Consumidor mais crítico

09/08/2015 às 18:42
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A importância do consumidor mais crítico.

Primeiramente, cabe ressaltar alguns marcos históricos que contribuíram para a evolução do Direito do Consumidor no Brasil e no mundo.

Segundo o autor Altamiro José dos Santos (pp. 78/79, 1987) pela “ Lei nº 235 do Código de Hamurabi (2.300 A.C.), o construtor de barcos estava obrigado a refazê-lo, em caso de defeito estrutural, dentro do prazo de até um ano”.

Isso demonstra que, desde há muito tempo, já existia preocupação de tutelar o consumidor nas relações consumeristas.

Mais adiante, na história da humanidade, o Direito do Consumidor, nos Estados Unidos, teve importante consolidação, no século passado, durante o governo de John Fitzgerld Kennedy.

John Kennedy editou importante política acerca da proteção dos consumidores no mercado consumerista norte americano.

Segundo transcrição da obra de Souza (p. 56, 1996), John Kennedy encaminhou relavante documento para o Poder Legislativo Norte Americano, contendo os seguintes termos:

“ (...) os bens e serviços colocados no mercado devem ser sadios e seguros para o uso, promovidos e apresentados de uma maneira que permita ao consumidor fazer uma escola satisfatória;

Que a voz do consumidor seja ouvida no processo de tomada de decisão governamental que detenha o tipo, a qualidade e o preço dos bens e serviços colocados no mercado;

Que o consumidor tenha o direito de ser informado sobre as condições e serviços;

E que tenha ainda o direito a preços justos”. (Miriam de Almeida Souza, p. 56, 1996).

Asseverou Souza (p. 48, 1996) também em sua obra que, com a crescente procura do setor primário, causada pela Revolução Industrial:

 

“ o produtor precisa dar escoamento à produção, praticando, às vezes, atos fraudulentos, enganosos, por isso mesmo, abusivos. A justiça social, então, entendeu ser necessária a promulgação de leis para controlar o produtor e fabricante e proteger o consumidor comprador”. (Miriam de Almeida Souza, p. 48, 1996).

No ano de 1.985, as Nações Unidas, através da Resolução nº 39/248 instituiu princípios, objetivos e normas a serem seguidas pelos Estados integrantes da ONU (Organização das Nações Unidas), reforçando as políticas protetivas dos consumidores, o que representou um marco mundial no que tange ao reconhecimento dos direitos dos consumidores.

Já no Brasil, as questões relativas aos direitos dos consumidores não foram esquecidas quando da promulgação da Constituição Federal de 1.988.

Essa nossa referida Carta Magna Fundamental de 1.988, estabeleceu em seu art. 5º, inciso XXXII que “o Estado promoverá, na fora da lei, a Defesa do Consumidor”.

Importa ressaltar que a tutela do consumidor foi inserida como um dos Princípios que regem as atividades econômicas, no Brasil, consoante art. 170, V da Constituição Federal de 1.988, visando “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”, conforme os seguintes termos:

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

 I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.” (Art. 170, V da Constituição Federal de 1988). Grifo nosso.

Dessa forma, como instrumento a mais na busca do referido objetivo, o Código de Defesa do Consumidor é fruto da determinação contida no art. 48 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, o qual fora cumprido, no ano de 1.990, mediante a aprovação e publicação da Lei nº 8078/1990 (CDC).

Nesta presente atividade, entendeu-se importante registrar, conforme projeto monográfico respectivo, alguns significados de determinadas palavras afetas ao Direito do Consumidor, visando a uma melhor compreensão e sentido desse trabalho.

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) define em seu art. 2º o consumidor como destinatário final de um produto ou serviço.

O consumidor pode assumir uma denotação coletiva diante de uma situação na qual exista um conjunto de pessoas envolvidas em uma mesma relação de consumo, conforme parágrafo único do art. 2º do Código de Defesa do Consumidor.

Consumidor pode vir a ser uma pessoa lesada em acidente de consumo (art. 17 do CDC).

Assim, o consumidor final é o último adquirente de um produto ou de um serviço, sem a intenção de utilizá-lo para outro fim, que não o de uso ou consumo do bem adquirido.

Nesse sentido, a aquisição não pode ser para uso comercial, senão será inaplicável o CDC, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

“Ementa: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. TEMPESTIVIDADE. REVISÃO DE PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. CONSUMIDOR FINAL. ATIVIDADE EMPRESARIAL. NÃO INCIDÊNCIA DO CDC. SÚMULA N. 83/STJ. LIMITAÇÃO DOS JUROS. IMPOSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. INEXISTÊNCIA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. 1. Aplica-se a Súmula n. 7 do STJ na hipótese em que a tese versada no recurso especial reclama a análise dos elementos probatórios produzidos ao longo da demanda. 2. É inaplicável o Código de Defesa do Consumidor a relação em que o consumidor final adquire produto a ser utilizado em sua atividade empresarial. Súmula n. 83/STJ. 3. A alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado (REsp repetitivo n. 1.112.879/PR). 4. Não merece conhecimento recurso especial fundado em dissídio jurisprudencial ante a não realização do devido cotejo analítico e a conseqüente ausência de demonstração de similitude fática e jurídica entre o acórdão recorrido e o paradigma. 5. Agravo regimental desprovido. (STJ – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL AgRg no AREsp 155559 SP 2012/0048773-5 (STJ). Data de publicação: 0409/2013)”. Grifo nosso.

Em relação ao conceito de fornecedor, o art. 3º do Código de Defesa do Consumidor estabelece que:

“Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. (Art. 3º do CDC).

Sendo assim, podemos considerar fornecedor como aquele(a) que oferta ou disponibiliza ao público a venda de gêneros e mercadorias de um determinado seguimento comercial, ou seja, são os fabricantes, os vendedores ou os prestadores de serviços.

Ocorre que, no Brasil, ocorrem muitas práticas abusivas, geralmente perpetradas pelos fornecedores em face dos consumidores finais, em muitos casos, aproveitando a ausência de conhecimento do consumidor; a hipossuficência financeira deste; a ausência de experiência naquela situação específica; falta ou omissão de informação relevante ou outras práticas irregulares.

Por essas razões é que se entende que existe a necessidade de o brasileiro, em geral, tornar-se uma sociedade composta por “consumidores mais críticos”, como instrumento capaz de auxiliar a evitar ou a mitigar a incidência de práticas indevidas que causam prejuízos aos consumidores nas diversas relações de consumo praticadas no Brasil.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 4º, I, instituiu o Princípio da Vulnerabilidade do consumidor, nas relações de consumo. Segundo os doutrinadores Almeida e Cavalhieri Filho (p. 15, 2010), tal Princípio:

“(...) é o ponto mais importante da proteção do consumidor, sobre o qual está fundada toda a linha filosófica do consumidor, visto que, este apresente em si sinais de fragilidade e impotência diante do poder econômico do fornecedor”. Grifo nosso.

As práticas comerciais no Brasil são tão importantes que quem estiver exposta a elas será considerado consumidor, consoante entendimento proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, amparado pelo art. 29 do CODECON, nos seguintes termos:

“PROCESSO CIVIL - ART. 267, INCISOS II E III, § 1º DO CPC - INAPLICABILIDADE - AUSÊNCIA DE DEPÓSITO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS - PRECLUSÃO - DESNECESSIDADE DA PROVA ORAL - APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 29 DO CODECON - CONCEITO DE PRÁTICAS COMERCIAIS - ÔNUS DA PROVA DA AUTORA. No caso de não pagamento dos honorários periciais, não há falar em aplicação do disposto no art. 267, incisos II e III, § 1º, do CPC, mas sim na aplicação do princípio da preclusão. Se a prova oral é despicienda, não provoca cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide. O conceito de consumidor deve levar em conta a disposição contida no art. 29 do CODECON, que equipara a consumidor, para os fins do capítulo em que se insere e do seguinte, todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas comerciais. Os contratos firmados após o advento do Novo Código Civil são regidos pelos princípios da boa-fé objetiva, eticidade, socialidade e operabilidade, concretizados no sistema das cláusulas gerais, que permitem a revisão de contratos que ofendam tais princípios contratuais, independentemente de estarem presentes os requisitos da teoria da imprevisão, adotada no art. 478 do mesmo diploma legal. Se não existem nos autos provas dos alegados abusos cometidos pelo réu, não há como dar provimento ao recurso, eis que o ônus de provar pertencia ao autor, a teor do disposto no art. 333, inciso I, do CPC. (TJ-MG 200000051479220001 MG 2.0000.00.514792-2/000(1), Relator: LUCAS PEREIRA, Data de Julgamento: 18/08/2005, Data de Publicação: 22/09/2005)”. Grifo nosso.

Dentre as práticas comerciais, existem as “abusivas” nas relações consumeristas. Tais práticas abusivas, na verdade, são aquelas que extrapolam os limites estabelecidos pela legislação e estão vedadas, de maneira exemplificadamente, pelo art. 39 do CDC.

Importa ressaltar que o grande aspecto desfavorável das práticas abusivas, no mercado de consumo, é que elas causam um desequilíbrio nas relações existentes entre fornecedores e consumidores finais, deixando estes em posição extremamente vulnerável e com grandes riscos de suportar prejuízos, danos morais e/ou materiais, conforme o caso.

Nesse contexto, extremamente importante se torna a atuação dos Órgãos de Proteção e Defesa dos Consumidores, visto que tais órgãos possuem a atribuição legal de aplicar multas aos fornecedores de produtos ou serviços, sempre que houver infração às normas consumeiristas, além de proceder à análise de cláusulas dos contratos mantidos entre fornecedores e consumidores para aferir situações de abusividade, consoante entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. ATRIBUIÇÃO LEGAL DOS ÓRGÃOS DE DEFESA DO CONSUMIDOR (PROCON). PODER REGULAMENTAR E SANCIONADOR. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS POR ÓRGÃO DE DEFESA DO CONSUMIDOR PARA AFERIR ABUSIVIDADE. POSSIBILIDADE. SANÇÃO ADMINISTRATIVA POR CLÁUSULA QUE ESTA CORTE ENTENDE NÃO ABUSIVA. ILEGALIDADE DA SANÇÃO. ATO ADMINISTRATIVO QUE, PRETENDENDO DIRIMIR CONFLITO NA SEARA CONSUMEIRISTA, DETERMINA AO FORNECEDOR DE PRODUTOS E SERVIÇOS A RESTITUIÇÃO DE VALORES AO CONSUMIDOR. IMPOSSIBILIDADE. ILEGALIDADE DO ATO. 1. Constatado que a Corte de origem empregou fundamentação adequada e suficiente para dirimir a controvérsia, é de se afastar a alegada violação do art. 535 do CPC. 2. Os órgãos de defesa do consumidor possuem a atribuição legal de aplicar multas aos fornecedores de produtos ou serviços sempre que houver infração às normas consumeiristas, observada a proporcionalidade, mediante ponderação sobre a gravidade da infração, vantagem auferida e condição econômica do fornecedor. 3. Incumbe aos órgãos administrativos de proteção do consumidor proceder à análise de cláusulas dos contratos mantidos entre fornecedores e consumidores para aferir situações de abusividade. Inteligência dos arts. 56 e 57 do CDC e 18 e 22 do Decreto 2.181/97. 4. Não obstante, a Segunda Seção desta Corte assentou, no julgamento do REsp 1.119.300/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC, que "é devida a restituição de valores vertidos por consorciado desistente ao grupo de consórcio, mas não de imediato, e sim em até trinta dias a contar do prazo previsto contratualmente para o encerramento do plano" (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 27/8/2010). Assim, aplicando o direito à espécie, resulta ilegal a aplicação de sanção administrativa em virtude de previsão contratual que a jurisprudência desta Corte entende não abusiva. 5. É ilegal, por extrapolar do seu poder regulamentar e sancionador, todo provimento de órgãos de defesa do consumidor que, pretendendo dirimir conflitos nas relações de consumo, determina ao fornecedor de produtos ou serviços a restituição de valores ao consumidor. 6. Recurso especial não provido. (STJ, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 22/04/2014, T1 - PRIMEIRA TURMA)”. Grifo nosso.

Atualmente, a capacidade de compra dos brasileiros, em geral, aumentou de tal forma como nunca se tinha visto na história de nosso país. Em qualquer cidade do Brasil é fácil constatar a abertura de novos estabelecimentos em diversos ramos comerciais e industriais.

Com o aumento do poder aquisitivo, houve um aumento manifesto da compra de produtos e de serviços. Nesse contexto, apesar de questionável possível evolução “social”, fato é que a parte da sociedade brasileira, outrora, excluída, inclusive, do mercado consumerista, está negociando e comprando cada vez mais produtos e/ou serviços nas diversas relações consumeristas praticadas no Brasil.

Essa constatação de aumento de rentabilidade, somada à facilitação de crédito e redução de preços, através do Mercosul e de outros Tratados Internacionais, estão desencadeando verdadeira multiplicação dos mais variados hábitos consumeristas.

É fácil perceber que o povo brasileiro jamais adquiriu tantos bens móveis e imóveis (veículos, computadores pessoais, telefones fixos, celulares, apartamentos, casas, etc.), como vem adquirindo nos dias atuais, assim como jamais, em nossa história, a população brasileira firmou tantos instrumentos contratuais, tais como de locação, de prestação de serviços de telefonia, de internet, de TV´s a cabo, de planos de saúde, de planos de seguros, etc.

Entretanto, em meio à referida crescente participação dos brasileiros, no mercado consumerista, infelizmente, constata-se que avançou também um aspecto muito negativo, qual seja, a de violação dos direitos dos consumidores.

Por esse motivo, o Poder Judiciário e os Procons recebem muitas reclamações de consumidores, sentindo-se prejudicados em diversas relações de consumo, em razão de práticas abusivas e ilícitas perpetradas pelos fornecedores de bens e de serviços.

Dessa forma, diante do elevado crescimento das reclamações de consumidores finais, torna-se extremamente necessário que os consumidores brasileiros sejam constantemente conscientizados de seus direitos, bem como protegidos pelo Poder Público, especialmente, através de órgãos do Procon e do Poder Judiciário.

Importa ressaltar, que, diferentemente do que muitas pessoas imaginam, nós não somos consumidores tão somente quando adquirimos um bem dentro ou fora de algum estabelecimento comercial ou quando firmamos um instrumento contratual.

Continuamos como consumidores de direito, quando utilizamos os produtos comprados ou serviços contratados, visto que durante a utilização do que foi adquirido ou contratado, ainda temos direitos, como, por exemplo, o direito de “garantia”.

Assim, verifica-se importante conscientizar os consumidores de que existem direitos que lhes dizem respeito e que são inerentes ao momento da compra ou da contratação e que há outros direitos que são relacionados ao momento de uso do bem ou serviço adquirido ou pactuado, consoante estabelecido pela microssistemática jurídica de proteção e de defesa do consumidor final.

Portanto, sendo a prática consumerista um verdadeiro costume atual e inarredável dos cidadãos brasileiros, revela-se imprescindível a instituição de medidas por parte do Poder Público, visando, de modo efetivo e eficaz, proteger e educar os consumidores brasileiros.

A fim de empreender a referida proteção dos consumidores, o Poder Público brasileiro criou o PROCON, cuja sigla quer dizer “Proteção ao Consumidor”, órgão de atuação no âmbito administrativo e ao qual compete combater as infrações praticadas no mercado contra os consumidores, bem como orientar e educar estes em relação aos seus direitos.

Em que pese seja extremamente louvada a atuação dos Procons, é certo que a maior parcela de atuação desse importante órgão ainda está voltada para combater as práticas abusivas perpetradas nas relações de consumo, razão pela qual se torna necessária aumentar a atuação, no âmbito preventivo, em todo o Brasil, no que concerne ao desenvolvimento de uma estratégia efetiva de educação e de orientação dos consumidores, visando preveni-los contra possíveis irregularidades praticadas no mercado.

A atuação do Procon ocorre, mediante instauração de procedimentos administrativos investigativos, nos quais o fornecedor reclamado terá sempre o seu direito de exercer o contraditório e ampla defesa, em relação aos fatos que lhe foram imputados na reclamação feita pelo consumidor que se sentiu prejudicado.

Em várias localidades do Brasil, temos Procons Municipais e Estaduais, sendo que ao Procon Estadual compete a tutela dos direitos difusos e coletivos dos consumidores, ou seja, a tutela de interesses transindividuais existentes, nas relações de consumo, enquanto que ao Procon Municipal foi atribuída a competência para defesa dos direitos e interesses individuais dos consumidores.

Importa ressaltar a lição dos doutrinadores João Batista de Almeida e Sérgio Cavaliere Filho (p. 16, 2010), os quais nos lembram que:

 

“O objetivo da Política Nacional do Consumo é harmonizar os interesses envolvidos e não o confronto, pois, é de interesse das partes, ou seja, dos consumidores e fornecedores, o cumprimento das relações de consumo, com o atendimento das necessidades dos primeiros e a execução do objetivo principal que justifica a existência do fornecedor, ocasionando, assim, o equilíbrio entre as partes”. (João Batista de Almeida e Sérgio Cavaliere Filho, p. 16, 2010). Grifo nosso.

As atribuições de ambos os Procon são regidas pela Lei nº 8078/90 (Código de Defesa do Consumidor), pelo Decreto nº 2181/1997, o qual dispõe do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, além de outras fontes normativas aplicáveis à espécie.

Importa ressaltar a existência do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), que se trata de um órgão criado pelo Governo Federal e que se encontra subordinado ao Ministério da Justiça.

O referido DPDC possui a competência de coordenar o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, criado pelo Decreto nº 2181/97, mediante expedição de recomendação jurídica e/ou administrativa para atuação não apenas do Procon mas também dos demais órgãos de proteção do consumidor final existentes.

O DPDC tem uma atribuição de extrema relevância que é de garantir, em qualquer Procon e em órgão de finalidade similar, o funcionamento de um sistema nacional de informações de defesa do consumidor (SINDEC).

O aludido SINDEC registra a instauração de reclamações no Procon, possibilitando o acompanhamento pelos interessados das respectivas tramitações, servindo como um importante instrumento de armazenamento de informações com as quais trabalham os órgãos de defesa do consumidor.

Segundo o doutrinador Figueiredo (p. 416, 2009), os órgãos municipais, estaduais e federais que fiscalizam o mercado consumerista, visando ao cumprimento do caput e parágrafo primeiro do art. 55 do CDC, devem:

“manter comissões permanentes para a elaboração, revisão e atualização das normas, com participação obrigatória de consumidores e fornecedores, devendo estes ser notificados para prestar informações sobre questões nas quais os direitos dos consumidores devem ser protegidos, sob efeito do crime de desobediência, sendo resguardado o segredo industrial”. (Simone Diogo de Carvalho Figueiredo e Fábio Vieira Figueiredo, 2009, p. 416).

 

Em Minas Gerais, por exemplo, o SINDEC é gerido pelo Procon Estadual, o qual promove a disponibilização desse sistema de informações para cada Procon Municipal, além de ofertar cursos de aperfeiçoamento e de orientação relativos aos Direitos do Consumidor.

 Em Minas Gerais, o Procon Estadual se trata de um órgão que pertence ao Ministério Público Estadual, para agir em defesa dos direitos consumeristas de âmbito difuso, coletivo ou individual homogêneo, ficando a proteção do direito individual puro do consumidor a cargo do Procon Municipal.

Dessa forma, em caso de venda casada, de cláusulas contratuais abusivas, de propaganda enganosa, de comercialização de produtos sem o devido rótulo, além de outras violações aos direitos “metaindividuais”, no âmbito da defesa do consumidor, o Ministério Público Estadual, através da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor ou do Procon Estadual agirá, com o intuito de suspender a infração praticada, podendo impor sanção(ões) ao estabelecimento autuado, nos termos da legislação de regência aplicável à espécie.

Em relação a conserto ou troca de bens adquiridos, cobrança indevida de valores, violação contratual, defeitos aparentes ou ocultos, a reclamação desses fatos deve ser feita pelo consumidor perante ao Procon Municipal ou junto ao Juizado Especial das Relações de Consumo local, visto que se tratam de direito individual inerente ao consumidor final.

Nesse sentido, Ada Pellegrini Grinover, em conjunto com outros autores do anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor, ensinou que:

“Caberá ao fornecedor, conhecedor de seu produto ou serviço, informar sobre “outros” dados que, no caso concreto, repute importantes. Se não o fizer voluntariamente, assim o determinará o juiz ou a autoridade administrativa, independente da reparação e da repressão (administrativa e penal).(Código de defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto, Rio de Janeiro: Forense, 10ª ed., 2011, vol. p. 289,290 e 291.” (Grifamos e negritamos).

Percebe-se, portanto, que o microssistema de proteção jurídica do consumidor prevê a tutela deste, tanto no âmbito administrativo, quanto judicial, com repercussão, inclusive, penal, dependendo da gravidade da infração cometida contra o consumidor.

O referido microssistema de tutela jurídica dos consumidores é executado, com as devidas adequações em termos de competência, por órgãos públicos de todos os Entes do Brasil, além de entidades privadas que possuem como objetivo a defesa do consumidor, consoante art. 105 do Código de Defesa do Consumidor, nos seguintes termos:

“Integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), os órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal e municipais e as entidades privadas de defesa do consumidor”. (Art. 105 do CDC). Grifo nosso.

É oportuno ressaltar que a inexistência do Procon e dos demais órgãos de defesa do consumidor traria diversos prejuízos para os consumidores finais.

Isso porque diversos fornecedores iriam ofertar ao público mercadorias impróprias para o uso ou consumo humano.

Muitas empresas e lojas de “shopping´s” espalhados pelo Brasil iriam praticar propagandas enganosas e/ou abusivas em face do consumidor.

Sem esquecer de que vários fornecedores elaborariam cláusulas de instrumentos contratuais, com teores expressamente abusivos e/ou irregulares, sem contar o mal atendimento, com possibilidade, inclusive, discriminatória, em desfavor do consumidor, pois, se com a proteção legislativa e existência dos órgãos de tutela do consumidor, tais infrações, infelizmente, ainda ocorrem, acreditamos, portanto, que a situação poderia ser pior se não existissem os órgãos e entidades de proteção do consumidor.

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Em caso da referida inexistência, várias entregas poderiam atrasar, por exemplo, sem motivo. Dessa forma, podemos perceber o quão importante é a existência dos Procons, Estadual e Municipal, bem como das demais entidades privadas que objetivam a defesa dos interesses dos consumidores, visto que tais órgãos e entidades, certamente, contribuem para evitar tais infrações e outras irregularidades.

Com efeito, nos locais onde não há Procon, tampouco entidade particular de defesa do consumidor, os sentimentos de impunidade e de ausência de fiscalização aumentam,  possibilitando a ocorrência de venda de produtos sem condições ou com condições inadequadas de uso ou de consumo; com validade expirada; sem rotulagem devida; fornecedores negando resolver problemas que prejudicam os consumidores, além de tantas outras práticas infrativas.

Alguns empresários no Brasil, ao ficarem cientes de que uma localidade não possui órgão de defesa do consumidor, encaminham suas mercadorias e/ou serviços de qualidade duvidosa ou inferior para serem negociados em tais localidades. Essa lógica indevidamente praticada é de fácil compreensão, pois as mercadorias e bens de qualidades superiores são comercializados, pelo mesmo empresário, nas localidades com melhor estruturadas, nas quais existem pelo menos um órgão integrante do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, visto que, nesses locais, se ofertar produtos ou serviços de má qualidade, o risco de ser autuado e de pagar multa compensatória pela infração cometida é muito grande.

Há casos que fornecedores chegam a praticar, inclusive, estelionatos, em desfavor dos consumidores, enganando-os com serviços de linhas telefônicas e de internet, oferecendo sofás terapêuticos sem nenhuma comprovação técnica científica, soluções “milagrosas” para emagrecimento, causando sérios prejuízos à saúde dos consumidores, etc.

Sendo assim, verifica-se extremamente importante a mera instalação e funcionamento de órgão de defesa do consumidor, pois contribui para proteção dos consumidores de uma determinada localidade.

 Note-se, assim, que os efeitos decorrentes da ausência de funcionamento local de órgão público ou entidade particular de defesa dos direitos do consumidor é bastante prejudicial para os consumidores que participam das relações consumeristas em tais localidades, visto que o mercado oferece produtos e/ou serviços de qualidade questionável ou imprópria para uso ou consumo humano, potencializando, portanto, o surgimento de prejuízos em desfavor do consumidor.

Dessa forma, conclui-se que inúmeros e valiosos são os benefícios que decorrem da instalação e funcionamento dos Procons e entidades privadas que realizam a proteção dos direitos dos consumidores em uma determinada localidade.

Corroborando o referido beneficiamento, sempre que há instalação de um Procon, em um Município, o mercado deste ganha aprimoramentos, em favor do consumidor, resultando em uma melhor obediência, especialmente, por parte dos fornecedores, dos dispositivos previstos no Código de Defesa do Consumidor e das demais legislações de regência que tutelam o consumidor final.

Através de medidas de cunho educativo e orientativo empreendidas pelo Procon, os consumidores ficam cientificados dos seus direitos existentes nas relações de consumo e, por conseguinte, passam a exigir mais os seus direitos.

O consumidor mais exigente gera uma prevenção coletiva e difusa para o moradores da região, visto que as mercadorias e serviços passam a ser ofertados, com mais qualidade, o que, certamente, beneficia os consumidores.

Importa ressaltar que ao Procon compete não apenas educar e orientar o consumidor final, mas também agir, visando orientar e educar os empresários, mediante atos fiscalizatórios, os quais, de início, devem substituir as medidas repressivas, por atitudes educativas e de orientações acerca do cumprimento da legislação de regência, conforme cada caso.

Os ganhos não param por aí, visto que nas localidades onde existe pelo menos um órgão de defesa do consumidor, podem ser realizadas reuniões com entidades e/ou associações tanto de consumidores, quanto de fornecedores, visando debater um determinado tema de interesse de uma ou ambas categorias, além da ministração de cursos conscientizadores dos direitos do consumidor, de palestras, de visitas a empreendimentos comerciais, bem como veiculação da educação para hábitos de consumo através de emissoras de rádio, de televisão ou de jornais escritos.

Diante do exposto, podemos concluir que medidas como estas, indubitavelmente, são capazes de contribuir, ao menos, para mudar substancialmente as caracterísiticas e as qualidades de um comércio local, visando uma melhor tutela, na prática, dos direitos e interesses individuais e metaindividuais dos consumidores, nas mais variadas relações de consumo existentes, conforme objetiva o microssistema jurídico brasileiro de proteção dos direitos do consumidor final.

Nesse sentido, o doutrinador Hélio Zagheto Gama (2004, p. 18) asseverou que para o Brasil executar a política nacional das relações de consumo, serão necessários “instrumentos voltados para defesa do consumidor com atuações nos campos da educação, da orientação e das identificações de situações insatisfatórias dos consumidores”.

Afinal, qQuais as vantagens e contribuições oriundas da formação de consumidores mais críticos, nas diversas relações de consumo existentes no Brasil?

Importa ressaltar que uma possível contribuição para diminuição das infrações praticadas pelos fornecedores pode vir a ser a formação de consumidores mais críticos, de modo a proporcionar maior efetivação dos direitos do consumidor, conquista que, sem nenhuma dúvida, podemos considerar extremamente louvável, em meio a uma sociedade que convive com os enormes anseios dos donos do capital que fomentam o sistema capitalista praticado no Brasil.

É notório que a população brasileira, em sua grande maioria, ainda desconhece seus verdadeiros direitos enquanto consumidores finais.

Nesse processo de formação de consumidor mais crítico, torna-se imprescindível o conhecimento prévio por parte dos consumidores finais de seus direitos previstos na Constituição Federal de 1988, bem como na legislação infraconstitucional (Código de Defesa do Consumidor e demais legislação especial) no que concerne às relações de consumo.

A Lei Federal nº 12.291 de 2010 tornou obrigatória a manutenção de exemplar de Código de Defesa do Consumidor nos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços, com cominação de multa, em caso de descumprimento, no montante de até R$1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), conforme arts. 1º e 2º do referido Diploma Legal, in verbis:

“Art. 1º São estabelecimentos comerciais e de serviços obrigados a manter, em local visível e de fácil acesso ao público, 1 (um) exemplar de Código de Defesa do Consumidor.

Art. 2º O não cumprimento do disposto nesta Lei implicará as seguintes penalidades, a serem aplicadas aos infratores pela autoridade administrativa no âmbito de sua atuação:

I – multa no montante de até R$1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos);

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.” Grifo nosso.

Apesar de a referida Lei representar importante avanço na defesa do consumidor final, entendemos que o Poder Público ainda necessita desenvolver mais políticas públicas de defesa dos consumidores finais.

Não podemos nos esquecer de que tão somente a disponibilização de um Código de Defesa do Consumidor não é de todo suficiente, apesar de importante, pois existem aquelas senhoras donas de casa, os velhinhos e as velhinhas e  ainda alguns cidadãos brasileiros que não tiveram, infelizmente, oportunidade de estudar, sendo que é preciso também ser criado mecanismos de inclusão dessas pessoas na política pública de defesa do consumidor final.

Visando equacionar ao referido problema, entendemos que o legislador brasileiro poderia exigir a disponibilização de cartilhas simplificadas, que esclareçam de forma mais fácil e mais clara possível quais são os direitos básicos dos consumidores, visando ao entendimento exatamente pelos senhores e senhoras que não tiveram oportunidade de estudar, sendo que essas cartilhas deveriam ser disponibilizadas também nos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços para consulta da população mais carente e mais simples.

Existem ainda aqueles cidadãos que, apesar de instruídos e alfabetizados, naturalmente, não conseguem, data maxima venia, entender os termos técnicos previstos no Código de Defesa do Consumidor, como por exemplo, o instituto da “decadência”, tão importante para proteção do consumidor final.

Por essas razões, a difusão do conhecimento dos direitos dos consumidores necessita avançar no Brasil, mediante realização de maior número possível de palestras, de ministrações e de cursos básicos sobre direitos do consumidor final, em escolas, em associações dos bairros, nas comunidades, podendo ainda ser distribuídas cartilhas explicativas para toda população em suas residências.

A título de exemplo, pode vir a ser realizada também a produção de “revistinhas em quadrinhos”, versando sobre histórias acerca de direitos do consumidor vividas pelos personagens infantis, a fim de ser distribuídas tais revistinhas para crianças e jovens nas escolas de ensinos infantil, fundamental e médio em todo o Brasil, como parte do trabalho pedagógico da educação dos direitos dos consumidores.

Essa situação relativa à ausência de conhecimento prévio dos direitos dos consumidores, nas relações de consumo, favorece muito aos fornecedores, especialmente, nas localidades mais afastadas dos grandes centros urbanos, pois as infrações consumeristas acabam passando desapercebidas nos referidos locais, o que não é de interesse dos consumidores, além de constituir violação ao direito destes.

Importa ressaltar que sem conhecer o seu próprio direito enquanto consumidor, não tem com a pessoa que adquire produto e/ou serviço fazer crítica importante em relação às práticas abusivas e o disposto contido no Ordenamento Jurídico brasileiro acerca da referida questão abusiva ou irregular no mercado de consumo.

Verifica-se, portanto, que para formação de consumidores brasileiros mais críticos é extremamente importante não apenas para que haja uma ampla e prévia difusão acerca dos conhecimentos dos direitos dos consumidores, mas também para que o consumidor não seja enganado facilmente pelas práticas abusivas dos fornecedores.

Os ganhos advindos do comportamento do consumidor mais crítico são enormes.

Um consumidor que vela pelos seus direitos induz um comportamento mais regular por parte do fornecedor, o que protege, via reflexa, os demais consumidores finais nas diversas relações de consumo.

Um elemento importante em qualquer relação de consumo é a boa fé, especialmente, por parte do fornecedor que deve prestar informações as mais claras possíveis para os pretensos consumidores, sob pena de incorrer em violação às disposições normativas estabelecidas para defesa do consumidor final.

Nesse sentido, certamente a atuação mais crítica dos consumidores, em relação às informações prestadas pelos fornecedores, constitui importante instrumento para fiscalização dos seus próprios direitos (de informação), sendo que a prévia e exigida informação prestada pelo fornecedor sobre produtos ou serviços oferecidos muitas vezes não é obedecida conforme determina a Lei.

Não são poucas as propagandas enganosas que violam o princípio da boa fé, nas relações de consumo, no Brasil, sendo que a atuação mais crítica do consumidor poderá contribuir para que as informações sobre produto e/ou serviço sejam prestadas de maneira clara, ostensiva, correta e precisa, visando atender aos feitos vinculantes do direito de informação previsto no art. 6º, III do CDC.

Segundo ensina Morais (2010, p. 187) “a publicidade visa o negócio, o comércio. Por sua vez, a propaganda possui caráter ideológico, político”.

Acerca do importantíssimo direito de informação sobre produtos e serviços ofertados aos consumidores finais, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu, em sede de julgamento de Recurso Especial, que:

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSUMIDOR. "REESTILIZAÇÃO" DE PRODUTO. VEÍCULO 2006 COMERCIALIZADO COMO MODELO 2007. LANÇAMENTO NO MESMO ANO DE 2006 DE NOVO MODELO 2007. CASO "PÁLIO FIRE MODELO 2007". PRÁTICA COMERCIAL ABUSIVA. PROPAGANDA ENGANOSA. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. ALEGAÇÃO DE REESTILIZAÇÃO LÍCITA AFASTADA. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROCEDENTE. 1.- Embargos de Declaração destinam-se a corrigir eventual omissão, obscuridade ou contradição intrínsecos ao julgado (CPC, art. 535), não constituindo via própria ao rejulgamento da causa 2.- O Ministério Público tem legitimidade processual para a propositura de ação Civil Pública objetivando a defesa de direitos individuais homogêneos, de origem comum (CDC, art. 81, III), o que se configura, no caso, de modo que legitimado, a propor, contra a fabricante, Ação Civil Pública em prol de consumidores lesados por prática comercial abusiva e propaganda enganosa. 3.- Embora lícito ao fabricante de veículos antecipar o lançamento de um modelo meses antes da virada do ano, prática usual no país, constitui prática comercial abusiva e propaganda enganosa e não de "reestilização" lícita, lançar e comercializar veículo no ano como sendo modelo do ano seguinte e, depois, adquiridos esses modelos pelos consumidores, paralisar a fabricação desse modelo e lançar outro, com novos detalhes, no mesmo ano, como modelo do ano seguinte, nem mesmo comercializando mais o anterior em aludido ano seguinte. Caso em que o fabricante, após divulgar e passar a comercializar o automóvel "Pálio Fire Ano 2006 Modelo 2007", vendido apenas em 2006, simplesmente lançou outro automóvel "Pálio Fire Modelo 2007", com alteração de vários itens, o que leva a concluir haver ela oferecido em 2006 um modelo 2007 que não viria a ser produzido em 2007, ferindo a fundada expectativa de consumo de seus adquirentes em terem, no ano de 2007, um veículo do ano. 4.- Ao adquirir um automóvel, o consumidor, em regra, opta pela compra do modelo do ano, isto é, aquele cujo modelo deverá permanecer por mais tempo no mercado, circunstância que minimiza o efeito da desvalorização decorrente da depreciação natural. 5.- Daí a necessidade de que as informações sobre o produto sejam prestadas ao consumidor, antes e durante a contratação, de forma clara, ostensiva, precisa e correta, visando a sanar quaisquer dúvidas e assegurar o equilíbrio da relação entre os contratantes, sendo de se salientar que um dos principais aspectos da boa-fé objetiva é seu efeito vinculante em relação à oferta e à publicidade que se veicula, de modo a proteger a legítima expectativa criada pela informação, quanto ao fornecimento de produtos ou serviços. 6.- Adequada a condenação, realizada pelo Acórdão ora Recorrido, deve-se, a fim de viabilizar a mais eficaz liquidação determinada (Ementa do Acórdão de origem, item 5), e considerando o princípio da demora razoável do processo, que obriga prevenir a delonga na satisfação do direito, observa-se que, resta desde já arbitrado o valor do dano moral individual (item 5 aludido) em 1% do preço de venda do veículo, devidamente corrigido, a ser pago ao primeiro adquirente de cada veículo, com juros de mora a partir da data do evento danoso, que se confunde com o da aquisição à fábrica (Súmula 54/STJ). 7.- Pelo exposto, nega-se provimento ao Recurso Especial. (STJ - REsp: 1342899 RS 2011/0155718-5, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento: 20/08/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/09/2013)”. Grifo nosso.

Para Mirgem (2013, p. 45), o Código de Defesa do Consumidor deve garantir “de forma ampla e irrestrita a proteção do consumidor exigida pela Constituição”.

Dessa forma, apesar de haver o Poder Judiciário e os órgãos públicos que atuam no âmbito administrativo para solucionarem os problemas narrados em reclamações ou em petições iniciais, é de suma importância que o consumidor conheça seus direitos enquanto consumidor final, sendo um deles o direito à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, para que o consumidor não seja prejudicado acerca de informações sobre composição, quantidade e qualidade dos produtos e serviços que desejar adquirir para satisfação de suas necessidades.

Outra questão curiosa e ao mesmo tempo relacionada ao presente tema é que, se repararmos bem, quase todo grande supermercado ou centro comercial, geralmente, não disponibiliza “relógios afixados nas paredes”, podemos acreditar que tal fato se trata de mais uma estratégia utilizada pelos fornecedores em todo o Brasil para que o consumidor esqueça do tempo quando estiver no interior do estabelecimento comercial.

Outro aspecto extremamente importante e que merece especial crítica por parte dos consumidores finais é a questão interligada aos marketing´s realizados pelas diversas empresas fornecedoras no Brasil.

Para Luiz Amaral (2010, p. 171), a publicidade é um procedimento que “tem por fim fazer conhecer uma marca, incitar o público a comprar um produto, utilizar um serviço; é um anúncio, encarte, uma atividade profissional dedicada à difusão pública de idéias associadas a empresas, produtos ou serviços”.

Entretanto, em relação ao marketing publicitário existem diversas questões que exigem uma postura mais crítica do consumidor final.

Os produtos que o consumidor adquire como necessidade prioritária, tais como leite, carne, legumes, etc., muitas vezes, ficam bem lá no fundo do estabelecimento, de tal forma que para o consumidor chegar até eles, observa, antes, diversos outros produtos que, normalmente, não adentrou no estabelecimento para comprá-los.

Há supermercados que, de vez enquanto, mudam produtos de seções, apenas para forçar o consumidor a “procurar um pouco mais” o mesmo produto e, com isso, percorrer novas seções que ofertam produtos que o consumidor não compraria e que, muitas vezes, faz uma parada para olhar e acaba comprando o que não entrou lá para adquirir.

Existem estabelecimentos comerciais que os corredores centrais são mais largos e os laterais, paralelos ou transversais são mais estreitos para causar facilmente congestionamento de carrinhos ou para diminuir a velocidade dos carrinhos e, assim, o consumidor é induzido a prestar mais atenção nos produtos oferecidos nas seções de amostras desses corredores estreitos.

As entradas dos hipermercados são consideradas áreas nobres por excelência, é onde são organizadas, geralmente, as buscas temáticas, que se referem, muitas vezes, a algum evento festivo com datas comemorativas culturais (ovos de páscoa, presentes do dia dos namorados, brinquedos para o dia das crianças, etc). Com o carrinho mais vazio logo ao entrar no estabelecimento, o consumidor pode estar mais receptivo a comprar alguma coisa que não pretendia.

Enquanto o consumidor espera na fila do caixa, existem pequenos mostruários ao lado, como pilhas, revistas, salgadinhos, doces, etc. Tudo pode ainda entrar no carrinho do consumidor na última hora.

Além da falta de relógios afixados nas paredes, muitos supermercados são construídos, sem janelas laterais, exatamente, para o consumidor final não perceber que o tempo está passando e assim permanecer na loja por mais tempo.

As estratégias de marketing estão sendo exercidas, inclusive, mediante gravações telefônicas, ocasião em que os fornecedores, aproveitando da hipossuficiência e situação vulnerável dos consumidores, “gravam” o aceite destes. Entretanto, o Poder Judiciário está atento à referida estratégia desfavorável ao consumidor e vem proferindo decisão que condena os realizadores de tal conduta, prática comercial abusiva, consoante entendimentos jurisprudenciais, nos seguintes termos: 

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO - INCLUSÃO DOS DADOS DA AUTORA PERANTE CADASTRO DE INADIMPLENTES - CONTRATAÇÃO POR MEIO DE CONTATO TELEFÔNICO - SERVIÇO DE "TELEMARKETING" - SENTENÇA QUE ENTENDEU PELA EXISTÊNCIA DE ACEITAÇÃO TÁCITA, PELA APELANTE, DOS TERMOS DO CONTRATO QUE LHE ERA OFERECIDO - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO - APELAÇÃO PROVIDA - SENTENÇA REFORMADA ANTE A HIPOSSUFICIÊNCIA DA APELANTE - PRÁTICA COMERCIAL ABUSIVA DO FORNECEDOR - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 39, IV, CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. - A degravação da conversa entabulada entre as partes revela a hipossuficiência da consumidora, bastante ingênua, que ainda mora com os pais, e que se limitou a assentir seu entendimento acerca dos termos da proposta, por polidez, jamais sua aceitação. - Contato telefônico realizado no período noturno e na residência do consumidor, situação de especial vulnerabilidade. - Os fornecedores, em suas práticas comerciais, devem zelar pela intimidade de seus clientes, bem como pelos demais direitos e garantias basilares do Estado Democrático de Direito, tornando pacífica e harmoniosa a convivência no mercado. (TJ-PR - AC: 3643149 PR 0364314-9, Relator: Ronald Schulman, Data de Julgamento: 28/09/2006, 10ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 7232).” Grifo nosso.

Ante à crescente e variada demanda das relações consumeristas, acreditamos ser de extrema importância uma postura mais crítica do consumidor acerca dos diversos mercados consumidores que lhe são propostos.

Como cediço, há instituições financeiras que enviam cartões de plástico concedendo linhas de créditos para os consumidores finais.

Cabe ressaltar que houve um caso concreto que ensejou um julgamento emblemático proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) que apreciou e julgou um caso no qual uma instituição bancária enviou não apenas o cartão de plástico ofertando crédito sob juros, mas também enviou para o consumidor “cheque já preenchido como proposta de mútuo”, tendo o TJRJ julgado que tais práticas constituem abusividades e que devem prevalecer os direitos fundamentais do consumidor previstos no art. 6º, incisos IV, VI e VIII do Código de Defesa do Consumidor, proferindo ainda o Egrégio TJRJ que a referida prática se trata de atividade agressiva de marketing que não pode ser recepcionada, por prejudicar o consumidor hipossuficiente,  in verbis:

“ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO 1ª TURMA RECURSAL RECURSO N 0046939-94.2009.8.19.0203 RECORRENTE: JUREMA MARANHÃO COSTA LOPES RECORRIDO : BANCO BMG S/A EMENTA - Responsabilidade civil objetiva do banco. Práticas abusivas identificadas por remessa de plástico referente a contrato de cartão de crédito não solicitado, bem como cheque já preenchido como proposta de mútuo, com a identificação do uso automático pelo consumidor como gatilho necessário para a concreção do negócio jurídico, exigindo-se simples atividade de desbloqueio, no caso do cartão, e depósito na conta do beneficiário, na hipótese do cheque. Prática que constitui abusividade desenhada no art. 39, III da Lei 8.078/90. Atividade agressiva de marketing que não pode ser recepcionada apenas como amostra grátis, já que efetivamente não traz qualquer benefício ao consumidor que assim pudesse ser considerado e, por outro lado, traz a reboque irrefragável preocupação de ocorrência das corriqueiras fraudes com a utilização por meliantes do crédito habilitado sem a anuência prévia e necessária do consumidor, bem como de eventuais cobranças de encargos contratuais. Despiciendo o fato de não ter ocorrido qualquer situação mais gravosa em decorrência do envio do plástico e do cheque, já que a simples possibilidade dos fatos ocorrerem já encerra tribulação espiritual, derivada da mera exposição a perigo, por força da prática comercial abusiva do fornecedor. A figura legal de acatamento como amostra grátis só deve ser identificada quando houver no envio do produto ou na prestação do serviço um bônus, consubstanciado em fator de proveito para o consumidor, não nestas hipóteses em que há exclusivamente fonte de preocupação e angústia. Procedimento que está em antinomia com o sistema jurídico de proteção do vulnerável consumidor. Prevalência dos direitos fundamentais do consumidor previstos no art. 6º, IV, VI e VIII do CDC, concernente a proteção contra métodos abusivos, reparação de danos e inversão do ônus da prova. Abuso de direito pelo excesso praticado, violando o recorrido com a sua conduta os princípios basilares da boa-fé, lealdade e transparência. Responsabilidade objetiva que prescinde da apuração de culpa. Dano moral configurado. Arbitramento que deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, com atenção a repercussão e natureza do dano. Provimento parcial do recurso. Ante o exposto, na forma do art. 46 da Lei 9.099/95, voto pelo provimento parcial do recurso para condenar o recorrido a pagar a reparar os danos morais sofridos, arbitrando a indenização em R$ 2.000,00, com correção monetária a partir da publicação do acórdão e juros de 1% ao mês desde a citação. Sem ônus de sucumbência. Rio de janeiro, 30 de março de 2011. ANDRÉ LUIZ CIDRA Juiz Relator (TJ-RJ - RI: 00469399420098190203 RJ 0046939-94.2009.8.19.0203, Relator: ANDRE LUIZ CIDRA, Primeira Turma Recursal, Data de Publicação: 25/05/2011 14:34).” Grifo nosso.

Para Fernandes (2009, p. 60) publicidade e propaganda são “técnicas especiais centradas na inserção de imagens no inconsciente das pessoas, que têm como objetivo persuadi-las a um determinado comportamento”.

No entanto, existem as publicidades abusivas, as quais na lição de Maltez (2011, p. 189) constituem “qualquer violação dos interesses e valores da sociedade ou que possa influenciar ou acarretar conduta danosa”.

A postura consciente e crítica da sociedade como um todo pode ajudar o consumidor a evitar sérios prejuízos, em estratégias publicitárias feitas pelos fornecedores que objetivam convencer os consumidores a comprarem mais do que estão habituados.

A título de exemplo, durante o período próximo ao Natal e Ano Novo, ocorrem diversas abusividades de marketing e de anúncios publicitários praticados pelos fornecedores, sempre visando induzir os consumidores a fazer compras com as chamadas “facilidades de pagamento”, que, muitas vezes, continuam com juros altos embutidos, como antes.

Anualmente, os fornecedores realizam estratégias para que não haja queda ou diminuição de vendas, após o período de Natal e do Ano Novo. Entretanto, é necessário que o consumidor faça uma interpretação mais crítica dessa circunstância, pois é exatamente nesse momento que o consumidor terá que pagar IPTU (Imposto de Propriedade Predial e Territorial Urbano); IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores); ITR (Imposto sobre Propriedade Territorial Rural); IR (Imposto sobre Rendas e Proventos de Qualquer Natureza); pagar matrícula de mensalidades escolares, fazer compra de materiais de escola para seus filhos, além de pagar outras dívidas eventualmente pendentes e realizar compras necessárias.

Existe uma estratégia de marketing muito utilizada pelos fornecedores no mercado consumidor no Brasil, que é o famoso “saldão ou queima de estoque”, ocasião em que são oferecidos “descontos milagrosos” aos consumidores. Entretanto, o consumidor deve ter uma postura mais crítica quando estiver também diante dessa situação.

Dessa forma, o comportamento mais crítico do consumidor poderá contribuir para evitar seu próprio prejuízo, visto que o consumidor não se deve deixar ser enganado, sendo que, na maioria das vezes, a participação do consumidor nos famigerados saldões não vale muito apena.

O consumidor deve fazer uso da crítica no sentido que no mercado dos negócios fornecedor nenhum joga para perder.

Nesse contexto, é possível que o produto menos interessante, seja por qualidade duvidosa ou durabilidade prejudicada, esteja com o maior desconto dentre todos os outros produtos.

O consumidor mais crítico deve estar atento, nesse momento, para não pagar um valor considerado caro, com prévia propaganda de “saldão de estoque”, mas que, na verdade, em razão da qualidade e durabilidade prejudicadas, pode estar sendo induzido a pagar um valor superior ao que realmente vale o produto e/ou serviço oferecido “com suposto desconto”.

 Há explicações, pois em muitos casos, o fornecedor não vende seu produto abaixo do preço de aquisição, do contrário, ele sofrerá prejuízos. Há casos nos quais a razão de ser dos saldões é que a empresa está em processo de falência ou deseja encerrar suas atividades, assim, surge a idéia dos “saldões de estoque”, devendo o consumidor portanto estar atento e fazer uso da crítica diante dessa situação.

Importa ressaltar que nos marketing’s dos saldões, as informações referentes a possível falência e/ou encerramento não estão explícitas, são ocultadas, sendo que, em caso de eventual defeito do produto ou do serviço, o consumidor poderá ter problemas em razão da falência e/ou do encerramento “ocultado”.

Nesse sentido, já julgou o Tribunal de Justiça do Distrito Federal que o consumidor tem direito a troca, por defeito do produto, ainda quando adquirido em “ponta de estoque ou em saldão”, consoante o seguinte julgado, in verbis:

CDC. PRODUTO ADQUIRIDO EM PONTA DE ESTOQUE - DEFEITO QUE AUTORIZA A TROCA. RESISTÊNCIA DO FORNECEDOR EM PROCEDER À TROCA VOLUNTÁRIA - AUSENTE VIOLAÇÃO A ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE. DANO MORAL INEXISTENTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. OBRIGA A TROCA DO PRODUTO POR EQUIVALENTE OU A RESCISÃO CONTRATUAL COM A RESTITUIÇÃO DAS PARTES AO ESTADO ANTERIOR O DEFEITO DO PRODUTO, AINDA QUANDO ADQUIRIDO EM "PONTA DE ESTOQUE" OU "SALDÃO". EM SE TRATANDO DE RELAÇÃO DE CONSUMO CABE AO FORNECEDOR A PROVA DE QUE, DIVERSAMENTE DO QUE AFIRMA O CONSUMIDOR, O PRODUTO NÃO APRESENTA DEFEITO. 2. A RESISTÊNCIA DO FORNECEDOR EM TROCAR O PRODUTO COM DEFEITO NÃO CARACTERIZA, POR SI SÓ, VIOLAÇÃO A ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE E NEM AUTORIZA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, SALVO PROVA DE PERSISTENTE E FRUSTRANTE TENTATIVA DO CONSUMIDOR NÃO ACATADA PELO FORNECEDOR. 3.DOU PROVIMENTO AO RECURSO PARA AFASTAR A CONDENAÇÃO POR DANOS MORAIS. 4.RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 5.DECISÃO PROFERIDA NA FORMA DO ART. 46 DA LEI Nº 9.099/95, SERVINDO A EMENTA COMO ACÓRDÃO. 6.SEM CUSTAS E HONORÁRIOS, NOS TERMOS DO ARTIGO 55 DA LEI 9.099/95. (TJ-DF - ACJ: 3243620108070012 DF 0000324-36.2010.807.0012, Relator: ASIEL HENRIQUE, Data de Julgamento: 26/04/2011, Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Publicação: 29/04/2011, DJ-e Pág. 259).” Grifo nosso.

Dessa forma, é descabível qualquer alegação do fornecedor no sentido de que o desconto do “saldão de estoque” já seria o abatimento no preço do produto, pois mesmo quando se tratar de produto adquirido em “saldão de estoque”, o consumidor tem direito a troca, por defeito do produto, conforme explicitado.

Nessa mesma linha de raciocínio, não seria razoável imaginar que um mero desconto alegado em marketing de saldão teria o condão de revogar a responsabilidade objetiva do fornecedor estabelecida, no art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

“Art. 12. O fabricante, o produto, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.” Grifo nosso.

Ademais, a oferta de produto, mediante saldão de estoque, não revoga o direito do consumidor de trocar o produto adquirido, em razão de defeito apresentado, consoante art. 18, § 1°, I do CDC, nos seguintes termos:

“Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;

III – o abatimento proporcional do preço.” Grifo nosso.

Portanto, é extremamente importante que o consumidor adote uma postura mais crítica e analise muito, antes, de decidir participar de qualquer tipo de “saldões de estoque” oferecidos pelos fornecedores.

É necessário que o consumidor final pesquise bastante, antes, de fazer compras, pois, do contrário, poderá estar correndo sério risco de adquirir um produto de amostra com algum defeito, pelo mesmo preço de um produto novo, lacrado e sem defeito, isso porque na maioria das vezes os saldões e queimas de estoque são tão somente “chamamentos dos consumidores”, sendo que na verdade os preços, ditos com descontos, muitas vezes, são os mesmos de duas semanas atrás.

Existem notícias de empresas que contratam pessoas só para ficar na fila do estabelecimento, visando chamar a atenção e atrair os consumidores, portanto é muito importante que o consumidor final tenha auto crítica sobre práticas de marketing comercial, para não vir a ser induzido a comprar o que não queria ou comprar sofrendo prejuízos.

Cabe ressaltar que o objetivo do presente trabalho não é afirmar que toda e qualquer oferta seja prejudicial ao consumidor, como se fosse impossível aproveitar as boas ofertas, porque existem ofertas que, realmente, são boas e podem, de fato, ser consideradas um bom negócio tanto para o consumidor quanto para o fornecedor, apenas está se ressaltando, na presente atividade, que alguns cuidados e alguns comportamentos mais críticos por parte do consumidor final sobre a realidade existente, principalmente, no âmbito dos marketing’s comerciais publicitários, podem ajudar a evitar prejuízos e/ou situações indesejadas no futuro em desfavor do consumidor final.

 Nesse sentido, é extremamente importante que o consumidor não se empolgue quando se deparar no comércio com expressões do tipo “saldão de estoque”; “queimão de estoque”; “limpa estoque” e “desconto”, especialmente, os “descontos” haja vista que estes ocorrem sempre, durante o ano inteiro.

Nesse contexto, é extremamente importante que a política pública da proteção do consumidor final nas relações de consumo seja complementada, através de adoção de medidas que visem à formação de consumidores mais críticos.

Deve se continuar garantindo, tanto no âmbito administrativo quanto judicial, a condenação de infratores de atos abusivos e irregulares no mercado de consumo. Entretanto, o Poder Público deve programar medidas que objetivem atuação preventiva, sendo uma delas a educação, orientação e formação de consumidores mais críticos, pois, dessa forma, o mercado consumerista como um todo ganharia uma importante proteção a mais contra as práticas abusivas.

Outra grande e significativa vantagem da atuação mais crítica dos consumidores é que tal comportamento servirá de desestímulo das práticas infratoras, as quais violam as regras do sistema jurídico de proteção do consumidor final.

Ressalte-se, por fim, que a ausência de responsabilização dos que praticam abusividades nas relações de consumo representa impunidade, além de legitimar indevidamente a má fé de qualquer fornecedor, o que deve ser solucionado, acreditamos, não apenas com a edição de normas de proteção do consumidor final estabelecidas no Ordenamento Jurídico brasileiro, mas também com a adoção de uma política pública que fomente um comportamento mais crítico do consumidor final diante das estratégias de marketing praticadas pelos fornecedores no mercado consumidor em nosso país.

Por todo o exposto, concluímos ser extremamente importante que o consumidor final adote cada vez mais um comportamento mais crítico, nas relações de consumo nas quais participa, visando, especialmente, não ser enganado, tampouco sofrer prejuízos advindos das “armadilhas” existentes nos marketing’s praticados pelos fornecedores de produtos e/ou de serviços, no mercado consumerista do Brasil e que o Poder Público amplie as possibilidades de proteção do consumidor final, mediante implementação de políticas públicas que tenham por fim a formação de consumidores mais críticos diante do mercado consumerista nacional.

Considerações Finais

Por essas razões concluímos que uma forma contributiva, para a proteção do consumidor final no Brasil, seria o Poder Público implementar uma política pública de formação de consciência e de comportamento mais crítico do consumidor final diante das estratégias de marketing praticadas pelos fornecedores no mercado consumidor em nosso país, que muitas das vezes se revelam violadores das normas e princípios regentes de proteção do consumidor.

No mesmo sentido, é extremamente importante que o consumidor final, de iniciativa própria, adote cada vez mais um comportamento mais crítico, nas relações de consumo das quais participa, com o intuito, especialmente, de não vir a ser enganado, tampouco suportar, indevidamente, eventuais prejuízos provenientes das “armadilhas” existentes nos marketing’s realizados pelos fornecedores de prestadores de serviços, no mercado consumerista do Brasil.

Ademais, convém que o consumidor faça reflexões sobre as práticas normalmente adotadas pelos fornecedores e sobre as conseqüências das escolhas que o consumidor realiza, tendo em vista que as reflexões são importantes instrumentos que podem apontar, através de comportamento mais crítico do consumidor, as inconveniências e inadequações do mercado de consumo cada vez mais presente e agressivo, além de contribuir para o aprimoramento do aludido mercado.

Torna-se extremamente relevante estabelecer um ponto de equilíbrio entre os avanços já alcançados e os prejuízos oriundos dessa realidade de um mercado consumidor agressivo contra o consumidor.

É necessário que os consumidores não se deixem levar pelas estratégias de marketing’s, nem se perdam dentro do mercado consumerista, ignorando valores que são essenciais e básicos para o ser humano.

Os benefícios e vantagens do comportamento do consumidor mais crítico são diversos.

Com comportando mais crítico, o consumidor não comprará, por exemplo, alimentos e remédios com prazos de validade vencidos; analisará a boa aparência das embalagens, evitando adquirir latas amassadas, estufadas ou enferrujadas, embalagens abertas ou danificadas, situações que podem causar prejuízos à saúde e à segurança do consumidor.

Através da postura mais crítica, o consumidor final checará a autenticidade dos produtos, evitando comprar produtos falsificados e/ou perigosos para a saúde ou segurança do consumidor e de sua família.

Com comportamento mais crítico, o consumidor não contratará um serviço, sem, antes, receber o orçamento respectivo, pois o orçamento prévio é direito do consumidor (art. 40 e seus parágrafos do Código de Defesa do Consumidor)

O consumidor tem direito de receber termo de garantia, sob pena de ser vítima de prática infrativa (art. 13, XIX do Decreto nº 2.181/97).

Por fim, concluímos que é de fundamental importância haver, não apenas a implementação de uma política Estatal de tutela consumerista, mas também a adoção de comportamento mais crítico por parte do consumidor, o que pode ensejar em diversas vantagens e benefícios de cunho coletivo e social, conforme explicitado. Ademais, com as pessoas adotando um comportamento mais crítico, nas relações de consumo, além delas fiscalizar mais seus direitos, haverá número maior de denúncias e de reclamações contra as relações de consumo, o que, sem dúvida, constitui instrumento a mais para a eficiência da fiscalização e do aprimoramento do mercado consumidor no Brasil, visando benefício coletivo, para toda a sociedade brasileira.

 

REFERÊNCIAS UTILIZADAS

Para a presente atividade, foram consultadas as seguintes obras bibliográficas:

- ALMEIDA, João Batista apud CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Direito do Consumidor. 2010, pp.15/16.

- GRINOVER, Ada Pellegrini...(et al). Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: Comentado pelos Autores do Anteprojeto. -10ª ed. rev. atual. e ref. – Rio de Janeiro: Forense, 2011, vol. I, pp. 289, 290, 291.

- FIGUEIREDO, Fábio Vieira e FIGUEIREDO, Simone Diogo Carvalho. Código de Defesa do Consumidor. 2009, p. 416.

- SOUZA, Miriam de Almeida. A Política Legislativa do Consumidor no Direito Comparado. Belo Horizonte: Edições Ciência Jurídica,1996, pp. 48 e 56.

- SANTOS, Altamiro José dos. Direitos do Consumidor. Revista do IAP. Curitiba. Instituto dos Advogados do Paraná, 1987, pp. 78/79.

- GAMA, Hélio Zagheto. Curso de Direito do Consumidor, 2004, p. 18.

- FERNANDES, Daniela Bacellar. Responsabilidade civil e direito do consumidor em face das mensagens subliminares. Curitiba: ed. Juruá. 2009, p. 60.

- AMARAL, Luiz Otávio de Oliveira. Teoria geral do direito do consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 171.

- MALTEZ, Rafael Tocantis. Direito do consumidor e publicidade: análise jurídica e extrajurídica da publicidade subliminar. Curitiba: ed. Juruá, 2011, p. 189.

- MORAIS, Ezequiel. Código de defesa do consumidor comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 187.

- MIRGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor. 4. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 45.

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Glaysson Pereira da Costa

Glaysson Pereira da Costa

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