UMA INVASÃO DA INTIMIDADE

30/07/2015 às 06:07
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O ARTIGO EXPÕE CASO CONCRETO EM QUE SE DISCUTE OS DIREITOS A INTIMIDADE E A PRIVACIDADE.

UMA INVASÃO DA INTIMIDADE

ROGÉRIO TADEU ROMANO

O  Ministério Público Federal abriu inquérito para investigar o site Tudo sobre Todos por  conta da divulgação e venda de dados pessoais na internet.

Além, do nome, o site disponibiliza o sexo, data de nascimento, a cidade, bairro em que a pessoa mora, e CEP onde a pessoa mora, e até um mapa mostrando o perímetro da sua casa. Em alguns casos, as informações estão desatualizadas, mas em outros, até os nomes dos vizinhos aparecem relacionados ao perfil que é buscado.

Em sendo assim ingressou o Parquet  na Justiça Federal com uma ação cautelar com pedido de liminar para retirar do ar o site “tudosobretodos.se”, que fornece ilegalmente informações particulares de cidadãos brasileiros, como endereço, CPF, nome de vizinhos, entre outros dados. 

A ação tem como ré a empresa Top Documents LLC, sediada na República de Seicheles e que mantém o site. Entre os pedidos do MPF à Justiça, estão um requerimento para que empresas brasileiras de Internet não permitam o acesso ao endereço eletrônico, além de uma solicitação ao Reino da Suécia, via Ministério da Justiça, para que retire do ar o “tudosobretodos.se”, tendo em vista que o site possui domínio naquele país europeu. 

Tenha-se em mente o julgamento do CC 120.559, Relator Ministro Jorge Mussi, 3ª Seção do STJ, onde   destacou-se que o fato de um delito ter sido cometido pela internet, ainda que em algumas páginas eletrônicas internacionais, não desloca a competência do caso para a Justiça Federal. Assim de acordo com esse entendimento, para ser fixada a competência da Justiça Federal é necessário que o crime ofenda bens, serviços ou interesses da União ou esteja previsto em tratado ou convenção internacional.

 A inviolabilidade de dados, prevista no artigo 5º, XII, da Constituição, uma garantia constitucional, é correlata ao direito fundamental à privacidade, previsto no artigo 5º, X, da Constituição.

No modelo constitucional que temos, desde 1988, é razoável entender que há um direito do indivíduo de excluir do conhecimento de terceiros aquilo que a ele, só a ele,  é pertinente e que diz respeito ao seu modo de ser exclusivo, seu way of life, no âmbito de sua vida privada.

Há um direito subjetivo fundamental visando a assegurar sua identidade, diante dos riscos proporcionados pela avassaladora pressão que contra ele é exercida pelo poder político e por terceiros  de forma a resguardar sua intimidade.

Tutela o artigo 5º, inciso X, da Constituição o segredo e a liberdade da vida privada. Mas há separação entre a intimidade e outras manifestações da privacidade: vida privada, honra e imagem das pessoas.

Para René Ariel Dotti(Proteção da vida privada e liberdade de informação, São Paulo, 1980), a intimidade se caracteriza como “a esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais”. Adriano de Cupis(Riservatezza e segretto, 1969, pág. 115) ensina que  a intimidade é o modo de ser da pessoa que consiste na exclusão do conhecimento de outrem de quanto se refira à pessoa mesma.

Por sua vez, a garantia do sigilo de dados funciona como um complemento aos direitos à privacidade e à intimidade.

Bem disse o Professor Tércio Sampaio Ferraz que ninguém pode ser constrangido a informar sobre sua privacidade. Não estamos no âmbito puro e simples do público-politico, onde o que se tem é a transparência; estamos no terreno da individualidade, onde há a privacidade que se rege pelo princípio da exclusividade.

Sabe-se que o direito à privacidade é o conjunto de informações acerca do individuo que ele pode decidir manter sob seu exclusivo controle , ou comunicar, decidindo a quem quando, onde e em que condições, sem isso poder ser legalmente sujeito, como disse Matos Pereira(Direito de informação, Lisboa, 1980, pág. 15).

Lembre-se que o nome é da pessoa, é patrimônio dela como pessoa natural. O nome integra os direitos da personalidade, direitos absolutos, especialmente protegidos por lei. Daí porque ninguém pode usurpar o nome da pessoa, que é privado e protegido como tal.

Não devemos esquecer que o artigo 5º, inciso XII, da Constituição, ao garantir a inviolabilidade do segredo, em suas diversas vertentes, consagrou o princípio da reserva de jurisdição em matéria de quebra de sigilo.

Essa a linha a adotar, na trilha da experiência constitucional italiana, para quem a quebra do sigilo pressupõe uma decisão Judicial motivada, caso a caso.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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