As lágrimas de Zola:a questão dos descontos salariais dos dias de greve legal

21/09/2015 às 17:28
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Discute-se a questão dos descontos dos dias parados referente à greve.

 O que este pequeno texto propõe é analisar a questão da greve e do desconto dos salários pelos dias parados. Não há quem não opine a respeito. É por isso que se expõe o que segue.

Inicialmente deve-se ter em mente o que é a greve. A greve, segundo o artigo 9o da CF/88, é um direito fundamental dos trabalhadores, alçado a esta condição pela Constituição federal de 1988, a fim de permitir que os trabalhadores, por si, tenham meios de buscar a melhoria de sua condição social, conforme, aliás, preceitua o artigo 7o, cabeça, do mesmo diploma.

Daí, todo o trabalhador, onde se inclui, conforme artigo 37, VII, da CF/88, também o servidor público, tem direito ao movimento grevista.

Mas o que garante, de fato, o gozo deste direito fundamental? O que o garante, além da legislação posta, lei 7.783/89, que se aplica aos empregados da iniciativa privada e ao poder público, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal, é a garantia de que os trabalhadores, durante o movimento, poderão reivindicar seus dirietos de forma a não se preocuparem com a questão da subsistência e do emprego.

Isso quer dizer que para o efetivo exercício do direito de greve, não há tolerar o desconto dos dias parados, salvo quando a greve for declarada ilegal ou abusiva pelo poder judiciário. Só há direito à greve com garantia plena à reivindicação por parte dos trabalhadores.

Ora, se lhes é suprimido o salário, é evidente que não farão a greve, pois que os salários pagos no Brasil são tão baixos que garantem pouco mais que  o sustento diário do trabalhador.

Há obra literária que aponta estes fatos. Émile Zola, romancista francês, em seu livro Germinal, investiga a questão da greve junto às minas de carvão na França. Conclui, após ter trabalhado como mineiro nestas mesmas minas, que o que acaba por consumir com os trabalhadores grevistas é a fome e a miséria fruto do não-pagamento dos dias parados. Isso faz com que tenham que retornar ao trabalho, a fim de poder pagar o pão de cada dia, sem ver suas reivindicações atendidas.

Note-se, para evitar interpretações equivocadas, que não há confundir o fundo de greve, que serve para o sindicato adquirir material para a execução do movimento como por exemplo tecido, bandeiras e estacas, com a desnecessidade de adimplemento dos dias parados. O fundo de greve não sustenta o trabalhador, mas sim o movimento. Sem o trabalhador não há o movimento!

É por esta razão que o desconto dos dias parados é inconstitucional, pois que acaba, no mundo dos fatos, com o direito fundamental à greve.

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Sobre o autor
Rafael da Silva Marques

Juiz do Trabalho titular da Quarta Vara do Trabalho de Caxias do Sul;<br>Especialista em direito do trabalho, processo do trabalho e previdenciário pela Unisc;<br>Mestre em Direito pela Unisc;<br>Doutor em Direito pela Universidade de Burgos (UBU), Espanha;<br>Membro da Associação Juízes para a Democracia

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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