COMÉRCIO SEXUAL

16/08/2015 às 14:39
Leia nesta página:

O ARTIGO DISCUTE OS CRIMES ENVOLVENDO O COMÉRCIO SEXUAL E ENTENDIMENTOS COM RELAÇÃO A MATÉRIA.

O COMÉRCIO SEXUAL

ROGÉRIO TADEU ROMANO

Procurador Regional da República aposentado

A Anistia Internacional quer inscrever a repressão à prostituição no rol das violações dos direitos humanos –como tortura, pena de morte e os confiscos de liberdade. A anistia defende punição para tráfico de pessoas, extorsão, violência, aliciamento de menores.

No Brasil, prostituição não é crime. Desde 2002, a Classificação Brasileira de Ocupações, instrumento do Ministério do Trabalho, apresenta, sob o número 5198, "profissional do sexo" como o que "busca programas sexuais" e exemplifica: garota ou garoto de programa, meretriz, messalina, michê, mulher da vida, prostituta, trabalhador do sexo. Está habilitado a contribuir para o INSS e a usufruir de seus benefícios.

Qual a lógica de punir quem se organiza para exercer uma atividade profissional formalmente reconhecida pelo poder público?

São punidas condutas como “tirar proveito da prostituição alheia com o usufruto de seu lucro”. É punido o rufianismo, “induzir ou atrair alguém a ela ou a outra forma de exploração sexual”. Ainda se pune “manter estabelecimento em que ocorra exploração sexual”.   

O Anteprojeto do Código Penal, lança os crimes de exploração sexual(artigo 183) e esterilização forçada(artigo 185) ainda como crimes contra a liberdade sexual.

O crime de exploração sexual, melhor fosse colocado como do lenocídio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual, do que se vê da Lei 12.015/2009, artigo 228.

Tem-se no crime de exploração sexual, ¨obrigar alguém a exercer a prostituição ou impedir ou dificultar que a abandone.¨

O tipo previsto no artigo 228, na redação dada à Parte Especial, previa ¨induzir ou atrair alguém à prostituição , facilitá-la ou impedir que alguém a abandone.¨

O projeto propõe a abolir esse tipo penal de favorecimento à prostituição, assim como outros crimes: mediação para servir à lascívia de outrem(artigo 227), casa de prostituição(artigo 229), rufianismo(artigo 230), ato obsceno(artigo 223), escrito ou objeto obsceno(artigo 234). Lembre-se, nesse passo, que a casa de prostituição é crime habitual, cuja prisão em flagrante, muitos na doutrina, não a reconhecem, sendo ainda discutível, pelos estudiosos, a criminalização da prática da mediação para alguém servir à lascívia de outrem, se a pessoa que se prostitui assim age costumeiramente.

Anoto que o tráfico de pessoas(artigo 469 do Anteprojeto) passou a constituir crime contra os direitos humanos, configurando-se se houver emprego de ameaça, violência, coação, fraude ou abuso. Será atípica a simples intermediação da prostituição(lenocínio), isto é, sempre que a suposta vítima, voluntariamente, e sem constrangimento ilegal algum, entrar ou sair do país para exercer a prostituição ou similar.

Mas, será crime a conduta de obrigar alguém a exercer a prostituição ou impedir ou dificultar que a abandone. Salutar, pois, a introdução da conduta como tipo penal. Obrigar é impor, forçar, coagir, compelir. Por sua vez, a prostituição, que não é crime, ¨estar à espera de quem venha¨, representa a atitude, seja da mulher, ou ainda do homem, oferecendo-se publicamente à concupiscência. Por prostituição se entende a prática sexual constante, promíscua e remunerada. Assim tem-se: o comércio sexual constante, a multiplicidade de parceiros sexuais, o fim de lucro.

Prevê o Anteprojeto ainda um tipo penal relacionado com a prostituição: a transgenerização forçada(artigo 464), que tem a seguinte redação: ¨Realizar em alguém, contra a sua vontade, qualquer ato tendente a alterar a percepção social de seu gênero designado pelo nascimento, com o fim de submetê-lo, induzi-lo à prostituição ou qualquer forma de exploração sexual. Ora, melhor seria que se constituísse não um novo tipo penal, mas uma forma equiparada ao tipo de exploração sexual(artigo 183), em parágrafo específico.

O artigo 228 do Código Penal, com a redação que lhe foi dada pela Lei 12.015/2009, determina que é crime ¨induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la , impedir ou dificultar que alguém a abandone. A pena é de 2 a 5 cinco de reclusão e multa.

Constitui-se a prostituição na habitualidade de prestações carnais a um número indeterminado de pessoas, independendo ela do fim de lucro.

É certo que o Superior Tribunal de Justiça, RT 748/588) já entendeu que apenas existirá o favorecimento quando a pessoa é levada à prostituição ou impedida de abandoná-la. Assim se quando a vítima passou a frequentar a casa da acusada, já fazia da prostituição o seu meio de vida, não haveria que se cogitar nesse delito. Essa a linha já externada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, JC 71/395, ao dizer que é duvidosa a caracterização do delito do artigo 228 do Código Penal, se não resta comprovado que o acusado agiu com animus lucro faciendi em relação ás moças, já francamente prostituídas, que atendiam na agência de acompanhantes, quando não havia necessidade de induzimento, violência ou fraude para que se prestassem a lascívia de outrem. Porém, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 94.168/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Jane da Silva, DJe de 22 de abril de 2008, já se manifestou no sentido de que aquele que facilita, dando condições favoráveis à continuação ou ao desenvolvimento da prostituição, pratica o crime de favorecimento á prostituição.

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Tutela o artigo 228 do Código Penal a moralidade sexual, prescindindo o crime da obtenção de lucro.

O crime consuma-se com o inicio ou o prosseguimento de uma vida de prostituição, sendo desnecessário o comércio carnal como prostituta(RT 449/382). Sendo assim é irrelevante para caracterização do crime  o fato de que as garotas não terem se iniciado na prostituição pelos acusados.

Pouco importa se o sujeito passivo seja pessoa de má reputação ou corrupta(RT 560/353), ocorrendo o delito na forma de induzir ou atrair a esse estado se o agente a incentivar, levando-a a exercer o meretrício(RT 606/328). Aliás, na última forma, já se entende que se pressupõe que a vítima seja prostituta.

Independe para a consumação do crime que haja consócio carnal do terceiro com a prostituta(RT 449/382).

Guilherme de Souza Nucci(Código Penal Comentado, 8ª edição, pág. 896) considera que o tipo é vetusto. Lembra que dissemina-se na sociedade a prostituição, que não é punida em si, mas ainda subsiste um tipo penal que pune o individuo que contribui, de alguma forma à prostituição alheia. Para tal corrente de pensar, cuidaria melhor o legislador de proteger o menor de idade ou aquele que é vitima de atos violentos, ameaçadores ou fraudulentos, mas não a pessoa adulta que foi convencida a levar a vida promíscua. Aliás, que dizer da leitura de jornais, com a proliferação maciça de anúncios e propagandas de fantasias sexuais diante do silêncio das autoridades?

Ainda Nucci(obra citada, pág. 897), ao estudar o sujeito passivo, entende que deve se afastar a possibilidade de considerar sujeito passivo a pessoa já prostituída, por  total atipicidade. Como punir aquele que induz alguém à prostituição se esta pessoa já está prostituída?

Veja-se a divergência de entendimento: a) Aquele que promove o agenciamento de mulheres e homens para o comércio do próprio corpo, com finalidade de arrecadar dinheiro, comete o crime do artigo 228 do CP(RT 753/662); b) Apenas existirá o favorecimento quando a pessoa é levada à prostituição ou impedida de abandoná-la; assim, se quando a vítima passou a frequentar a casa da acusada já fazia da prostituição o seu meio, não há que se cogitar do delito do art.228(STJ, RT 748/588).

Enquanto isso, na França, na linha do que já existe na Suécia, avizinha-se uma lei contra a prostituição, que muitos reconhecem como moralista, proibindo a compra de serviços sexuais. A prostituição naquele país escandinavo não é ilegal, mas os clientes das prostitutas estão sujeitos a pagar multa ou pegar pena de até seis meses de prisão. Tal valor da penalidade é calculada tendo como base a renda da pessoa condenada, geralmente a meio salário mensal. Ora, mesmo assim, se a prostituição de rua, naquele país, foi reduzida, na década posterior à aprovação da lei, aumentou fortemente na Internet.

Ora, tal levou o comércio sexual à clandestinidade assim como na Noruega que tem legislação similar desde 2009.

Na Alemanha, na Holanda, na Suíça, a prostituição é legalizada, assim como os bordéis.

O certo é que a França vive um conflito entre o chamado ¨drama sanitário¨ e a intervenção moral do Estado na vida sexual dos cidadãos, que, num Estado Democrático, é de duvidosa constitucionalidade.

Se há países, que de forma absurda, punem a própria prostituição, o Canadá tenta punir a freguesia. Nos EUA, policiais já veem o porte de camisinhas como indício de prostituição, o que cria embaraço para políticas públicas de prevenção a doenças sexualmente transmissíveis.

O tema e complexo e polêmico, não resolvendo estigmatizar, a par dos riscos de violência que podem surgir diante de proibições arbitrárias, independente do fato de que há a chamada maré do politicamente correto que tem voz na questão.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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