Articulação política ou corrupção?

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Análise da articulação política praticada no Brasil, confrontando com o que dispõe o Código Penal Brasileiro.

Pode parecer estranho, mas muitos associam a política com algo relacionado a corrupção, pois, em geral, principalmente nos momentos atuais, os jornais vêm apresentando muita corrupção no meio político.

O Brasil descobriu que existe corrupção em alguns setores da administração pública ou onde o governo atua, cujo grande destaque iniciou com o esquema do mensalão, que está quase esquecido.

Aí veio o petroleoduto, o maior esquema de corrupção do país. Mas será?

Com certeza, os efeitos do petroleoduto, cuja operação da polícia federal foi denominada “lava jato”, estão sendo devastadores.

Uma empresa, a maior do país, com representação mundial, manipulou números de seus balanços, fez gastos desnecessários e superfaturados, fez “doações coercitivas” a partidos políticos e a candidatos, e tantas outras irregularidades, digamos assim, ao longo dos anos, ocasionando, agora que está sendo revelado, uma avalanche de demissões, de quebra de empresas, de “falência” de municípios.

Descobriram que até no Exército Brasileiro existe um esquema de corrupção, onde militares vendem certificados de blindagem para empresas e veículos, colocando em risco a vida de muitos, até deles mesmos, pois ultimamente, o Exército Brasileiro tem sido utilizado em ocupações de comunidades, e eles, os militares, utilizam de coletes e capacetes blindados.

Há esquema de corrupção dentro do BNDES, CEF, várias prefeituras, FIFA, até mesmo dentro do Poder Judiciário foi encontrado esquema de venda de sentenças.

Todos sabem, principalmente empresários, que fiscais fazendários, de posturas, de vigilância Sanitária, quase sempre “negociam” a fiscalização.

Se perguntarem nas ruas, se existe esquema no processo licitatório, todos irão dizer que sim, mesmo sem conhecer o esquema.

O esquema no processo de licitação é, em geral, feito por formação de quadrilha, onde um grupo de empresas combina entre si, qual será o valor de cada proposta, para que a empresa da vez ganhe o processo.

Quem furar o esquema, com certeza será excluído do grupo e dificilmente conseguirá participar de qualquer outra licitação pública, pois será "queimado" no mercado e suas propostas não serão aprovadas.

Ninguém acha estranho que são sempre as mesmas empresas que fazem as grandes obras públicas?

Assim, estas mesmas empresas estipulam o valor da obra, sempre superfaturado, para cobrir os gastos para conquista da obra, para manter-se no grupo, etc.

As vezes o superfaturamento não está no preço em si, mas na realização da obra. Por exemplo: a licitação seria para uma pavimentação de 30km de ruas, mas a empresa somente realiza 15km, e o órgão público contratante dá como completo o serviço licitado e contratado, pagando os 30km.

Desta forma, a empresa “ganhadora” do processo de licitação terá como pagar as “despesas extras” que teve na obra.

Mas até onde vai o esquema de “troca de favores” que existe nos órgãos e empresas públicas.

Aqueles que acompanham o noticiário político devem ter notado que vários projetos de lei são “negociados” nas casas legislativas, para sua aprovação ou não.

A negociação envolve uma articulação política de oferecimento ou solicitação de cargos e pastas ministeriais para determinados políticos ou ao partido destes.

Então, qual é a diferença entre a negociação para se “ganhar” uma licitação, de se obter o resultado desejado na casa legislativa em relação a um determinado projeto de lei?

A meu ver, nenhuma! Ambos estão, em razão do cargo ou função pública, solicitando ou recebendo vantagem indevida, para si ou para outrem, ou ainda, oferecendo ou prometendo vantagem indevida a funcionário público.

Analisando os arts 317 e 333 do Código Penal Brasileiro, os mesmos dispõem:

 Corrupção passiva

        Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

        Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

        § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.

        § 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:

        Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

Corrupção ativa

        Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício:

        Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

        Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

Como visto, a conduta praticada pelos nossos representantes legislativos e dos poderes executivos podem, em tese, enquadrar-se nos dispositivos penais acima transcritos.

Interesses pessoais ou partidários se sobrepondo aos interesses da nação, do povo brasileiro, do progresso do país em nome da política, da articulação política.

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Será, então, que articulação política é a legalidade da corrupção no meio político?

Segundo o filósofo grego Aristóteles, a política é a ciência que tem por objetivo a felicidade humana e divide-se em ética (que se preocupa com a felicidade individual do homem na Cidade-Estado, ou pólis), e na política propriamente dita (que se preocupa com a felicidade coletiva). A política situa-se no âmbito das ciências práticas, ou seja, as ciências que buscam conhecimento como meio para a ação.

Dizia Aristóteles:

"Vemos que toda cidade é uma espécie de comunidade, e toda comunidade se forma com vistas a algum bem, pois todas as ações de todos os homens são praticadas com vistas ao que lhes parece um bem; se todas as comunidades visam algum bem, é evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas as outras, tem mais que todas, este objetivo e visa ao mais importante de todos os bens; ela se chama cidade e é a comunidade política" (Pol., 1252a).

Enfim a Política é tudo o que se relaciona à busca de ações para o bem estar tanto individual como coletivo.

Articulação é discutir determinados temas dentro das comunidades. É juntar as pessoas. Tem o mesmo sentido que mobilizar. Tomando como exemplo o punho, que é uma articulação entre a mão e o antebraço e o cotovelo, que é uma articulação entre o antebraço e o braço, articular é harmonizar, combinar os movimentos e ações de várias partes para atingir um determinado objetivo. Se cada parte do corpo agir de maneira desarticulada, não conseguiremos realizar as atividades que queremos. Deve, de fato articular as discussões e lutas das várias comunidades e organizações para irem na mesma direção e terem maior resultado, tendo sempre em vista também os seus objetivos. Assim não se corre o risco de haver ações divergentes nem a necessidade de centralizar todas as decisões e ações, o que acaba sendo uma tendência não muito participativa e democrática, mas bastante comum.

Dessa forma, articulação política é a discussão de temas com os envolvidos, cujo interesse deve ser o bem estar dos mesmos, mobilizando-os para uma mesma ação, um mesmo objetivo, um mesmo resultado.

Todavia, o que se tem visto no meio político brasileiro, seja em âmbito municipal, estadual ou federal, este com mais destaque da mídia, é que a articulação política vem sendo praticada com a promessa ou cobrança de cargos ou pastas ministeriais em troca do voto em determinado projeto de lei.

Assim, independentemente de ser bom ou ruim para o país, o voto do projeto será determinado pelo pagamento oferecido ou solicitado.

Essa negociação de cargos e pastas é tão descarada que chega a ser motivo para o vice-presidente da república dizer que não irá continuar à frente da articulação política, tendo em vista que suas negociações com parlamentares, bem como suas nomeações para o segundo escalão tem sido travadas por Aloizio Mercadante, conforme destacou a matéria da revista Época em sua página eletrônica no dia 03/07/2015 as 21/30h, como segue:

“O vice-presidente Michel Temer diz que não dá mais para continuar à frente da articulacão política do governo, apesar dos pedidos da presidente Dilma Rousseff para que permaneça na função. O motivo da insatisfação tem nome e sobrenome: Aloizio Mercadante. Sabota as negociações com os parlamentares e trava as nomeações para o segundo escalão. Temer cansou de dar novas chances e sair frustrado”.

O futuro de uma nação depende dos interesses individuais daqueles que estariam nos representando, daqueles que deveriam estar votando em prol da nação, do povo e não do seu partido político, do seu único e exclusivo interesse pessoal.

Certamente que num governo democrático é necessário haver a articulação política, contudo, não se pode usar a democracia, corrompendo o conceito de articulação política.

Sobre o autor
Andre Luis Madeira de Carvalho

advogado inscrito na OAB/RJ sob nº 125601.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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