CRIME PERMANENTE E PRISÃO DE PARLAMENTAR

24/10/2015 às 07:13
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O ARTIGO ANALISA A PRISÃO DE PARLAMENTAR E AINDA O CHAMADO CRIME PERMANENTE À LUZ DE CASO CONCRETO.

~~CRIME PERMANENTE E PRISÃO DE PARLAMENTAR

ROGÉRIO TADEU ROMANO

Tem-se da lição de  José Afonso da Silva  (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 535/536, item n. 15, 30ª ed., 2008, Malheiros):
“‘
“‘Quanto à prisão’, estatui-se que, salvo flagrante de crime inafiançável, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos dentro do período que vai desde a sua diplomação até o encerramento definitivo de seu mandato por qualquer motivo, incluindo a não reeleição. Podem, pois, ser presos nos casos de flagrante de crime inafiançável, mas, nesse caso, os autos serão remetidos, dentro de 24 horas, à Câmara respectiva, para que, pelo voto da maioria (absoluta) de seus membros, resolva sobre a prisão (art. 53, § 2º, EC-35/2001). Convém ponderar a respeito da questão da afiançabilidade de crime, hoje importante, diante do disposto no art. 5º, LXVI, segundo o qual ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Se o crime fora daqueles que admitem liberdade provisória, o tratamento a ser dado ao congressista há de ser idêntico ao dos crimes afiançáveis, ou seja: ‘vedada a prisão’.”
Discute-se a situação do Deputado Federal Eduardo Cunha onde se aponta que há investigação com relação a crime de promoção de evasão de divisas.
Trata o artigo 22 da Lei 7.492/86:
Art. 22. Efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País:
Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente.
No parágrafo único do artigo 22 o legislador penal previu duas modalidades de conduta: promover a saída de moeda ou divisa e manter depósitos não declarados.
Na segunda modalidade, o crime é permanente. Para o aperfeiçoamento do tipo, não basta o comportamento isolado. Necessária a conduta reiterada. O momento consumativo inicial é aquele em que é feito o depósito, um momento consumativo final, é aquele que se traduz na cessação do depósito e um momento intermediário, que é contínuo, ininterrupto e de duração apreciável.
O crime exige o dolo específico.
No caso em discussão, segundo as investigações realizadas pelas autoridades suíças, Cunha era titular de três contas na Suíça e a mulher dele, Cláudia Cruz, era titular de outra. Duas das contas de Cunha foram encerradas antes que as autoridades suíças conseguissem bloquear os valores. As outras duas contas tinham saldo de 2,39 milhões de francos suíços e de 176 mil francos suíços ( R$ 10 milhões, ao todo). O dinheiro teria sido proveniente de pagamento de propina referente a contratos da Petrobras.
No inquérito aberto no STF, também são investigadas a mulher de Cunha e uma das filhas dele, Danielle Dytz da Cunha Dotorovitch. A suspeita é de que os três tenham cometidos crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. O deputado também é suspeito de corrupção.
 
Ora, como já salientado, na modalidade de manter depósitos não declarados o crime é permanente.
Se há um crime permanente pode-se falar na hipótese de prisão em flagrante do parlamentar.
A prisão em flagrante é medida cautelar de segregação provisória do autor da infração penal. Exige-se para tanto que haja aparência da tipicidade, não se exigindo nenhuma valoração sobre a ilicitude e a culpabilidade do acusado.
A  prisão em flagrante é prisão cautelar de natureza administrativa, realizada no instante em que ocorre ou termina a infração penal. Como prisão cautelar, provisória, soma-se a outras espécies como a prisão preventiva e a prisão temporária. A  prisão processual ou cautelar se opõe à prisão em razão de sentença judicial penal condenatória transitada em julgado.
O artigo 301 do Código de Processo Penal é taxativo ao determinar que qualquer do povo  poderá     e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
Com a prisão em flagrante, impede-se a consumação do delito, no caso em que a infração está sendo praticada, a teor do artigo 302, I, do CPP, ou de seu exaurimento, nas demais situações, como se dá quando a infração acabou de ser praticada(artigo 302, II, CPP), ou, logo após a sua prática, tenha se seguido a perseguição(artigo 302, III, CPP), ou o encontro do presumido autor(artigo 302, IV, CPP).
Como bem disse Eugênio Pacceli(Curso de Processo Penal, 17ª edição, pág. 542),a prisão em flagrante cumpre importantíssima missão, cuidando da diminuição dos efeitos da ação criminosa, quando não do seu completo afastamento. 
Enquanto a conta no exterior existir haverá crime permanente. Isso porque manter conta no exterior sem a devida declaração aos órgãos competentes é crime previsto na Lei de crimes do colarinho branco.
Discute-se a prisão em flagrante nos casos de crime permanente.

O crime permanente é o delito cuja consumação se prolonga com o tempo, dependente da atividade do agente que pode cessar quando este quiser(cárcere privado, sequestro, tráfico ilícito de entorpecentes). Enquanto não cessar a permanência, a prisão em flagrante poderá ser realizada em qualquer tempo(artigo 303, CPP).

Os parlamentares, segundo a Constituição, desde a diplomação “não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável” e, mesmo nesta hipótese, caberá à Câmara dos Deputados ou ao Senado Federal “resolver” sobre a manutenção ou não da prisão do parlamentar (art. 53, § 2º). Essa a redação dada à Constituição pela Emenda 35/2001. 
O congressista, independente de licença prévia, poderá sofrer qualquer espécie de prisão penal, incluindo-se a prisão em flagrante, ou ainda por sentença penal condenatória.
Alerte-se que, para o caso, aplica-se, outrossim, o artigo 324, IV, do Código de Processo Penal, que determina que não será concedida fiança nos casos em que estejam presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva(artigo 312 do CPP),  ou  seja: para garantia da ordem pública, da conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal.
Essa última hipótese deve ser devidamente analisada pelo Ministério Público, que,  inclusive,  poderá  ser considerada nas razões para eventual afastamento da função do parlamentar(artigo 319, VI, do CPP).

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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