os substitutivos apreciados pela Câmara dos Deputados. A proposta consiste em decidir se o menor de 16 anos é ou não inimputável penalmente.

Não pode a pessoa de 16 anos  ser inimputável e ao mesmo tempo imputável. Seria o mesmo que conferir ao menor de 18 anos o direito de eleger vereadores, deputados estaduais, prefeitos e governadores, mas proibi-lo de eleger deputados federais, senadores e Presidente da República sob o argumento de que para esses últimos cargos se requer um voto maduro.

Voltando à questão da tumultuada votação na madrugada do dia 2 de julho, entendo que a proposta aprovada não feriu o   § 5º, do art. 60 da CF. Segundo a jurisprudência do STF o que não pode ser votado na mesma sessão legislativa é a Emenda rejeitada ou havida por prejudicada, e não o substitutivo que é espécie do projeto originalmente proposto (MS nº 22.503, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 6-6-1997).

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