I. INTRODUÇÃO
Diante dos avanços da medicina, sobretudo nas últimas décadas, com o surgimento de procedimentos e drogas capazes de curar diversas enfermidades, aliados ao maior acesso por parte da população a informações de prevenção e aos profissionais da saúde, as pessoas viram aumentar suas expectativas de vida além de usufruírem da mesma com maior qualidade.
Todavia, por se tratarem, muitas vezes, de procedimentos e diagnósticos complexos que os atuantes da saúde devem efetuar, podendo o mesmo ser dito para aqueles que elaboram e distribuem medicamentos, surge a dúvida quanto ao dever de reparar em caso de ocorrência de dano ao paciente/usuário da medicação.
Afinal, deveria aquele profissional que, em última instância, buscou por todos os meios salvar uma vida ser responsabilizado por um resultado negativo? E em relação ao dano causado pelo profissional contratado para efetuar meramente um procedimento estético, tais como um cirurgião plástico ou dentista? O Direito Brasileiro trata de forma equânime tais situações? Qual seria a forma de responsabilização de cada atuante da seara médica?
Em uma breve explanação, a ser desenvolvida no decorrer desta pesquisa, pode-se dizer que a maior parte da doutrina entende a responsabilidade médica como sendo contratual, id est, não se caracterizando a mesma por ter ocorrido um ato ilícito, se tratando ainda, como regra, de uma obrigação de meio, onde o profissional não assume o dever de curar o paciente, mas que atuará com diligência e cuidado para tal fim.
A exceção se dá nos casos onde há uma obrigação de resultado, sendo exemplo os procedimentos com fins estéticos, aplicando-se, portanto, o Código de Defesa do Consumidor e caracterizando uma verdadeira responsabilidade objetiva.
A responsabilidade dos enfermeiros e farmacêuticos não difere, em regra, daquela atinente aos médicos, se tratando de responsabilidade subjetiva, necessitando da comprovação de negligência, imperícia ou imprudência.
Por fim, merece observação a responsabilidade de hospitais e planos de saúde, tendo em vista novas situações decorrentes da vida moderna, por seus atos bem como os causados por terceiros mas que ensejam a solidariedade daqueles.
Feitas as devidas premissas, esta pesquisa buscará o aprofundamento das questões elencadas, trazendo ainda os enunciados do Conselho Nacional de Justiça e concluindo com um comentário sobre um julgado relativo ao assunto tratado, que demonstrará o posicionamento do Poder Judiciário ante este tema de extrema relevância para a população em geral.
II. REPONSABILIDADE CIVIL
Isaac Newton acertadamente disse que toda ação tem uma reação, e é obvio que nas relações humanas isso não é diferente. O exercício de qualquer ação traz consequências jurídicas, e quando esse ato traz consequências negativas á alguém, o causador do dano possui o dever de reparar o avaria em suas exatas dimensões, é o que damos o nome de Responsabilidade Civil.
É certo que a o Direito sempre combateu as injustiças sofridas em decorrência dos atos humanos por meio de penas ou indenizações.
A responsabilidade civil possui complexa evolução histórica, mas é importante é ressaltar que o instituto ganhou notoriedade após a Revolução Industrial devido ao altíssimo numero de acidentes de trabalho, que tornou um numero considerado de pessoas em inválidos, e por essa razão gerou grande problema social na época.
No que se refere a função da responsabilidade civil Maria Helena Diniz (2009, p.5), ensina: “interesse de restabelecer o equilíbrio violado pelo dano.”
E é justamente por essa razão que a reparação deve ser adequada ao dano causado, a indenização deve ser proporcional, sob pena de promoção do locupletamento ilícito, o quantum indenizatório deve se limitar a restaurar a situação anterior ao prejuízo, ou ao menos minorar seus efeitos.
Mas para vermos caracterizada a responsabilidade de indenizar, necessário vermos presentes os pressupostos da responsabilidade civil, são eles ação ou omissão, leia-se ato, dano, nexo de causalidade e alguns casos a culpa.
A inexecução ou a execução indevida de uma obrigação contratual ou normativa é o que basicamente aufere o ato danoso, pelo menos em regra, e é justamente essa ação ou omissão que gera ao agente causador o ônus indenizatório.
Silvio Rodrigues define que:
“a responsabilidade do agente pode defluir de ato próprio, de ato de terceiro que esteja sob a responsabilidade do agente, e ainda de danos causados por coisas que estejam sob a guarda deste. A responsabilidade por ato próprio se justifica no próprio princípio informador da teoria da reparação, pois se alguém, por sua ação, infringindo dever legal ou social, prejudica terceiro, é crucial que deva reparar esse prejuízo.”
Desse ato comissivo ou omissivo deverá resultar dano, o qual é sem dúvida o elemento essencial para a responsabilidade civil. Dano pode ser definido como à diminuição de um bem juridicamente tutelado e pode ter cunho patrimonial, moral, ou ate mesmo estético.
O ultimo pressuposto indispensável é o nexo de causalidade, o liame que amarra o ato praticado pelo agente com o dano sofrido pela vitima.
O requisito da culpa é exigido apenas em algumas situações em que temos a chamada responsabilidade subjetiva, que será explicada mais a frente nesse estudo. A culpa nada mais é do que a inobservância de um dever que o agente devia conhecer e observar.
Quando é mencionada culpabilidade no campo civil, a noção abrange o dolo e a culpa, em que pese haver grande disparidade entre o ato pelo qual o agente visa ao resultado (dolo) e aquele praticado por negligência, imprudência ou imperícia (culpa). Em sede de indenização, porém, as consequências são idênticas.
A doutrina tradicional triparte a culpa em três graus: grave, leve e levíssima. A culpa grave se manifesta de maneira grosseira, se aproximando do dolo. Nesta se inclui a chamada culpa consciente. A culpa leve é a que se caracteriza pela infração a um dever de conduta a qual um homem comum, em tese, não transgrediria. A culpa levíssima é constatada pela falta de atenção extraordinária, em um caso concreto no qual somente uma pessoa extremamente perita conseguiria ter.
A culpa, sob os princípios consagrados da negligencia, imprudência e imperícia, contém uma conduta voluntária, mas com resultado involuntário, a previsão ou a previsibilidade e a falta de cuidado devido, cautela ou atenção. A previsibilidade é aquela aferida no caso concreto, uma definição do previsível. Na negligência o agente não age com a atenção devida. Na imprudência o agente é intrépido, açodado, precipitado e age sem prever as consequências. É imperito aquele que demonstra inabilidade para seu ofício, profissão ou atividade.
Entre as modalidades de culpa destaca-se:
Culpa in elegendo é a oriunda da má escolha do representante, por exemplo, contratar empregado inabilitado ou imperito, a qual podemos destacar nesse certame,aquela que deriva da relação de emprego entre o hospital e o médico contratado que comete erro.
A responsabilidade pode também ser fundada no risco, ou seja, na obrigação de indenizar o dano produzido por atividade exercida no interesse do agente e sob seu controle, sem que haja qualquer indagação sobre o comportamento do lesante, fixando-se no elemento objetivo, isto é, na relação de causalidade entre o dano e a conduta do causador. Trata-se do elo da responsabilidade civil objetiva.
Nesta sintonia, há que se observar a chamada Teoria do Risco, a qual exprime diversas formas de risco, entre as quais merecem destaque: risco criado, risco-proveito e risco integral.
O primeiro desses, o risco criado, é aquele cuja atividade ou conduta do agente resulta, por si só, exposição a um perigo.
O risco-proveito está moldado na ideia de que quem exerce determinada atividade e desta tira proveito, direto ou indireto, deve ser responsabilizado pelos danos que ela causar, independentemente de culpa, essa teoria não é aplica ao Direito pátrio.
Por último, no risco integral, o dever de indenizar estará presente exclusivamente perante o dano causado, ainda que com culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior. Trata-se, pois, de modalidade extremada, aplicada para a Administração Pública e em danos ambientais.
Muito se discutiu sobre a Teoria do Risco como caracterizadora da responsabilidade civil do médico, sob o prisma de a atividade a ser desenvolvida por este representa riscos à coletividade ou ao particular.
Hodiernamente, no entanto, o entendimento dominante acerca da atuação do profissional da medicina é o da obrigação de meio, aquela em que o agente deve se valer de todos os meios possíveis a fim de obter um resultado satisfatório, salvo no que tange aos cirurgiões plásticos os quais firmam obrigações de resultado.
Ou seja, em regra o médico não tem obrigação direta em produzir o resultado almejado por seu paciente, não se pode garantir a cura de um paciente, a obrigação esta fundada em empregar todo seu conhecimento técnico-científico e zelo para tal fim, conforme aparece esculpido no art. 2º do Código de Ética Médica:
“Art. 2º. O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.”
Logo, não há que se falar em atividade de risco, porquanto se entende que tais profissionais possuem plena preparo suficiente para sua execução.
Assim, aplicar a responsabilidade civil do médico facultada no risco, seria impor ao profissional o dever de infalibilidade, inaceitável, haja vista a própria condição do ser humano como um todo, sujeito a erros e acertos.
A Teoria Clássica, também chamada de teoria da culpa ou subjetiva, pressupõe a culpa como fundamento da responsabilidade civil, portanto, não havendo culpa, não há responsabilidade. O Código Civil Brasileiro filiou-se a essa teoria, conforme se verifica no artigo 186 deste diploma legal, que erigiu o dolo e a culpa como fundamentos para a obrigação de reparar o dano.
A responsabilidade subjetiva subsiste como regra necessária, sem prejuízo da adoção da responsabilidade objetiva, em vários dispositivos e esparsos, e se esteia na ideia de culpa; sua prova passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável, sendo que o ônus desta é incumbido à vítima.
No que tange as especialidades médicas:
a) Enfermeiro: é um profissional comprometido com a saúde do ser humano e da coletividade. Está apto a observar as reações dos pacientes em termos de sintomas apresentados, evolução diagnóstica e variações indicativas de melhoras, estabilidade ou piora das condições do paciente, acionando quando necessário, providências imediatas para o pronto atendimento médico, garantindo sua efetividade. Com isto há possibilidade de ser responsabilizado por seus atos na atuação junto ao paciente, com repercussões legais que podem se situar na área jurídica da responsabilidade civil. Aplicam-se quanto à atividade profissional dos enfermeiros a Lei n° 7.498/86, regulamentada pelo Decreto nº 94.406/97, e CDC, art. 14,§ 4º.
Por serem profissionais liberais se aplicam as noções de obrigação de meio, que partem de um contrato entre o enfermeiro e o paciente. Há um inadimplemento deste contrato quando o enfermeiro deixa de cumprir com a obrigação de meio. Sobre a obrigação de meio nos ensina Maria Helena Diniz: “A obrigação de meio é aquela em que o devedor se obriga tão-somente a usar de prudência e diligência normais na prestação de certo serviço para atingir um resultado, sem, contudo, se vincular a obtê-lo. Infere-se daí que sua prestação não consiste num resultado certo e determinado a ser conseguido pelo obrigado, mas tão-somente numa atividade prudente e diligente deste em benefício do credor. Seu conteúdo é a própria atividade do devedor, ou seja, os meios tendentes a produzir o escopo almejado, de maneira que a inexecução da obrigação se caracteriza pela omissão do devedor em tomar certas precauções, sem se cogitar do resultado final. (CURSO DE DIREITO CIVIL BRASILEIRO. V.7, Responsabilidade Civil, 10.ed., São Paulo: Editora Saraiva, 1996, p. 194).”
O Código de Ética do Profissional de Enfermagem e o Código Civil brasileiro, através de seus dispositivos, caracterizam ser necessária a presença de culpa no agir do Enfermeiro, através da presença da imprudência, da imperícia ou da negligência no seu agir profissional para que se caracterize um ilícito civil passível de responsabilização judicial do Enfermeiro pelos danos que venha a ter sofrido um paciente. No mesmo sentido, o Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990) dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Segundo o artigo 14, § 4º do CDC, a responsabilidade dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.
Geralmente, o enfermeiro está vinculado a uma instituição de saúde, seja ela pública ou privada, e a sua atividade em hospital, ou outro serviço de saúde, em caso de dano ao paciente, vai levar à responsabilização civil também do ente hospitalar. A responsabilização, na área da justiça civil, atingirá a todos que de uma maneira ou outra estejam vinculados como causadores do prejuízo – todos que tenham sido responsáveis pelo dano causado ao paciente. Ele também se responsabiliza por danos causados por equipamentos, materiais e substâncias que venha a utilizar no paciente. Fica, nestes casos, caracterizada a responsabilidade civil do Enfermeiro pelo fato da coisa. Se ocorrer um dano ao paciente decorrente do uso dos equipamentos que utiliza este arcará com a responsabilidade civil.
Portanto, a responsabilização do Enfermeiro pelos danos que porventura lhe sejam imputados, no atendimento a um paciente, será avaliada por nossos tribunais nos termos da responsabilidade subjetiva (Teoria da Culpa).
Entre o Enfermeiro e o paciente se estabelece uma relação contratual, sendo que esta se dá através de uma obrigação de meio onde o objeto jurídico é a adequada assistência. Salienta-se que a responsabilidade do enfermeiro poderá acarretar a do seu empregador, pois geralmente ele é empregado do hospital, do médico ou de organização médica. Neste caso, não há que se provar a culpabilidade do enfermeiro para fins de ação regressiva, visto que a responsabilidade é por fato de terceiro.
Em relação aos Farmacêuticos, há um pluralismo semântico, pois se trata de palavra equívoca, tornando-se imprescindível a conceituação de cada sentido para uma melhor análise, uma vez que são distintas as consequências jurídicas a depender de como atua este.
Assim, “farmacêutico” poderá ser aquele que age como empresário, submetido às normas respectivas, principalmente no que concerne à concorrência desleal, ou seja, a empresa farmacêutica, fabricante e distribuidora de medicamentos, como também poderá ser aquele que atua como auxiliar do médico e executor de suas prescrições, o profissional mais próximo da população que age na venda direta dos medicamentos prescritos pelos médicos e na orientação e comercialização daqueles não-prescritos. No primeiro caso, qual seja a fabricante de medicamentos, percebe-se que o seu conceito se enquadra de forma totalmente satisfatória à hipótese elencada no artigo 3° do Código de Defesa do Consumidor: “ Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.” Por este preceito, é possível vislumbrar, ainda, a responsabilidade solidária do estabelecimento que comercializa os medicamentos, ou seja, a farmácia. Da mesma forma, poderá ser aplicado o mesmo ao adquirente da medicação, caracterizando-o como consumidor, conforme se depreende da leitura do artigo 2° do supracitado diploma legal: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.” Restando, portanto, inequívoca a relação consumerista entre aquele que produz o medicamento e o seu consumidor final, ter-se-á uma responsabilidade objetiva com fundamento no artigo 6°, inciso VIII do CDC, onde, o consumidor deverá tão somente demonstrar o nexo de causalidade entre o defeito do produto e o dano causado.
A responsabilidade objetiva dos fornecedores de medicamentos é vista de forma pacífica perante a doutrina e a jurisprudência, estando pautada a mesma em razão da desigualdade entre aqueles e o consumidor bem como em função da teoria do risco-proveito, onde todo aquele que exerce alguma atividade cria um risco de dano para terceiros(...) sendo reparável o dano causado a outrem em consequência do benefício do responsável. De fato, o comércio de medicamento mostra-se cada vez mais como um mercado altamente rentável, o que faz a busca pelo lucro incessante, ainda que colocando a saúde das pessoas através de matérias-primas e procedimentos de pesquisas mais baratos, devendo, a norma, resguardar os direitos daqueles que vierem a sofrer danos pela má qualidade de produtos de tamanha importância.
Ademais, quanto à responsabilidade dos farmacêuticos pessoas físicas auxiliares do médico, os mesmos respondem de forma subjetiva, com fundamento na regra geral contida no artigo 927 cumulado com artigo 186, ambos do Código Civil.
Portanto, só haverá responsabilidade do farmacêutico nas suas atribuições, quando se comprovar que houve culpa sua, isto é, negligência, imperícia ou imprudência. Haverá responsabilidade do farmacêutico, dentre outras hipóteses, se ele: a) infringir as normas de sua profissão; b) não observar as regras de prudência a que está submetido o exercício de qualquer profissão; c) vender substâncias tóxicas sem receita médica; d) revelar segredo profissional, divulgando conteúdo de receitas, a respeito do qual deveria silenciar, no interesse da saúde do doente e por razões morais relevantes; e) não cumprir as prescrições médicas; f) preparar mal uma receita, devido a sua imperícia etc.
Destarte, a Resolução n° 461/2007 do Conselho Federal de Farmácia elenca as infrações éticas nas quais o profissional submetido a esta autarquia podem ocorrer e que podem dar ensejo à responsabilização na esfera cível, sendo exemplos a) Desrespeitar ou ignorar o direito ao consentimento livre e esclarecido do usuário sobre sua saúde e seu bem-estar; b) Participar de qualquer tipo de experiência em seres humanos com fins bélicos, raciais, eugênicos e em pesquisa clínica, na qual se observe desrespeito dos direitos humanos; c) Praticar ato profissional que cause dano físico, moral ou material ao usuário do serviço, caracterizado como imperícia, negligência ou imprudência; d) Extrair, produzir, fabricar, fornecer, transformar, sintetizar, embalar, reembalar, importar, exportar, armazenar produtos dietéticos, alimentares, cosméticos, perfumes, produtos de higiene, produtos saneantes e produtos veterinários, em desacordo com a regulação sanitária e farmacêutica; e) Delegar a outras pessoas atos ou atribuições exclusivas da profissão farmacêutica.
É possível, por fim, a imputação de responsabilidade solidária do farmacêutico por erros de seus subordinados que atuarem com negligência, imperícia ou imprudência, com fulcro nos artigos 932, inciso III e 933 do Diploma Civil, ainda que o farmacêutico não tenha participado do ato que ensejou o dano, haja vista sua culpa in elegendo.
Dentistas: Em relação aos cirurgiões-dentistas, embora em certos casos se possa dizer que sua obrigação é de meio, na maioria das vezes apresenta-se como de resultado, porque a terapêutica é mais definida e é mais fácil para o profissional comprometer-se a curar. Essa obrigação torna-se mais evidente quando se trata de trabalho de natureza estética.
Em alguns casos somente o exame do caso concreto pode definir se a obrigação é de meio (de cura, como por exemplo, se no caso de cirurgia de gengiva, de tratamento de canal em que deverá empregar todo o seu zelo ao tratar do cliente, sem, contudo, obrigar-se a curá-lo efetivamente) ou de resultado (se se tratar de problema estético, como por exemplo, colocação de pivô ou feitura de uma jaqueta).
Segundo Venosa (2001, p. 575):
"A responsabilidade dos dentistas situa-se no mesmo plano e sob as mesmas perspectivas da responsabilidade médica, valendo o que aqui foi afirmado. O art. 1.545 os coloca juntamente com os médicos, cirurgiões e farmacêuticos. A responsabilidade do dentista, contudo, traduz mais acentuadamente uma obrigação de resultado. Observe, no entanto, que a responsabilidade do dentista geralmente é contratual, por sua própria natureza. Com freqüência o dentista assegura um resultado ao paciente. Sempre que o profissional assegurar o resultado e este não for atingido, responderá objetivamente pelos danos causados ao paciente (Oliveira, v. p. 645:1999:205). No entanto, nem sempre a obrigação do odontólogo é de resultado"
Já Guimarães Menegale [Revista Forense, nº 80], observa com inteira propriedade, que o compromisso profissional do operador odontológico envolve mais acentuadamente uma obrigação de resultados: "[...] à patologia das infecções dentárias corresponde etiologia específica e seus processos são mais regulares e restritos, sem embargos das relações que podem determinar com desordens patológicas gerais; conseqüentemente, a sintomatologia, a diagnose e a terapêutica são muito mais definidas e é mais fácil para o profissional comprometer-se a curar."
Para Saad [1998, p. 246], "em regra, a obrigação do dentista é de resultado, o qual não compreende a patologia das infecções dentárias, com etiologia específica. Essa obrigação de resultado ganha mais nitidez em tratamento objetivando colocação de próteses, restaurações de dentes etc. com fins predominantemente estéticos".
A odontologia divide-se em várias áreas em que o cirurgião-dentista pode se especializar como forma de melhor prestar os seus serviços. Esta especialização pode significar um serviço diferenciado e que, como chamariz, pode aumentar a responsabilidade em caso de algum erro.
São considerados atos odontológicos lato sensu aqueles praticados por profissional com graduação em Odontologia, recebendo o título em instituição nacional reconhecida ou em faculdade estrangeira, porém com a devida revalidação do respectivo diploma. Estes atos devem necessariamente seguir os ensinamentos ministrados na graduação, e também pós-graduação, utilizando-se o dentista dos conhecimentos arraigados, para atender satisfatoriamente os seus pacientes.
Cabe ao cirurgião-dentista, além dos atos odontológicos específicos, isto é, os inerentes à profissão e que se aperfeiçoam através das especializações, praticar atos não específicos, como prescrever medicamentos na esfera odontológica, atestar estados mórbidos, proceder à perícia odonto-legal a fim de verificações em sede civil, criminal, trabalhista e administrativo, bem como a utilização de anestesia local e troncomandibular.
São várias as áreas de atuação do profissional da odontologia, sendo que pode este vir a ser representado ou processado civil ou criminalmente. O dentista, como operador da saúde humana, se coloca em campo de trabalho no qual o maior bem é a vida e a saúde dos seus pacientes, os quais devem ser atendidos com zelo e presteza.
Outro ato ilícito que pode ser cometido pelo odontólogo é a falta de diligência devida, quando o mesmo pode obrar com imprudência, negligência e imperícia. São os casos em que os pacientes são atendidos de forma mais superficial, ou melhor, sem o devido cuidado por parte do profissional, abrindo, destarte, possibilidade de dano tanto pela sua atuação, quanto pela sua omissão ou ainda pela falta de experiência.
Definindo as três espécies que formam o conceito da culpa stricto sensu, ou seja, a imprudência "é a falta de diligência, a falta de cuidado necessário para a prática de determinado ato" [Oliveira, 1999, p. 109], age com imprudência o profissional que tem atitudes não justificadas, açodadas, precipitadas, sem usar a cautela, ou seja, atua de modo descuidado.
Em relação à negligência, "é caracterizada pela omissão do agente no desenvolvimento de determinado ato" [Oliveira, 1999, p. 106], pela inação, indolência, inércia, passividade, em outras palavras é a falta de observância aos deveres que as circunstâncias exigem. Para diferenciar estas duas espécies, que sempre causam alguma confusão, a doutrina já observou que "enquanto na negligência o sujeito deixa de fazer alguma coisa que a prudência impõe, na imprudência ele realiza uma conduta que a cautela indica que não deve ser realizada" [Jesus, 1994, p. 257]. Percebe-se, dessa forma, que a grande diferença está na atuação, na imprudência o sujeito age mal e, na negligência, quando devia tomar uma atitude o autor não age.
Quanto ao último aspecto da falta de zelo profissional apresenta-se a imperícia, que nada mais é do que "a incapacidade, a falta de conhecimentos técnicos no exercício de arte ou profissão, não tomando o agente em consideração o que sabe ou deve saber" [Mirabete, 1998, p. 145], ou ainda, a falta de aptidão ou habilidade para fazer alguma coisa da qual o agente, em razão de sua profissão ou atividade, não poderia ter falhado na execução.
A segunda espécie de ato ilícito odontológico é o erro de diagnóstico. O primeiro atendimento efetuado pelo profissional é um exame realizado a fim de constatar qual a moléstia que está atacando o paciente, bem como as possíveis possibilidades de tratamento que serão mais eficientes para resolver o caso.
Outro problema é a questão do erro de diagnóstico, que seria o método e o equipamento utilizado para realizar este exame inicial, decisivo para a opção de tratamento a ser realizado. Logicamente, um profissional que acompanha a evolução tecnológica da sua ciência, terá menos possibilidade de errar em contato com um caso concreto, do que um profissional que se utiliza de métodos antiquados e equipamentos não mais utilizados, o qual se expõe a riscos que deve ter conhecimento.
Porém, o maior causador de processos de responsabilidade contra o profissional é o erro na escolha da espécie de tratamento a ser aplicado no caso específico. Muitas vezes isso ocorre combinado com o equívoco de diagnóstico ou ainda com a falta de cuidado ou atenção do dentista, entretanto a opção curativa errada acarreta graves sanções, tanto criminais como patrimoniais.
Assim, abre-se ao cirurgião-dentista inúmeras possibilidades de terapêutica, para os mais diversos casos, sendo realmente muito fácil ocorrer erros na opção do tratamento, o que por si só o condena. É determinado aos dentistas que procurem ordenar o tratamento menos perigoso, a não ser em caso de necessidade ou urgência, ou quando é aberta a possibilidade do paciente optar pelo método a ser utilizado, principalmente na questão do valor deste. Mesmo tendo ocorrido um resultado que não tenha sido o previsto pelo paciente, o cirurgião dentista pode ser isentado da reparação.
"Alguns acontecimentos, no entanto, podem interromper a cadeia causal, desobrigando o agente do dever de indenizar, e são chamados de excludentes de responsabilidade. São eles: o estado de necessidade, a legítima defesa, a culpa da vítima, o fato de terceiro, a cláusula de indenizar e o caso fortuito ou força maior" [Oliveira, 1999, p. 181].
Portanto, no caso do odontólogo, resta a este o ônus de provar a sua atuação correta, sendo invertido o ônus em favor do ofendido.·.
Hospitais: é importante dizer que no que se refere aos hospitais não pode ser levianos. A mera presunção de culpa do Hospital, por aplicação da teoria do risco empresarial diante das peculiaridades que envolvem a natureza do serviço prestado, é um erro. Assim, é necessária uma demonstração analítica dos requisitos que têm que estarem presentes para que se possa falar em responsabilidade civil dos hospitais e estabelecimentos de saúde.
O vínculo entre paciente e hospital pode-se dar contratualmente e extracontratualmente. Na primeira hipótese (responsabilidade contratual), é imprescindível que haja, por óbvio, um contrato entre as partes (que pode ou não estar formalizado por instrumento), e que qualquer delas tenha descumprido qualquer das obrigações estipuladas. Além disso, é necessário que haja dano sofrido pela outra parte em decorrência do inadimplemento contratual.
Quando um paciente dá entrada em um Hospital, espera-se que este preste os serviços necessários ao internamento, cabendo ao primeiro fornecer os equipamentos, os medicamentos e os materiais utilizados durante o internamento, bem como as instalações para a realização de eventual cirurgia.
A obrigação do Hospital é classificada como “de meio”, cabendo a ele fornecer os meios necessários ao correto atendimento do paciente.
No caso de responsabilidade extracontratual, não há contrato entre as partes. Uma delas pratica um ato ilícito, aplicando-se, então, o princípio de que ninguém deve infringir a lei e os princípios dela decorrentes. A lei estabelece que verificado o dano, haverá a obrigação de indenizar desde que presentes os requisitos da responsabilidade civil (culpa e nexo causal).
Médicos: Ao prejudicado incumbe a prova de que o profissional agiu com culpa, a teor do estatuído nos artigos 951 do Código Civil e 14, § 4º do CDC. Permite este ao juiz inverter o ônus da prova em favor do consumidor, dada a sua hipossuficiência. O médico responde não só por fato próprio, como pode também responder por fato danoso praticado por terceiros que estejam diretamente sob suas ordens. Se o médico tem vínculo empregatício com o hospital, integrando sua equipe médica, responde objetivamente a casa de saúde, como prestadora de serviços (CDC, artigo 14, caput). Porém, se o profissional apenas utiliza o hospital para internar seus pacientes particulares, responde com exclusividade por seus erros, afastada a responsabilidade do estabelecimento.
Planos de Saúde: Antes do surgimento do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade civil das operadoras era apurada através do Código Civil, pautada, portanto, na sua modalidade subjetiva. Essa situação criava enorme óbice ao beneficiário que desejava demandar contra a seguradora, pois, dada sua condição hipossuficiente, nem sempre este conseguia provar em juízo o dolo ou a culpa desta.
Após a inserção do diploma consumerista em nosso ordenamento jurídico, enquadrou-se a relação entre seguradora e segurado como de consumo, haja vista que o cidadão que contrata o plano de saúde é destinatário final daquele serviço fornecido pela empresa seguradora. Nesse contexto, a responsabilidade civil das operadoras, baseada no CDC, tem de ser apurada sob a ótica objetiva, nos termos de seu art. 14: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”
Portanto, a empresa prestadora de serviços de saúde responde objetivamente pelos danos causados a seus consumidores, pelos defeitos relativos aos serviços prestados e pelas informações insuficientes ou inadequadas sobre a fruição e os riscos do serviço.
Laboratório de Análises Clinicas: no que tange as análise de responsabilidade civil médica de laboratórios de diagnósticos, a responsabilidade será sempre subjetiva, ou seja a prova de culpa é imprescindível, a demonstração de erro grosseiro no diagnóstico, seria a única forma de responsabilizar o laboratório. Entretanto, necessário falar sobre a dificuldade do paciente produzir prova desse erro, uma vez que resta evidente a dificuldade técnica dessas análises, portanto é indispensável nesses casos a inversão do ônus probandi.
III.RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL
Trata-se de um tema bastante controvertido segundo Maria Helena Diniz, pois há autores que a incluem na esfera contratual, outros, na extracontratual, e há hipóteses em que coincidem as duas responsabilidades.
A responsabilidade será contratual aos profissionais liberais que ao efetuarem prestações de serviços, poderão assumir obrigação de meio e de resultado, consubstanciada num ajuste de vontade. Na obrigação de meio o devedor se obriga tão somente a usar de prudência e diligência normais na prestação do serviço, e havendo inadimplemento, é imprescindível a análise do comportamento do devedor para a sua responsabilização. ( Responsabilidade Subjetiva).
O contrato de prestação de serviços profissionais pelo médico ou pelo advogado é exemplo desse tipo de obrigação. Já a obrigação de resultado é aquela em que o credor tem o direito de exigir do devedor a produção de um resultado, e basta que o resultado não seja atingido para que o credor seja indenizado pelo obrigado. Podemos citar como exemplo o contrato de empreitada.
A responsabilidade será extracontratual quando não deriva de contrato, mas de infração ao dever de conduta (dever legal) imposto genericamente no art. 927 do Código Civil Brasileiro.
No campo de certas profissões dotadas de função social há hipóteses em que coincidem as duas responsabilidades – a contratual e a extracontratual- e o profissional deverá observar as normas reguladoras de seu ofício, umas vezes por força do contrato e outras, em virtude de lei. O inadimplemento da obrigação contratual e legal, quando há vinculo contratual cairá sobre a responsabilidade contratual, ante a preponderância do elemento contratual.
Portanto, a responsabilidade civil profissional é subjetiva, todavia, se o profissional estiver na condição de preposto ou empregado, a responsabilidade civil do empregador ou comitente será objetiva nos termos do artigo 932, inciso III ou artigo 14 do CDC em se tratando de relação de consumo.
A responsabilidade civil pode apresentar-se sob diferentes espécies, no que tange ao fato gerador desta, podendo ser contratual, quando decorre um instrumento de manifestação de vontade, leia-se contrato, ou podendo ser extracontratual, quando mesmo sem qualquer relação jurídica o agente causa dano a uma vitima em razão de ato ilícito.
A responsabilidade contratual se origina da inexecução contratual, ou seja em um descumprimento obrigacional pactuado entre as partes. Resulta, portanto, de ilícito contratual. É uma infração a um dever especial estabelecido pela vontade dos contratantes, por isso decorre de relação obrigacional preexistente e pressupõe capacidade para contratar.
Na responsabilidade contratual, não há o que se falar sobre culpa do inadimplente, para obter reparação das perdas e danos, necessário apenas provar o inadimplemento. O ônus da prova, na responsabilidade contratual, competirá ao devedor nos termos do Art. 1056 do Código Civil de 2002. Para excluir o dever de indenizar , o devedor terá que provar as excludentes, conforme positivado no Art. 1058 CC.
A responsabilidade extracontratual, também chamada de aquiliana, resulta do inadimplemento normativo, ou seja, da prática de um ato ilícito por pessoa capaz ou incapaz, nos termos do Art. 156 CC, ou ainda da violação de um dever fundado em algum princípio geral de direito, conforme elucida o Art. 159 CC. É a lesão a um direito sem que entre o ofensor e o ofendido preexista qualquer relação jurídica. Aqui, ao contrário da contratual, caberá à vítima provar a culpa do agente, aplica-se a responsabilidade subjetiva.
No que tange a responsabilidade do médico, essa tem por base as teorias subjetivas, fundada na culpa e a teoria objetiva fundada no risco. No entanto, para compreensão da responsabilidade civil do médico há que se ter em mente que responsabilidade civil é a obrigação de repara o prejuízo decorrente de uma ação ou omissão.
Para que haja a responsabilização do médico por evento danoso ao paciente, deve haver conduta imprudente, negligente ou imperita, causando tal ato, dano ao paciente. Pode ocorrer também a responsabilização do médico nos casos em que se configure obrigação de resultado e o mesmo não seja atingido.
O profissional da medicina deve sempre agir com perícia no exercício de sua profissão. Deve seguir regras de conduta relativas ao dever de informação, dever de atualização, dever de assistir e dever de abstenção de uso.
É importante destacar que o principal dever de um profissional da saúde é informar, seguindo inclusive princípios éticos da própria medicina, e o Princípio do Consentimento Informado, e o mesmo se aplica aos estabelecimentos médicos e aos outros profissionais da saúde.
O dever de informar consiste na obrigação do médico prestar ao paciente todas as informações necessárias ao tratamento, tais como a necessidade de intervenções, riscos, possíveis efeitos da medicação prescrita, consequências do tratamento, preço e demais informações relativas ao serviço a ser prestado, além de informações relativas a sua especialização em determinada área médica. O dever de informar é pré-requisito a obtenção do consentimento do paciente.
Além do dever de informar o médico tem o dever de assistir, ou seja, assessorar seu paciente da melhor forma possível, sempre buscando atender seus chamados, respondendo às solicitações, prestando esclarecimentos.
E ainda o dever de abstenção de abuso, leia-se, obrigação do médico de pautar-se nos princípios da ética em sua atuação, não devendo visar apenas o lucro ou obtenção de vantagens.
Antes mesmo de tratar da responsabilidade civil do médico é necessário falar sobre a natureza jurídica de sua prestação, essa discussão é controvertida entre os doutrinadores. Alguns consideram como obrigação de meio, outros como obrigação de resultado.
Acertadamente a doutrina entende, em regra, que a responsabilidade civil do médico é sob o regime de obrigação de meio, já que realizam atividades na busca de melhora do paciente, no entanto, não podem garantir a cura, por fatores que fogem a sua responsabilidade. Porém, em algumas atividades médicas, como a medicina estética, o profissional dá a seu paciente a garantia de obter determinados resultados.
Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, os profissionais da saúde e os estabelecimentos de saúde, passaram a ser equiparados a prestadores de serviços. Divide-se os serviços médicos em: o médico profissional liberal, leia-se aquele que presta serviço diretamente ao paciente e com esse possui contrato, basicamente o chamado atendimento de consultório; o prestador de serviços empresariais é aquele que presta serviços de forma empresarial, ou seja, em clinicas médicas, laboratórios, hospitais, entre outros; temos ainda os médicos que atendem em hospitais públicos.
A responsabilidade civil do médico profissional liberal está descrita no artigo 14 § 4°:
“Art. 14. O fornecedor de produtos e serviços responde independentemente da existência de culpa pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos a prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos,
§4° a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação da culpa.”
Ou seja, o Código de Defesa do Consumidor blinda o profissional liberal da responsabilidade objetiva, admitindo em alguns casos a inversão do ônus da prova, uma vez observada a hipossuficiência do paciente em relação ao médico (Art. 6º, inciso VIII, Código de Defesa do Consumidor).
Em se tratando de cirurgião plástico, temos não mais obrigação de meio, mas sim obrigação de resultado, por se tratar de responsabilidade civil objetiva, uma vez que um erro acarretará um dano estético algumas vezes irreparável, nesses casos a prova da culpa do médico será irrelevante, havendo em regra a inversão do ônus da prova.
Os médicos que prestam serviço em hospitais, compartilham a responsabilidade em reparar o dano causado ao paciente, resguardado sempre o direito de regresso, a justificativa para tanto é a redação do Art. 932 III do Código Civil:
“Art. 932 São também responsáveis pela reparação civil:
III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;”
A grande discussão é sobre os médicos dos Sistema Único de Saúde, o temeroso SUS, tal e qual o atendimento prestado nos Hospitais Públicos.
Nessa seara é necessário definir a priori, quem poderá ser responsabilizado nas ações de erro médico quando tratar-se de um atendimento prestado na qualidade de serviço público, através do SUS, qual o ente público tem legitimidade para figurar no polo passivo dessas demandas.
A vítima poderá acionar o médico, o Estado, ou ambos? Ou seja, diante de um erro médico causado em um hospital estadual, qual ente federativo deve configurar no polo passivo da demanda? A União, responsável pela direção do SUS; o Município, responsável pelo serviço de saúde; ou, o ente público que mantém aquela instituição hospitalar, em razão do disposto no parágrafo 6°, art. 37 da Constituição Federal.
Em razão da competência compartilhada no que tange a saúde a questão é obscura e divide os doutrinadores.
É possível admitir que a legitimidade seria da União, há duas vertentes: de um lado aqueles que defendem a tese que a União tem legitimidade para responder as ações de erro médico, justificando que, a Lei Orgânica da Saúde determina que é da competência da União a direção nacional do SUS. Entretanto, há doutrinadores e jurisprudências no sentido de que a União não é responsável pelos erros cometidos por médicos conveniados ao SUS, seria,nessa hipótese, o responsável solidario pelo dano, o ente federativo que mantém a instituição de saúde, leia-se hospitais, laboratórios e afins.
COMENTÁRIOS AO ACORDÃO- EMBARGOS INFRINGENTES Nº 2004013605-6 (TJSC)
EMBARGOS INFRINGENTES - AÇÃO INDENIZATÓRIA - INJEÇÃO DE MEDICAMENTO - ERRO QUANTO AO PROCEDIMENTO DE APLICAÇÃO - RESPONSABILIDADE DO ENFERMEIRO - REFORMA DA SENTENÇA PARA RECONHECER A ILEGITIMIDADE DO MÉDICO - CONDENAÇÃO EXCLUSIVA DO HOSPITAL - EMBARGOS IMPROVIDOS.
O caso em tela analisa a responsabilidade civil do hospital, médico e enfermeiro em se tratando de dano causado a paciente.
O paciente ao se submeter a um procedimento médico espera, além de um bom atendimento, que seu problema seja resolvido, ou ao menos, minimizado. Ocorre que, no caso em questão, o paciente sofreu um dano que decorreu de erro na aplicação do medicamento realizada por enfermeiro.
Quem se responsabilizará pelo dano?
O médico, que segundo o Código de Ética Médica atribui a ele a responsabilidade pelo paciente durante o período em que este estiver sob seus cuidados?
O enfermeiro, que causou o dano por não demonstrar conhecimentos técnicos e científicos adequados?
Ou o Hospital, na qualidade de empregador, no fundamento da culpa in elegendo e in vigilando?
Vejamos:
O médico e o enfermeiro são profissionais liberais e respondem pelos seus atos subjetivamente, quando agem com negligência, imprudência e imperícia. Isto é assim, pois suas responsabilidades advêm de um contrato com o paciente, consubstanciada em obrigações de meio ou resultado.
No caso em questão a responsabilidade é de meio, devendo agir com diligência e prudência na consecução do resultado, porém este, não vincula à responsabilização caso não venha a ocorrer, visto que o paciente não pode exigir que o médico ou enfermeiro infalivelmente, o cure.
Na maioria das vezes esses profissionais liberais têm vínculos empregatícios com as redes de hospitais, pois não são todos que conseguem abrir ou manter seus próprios estabelecimentos.
Quando o hospital exerce a função de empregador contratando funcionários, passa a ter sobre eles responsabilidade objetiva, isto é, passa a ter responsabilidade sobre os funcionários que contrata- responsabilidade in elegendo- e também a ter responsabilidade de fiscalizá-los e vigiá-los- responsabilidade in vigilando. Contudo, ao ser responsabilizado por danos causados pelos seus funcionários, pode, se comprovar culpa ou dolo destes, ajuizar ação de regresso.
Neste acórdão a decisão dos doutos juízes foi sabia ao responsabilizar o hospital pelo erro de seu preposto, pois como dito acima, responde objetivamente pelos danos causados a terceiros por seus funcionários.
O enfermeiro também responderá por que agiu culposamente, visto que foi imprudente em sua conduta se precipitando, sem usar a devida cautela.
O médico, neste caso ora em comento, foi excluído do polo passivo, pois não houve nexo de causalidade entre sua conduta e o dano causado. Ele agiu conforme o procedimento, especificando: a medicação, a dosagem e a forma de aplicação (intramuscular), cabendo ao enfermeiro à responsabilidade de executar tal procedimento, já que a Lei nº 7498/86 regulamentada pelo Decreto nº 94.406/87 disciplina que a aplicação de injeção é atividade que compete ao enfermeiro.
Posto isto, fica claro que para o sucesso de uma assistência adequada ao paciente, contribuem vários profissionais de diferentes níveis de qualificação. Todos têm uma participação direta ou indireta na assistência. Na ocorrência do erro, médicos e enfermeiros são passíveis de responder judicialmente. Para tanto, é necessária a conjunção de três elementos formadores: uma conduta que pode ser ação ou omissão; um resultado ocasionando um prejuízo moral ou físico e nexo causal - que é a ligação lógica entre a conduta realizada e o resultado final dessa conduta. Sendo certo que o Hospital tem responsabilidade objetiva já que atua como empregador. Tudo para garantir uma assistência de qualidade humanizada, respeitando os seus direitos como cidadão.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - Responsabilidade Civil - Saraiva - 24ª edição - ed. 2010
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