GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO E A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ESSENCIAIS: UM CONFLITO DE DIREITOS.

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Estudo da possibilidade de ter o servidor público o seu direito de greve efetivado sem ferir o Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos, principalmente no que se refere aos serviços essenciais prestados pelo Estado à sociedade.

GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO E A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ESSENCIAIS: UM CONFLITO DE DIREITOS.

ROMANHOLO, Maria Inês de Assis [1]

FERREIRA, Kátia Regina ²

SEDIYAMA, Elaine Harumi ³

RESUMO: O principal objetivo deste trabalho é estudar a possibilidade de ter o servidor público o seu direito de greve efetivado sem ferir o Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos, principalmente no que se refere aos serviços essenciais prestados pelo Estado à sociedade.

PALAVRAS-CHAVES: Greve, Serviços Essenciais, Servidor Público, Interesse Público.

SUMÁRIO: 1- Introdução. 2-História da Greve no Direito Brasileiro 2.1- A Greve no Direito Privado 2.2- A Greve no Direito Público 3- O Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos e Serviços Essenciais 3.1- Interesse Público X Direito de Greve do Servidor Público 4-Os Limites do Direito de Greve no Serviços Público 5- O STF e a Greve do Servidor Público 5.1 –Aplicação da Lei 7.783/89 6- A Greve e a Responsabilidade Face aos Serviços Essenciais 7- Projeto de Lei do Senado Nº 710/2011 8- Conclusão 9- Bibliografias

  1. Introdução

A greve é uma possibilidade garantida a todo trabalhador de exigir os seus direitos, seja ele da esfera privada ou pública. É um instrumento utilizado em diversas fases da história mundial, devido às péssimas condições de trabalho e também aos baixos salários pagos, ou seja, é o meio utilizado para reivindicações de melhorias para os trabalhadores.

O termo “greve”, de acordo com Dicionário da Língua Portuguesa Houaiss significa: “Interrupção voluntária e coletiva do trabalho pelos funcionários, para obtenção de benefícios materiais e/ ou sociais”.

O direito de greve, no ordenamento jurídico brasileiro, vem assegurado pela Constituição Federativa do Brasil de 1988 em seu artigo 9º, inserido no Capítulo II, o qual se refere aos Direitos Sociais, e em seus parágrafos prescreve que os limites e as responsabilidades serão definidas por lei.

Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.

§ 1º A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

§ 2º Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.

O artigo 9º da Carta Magna traz somente a garantia do exercício do direito de greve para os trabalhadores da esfera privada, ficando para o artigo 37, em seu inciso VII, a previsão de tal direito para os servidores públicos. Este direito não nasceu com a Constituição em 1988, foi introduzido pela Emenda Constitucional nº 19 de 04 de junho de 1998, dependendo de lei específica para sua regulamentação.

Art. 37 A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

VII -  o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;

[...]

A greve dos trabalhadores da iniciativa privada foi regulamentada pela Lei 7.783 de 28 de junho de 1989 que dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais e regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e trouxe em seu artigo 2º a definição do direito de greve: “[...] considera-se legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços ao empregador.”.

Apesar de também ter sido conferido ao servidor público o exercício do direito de greve na Constituição da República, tal direito ainda não foi regulamentado em quase dezessete anos de sua introdução na Carta Magna. Tem-se, porém, a possibilidade de sê-lo, já que tramita no Senado Federal um projeto de lei nº 710/2011 com o objetivo de disciplinar esta matéria tão polêmica.

  1. História da Greve no Direito Brasileiro

2.1 - A Greve no Direito Privado

            Os primeiros relatos de movimentos operários ocorreram no final do século XIX e início do século XX, período de transição do Império para República, no qual ocorreu o crescimento da industrialização brasileira.

            Em 1890, o Código Penal, Decreto nº 847, proibia a greve. No capítulo VI, no qual discriminava os crimes contra a liberdade do trabalho, em seu artigo 206 considerava crime o ato de: “Causar ou provocar cessação ou suspensão de trabalho para impor aos operários ou patrões aumentos ou diminuição de serviço ou salário.”.

            A Constituição de 1937, na segunda parte do artigo 139, considerava a greve e o lockout, paralisação realizada pelos patrões, recursos antissociais, nocivos ao trabalho e ao capital, portanto eram incompatíveis com os superiores interesses da produção nacional.

            A Justiça do Trabalho no Brasil foi organizada pelo Decreto-lei nº 1.237, de 02 de maio de 1939, e trouxe em seu bojo, nos artigos 81 e 83, as punições cabíveis para todos os empregados que praticassem a greve e também para aqueles que instigassem a sua prática.  

No ano seguinte, o Código Penal Brasileiro, Decreto-lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940, vigente ainda hoje, corroborou a característica delituosa da greve, pois considerava crime a paralisação do trabalho seguida de violência e perturbação da ordem, prescrevendo em seu artigo 200 penas de detenção e multa para quem participasse de greve praticando violência.

            As mudanças de diretriz no significado da greve começaram a surgir com a aprovação do Decreto-lei nº 5.452, CLT – Consolidação das Leis do Trabalho em 1º de maio de 1943, que estabelecia além das penas para os grevistas, estabelecia também sanções aos empregadores que recusassem a cumprir decisão proferida em dissídio coletivo, previsão da segunda parte do artigo 722.

            Em 1946, com a promulgação da Constituição em 18 de setembro, muda-se radicalmente a orientação, e a greve, de delito passa a ser um direito do trabalhador, reconhecido no artigo 158, porém sua regulamentação ficaria a cargo de uma lei ordinária, que foi aprovada em 1º de junho de 1964, Lei 4.330.

            Na Constituição de 1967, promulgada durante o regime ditatorial imposto no Brasil pelas Forças Armadas em 31 de março de 1964, o direito de greve continuou presente, mas, os movimentos paredistas deflagrados em 1968 foram reprimidos duramente pelos militares. E somente passado o auge da repressão foi possível o aumento destes movimentos.

            Com o fim do regime militar e a promulgação da constituição cidadã de 1988, o direito de greve dos trabalhadores continuou garantido, tendo sido regulamentado pela Lei 7.783 de 28 de junho de 1989, revogando assim as regras previstas na Lei 4.330 de 1964.

2.2 - A Greve no Direito Público

A greve, em geral, como dito alhures, foi considerada por muitos anos na legislação brasileira um crime passível de punições. A greve no serviço público não poderia ser diferente, a possibilidade nem era discutida e quando isso ocorreu, no Decreto-lei nº 1.237, de 02 maio de 1939, teve suas penas aplicadas em dobro, conforme consta no parágrafo 1º do artigo 83

Art. 83 § 1º Tratando-se de serviço público, ou havendo violência contra pessoas coisa, as penas prevista neste artigo serão aplicadas em dobro sem prejuízo de quaisquer outras estabelecidas nestes capítulos e na legislação penal comum.

A partir daí, a greve do servidor público era sempre mencionada, porém sempre proibida. A Lei nº 4.330/64 (revogada pela Lei 7.783/89) que regulamentava o direito de greve previsto na Constituição de 1946, também vedou o exercício de greve dos servidores públicos, conforme seu artigo 4º:

Art. 4º A greve não pode ser exercida pelos funcionários e servidores da união, Estados, Territórios, Municípios e autarquias, salvo se se tratar de serviço industrial e o pessoal não receber remuneração fixada por lei ou estiver amparado pela legislação do trabalho.

Na Constituição de 1967, a proibição também veio expressa no artigo 157, parágrafo 7º, e além da greve nos serviços públicos, ressaltava a proibição nas atividades essenciais, que seriam definas em lei.

Ainda no regime militar, foi editado o Decreto-lei nº 477, de 26 de fevereiro de 1969, já revogado, que definia infrações disciplinares praticadas por professores, alunos, funcionários ou empregados de estabelecimentos de ensino público ou particulares e também previa punições. Com base nesse Decreto-lei, muitos professores foram demitidos e ficaram impossibilitados de trabalhar em qualquer outra instituição educacional do país. Assim constava no artigo 1º (revogado):

Art. 1º Comete infração disciplinar o professor, aluno, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino público ou particular que:

I - Alicie ou incite à deflagração de movimento que tenha por finalidade a paralisação de atividade escolar ou participe nesse movimento;

§ 1º As infrações definidas neste artigo serão punidas:

I - Se se tratar de membro do corpo docente, funcionário ou empregado de estabelecimento de ensino com pena de demissão ou dispensa, e a proibição de ser nomeado, admitido ou contratado por qualquer outro da mesma natureza, pelo prazo de cinco (5) anos;

II - Se se tratar de aluno, com a pena de desligamento, e a proibição de se matricular em qualquer outro, estabelecimento de ensino pelo prazo de três (3) anos.

Em 1978, foi editado o Decreto-lei 1.632 de 04 de agosto (revogado pela Lei 7.783/89) que tratava da proibição da greve em serviços públicos e em atividades essenciais de interesse da segurança nacional e enumerava quais seriam essas atividades. De acordo com o decreto, incorria em falta grave, punível com demissão ou suspensão, o servidor público que participasse de greve ou para ela concorresse, pois o serviço público era considerado essencial conforme o parágrafo 2º do artigo 1º:

Art. 1º § 2º Consideram-se igualmente essenciais e de interesse da segurança nacional os serviços públicos federais, estaduais e municipais, de execução direta, indireta, delegada ou concedida, inclusive os do Distrito Federal.

Somente em 1998, com a nova redação dada pela Emenda Constitucional nº 19 à Constituição Federal, o direito de greve para o servidor foi reconhecido, sendo assegurado em seu artigo 37, inciso VII, mas limitado pela falta de regulamentação, já que a constituição prevê a edição de lei específica para que o direito seja plenamente exercido.

  1. O Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos e Serviços Essenciais

O Direito Administrativo é regido por vários princípios que se subdividem em princípios expressos e princípios reconhecidos. Expressos são aqueles princípios elencados no caput do artigo 37 da Constituição Federal de 1988, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Já os princípios reconhecidos são todos aqueles que, apesar de não estarem no corpo constitucional, tem a mesma relevância daqueles, pois, se incluem no rol de princípios que orientam e dão diretrizes para a Administração Pública e são reconhecidos pela doutrina geral e pela jurisprudência.

Dentre os princípios reconhecidos, o princípio da continuidade dos serviços públicos é o mais solicitado quando se trata de estudar o direito de greve do servidor público, pois com já visto, o serviço público no Decreto-lei 1.632/78 era considerado essencial. O Decreto-lei foi revogado pela Lei 7.783/89, que regulamenta a greve em geral, e esta por sua vez é silente no que se refere à natureza jurídica do serviço público.

Quanto ao conceito de serviços públicos, assim diz Hely Lopes Meirelles:

Serviço Público é todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado. (1995, p.294)

Hely Lopes Meirelles ainda define:

Serviços públicos: propriamente ditos, são os que a Administração presta diretamente à comunidade, por reconhecer sua essencialidade e necessidade para a sobrevivência do grupo social e do próprio Estado. Por isso mesmo, tais serviços são considerados privativos do Poder Público, no sentido de que só a Administração deve prestá-los, [...] (1995, p.295).

O princípio da continuidade dos serviços públicos tem como principal objetivo não prejudicar o atendimento da população, principalmente no que se refere aos serviços essenciais, que devem ser prestados de forma permanente, pois muitas vezes constituem necessidades urgentes e inadiáveis. Esse princípio, assim como o princípio da supremacia do interesse público, pretende que os interesses da sociedade em geral sejam sempre sobrepostos aos interesses individuais.

Corroborando esse raciocínio vem José dos Santos Carvalho Filho (2009, p.38): “[..] o princípio em foco guarda estreita pertinência com o princípio da supremacia do interesse público. Em ambos se pretende que a coletividade não sofra prejuízos em razão de eventual realce a interesse particulares.”

Quanto aos serviços essenciais, a Lei 7.783/89 traz em seu artigo 10 um rol considerado meramente exemplificativo, pois, nada obsta que outras atividades não previstas na lei, sejam consideradas como essenciais. Assim prescreve o artigo:

 Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:

I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;

                                    II - assistência médica e hospitalar;

                                    III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;

                                    IV - funerários;

                                      V - transporte coletivo;

                                     VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;

                                      VII - telecomunicações;

VIII- guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;

                                      IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;

                                     X - controle de tráfego aéreo;

                                      XI compensação bancária.

E no artigo 11 da referida lei dispõe sobre a obrigatoriedade de se manter os serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da coletividade.

Art. 11. Nos serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

Parágrafo único. São necessidades inadiáveis, da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população.

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Dentre os serviços essenciais que não estão presentes no rol do artigo 10 da Lei 7.783/89 estão aqueles prestados pelo Estado e que são de extrema necessidade para a sociedade, como, por exemplo, os serviços de preservação da saúde pública, de segurança pública, de defesa nacional, dentre outros. Analisando a importância da prestação desses serviços, pode-se concluir que são serviços indispensáveis, verifica-se então que, o princípio da continuidade do serviço público, apesar de não ser absoluto, deve ser sempre observado, respeitando-se as peculiaridades de cada caso concreto.

3.1- Interesse Público X Direito de Greve do Servidor Público

            O princípio da supremacia do interesse público, apesar de não vir expresso no texto constitucional, é uma das vigas mestras do nosso ordenamento jurídico, pois, é dele que vem a imposição de se sobrepor o interesse de toda a coletividade ou da sociedade sobre o interesse individual ou privado. Dessa forma todas as ações adotadas pela Administração devem ser direcionadas ao interesse da coletividade.

            Para Celso Antônio Bandeira de Mello (2005, p.85), o princípio da Supremacia do interesse público é: “[...] princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência.” E continua: “Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social.”.

            Como já foi dito, a greve no serviço público sempre foi proibida no Brasil, pois sempre foi contrária ao princípio do interesse público. A sua proibição era decorrente da natureza dos serviços prestados, por serem considerados serviços essenciais, inadiáveis, amparados, principalmente, pelo princípio da continuidade do serviço.

            Os servidores públicos sempre tiveram a função de viabilizarem a prestação desses serviços essenciais para a sociedade, portanto, estavam impedidos de fazer qualquer tipo de paralisação. O Estado não visa lucro e o fato de a maioria dos servidores gozarem de certos benefícios, como por exemplo, a estabilidade para os servidores estatutários, tornava a greve um direito cada vez mais difícil de ser alcançado.

  1. Os Limites do Direito de Greve no Serviço Público

Assim como todo direito, o direito de greve não é absoluto, portanto, é passível de diversas limitações, principalmente quando o seu exercício venha ferir outros direitos considerados fundamentais para uma sociedade como, por exemplo, os serviços essenciais. A princípio, tais limitações são aquelas constantes no texto constitucional, haja vista, não existir uma lei específica para regulamentar o direito de greve do servidor público.

A Carta Magna, em seu artigo 5º, garante a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, portanto, todo movimento grevista que violar esses direitos, não terá amparo constitucional e no caso do direito de greve do servidor público, que não tem lei específica, sem o amparo da lei maior o exercício é totalmente impossibilitado.

Ainda no artigo 5º, temos o inciso IV que prevê a livre manifestação do pensamento, que no exercício do direito de greve deverá ser sempre observado, pois, não se deve obrigar a adesão de pessoas que não concordem com o movimento. Aqueles que forem contrários a ele deverão ser respeitados na sua forma de pensar. Deve-se inclusive permitir que eles trabalhem, entrem e saiam das repartições públicas sem nenhum impedimento, conforme inciso XV, também do artigo 5º, é o exercício do direito da livre locomoção.

Além dos limites previstos na Constituição, a Lei 7.783/89 traz em seu artigo 6º, parágrafo 1º a vedação de qualquer constrangimento de direitos e garantias fundamentais reforçando no parágrafo 3º o direito de livre locomoção e o direito à propriedade.

Art. 6º   § 1º Em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.

                                   §   2º [...]

§ 3º As manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.

            A greve do servidor público ainda não foi regulamentada, mas deverá respeitar todos os limites previstos na Constituição e possivelmente terá outros limites a serem elencados na lei específica, principalmente no que se refere aos serviços essenciais. O que fica claro é a impossibilidade de violação dos direitos fundamentais da sociedade, pois em uma ponderação de direitos, deverá sempre prevalecer o interesse geral.

  1. O STF e a Greve do Servidor Público

Por diversas vezes o Supremo Tribunal Federal foi provocado por meio de Mandados de Injunção a se manifestar sobre o tema “Direito de Greve do Servidor Público” e nas diversas vezes que se manifestou a decisão foi sempre a mesma, qual seja, constituir o poder legislativo em mora pela falta de edição de lei específica.

Em relação ao Mandado de Injunção e seus efeitos, o STF por muitos anos defendeu a aplicação da teoria não concretista, pela qual, ao Poder Judiciário caberia apenas o reconhecimento formal da inércia legislativa e a consequente comunicação ao órgão competente para a elaboração da norma regulamentadora necessária ao exercício do direito constitucional inviabilizado.

Em 2007, com a conclusão do julgamento dos MIs 670/ES, 708/DF e 712/PA, impetrados, respectivamente, pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo – SINDPOL, pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de João Pessoa – SINTEM e pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado do Pará – SINJEP, os ministros do STF começaram a rever o posicionamento do tribunal quanto aos efeitos do Mandado de Injunção.

A teoria não concretista deixou de ser a teoria mais utilizada, por vezes passou-se a adotar a teoria concretista geral, pela qual, cabe ao Poder Judiciário o suprimento da lacuna diante da ausência da norma regulamentadora; e por vezes a teoria concretista individual, pela qual o caso específico é regulamentado.

No Mandado de Injunção 708 do Distrito Federal, a opinião do seu relator Ministro Gilmar Mendes era no sentido de existir a necessidade de uma solução obrigatória da perspectiva constitucional, assim ele disse:

Identifica-se, pois, aqui a necessidade de uma solução obrigatória da perspectiva constitucional, uma vez que ao legislador não é dado escolher se concede ou não o direito de greve, podendo tão-somente dispor sobre a adequada configuração da sua disciplina. (STF, MI 708/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, Data do Julgamento: 25/10/2007, Tribunal Pleno).

Assim, constatando a Suprema Corte a necessidade de se viabilizar o exercício do direito de greve dos servidores públicos, previsto constitucionalmente, decidiu pela aplicação subsidiária da Lei 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve na iniciativa privada.

MANDADO DE INJUNÇÃO E DIREITO DE GREVE – 7

O Tribunal concluiu julgamento de três mandados de injunção impetrados, respectivamente, pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Espírito Santo - SINDIPOL, pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de João Pessoa - SINTEM, e pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado do Pará - SINJEP, em que se pretendia fosse garantido aos seus associados o exercício do direito de greve previsto no art. 37, VII, da CF ("Art. 37.... VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;") - v. Informativos 308, 430, 462, 468, 480 e 484. O Tribunal, por maioria, conheceu dos mandados de injunção e propôs a solução para a omissão legislativa com a aplicação, no que couber, da Lei 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve na iniciativa privada.
MI 670/ES, rel. orig. Min. Maurício Corrêa, rel. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 25.10.2007. (MI-670)
MI 708/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.10.2007. (MI-708)
MI 712/PA, rel. Min. Eros Grau, 25.10.2007. (MI-712) Grifo nosso.

Dessa forma, no julgamento acima referido, prevaleceu a teoria concretista geral com a utilização da Lei 7.783/89, porém, o uso dessa lei deve ser de forma peculiar, visto existir o interesse da coletividade.

5.1 Aplicação da Lei 7.783/89

A decisão do Supremo Tribunal Federal nos Mandados de Injunção 670/ES, 708/DF e 712/PA configurou uma verdadeira evolução no seu pensamento, reconheceu que o servidor público é um trabalhador como qualquer outro, pois é desse trabalho que retira o sustento de sua vida, e não muda a sua condição pelo fato de trabalhar para o Estado.

A aplicação da Lei 7.783/89 não será tão simples, haja vista o conflito de interesses que existe no exercício de um direito, que a princípio parece tão simples, pois há tempos está previsto constitucionalmente. O STF, antevendo as dificuldades, pacificou que o disposto na lei não deveria ser aplicado tão-somente nos casos de greve no âmbito da Administração Pública, pois a greve nesse setor pode comprometer o interesse público e não apenas os interesses individuais.

Assim, os ministros da Suprema Corte decidiram que alguns artigos da lei geral de greve poderiam ser utilizados na sua íntegra, outros, porém, deveriam ser adaptados à realidade dos serviços prestados pelo Estado por meio de seus servidores. Os artigos aplicáveis, de acordo com a decisão, são do 1º ao 9º; 14; 15; 17. Os artigos alterados para se adequarem à cada situação e suas peculiaridades foram os 2º; 3º e parágrafo único, 4º; parágrafo único do 7º; 9º e parágrafo único e o artigo 14.

De acordo com o parágrafo 1º da lei geral de greve o servidor público poderá exercer o seu direito de greve de forma ampla, pois não houve nenhuma alteração, portanto o servidor deverá apenas decidir a oportunidade de exercê-lo e os interesses a serem defendidos.

            No artigo 2º foi feita a primeira alteração, pois na redação original era permitido que os empregados suspendessem total ou parcialmente a prestação dos serviços, já para os servidores públicos foi suprimido o adjetivo “total”, assim os serviços poderão ser suspensos somente parcialmente.

Art. 2º Para os fins desta Lei considera-se legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a empregador. (grifos nossos)

Art. 2º (adaptado) Para os fins desta Lei considera-se legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica, parcial, de prestação pessoal de serviços a empregador. (grifos nossos)

                                              

O artigo 3º também foi alterado respeitando-se o mesmo raciocínio do artigo 2º, pois, no caput do artigo suprimiu-se a possibilidade de cessação coletiva do trabalho, permitindo somente a cessação parcial. No parágrafo único a necessidade de notificação aos empregadores, antes 48 horas passou para 72 horas anteriores à paralisação, antecedência mínima já prevista no artigo 13 da Lei 7.783/89, quando trata da greve nos serviços ou atividades essenciais, corroborando assim a necessidade da manutenção da prestação dos serviços públicos, avisando com antecedência à sociedade.

Art. 3º Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a cessação coletiva do trabalho.

Parágrafo único. A entidade patronal correspondente ou os empregadores diretamente interessados serão notificados, com antecedência mínima de 48 (quarenta e oito) horas, da paralisação. (grifos nossos)

Art. 3º (adaptado) Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a cessação parcial do trabalho.

Parágrafo único. A entidade patronal correspondente ou os empregadores diretamente interessados serão notificados, com antecedência mínima de 72(setenta e duas) horas, da paralisação. (grifos nossos)

Art. 13 Na greve, em serviços ou atividades essenciais, ficam as sindicais ou os trabalhadores, conforme o caso, obrigados a comunicar a decisão aos empregadores e aos usuários com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas da paralisação.(grifos nossos)

No artigo 4º foi acrescentado o adjetivo “parcial” no texto original, enfatizando assim que a paralisação da prestação do serviço público deverá ser parcial, respeitando-se mais uma vez o Princípio da continuidade do serviço público.

Art. 4º Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembleia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação coletiva da prestação de serviços. (grifos nossos)

 Art. 4º (adaptado) Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembleia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação parcial da prestação de serviços. (grifos nossos)

A alteração do artigo 7º foi a supressão da referência ao artigo 9º, permitindo que somente nas hipóteses do artigo 14, que com as alterações realizadas se refere ao comprometimento da regular continuidade da prestação do serviço público.

Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.

Parágrafo único. É vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na ocorrência das hipóteses previstas nos arts. 9º e 14. (grifos nossos)

 Art. 7º (adaptado) Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho. Parágrafo único. É vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, exceto na ocorrência das hipóteses previstas no art. 14. (grifos nossos)

O artigo 9º alterado, também acentua a necessidade de assegurar a regular continuidade do serviço público, permitindo inclusive, a contratação de serviços quando necessário.

Art. 9º Durante a greve, o sindicato ou a comissão de negociação, mediante acordo com a entidade patronal ou diretamente com o empregador, manterá em atividade equipes de empregados com o propósito de assegurar os serviços cuja paralisação resultem em prejuízo irreparável, pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, bem como a manutenção daqueles essenciais à retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento.

Parágrafo único. Não havendo acordo, é assegurado ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar diretamente os serviços necessários a que se refere este artigo. (grifos nossos)

 Art. 9º Durante a greve, o sindicato ou a comissão de negociação, mediante acordo com a entidade patronal ou diretamente com o empregador, manterá em atividade equipes de empregados com o propósito de assegurar a regular continuidade da prestação do serviço público.

Parágrafo único. É assegurado ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar diretamente os serviços necessários a que se refere este artigo. (grifos nossos)

            Na mesma linha de pensamento vem a alteração do artigo 14, o enfoque fica sempre na continuidade da prestação de serviço público.

Art. 14 Constitui abuso do direito de greve a inobservância das normas contidas na presente Lei, bem como a manutenção da paralisação após a celebração de acordo, convenção ou decisão da Justiça do Trabalho.

 Art. 14 Constitui abuso do direito de greve a inobservância das normas contidas na presente Lei, em especial o comprometimento da regular continuidade na prestação do serviço público, bem como a manutenção da paralisação após a celebração de acordo, convenção ou decisão da Justiça do Trabalho. (grifos nossos)

Como visto, todas as alterações efetuadas no texto da lei foram realizadas com o intuito de adequá-la ao princípio constitucional da continuidade do serviço público, levando-se em consideração a importância do serviço prestado para o andamento da vida em sociedade, objetivando, principalmente, que o exercício do direito de greve seja um direito concreto dos servidores públicos, sem com isso causar danos públicos ao Estado e aos cidadãos.

  1. A Greve e a Responsabilidade Face aos Serviços Essenciais

Os serviços essenciais prestados pelo Estado, como já foi visto, são de extrema importância, são indispensáveis para a sociedade. O direito de greve do servidor público, apesar de ser previsto na Constituição de 1988, vai de encontro aos interesses da coletividade, pois prejudica a regular prestação desses serviços, podendo até causar danos irreversíveis para os cidadãos, dando ensejo à responsabilização pelos prejuízos sofridos.

O vocábulo “responsabilidade” significa, de acordo com o Dicionário da Língua Portuguesa Houaiss, o “dever ou capacidade de responder pelos atos próprios ou de outros”.

Para Carlos Roberto Gonçalves (2007, p. 453) “a palavra “responsabilidade” origina-se do latim re-spondere, que encerra a ideia de segurança ou garantia da restituição ou compensação do bem sacrificado”.

Ainda de acordo com Carlos Roberto Gonçalves (2007, p.454) tem-se que: “A responsabilidade penal é pessoal, intransferível. Responde o réu com a privação de sua liberdade. A responsabilidade civil é patrimonial; é o patrimônio do devedor que responde por suas obrigações”.

O Código Civil, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002, diz que qualquer ação ou omissão poderá gerar a responsabilidade, desde que viole direito ou cause dano a outrem. A responsabilidade no Código Civil se fundamenta com a combinação dos artigos 186 e 927.

 .

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Já as responsabilidades pelos atos praticados durante a paralisação serão apuradas conforme o descrito no artigo 15 da Lei 7.783/89.

Art. 15 A responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos ou crimes cometidos, no curso da greve, será apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil ou penal.

Parágrafo único. Deverá o Ministério Público, de ofício, requisitar a abertura do competente inquérito e oferecer denúncia quando houver indício da prática de delito.

            No que se refere à prestação de serviços essenciais pelo Estado, principalmente nas áreas da saúde pública e segurança pública, como por exemplo, greves em hospitais públicos e também greve de policiais civis e militares, o prejuízo causado poderá ser irreversível e incalculável, portanto, aqueles que se sentirem lesados poderão reivindicar seus direitos diante dos tribunais.

            Os serviços considerados essenciais não podem ser paralisados, pois envolvem direitos fundamentais do cidadão, violar esses direitos significa violar o que está previsto na Constituição da República. O maior obstáculo para regulamentar o direito de greve do servidor público talvez seja justamente a dificuldade de se preservar o direito que tem o cidadão de ter os serviços públicos prestados de forma contínua e o direito que o servidor público tem de reivindicar melhorias por meio da greve, ou seja, justamente a paralisação desses serviços.

  1. Projeto de Lei do Senado Nº 710/2011

O exercício do direito de greve pelo servidor público, como já visto anteriormente, apesar de previsto na Carta Magna, não tem sua garantia por meio de lei específica conforme determinado, mas esse direito pode ser exercido, utilizando por analogia a Lei 7.783/89, lei de greve dos trabalhadores do setor privado, conforme  decisão do Supremo Tribunal Federal.

Existe no Senado Federal um projeto de lei, PLS nº 710/2011, apresentado pelo Senador Aloysio Nunes Ferreira em 30 de novembro de 2011. Esse projeto visa disciplinar o exercício do direito de greve dos servidores públicos, previstos no inciso VII           do artigo 37 da Constituição. Segue a explicação da ementa do projeto de lei:

Assegura o exercício do direito de greve dos servidores públicos da Administração Pública direta, autárquica ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Dispõe que não são servidores públicos, para os fins desta Lei, Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Distritais, Vereadores, Ministros de Estado, Diplomatas, Secretários Estaduais, Secretários Municipais, membros do Poder Judiciário e do Ministério Público. Considera exercício do direito de greve a paralisação coletiva, total ou parcial, da prestação de serviço público ou de atividade estatal dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Dispõe que o estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de convocação dos servidores para assembléia geral que deliberará sobre a paralisação. Estabelece que as deliberações aprovadas em assembléia geral, com indicativo de greve, serão notificadas ao Poder Público para que se manifeste, no prazo de trinta dias, acolhendo as reivindicações, apresentando proposta conciliatória ou fundamentando a impossibilidade de seu atendimento, caso em que poderão os servidores deflagrar a greve. Dispõe que a participação em greve não suspende o vínculo funcional. Estabelece que os servidores em estágio probatório que aderirem à greve devem compensar os dias não trabalhados de forma a completar o tempo previsto na legislação. Veda ao Poder Público durante a greve e em razão dela, demitir, exonerar, remover, substituir, transferir ou adotar qualquer outra medida contra o servidor em greve, salvo, nas hipóteses excepcionais mencionadas nesta Lei. Define serviços públicos estatais essenciais aqueles que afetem a vida, a saúde e a segurança dos cidadãos. Dispõe que durante a greve em serviços públicos ou atividades essenciais, ficam as entidades sindicais ou os servidores obrigados a manter em atividade percentual mínimo de sessenta por cento do total dos servidores, com o propósito de assegurar a regular continuidade da prestação dos serviços públicos ou atividades indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade. O percentual mínimo será de oitenta por cento tratando-se de servidores que trabalham na segurança pública e em caso de serviços públicos estatais não-essenciais deve-se manter em atividade percentual mínimo de cinqüenta por cento do total de servidores. Dispõe que as ações judiciais envolvendo greve de servidores públicos serão consideradas prioritárias pelo Poder Judiciário. Dispõe que julgada a greve ilegal, o retorno dos servidores aos locais de trabalho deverá ocorrer em prazo não superior a quarenta e oito horas contado da intimação da entidade sindical responsável, e em caso de não haver retorno ao trabalho, será cobrada multa diária da entidade sindical responsável. Veda a greve aos membros das Forças Armadas e aos integrantes das Polícias Militares e Corpo de Bombeiros Militares. (grifos nossos)

O PLS 710/2011 tem por objetivo regulamentar de forma rigorosa as paralisações dos servidores públicos. Muitos pontos do projeto de lei vão gerar polêmicas, como por exemplo, o número mínimo de servidores que deverão atuar durante a paralisação. Nos serviços essenciais, a proposta é de um percentual mínimo de sessenta por cento do total dos servidores. Já na segurança pública o percentual mínimo será de oitenta por cento. O projeto está voltado, principalmente, para assegurar a continuidade do serviço público e manter a sua regular prestação.

A definição de quais serão os serviços essenciais também pode gerar polêmica, entre outras ainda estão a antecedência mínima do aviso para deflagração da greve e a substituição de grevistas após decisão judicial. A possibilidade de uma discussão calorosa provocada por esses pontos do projeto poderá atrasar a sua votação definitiva e com isso mais demorada fica a concretização de uma regulamentação para a greve do servidor público.

  1. Conclusão

O direito de greve do servidor público é um direito constitucionalmente previsto, mas, a falta de regulamentação impede o seu exercício de forma plena. A solução encontrada pelo STF foi uma evolução, com certeza, mas não resolve o problema definitivamente, a utilização da lei 7.783/89 é uma solução precária.

A tramitação de um projeto de lei no Senado Federal, o PLS 710/2011, renova as esperanças de um dia a greve do servidor público ser regulamentada, mas muitos entraves vão dificultar a aprovação da lei, principalmente a definição do que seja os serviços essenciais, aqueles que a sociedade mais necessita para sua sobrevivência.

A generalização do conceito de serviços essenciais poderá prejudicar o exercício do direito de greve, pois se todo o serviço prestado pelo Estado for considerado essencial, a adesão dos servidores ao movimento grevista será condicionada a um percentual de servidores que não poderão participar, dessa forma a greve se tornará inócua, não terá a força suficiente para atingir os seus objetivos, o serviço continuará sendo prestado de forma normal e não fará nenhuma pressão aos administradores públicos.

Mais uma vez tem-se um confronto de direitos e princípios, o direito do servidor público de exercer a greve é contrário ao Princípio da Continuidade dos Serviços Públicos, principalmente a continuidade dos serviços essenciais. Tais serviços, por incoerência da Administração, são na maioria das vezes os serviços mais precários, como por exemplo, os serviços prestados pela saúde pública, nos quais muitos médicos e enfermeiros não têm nos hospitais públicos o mínimo necessário para a prestação dos serviços de forma digna, a falta de investimento no setor e a falta de administração dos poucos recursos existentes prejudicam toda a sociedade. Sem a possibilidade de fazer greve, o serviço continuará precário e tanto o servidor, quanto o cidadão ficarão insatisfeitos.

O maior desafio dos legisladores para a edição da lei regulamentadora do artigo 37, inciso VII, cujo tema é a greve do servidor público, é a ponderação dos interesses envolvidos. De um lado o direito do servidor público de fazer greve e de outro o direito da coletividade de ter a prestação dos serviços públicos de forma continua e satisfatória, principalmente os serviços essenciais. Dessa forma, o Congresso Nacional deverá assegurar a possibilidade de exercício do direito constitucional de greve dos servidores públicos, bem como as suas limitações, e também a continuidade na prestação dos serviços públicos, imprescindível para manutenção da paz na sociedade.

  1. Referências Bibliográficas

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[1] Maria Inês de Assis Romanholo, Mestranda na Universidade Presidente Antônio Carlos – Juiz de Fora, Hermenêutica e Direitos Fundamentais, Pós-graduada em Direito do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes, Graduada em Direito pela Universidade Federal de Viçosa, Professora na Faculdade Presidente Antônio Carlos de Ubá – Disciplinas: Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

² Kátia Regina Ferreira, Graduada em Direito pela Faculdade Univiçosa , pós-graduada em Direito e Gestão Pública pela Faculdade Univiçosa, pós-graduanda em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Faculdade Univiçosa e servidora do TJMG.

³ Elaine Harumi Sediyama, Graduada em Odontologia pela Universidade Federal de Uberlândia, pós-graduada em Direito e Gestão Pública pela Faculdade Univiçosa,  pós-graduanda em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Faculdade Univiçosa e servidora do TJMG.

Sobre as autoras
Kátia Regina Ferreira

Graduada em Direito pela Faculdade Univiçosa , pós-graduanda em Direito e Gestão Pública pela Faculdade Univiçosa e servidora do TJMG.

Elaine Harumi Sediyama

Graduada em Odontologia pela Universidade Federal de Uberlândia, pós-graduanda em Direito e Gestão Pública pela Faculdade Univiçosa e servidora do TJMG.

Maria Inês de Assis Romanholo

Mestranda na Universidade Presidente Antônio Carlos – Juiz de Fora, Hermenêutica e Direitos Fundamentais, Pós-graduada em Direito do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes, Graduada em Direito pela Universidade Federal de Viçosa, Professora na Faculdade Presidente Antônio Carlos de Ubá – Disciplinas: Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

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