Direito Administrativo:constitucionalização das licitações públicas sustentáveis

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A constitucionalização das licitações públicas sustentáveis é o elo de efetivação normativa da sua aplicabilidade com plena eficácia no ordenamento jurídico infraconstitucional.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Hodiernamente, a sustentabilidade tem sido temática de profundas discussões jurídicas no âmbito nacional com vistas à garantia do meio ambiente equilibrado para as futuras gerações. Do mesmo modo, o estatuto das licitações públicas, Lei federal 8.666/93, no intuito de seguir a tendência evolutiva dos direitos difusos, teve seu texto adaptado pela Lei federal 12.349/2010, inserindo na definição das licitações a finalidade da promoção do desenvolvimento nacional sustentável. No entanto, por se tratar de uma diretriz, não há mecanismos jurídicos coercitivos para seguimento da disposição prescrita na lei, uma vez que sua definição infraconstitucional e abstrata não vincula as instituições públicas a se adequarem ao procedimento em comento.

Neste interim, a inserção na carta maior tem finalidade coercitiva e traria à baila a nacionalização da sustentabilidade das contratações públicas no intuito do desenvolvimento nacional sustentável, onde o Estado é o personagem finalístico. O fenômeno da constitucionalização de direitos traz ao ordenamento jurídico a inquestionável aplicabilidade para os dispositivos infraconstitucionais. Desta forma, a inconstitucionalidade não seria arguida pelas hipóteses de confronto normativo com institutos infraconstitucionais.

A constitucionalização das licitações públicas sustentáveis vincularia toda administração pública e traria a nacionalização da concepção de desenvolvimento sustentável como meta na contratação de bens e serviços. Portanto a contribuição do presente trabalho tem por objetivo o estudo da inserção das disposições de licitações públicas sustentáveis na Constituição Federal, objetivando sua aplicabilidade com plena eficácia no ordenamento jurídico nacional com intuito de máxima efetividade das contratações sustentáveis.

Para concretização do presente trabalho, foi empregada a técnica de pesquisa nominada de análise de dados bibliográficos, com fito de conhecer, refletir e discutir acerca da constitucionalização das contratações públicas sustentáveis. A pesquisa bibliográfica é o levantamento de toda a bibliografia já publicada, em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita (MARCONI, LAKATOS, 1992).

No segundo capítulo, foi tratado o constitucionalismo e sua concepção como norma fundamental para o ordenamento jurídico de uma nação, desde os movimentos revolucionários que ensejaram neste novo paradigma normativo e organizaram, em uma carta maior, todas as disposições basilares de direitos e garantias fundamentais. Nesta carta, ficaram inseridas as garantias fundamentais do homem, liberdades negativas do estado e dispositivos limitadores que asseguraram o mínimo existencial. Estas garantias encontraram fundamento na dignidade da pessoa humana como princípio máster do constitucionalismo ocidental, princípio este que emana garantias por todo o ordenamento jurídico.

Estas concepções de garantias fundamentais estenderam-se dentre os direitos, indo além do individualismo, com os movimentos constitucionais germânico de Weimar e da constituição Mexicana, que inseriram garantias além da pessoa humana, assegurando condições sociais à nação, direitos da prole, à moradia digna, à saúde, educação, seguridade social dentre outras.

Entretanto, uma terceira linha de direitos assegurados aos que não podem ser individualizados no contexto jurídico, os direitos difusos ou transindividuais que tutelam a coletividade, assegura um meio ambiente equilibrado como bem de todos. Por fim, foi tratada a supremacia da norma constitucional perante o ordenamento jurídico do país. Esta supremacia, tradada sob o modelo positivista da pirâmide de normas, em que a constituição é a norma fundamental e suprema do ordenamento jurídico, limita os demais dispositivos legais, sob pena de padecer sob o vício da inconstitucionalidade a lei ou ato normativo que lhe for contrário.

O terceiro capítulo trouxe a tratativa da competência constitucional na tutela do meio ambiente, suas garantias constitucionais para um meio ambiente equilibrado, sua base principiológica como norte do ordenamento jurídico nacional, a precaução como princípio de suma importância na tutela do meio ambiente, bem como sua relação com a Ordem Econômica e Financeira do país com a prerrogativa de defesa do meio ambiente na formação do desenvolvimento econômico sustentável. Desta maneira, o meio ambiente, de forma irrestrita, é direito de todos e a sua garantia, um dever do Estado.

No quarto capítulo, foi abordada a conceituação atual das licitações públicas, suas previsões esparsas e limitadas no âmbito de proteção ao meio ambiente, seu conceito, os princípios do procedimento licitatório, como também a vinculação da Administração pública aos seus procedimentos como requisito de eficácia para a atividade administrativa. Esta abordagem deu ênfase à argumentação da necessidade da constitucionalização das licitações sustentáveis, haja vista as disposições existentes não universalizarem sua aplicabilidade de forma sustentável, sendo apenas um norte, uma diretriz para a administração na realização das contratações públicas.

Ainda no quarto capítulo, foi realizado o estudo sistemático da constitucionalização das licitações públicas sustentáveis, a atual deficiência na sua aplicação, a grandiosa importância para a sociedade, bem como a sua vinculação às disposições de licitações sustentáveis inseridas na Constituição.

A CONSTITUIÇÃO COMO NORMA FUNDAMENTAL

O constitucionalismo surgiu em momento histórico conturbado dos direitos do homem, uma ocasião onde não havia a consolidação das normas fundamentais básicas que norteassem o ordenamento jurídico, este momento histórico inseriu um novo paradigma normativo ao sistema jurídico, modificando o contexto das normas e sua finalidade precípua, este marco histórico, surgiu de movimentos revolucionários e libertários do Estado em uma luta árdua contra a tirania e a arbitrariedade do legislador.

A origem histórica do “constitucionalismo está ligada às Constituições escritas e rígidas dos Estados Unidos da América, em 1787, após a independência das 13 Colônias, e da França, em 1791, a partir da Revolução Francesa” (MORAES, 2009, p 1).

Antes deste movimento, haviam leis esparsas e adstritas ao detentor do Poder, centralizando a competência de edição das normas sem qualquer instrumento de proteção dos direitos fundamentais da pessoa humana, logo, com os movimentos revolucionários dos separatistas republicanos do novo mundo nos Estados Unidos e pelos franceses com o iluminismo, assim, “não é mais a norma segundo a qual a velha constitucional monárquica era válida, mas uma norma segundo a qual a nova constituição republicana é válida, uma norma que investe o governo revolucionário de poder legal” (KELSEN, 2000, p. 173), desta forma, as garantias fundamentais são parte integrante do conteúdo normativo da constituição, o foco finalístico das disposições constitucionais.

Com este fundamento formou-se o constitucionalismo, inspirado nos ideais iluministas de liberdade, igualdade e fraternidade, os quais modificaram o contexto dos direitos, pondo as vontades do povo em uma carta solene e de plena eficácia no ordenamento jurídico, “a constituição, que é o certificado da cidadania dos povos, o compromisso de seu futuro, o monumento de sua maioridade, a carta de seus direitos, o compêndio de suas liberdades, a garantia de sua proteção fundamental” (BONAVIDES, 2009, p 58).

Desta formas, foram asseguradas garantias pela lei maior, lei posta no ápice da hierarquia normativa, que além das prerrogativas inerentes às proteções fundamentais, foram inseridas no seu texto analítico a estrutura Político-Administrativa do Estado, a ordem econômica e demais dispositivos fundamentais à organização político administrativa. Deste modo:

para ser um Estado, a ordem jurídica necessita de ter o caráter de uma organização no sentido estrito da palavra, quer dizer, tem de instituir órgãos funcionando segundo o princípio da divisão do trabalho para criação e aplicação das normas que a formam (KELSEN, 1998, p. 200).

A divisão de trabalho surgiu com a descentralização do poder, além da delimitação de suas atividades calcadas no sistema de freios e contrapesos ou check and balances, onde foram delimitadas as atividades dos órgãos integrantes da administração pública, descentralizando suas funções e limitando sua linha de liberdade de administrar, “somente a disposição das leis, e mesmo das leis fundamentais, forma a liberdade em sua relação com a constituição” (MONTESQUIEU, 2000, p. 196), destarte, o judiciário de uma nação trataria apenas de sua função jurisdicional, o legislativo apenas das leis e fiscalização dos atos do poder executivo que por sua vez, executa as políticas públicas do Estado, no entanto, existe uma pequena parcela de poderes atípicos dos órgãos, de forma limitada, podem exercer funções dos demais órgãos funcionando de forma harmoniosa entre si.

O texto constitucional vai além do elenco de normas fundamentais da pessoa humana, uma “constituição política do Estado, no sentido amplo de estabelecer sua estrutura, a organização de suas instituições e órgãos, o modo de aquisição e limitação do poder, através, inclusive, da previsão de diversos direitos e garantias fundamentais” (MORAES, 2009, p. 1) que se estendem por todo o conteúdo da constituição como uma base para elaboração das demais normas do texto constitucional.

As garantias constitucionais foram editadas sob o princípio máster do constitucionalismo ocidental, a dignidade da pessoa humana, tendo a “afirmação de que todos os direitos e garantias fundamentais encontram seu fundamento direto, imediato e igual na dignidade da pessoa humana” (SARLET, 2011, p. 93), este fundamento encontra guarida no pensamento Kantiano de que “o homem, e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não simplesmente como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade” (KANT, apud SARLET, 2011, p. 40), desta ótica kantiana, “os seres humanos possuem um valor com certo caráter normativo, mas não utilitário” (SARLET, 2011, p. 41). Este caráter normativo ensejou na criação dos direitos fundamentais, liberdades negativas, direitos de defesa do homem frente ao Estado como uma forma impositiva de combate à arbitrariedade estatal.

Direitos de Primeira dimensão, os direitos fundamentais.

A princípio, os “Direitos naturais, diziam-se por se entender que se tratava de direitos inerentes à natureza do homem; direitos inatos que cabem ao homem só pelo fato de ser homem” (SILVA, 2009, p 176). Contudo, “a enorme importância do tema dos direitos do homem depende do fato de ele estar extremamente ligado aos dois problemas fundamentais do nosso tempo, a democracia e a paz” (BOBBIO, 2004, p 203), assim, devem ser inseridos democraticamente como elemento finalístico dos direitos, o homem livre e detentor de direitos.

Portanto, os direitos de primeira geração são os direitos da liberdade, “os primeiros a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos, que, em grande parte, correspondem, por um prisma histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo no ocidente” (BONAVIDES, 2008, p 353), dimensão de nosso ordenamento jurídico de estado democrático de direito, onde “garantir direitos faz parte da natureza e essência dos regimes constitucionais, tal se infere no texto oracular dos fundadores do constitucionalismo” (BONAVIDES, 2008, p. 67), pondo o caráter limitado ao o Estado frente às liberdades constituídas aos seres humanos integrantes da nação, cujos titulares possuem um fim em si mesmo.

Onde a constituição, a despeito de seu caráter compromissário, confere uma unidade de sentido, de valor e de concordância prática ao sistema de direitos fundamentais, que por sua vez, repousa na dignidade da pessoa humana, isto é, na concepção que faz da pessoa fundamento e fim da sociedade e do Estado (SARLET, 2011, p 91).

Postos estes fins dos direitos fundamentais que são, a um só tempo, direitos subjetivos e elementos fundamentais da ordem constitucional objetiva. “Enquanto direitos subjetivos, os direitos fundamentais outorgam aos titulares a possibilidade de impor os seus interesses em face dos órgãos obrigados” (MENDES, 1999, p. 1), e, enquanto direitos objetivos, limitam o poder arbitrário do Estado frente sua população.

Estas preleções de direitos fundamentais integrantes do compêndio constitucional estendem-se por toda carta maior, integrando demais dimensões dos direitos do homem.

Direitos de segunda dimensão, direitos sociais.

Com base no constitucionalismo germânico de Weimar e da carta constitucional do México que inovou o contesto dos direitos do homem de primeira dimensão, indo além das disposições de direitos fundamentais inerentes ao indivíduo, ampliou suas liberdades, sua honra, sua personalidade, criando as diretrizes de socialização dos direitos, passando ao coletivismo de direitos, contextualizando o constitucionalismo social, tendo como base fundamental a igualdade indivíduos.

Os direitos fundamentais sociais encontraram escopo em liberdades positivas, devem sempre ser lembradas, ambas, como os primeiros textos constitucionais que efetivamente concretizaram, ao lado das liberdades públicas, dispositivos expressos impositivos de uma conduta ativa por parte do Estado para que este viabilize a plena fruição, por todos os cidadãos, dos direitos fundamentais de que são titulares (PINHEIRO, 2006, p. 121)

Estas liberdades positivas são postas como fundamento objetivo do Estado em assegurar condições mínimas ao social, condições inseridas nas vertentes de trabalho, moradia, previdência e demais benefícios sociais inerentes ao âmbito coletivo, à “aplicabilidade das políticas públicas em sua essência, tendo por finalidade a melhoria de condições de vida aos hipossuficientes” (MORAES, 2009 p 195), inserindo a função estatal de complementariedade dos direitos fundamentais assegurados no âmbito social.

Direitos de terceira dimensão, os direitos difusos.

Os direitos transindividuais ou coletivos lato sensu abrangem os direitos difusos e os direitos coletivos stricto sensu. O termo difuso, utilizado bastante nos dias atuais, não foi criado modernamente. Sua origem encontra-se na doutrina romanística (COIMBRA, 2011, p. 66). Este contexto de direitos foi inserido no nosso ordenamento jurídico constitucional de forma inovadora no sistema civil law “foi o legislador brasileiro, na verdade, que protagonizou, de modo muito mais profundo e mais rico do nos países da civil law ‘a revolução’ mencionada por Capelletti e Garth, em prol da criação de instrumentos de tutela coletiva” (Zavascki apud COIMBRA, 2011, p. 69), que, além dos direitos fundamentais inerentes à pessoa em si, limitadores da atividade do Estado em função da pessoa humana, os direitos difusos passaram a garantir direitos aqueles que não podem ser individualizados, ou seja, passou a tutelar uma universalidade de sujeito.

O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e a condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade que permita uma vida de dignidade e bem-estar, e ele tem uma responsabilidade solene de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras. A este respeito, as políticas que promovem ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, colonial e outras formas de opressão e de dominação estrangeira permanecem condenadas e devem ser eliminadas. (ONU, 1972, parágrafo 1)

Desta forma, o bem estar social e o meio ambiente passaram a ser assegurados na constituição.

Com a evolução dos direitos e a emergência de categorias como os direitos coletivos e difusos, os interesses da sociedade como um todo, mesmo que seus titulares não possam ser individualmente identificados, devem prevalecer sobre os interesses particulares que, desta forma, precisam ser adaptados às características deste momento histórico (BORGES, 1998, p. 68).

Estas inovações vieram com o surgimento da terceira dimensão dos direitos do homem, o compêndio de medidas garantidoras da qualidade de vida, direitos que em sua natureza não podem ter os sujeitos de direito individualizados. O mínimo existencial do homem de permanecer em um ambiente ecologicamente equilibrado, garantindo o futuro das nações, assegurando que próximas gerações possam habitar um mundo melhor, mais solidário.

A consagração dos direitos humanos se fez em contextos históricos diversos e dimensões diferentes, pelo que se consagrou seu estudo pela análise das ‘dimensões dos direitos fundamentais’, e é neste contexto que se deve buscar a compreensão da construção tardia do Direito do Meio Ambiente, pela conjugação de diversos fatores e elementos, dentre eles o histórico, o social, o político, o econômico e o científico. (PADILHA, 2010, p. 36).

 Portanto, os direitos difusos de terceira geração, fundados no idealismo iluminista de fraternidade ou solidariedade, tem como fundamento a garantia da “promoção de um desenvolvimento sustentável, consistindo a conciliação entre o desenvolvimento, a preservação do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vida” (FERRARI, 2001, p. 3). Uma extensão dos direitos individuais em favor da coletividade.

O direito à integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identi­ficado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos huma­nos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade. (MS 22.164, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 30‑10‑1995, Plenário, DJ de17‑11‑1995.)

 Indo além da questão ambiental, nos direitos difusos estão inseridos também os direitos do consumidor, os direitos ligados à preservação do patrimônio sócio cultural e com os bens e direitos de valor artístico, preservação do patrimônio histórico, turístico e paisagístico, por infração à ordem econômica.

Sua peculiar caracterização dá-se por meio da impossibilidade de individualização do sujeito de direitos, tendo como crivo elementar a proteção à coletividade.

 A supremacia da norma constitucional perante o ordenamento jurídico.

A existência de escalonamento normativo é pressuposto necessário para a supremacia constitucional, pois, “ocupando a constituição a hierarquia do sistema normativo é nela que o legislador encontrará a forma de elaboração legislativa e o seu conteúdo” (MORAES, 2009, p 699). Assim, “a hegemonia normativa dos princípios constitucionais fez o Direito Constitucional subir ao mais alto patamar da ciência jurídica até se tornar o direito dos direitos, a disciplina das disciplinas, o código dos códigos” (BONAVIDES, 2008, p. 352). Formando uma hegemonia legal, tendo como base a constituição como norma fundamental das demais normas jurídicas.

Essa hegemonia dá-se pela superioridade da norma constitucional, dando a ela legitimidade. Pois, sem legitimidade não há democracia, e sem democracia não prevalece o Estado de Direito. Faltando uma e outra, falta tudo a um povo para ser livre e digno (BONAVIDES, 2008, p 59).

A carta constitucional sobrepõe aos demais dispositivos normativos, tais como Leis complementares, Ordinárias, Leis Estaduais, Municipais e demais dispositivos legais, disciplinando todo o ordenamento jurídico em forma de controle imperativo das normas infraconstitucionais, “não se pode negar, ademais, que a falta de um mecanismo de controle de constitucionalidade pode ser fatal para os direitos e garantias fundamentais, que ficariam, de fato, a mercê da vontade do legislador” (MENDES, 1993, p. 183). Pondo a constituição como norma fundamental do ordenamento jurídico, toda sistemática fica adstrita aos seus comandos, pondo “a derivação das normas de uma ordem jurídica a partir da norma fundamental dessa ordem é executada demostrando-se que as normas particulares foram criadas em conformidade com a norma fundamental” (KELSEN, 2000, p. 168)

Nossa constituição é rígida. Em consequência, é a lei fundamental e suprema do Estado brasileiro. Toda autoridade só nela encontra fundamento e só nela confere poderes e competências governamentais. Nem o governo federal, nem os governos dos Estados, nem os Municípios ou Distrito Federal são soberanos, porque todos são limitados, expressa ou implicitamente, pelas normas positivas daquela lei fundamental. (DA SILVA, 2009, p. 46)

            O foco normativo da carta maior como fundamento do sistema normativo, sua função primordial de ser, seus fins exprimidos em seu compêndio como norma fundamental que objetiva, os fins e metas do Estado postas em uma carta extensiva que expressa as vontades do povo, onde:

A Constituição deve ser compreendida como uma unidade, como um sistema que privilegia valores e que a Lei Fundamental de 88 além de garantir o presente, direciona-se par o futuro, o que faz por meio de normas que enunciam programas, tarefas, diretrizes e fins que devem ser cumpridos pelo Estado e pela sociedade, como instrumentos de transformação social e de fundamento para as políticas públicas (FERRARI, 2001, p. 3)

A inserção de qualquer dispositivo normativo infraconstitucional deve atender diuturnamente às disposições constitucionais, sob pena de padecer sob o crivo do vício de inconstitucionalidade, perdendo desta forma a eficácia normativa em confronto com os preceitos constitucionais, esta hierarquização ao texto constitucional como norma fundamental do ordenamento jurídico tem por fim a vinculação de seus preceitos, unificando a finalidade do sistema normativo, que, pelo contrário:

quanto mais largo o hiato entre a Constituição e a realidade, o Estado e a sociedade, a norma e sua eficácia, os governantes e os governados, a lei e a justiça, a legalidade e a legitimidade, a constitucionalidade formal e a constitucionalidade material, mais exposto e vulnerável à crise constituinte fica o arcabouço do ordenamento estatal, por cujas juntas e articulações estalam todas as estruturas do poder e da organização social (BONAVIDES, 2008, p. 76)

            Esta vinculação é posta sob o aspecto formal, cujo procedimento legal deve atender a ritos preestabelecidos de acordo com a complexidade e conteúdo normativo, além do mais, o texto das leis busca fundamento absoluto nas prerrogativas constitucionais, harmonizando o sistema normativo. Portanto, o caráter de norma fundamental suprema do Estado tem sua aplicabilidade calcada nos ditames da supremacia constitucional, assegurando desta feita o parâmetro mínimo de vinculação das normas abaixo de seu patamar jurídico. Assegurando a hegemonia normativa, garantindo o mínimo de direitos do homem de forma democrática e finalística da nação.

Controle de Constitucionalidade como ferramenta de garantia da norma constitucional

O controle de constitucionalidade foi inserido na constituição para garantir a hegemonia da Constituição Federal como norma fundamental, esta medida assecuratória da norma constitucional surgiu nos Estados Unidos, em 1803, no caso Marbury vs. Madison, onde se questionou a validade de uma norma infraconstitucional integrante de um ente da federação perante a norma constitucional, atribuindo-se o termo de Lei maior à Constituição Federal.

No Brasil, foi à constituição imperialista de 1824 que inseriu a separação dos poderes, instituindo o Poder Executivo, Legislativo, Judiciário e o Moderador, tendo como representantes da nação o Imperador e a Assembleia Geral que teve a titularidade para o exercício do controle de constitucionalidade, todos estes poderes do império como delegações da nação.

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Vê-se que o controle da constitucionalidade das leis no Império era exercido pelo próprio Poder Legislativo, o qual deveria interpretar as leis (em interpretação dita autêntica, como fez na Lei de Interpretação, de 1840, que limitou o alcance do Ato Adicional de 1834, este a única emenda formal à Carta de 1824) e até mesmo legislar sem receio de que a lei fosse dita ‘irrazoável’, como foi no caso da Lei da Maioridade, também de 1840, que declarou que o jovem Pedro de Alcântara, então com 14 anos, passava a ser maior, assim preenchendo o requisito constitucional de que o Imperador deveria contar, ao menos, com 18 anos para que subisse ao Trono e, desta forma, cessando a anarquia que caracterizou os períodos de Regência (SLAIBI FILHO, 2008, p. 4)

Atualmente, a Constituição de 1988 delimitou a atribuição de guardião da Constituição que ficou estabelecida no art. 102 da CF/88, atribuindo ao Supremo Tribunal Federal, de forma concentrada, a prerrogativa de julgar as ações de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, bem como as Ações Declaratórias de Preceitos Fundamentais. Desta forma, a suprema corte nacional ficou incumbida de assegurar a superioridade da norma constitucional.

DIREITO AMBIENTAL NO ÂMBITO CONSTITUCIONAL

Inserido no cerne dos direitos difusos, o direito ambiental, direito de todos e dever do Estado a sua preservação, onde “as normas constitucionais assumiram a consciência de que o direito a vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente” (DA SILVA, 2009, p. 848).

A finalidade das garantias de tutela do meio ambiente sob o âmbito constitucional tem como fundamento a composição da vida digna cuja “qualidade do ambiente é um bem, cuja preservação, proteção e defesa, tornam-se um imperativo para assegurar o direito fundamental à vida” (PIOVESAN apud FERRARI, 2001, p. 4), neste contexto a constituição

assume a condição de matriz axiológica do ordenamento jurídico, visto que é a partir deste valor e princípio que os demais princípios (assim como as regras) se projetam e recebem impulsos que dialogam com os seus respectivos conteúdos normativo-axiológicos, o que não implica a aceitação da tese de que a dignidade é o único valor a cumprir tal função e nem a adesão ao pensamento de que todos os direitos fundamentais (especialmente se assim considerados os que foram como tais consagrados pela Constituição) encontram seu fundamento direto e exclusivo na dignidade da pessoa humana. Assim, a dignidade humana, para além de ser também um valor constitucional, configura-se como sendo – juntamente com o respeito e a proteção da vida! – o princípio de maior hierarquia da CF88 e de todas as demais ordens jurídicas que a reconhecem (SARLET, 2013, p. 73).

Este princípio máster do constitucionalismo, fundamento absoluto de todos os demais, consagra o meio ambiente equilibrado como integrante da holística da dignidade da pessoa humana como mínimo qualitativo de todos, sem distinção, cabendo ao Estado  

a proteção e defesa do meio ambiente, como encargo do Poder Publico e da coletividade, cria um direito subjetivo público, pois cabe ao Estado o dever jurídico de agir, de modo a criar condições para que o meio ambiente propicie uma sadia qualidade de vida, a ser usufruída por todos, isto é, cabendo ao Poder Público a realização de prestações positivas, o seu não atendimento acarreta uma inconstitucionalidade (FERRARI, 2001, p. 4, Grifo próprio).

Portanto, de forma ampla e irrestrita, a tutela do meio ambiente é tida como máxima de direitos inserida na dimensão dos direitos difusos, sob o prisma do constitucionalismo, assegurando e garantindo no ordenamento jurídico infraconstitucional sua preservação, e, quando degradado, sua devida restituição ao status quo ante.

A ordem econômica nacional, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, sob a égide da constituição, atrelada ao protecionismo ambiental, elencado como princípio norteador da atividade econômica que hoje ligado intrinsecamente com a sustentabilidade, esta política integrou o desenvolvimento econômico ao cerne dos direitos difusos, alicerçando o surgimento do desenvolvimento econômico sustentável.

O conceito de desenvolvimento sustentável surgiu em 1972 em conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), em Estocolmo, buscando meios renováveis e retornáveis de produção, objetivando “[...] defender e melhorar o meio ambiente para as atuais e futuras gerações se tornou uma meta fundamental para a humanidade [...]” (ONU, 1972, parágrafo 6), para que esta e futuras gerações possam desfrutar de condições mínimas de vida.

Um ponto foi atingido na história em que devemos moldar nossas ações em todo o mundo, com um atendimento mais prudente para as suas consequências ambientais. Por ignorância ou indiferença podemos causar danos maciços e irreversíveis ao meio ambiente terrestre em que a nossa vida e o bem-estar dependem. Por outro lado, através de um conhecimento mais aprofundado e de ação mais prudente, podemos conseguir para nós mesmos e nossa posteridade uma vida melhor em um ambiente mais de acordo com as necessidades e esperanças humanas [...] (ONU, 1972, parágrafo 6)

Sob esta ótica de preservação do meio ambiente estabelecida na política da ONU, em total consonância com o assentado na conferência de Estocolmo, a constituição estabeleceu que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (CF/88, art. 225), esta disposição constitucional fundada no princípio da obrigatoriedade de atuação/intervenção estatal, onde o Estado é tido como principal sujeito ativo da proteção do meio ambiente, esta diretriz da atuação estatal está imposta no parágrafo 17 da Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, editada em Estocolmo em 16 de junho de 1972, prelecionando que às “Instituições nacionais apropriadas deve ser confiada a tarefa de planejar, administrar ou controlar os nove recursos ambientais dos Estados, com vista à melhoria da qualidade ambiental” (ONU, 1972, Parágrafo 17). Portanto cabe ao Estado a tarefa de tutelar o meio ambiente como direito transindividual.

Competência da proteção do meio ambiente

É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, proteger o meio ambiente e combater a sua degradação em qualquer de suas formas. Competência que se estende do âmbito normativo, inserindo atribuições positivas para os entes da Administração. Preleciona o texto constitucional, no art. 23 da CF/88, o poder/dever de proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, bem como recuperar o meio ambiente degradado. Atividade comum a todas as esferas da federação. Desta forma, todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para às presentes e futuras gerações.

Aquele que explorar recursos naturais fica obrigado a recuperar o meio ambiente afetado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei, bem como as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente. Estão sujeitos os infratores, pessoas físicas ou jurídicas às sanções penais e administrativas, que se aplicação subsidiariamente à obrigação de reparar os danos causados, desta forma, aquele que poluir fica obrigado a restituir o meio ambiente ao status quo ante, caso contrário sofrerá penalidades de cunho pecuniário, independente da aplicação de sanções penais.

A constituição e o Desenvolvimento econômico sustentável

Dentre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, inseridas no texto constitucional, “garantir o desenvolvimento nacional” (CF/88, Art. 3,II), desenvolvimento de forma harmoniosa com o meio ambiente, pondo “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, como finalidade de assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social” (CF/88, art. 170). Estes ditames estabelecidos na norma constitucional estão intrinsecamente ligados à “defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação” (CF/88, art. 170, VI).

A questão do desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, II) e a necessidade de preservação da integridade do meio ambiente (CF, art. 225): O princípio do desenvolvimento sustentável como fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia. O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasi­leiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamen­tais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações. (ADI 3.540‑MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 1º‑9‑2005, Plenário, DJ de 3‑2‑2006.)

Desta forma, incube ao Estado, o objetivo fundamental de garantir o desenvolvimento nacional de forma sustentável, interligando a economia e seus meios de produção ao meio ambiente equilibrado, invocando pelo afastamento de atividades econômicas nocivas ao meio ambiente em favor das futuras gerações.

Em contrário senso, as políticas econômicas impulsionam o desequilíbrio ambiental em face da lucratividade de baixos custos. Portanto as medidas normativas que asseguram o desenvolvimento sustentável devem limitar a produção danosa em massa, delimitando a atividade nociva ao meio ambiente, assim,

a atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios desti­nados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz con­ceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os ins­trumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem‑estar da população, além de causar graves danos ecológicos ao patrimônio ambiental, considerado este em seu aspecto físico ou natural. (ADI 3.540‑MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 1º‑9‑2005, Plenário, DJ de 3‑2‑2006.)

Sob esta ótica, o direito constitucional age como norma fundamental reguladora da ordem econômica em pleno equilíbrio com o direito ambiental, assegurando a plenitude dos direitos ambientais em função do desenvolvimento nacional sustentável, emanando seus preceitos por todo o ordenamento jurídico infraconstitucional.

Dos princípios constitucionais norteadores do meio ambiente.

“Os princípios jurídicos aqui são compreendidos como diretrizes que exprimem o caráter racional do ordenamento” (Ehrhardt, 2011, p. 60), assim, os princípios, norteadores do ordenamento jurídico trazem toda fundamentação teleológica para formulação das normas jurídicas. No direito ambiental, os princípios conduzem, de forma sistêmica o ordenamento, pois “o direito ambiental é uma ciência nova, porém autônoma. Essa independência lhe é garantida porque o direito ambiental possui seus próprios Princípios diretores, presentes no art. 225 da Constituição Federal” (Fiorillo, 2012, p. 85).

O princípio do poluidor-pagador e o protetor-recebedor, que prelecionam que os custos finais da produção e destinação de resíduos poluidores devem ser arcados por quem os produz,

o princípio do poluído-pagador determina a incidência e aplicação de alguns aspectos do regime jurídico da responsabilidade civil aos danos ambientais: a) responsabilidade civil objetiva; b) prioridade da reparação específica do dano ambiental; e c) solidariedade para suportar os danos causados ao meio ambiente. (Fiorillo, 2012, p. 101)

            Tendo como classificação a responsabilidade civil objetiva extracontratual, percebe-se que o elemento culpa é estranho na aplicação da responsabilidade civil, assim, aquele que causar dano ao meio ambiente independente de culpa, terá o dever de reparar, sem prejuízo das demais sanções Administrativas e penais.

O Princípio do desenvolvimento sustentável, componente da holística da ordem econômica nacional ligada à sustentabilidade,

o princípio do desenvolvimento sustentável tem por conteúdo a manutenção das bases vitais da produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens e destes com o seus ambiente, para que as futuras gerações também tenham oportunidade de desfrutar os mesmo recursos que temos hoje à nossa disposição (Fiorillo, 2012, p. 87).

Mediante a compatibilização entre a produção de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e traga qualidade de vida, a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta, responsabilidade compartilhada pelo ciclo de produção, repondo os bens retornáveis bem como a destinação final de dejetos não reutilizáveis, a aplicação de políticas públicas de utilização de fontes de energia renováveis e redução de utilização de combustíveis fósseis com foco na eliminação de gazes poluidores causadores do efeito estufa, o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda, promotor de cidadania, agregando valores econômicos aos resíduos antes considerados dejetos inutilizáveis “não há dúvida de que o desenvolvimento econômico também é um valor precioso da sociedade. Todavia, a preservação ambiental e o desenvolvimento econômico devem coexistir, demo do que aquela não acarrete anulação deste” (Fiorillo, 2012, 94). Deve existir cooperação entre as diferentes esferas do poder público, competência comum estabelecida pela Constituição como poder/dever do Estado, da economia e demais segmentos da sociedade, com foco na cooperação entre os povos para o progresso da humanidade sem limites fronteiriços com demais nações, objetivando o meio ambiente como bem irrestrito da humanidade.

O princípio da publicidade assegura à população o direito à informação e ao controle social, que “em seus aspectos regulatórios, depende da Administração Pública, que tem no princípio da publicidade administrativa um dos seus alicerces” (Antunes, 2013, p. 27), assim, todos os atos inerentes à proteção do meio ambiente devem ser públicos, pois, a temática do direito ambiental está inserida no âmbito dos direitos difusos que impossibilita a individualização dos sujeitos de direito.

Desta feita, a Constituição, em seu texto analítico, no intuito de assegurar o meio ambiente devidamente equilibrado como bem irrestrito de todos, estabelece políticas de proteção como requisito de todas as atividades da federação, aplicando-se o princípio da prevenção que “é o preceito fundamental, uma vez que os danos ambientais, na maioria das vezes, são irreversíveis e irreparáveis” (Fiorillo, 2012, p. 126), que por sua vez:

Para proteger o meio ambiente medidas de precaução devem ser largamente aplicadas pelos Estados segundo suas capacidades. Em caso de risco de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não deve servir de pretexto para procrastinar a adoção de medidas efetivas visando a prevenir a degradação do meio ambiente (princípio 15, RIO, 1992)

Portanto como princípio maior da tutela ambiental, o princípio da prevenção é acionado mediante suspeita de danos ao meio ambiente, não sendo necessária a concretização do ato danoso para que seja efetuada a proteção, pois, há danos de efeitos irreversíveis que devem ser precavidos.

AS LICITAÇÕES PÚBLICAS COMO INSTRUMENTO DE APLICABILIDADE DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A Constituição Federal de 1988 classificou a competência legislativa em privativa, exclusiva, concorrente e comum, quanto às licitações públicas, preceituou que sua edição seria de competência privativa da união, assim disposto no art. 22 que tem como texto:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

[...]

XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III.

Também previu a carta maior que a Administração pública de qualquer das esferas e seus órgão integrantes ficariam adstritos ao procedimento Administrativo pelo qual selecionasse a proposta mais vantajosa, e, assim preleciona o art. 37 que cita:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

As licitações apesar de enunciadas pela Carta Magna não são tratadas de forma exaustiva, sendo previstas em lei infraconstitucional, regulamentada por a lei federal 8.666/93, tendo em vista a observância da contratação da proposta mais vantajosa em respeito aos princípios da administração pública.

A norma geral de Licitações e Contratos, tratada por a lei federal 8.666/93 tem seu conceito disposto no art. 3º que enuncia:

A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

A licitação que “é um procedimento administrativo e a escolher proponentes de contratos de obras, serviços, compras e alienações do Poder Público” (DA SILVA, 2009, p. 672), ainda que enquanto os particulares desfrutam de ampla liberdade na contratação de obras e serviços, a administração Pública, em todos os seus níveis, para fazê-lo, precisa observar como regra, um procedimento preliminar determinado e balizado na conformidade da legislação. “Em decorrência dos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e probidade administrativa” (DE MORAIS, 2009, p. 360) que é ato precedente ao contrato administrativo. “A licitação é um procedimento integrado por atos e fatos da Administração e atos e fatos do licitante, todos contribuindo para formar a vontade contratual” (DI PIETRO, 2009, p. 350).

            Fundamentada por normas regentes o direito público complementa sua hermenêutica primando por princípios da administração enunciados na Carta Magna.

É induvidosa a vantagem da inserção constitucional de tais fundamentos como princípios, sob os quais a Administração Publica deve pautar suas atividades. Elevados à condição de princípios positivados, cimentam a base de validade ético-jurídica daquela e, ao mesmo tempo assume o papel de parametrizar a avaliação da atuação administrativa (FAZZIO JUNIOR, 2008, p. 5).

A legalidade, como princípio da administração (CF, art. 37, caput), significa que:

o administrador púbico está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal conforme o caso (FAZZIO JUNIOR, 2008, p. 7).

Ainda os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para os quais estes poderes lhes foram conferidos. A Administração só pode agir segundo a expressa determinação legal, seu raio de ação não está amparado em fazer o que a lei não veda, mas sim, somente o que a lei expressamente determina como ação executória. Pelo entendimento generalizado diz se que enquanto no direito privado ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo se não em virtude de lei, Art. 5º, II, CF/88, o direito administrativo prima que algo só pode ser feito ou deixar de ser feito se houver previsão legal. Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal

Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa ‘pode fazer assim’; para o administrador público ‘deve fazer assim’ (MEIRELLES, 2004, p. 88).

E que, além disso, mais do que direito público subjetivo, a observância da legalidade foi erigida em interesse difuso, passível de ser protegido por iniciativa do próprio cidadão.

Também o conhecido como princípio da impessoalidade, tem em sua essência o fato de que nas suas relações com os particulares, a Administração Pública não deve privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhum administrado em razão seja de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação econômica ou condição social. “O princípio da igualdade constitui um dos alicerces da licitação, na medida em que esta visa, não apenas permitir à administração a escolha da melhor proposta, como também assegurar igualdade de direitos a todos os interessados em contratar” (DI PIETRO, 2009, p. 355).

Todos são iguais perante a Administração. Prevalece à impessoalidade, assim evita-se o favoritismo, a preferência e melhor se resguarda o interesse público. Trata se da isonomia, que prima por a igualdade de todos sem distinção e cujo tratamento é tido de igual forma devidamente previsto no ato convocatório, princípio este polêmico quanto aduz ao que trata a norma regida na lei complementar 123/06 que prima por tratamento diferenciado para Micro Empresas ou Empresas de Pequeno Porte, uma vez que se valendo da isonomia substancial, traz o equilíbrio econômico à disputa de contratação com a administração.

“É da essência da licitação a adoção de tratamento diferenciado entre os participantes. Assim se impõe porque a licitação conduz à seleção de um ou mais de alguns dos potenciais interessados” (FILHO, 2009, p. 67).

Todos os atos e termos pertinentes ao processo licitatório, inclusive as decisões da Administração devidamente motivadas, necessariamente devem ser expostos ao conhecimento de todo e qualquer cidadão, no momento em que seus atos são publicados na imprensa oficial, inicia-se a fase externa, onde qualquer interessado pode demonstrar querer ser conhecedor. É por meio da transparência que participam do procedimento licitatório como também dos órgãos de controle tomam conhecimento dos atos da Administração, ainda que dele não participem ou interfiram.

No exercício da atividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionarem-se segundo as regras da boa-fé. Devendo ser probo em seus atos, tendo como base a probidade preceituada na Constituição federal. Tanto o Administrador público quanto o Licitante devem ter como parâmetro uma conduta digna, honesta, alheia a qualquer tipo de conluio ou concertos obscuros.

A Administração Pública e os Licitantes sempre estarão limitados em suas ações ao exato conteúdo dos termos do Edital.

Impõe-se, pelos princípios da vinculação ao instrumento convocatório e do julgamento objetivo, a desclassificação do licitante que não observou exigência prescrita no edital de concorrência. 3. A observância ao princípio constitucional da preponderância da proposta mais vantajosa para o Poder Público se dá mediante o cotejo das propostas válidas apresentadas pelos concorrentes, não havendo como incluir na avaliação a oferta eivada de nulidade. (STF RMS 23.640-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 16.10.2001)

Assim, deve o Edital conter determinações claras, objetivas, precisas, dos diversos procedimentos em suas diversas etapas, para que não permitam, em momento algum, a possibilidade, ainda que mínima, de se definir subjetivamente em qualquer das etapas do certame.

Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos

§ 1º. É vedado aos agentes públicos:

I – admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato;

[...]

            Portanto todo ente federativo da Administração direta e indireta de todos os poderes estão vinculados ao procedimento licitatório, assegurando igualdade de condições a todos os participantes em função da obtenção da proposta mais vantajosa, que por diversas vezes não é a mais econômica, pois a economicidade nem sempre implica em efetividade do objeto da licitação. Sob este aspecto em total consonância com a previsão constitucional de desenvolvimento econômico sustentável como bem de todos e dever da união, surgiram diversas previsões inerentes ao meio ambiente, ainda previsões amplitude sob o âmbito nacional e que em pontos delimitados preveem a observância da tutela ambiental.

Previsões legais relativas às contratações sustentáveis

Com a edição da Lei federal 12.349/2010, que modificou o conceito das licitações públicas, inseriu no texto normativo, art. 3º, o conceito de sustentabilidade, visando à promoção do desenvolvimento nacional sustentável como elo da obtenção da proposta mais vantajosa à Administração em total consonância com os princípios constitucionais, e, além destes o atendimento dos princípios específicos das licitações.

Tendo como base fundamental o texto da Lei Federal 12.349/2010, a União editou o Decreto de Nº 7.746/2012, regulamentando no âmbito federal instituindo a Comissão Interministerial de Sustentabilidade na Administração Pública – CISAP, órgão de apoio operacional da união objetivando propor à Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão o estabelecimento de outras formas de veiculação dos critérios e práticas de sustentabilidade nas contratações.

Em atendimento ao preceito abstrato de licitações do Decreto de Nº 7.746/2012, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, editou a Instrução Normativa de nº 01, de janeiro de 2010, dispondo sobre critérios de sustentabilidade na aquisição de bens e serviços ou obras pela Administração Federal direta, autárquica e fundacional. Assim, trouxe à baila questões mais sucintas da sustentabilidade das licitações públicas, inserindo, dentre outras ações o critério de sustentabilidade ambiental, considerando os processos de extração ou fabricação, utilização e descarte dos produtos e matérias primas.

No entanto a instrução normativa supramencionada preleciona critérios objetivos para atendimento de condições mínimas no âmbito da União, não tendo seus efeitos estendidos às demais esferas, ademais cita que a fixação dos critérios de sustentabilidade não deve ir de encontro à competitividade, objetivando a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, em contrário senso da economicidade.

            Fundada em diversos princípios ensejadores da política de sustentabilidade, foi editada a Lei Federal Nº 12.305, de 02 de agosto de 2010, pela qual Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, dispondo sobre seus princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, incluídos os perigosos, às responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos aplicáveis, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos.

Ainda dentro das normas esparsas do ordenamento jurídico infraconstitucional, fora editada a Lei 12.187/2009, que instituiu a Política Nacional sobre Mudança do Clima, com forte influência no Protocolo de Quioto, foi aberto para assinatura em 16 de março de 1998. Entrará em vigor 90 dias após a sua ratificação por pelo menos 55 Partes da Convenção “Esse compromisso, com vinculação legal, promete produzir uma reversão da tendência histórica de crescimento das emissões iniciadas nesses países há cerca de 150 anos” (ONU, 1997, p. 2), com base nas metas estabelecidas no protocolo de Quioto, onde são instrumentos da política nacional sobre mudança no clima, dentre outros,

as medidas existentes, ou a serem criadas, que estimulem o desenvolvimento de processos e tecnologias, que contribuam para a redução de emissões e remoções de gases de efeito estufa, bem como para a adaptação, dentre as quais o estabelecimento de critérios de preferência nas licitações e concorrências públicas, compreendidas aí as parcerias público-privadas e a autorização, permissão, outorga e concessão para exploração de serviços públicos e recursos naturais, para as propostas que propiciem maior economia de energia, água e outros recursos naturais e redução da emissão de gases de efeito estufa e de resíduos (art. 6º, XII, Lei Federal 12.187/2009)

Desta forma, as normas inerentes às contratações públicas sustentáveis não possuem ampla utilização, uma vez que seus conceitos existentes são muito limitados perante o leque de objetos de contratação da Administração pública, assim a constitucionalização como meta fundamental do desenvolvimento econômico sustentável modificaria o contexto da norma infraconstitucional.

O fundamento da constitucionalização das licitações públicas sustentáveis.

A globalização das políticas públicas de desenvolvimento econômico sustentável implementada pela Organização das Nações Unidas – ONU, discutidas no Protocolo de Kyoto, editado em 1998, em Convenção de mudanças climáticas, tendo dentre os objetivos o da

a redução gradual ou eliminação de imperfeições de mercado, incentivos fiscais, isenções tributárias e tarifárias e de subsídios em todos os gases de efeito estufa que emitem setores contrários ao objetivo da Convenção e aplicação de instrumentos de mercado. (ONU, 1998, Capítulo 2, art. 1 alínea a) item 5, grifo próprio)

Estas políticas de eliminação de imperfeições de mercado por meio de subsídios aos produtores sustentáveis, previstas na convenção de Kyoto, poderiam ir além da questão fiscal e subsidiária, aplicando meios de aquisição unicamente de bens e serviços ecologicamente corretos sob o âmbito da Administração pública, pois

os governos, como grandes compradores no âmbito de cada mercado, podem e devem pautar suas aquisições em critérios de sustentabilidade. As compras governamentais no Brasil situam-se no patamar de bilhões de reais. (...) A Administração Pública, em decorrência de seu poder de compra, é grande indutor na implementação de ações sustentáveis (ALTOUNIAN, 2012, p. 368, grifo próprio).

Estas implementações em que o governo se encontra são fundamentais para a efetivação das políticas de sustentabilidade, pois com grande poder de aquisição e, além disso, a vinculação à lei, estabelecida pela Constituição, no princípio constitucional da legalidade, impulsionam a Administração no patamar de aquisições sustentáveis, assim, as aquisições sustentáveis não seriam uma faculdade e sim uma obrigação a seguir, ampliando a exigibilidade do dever de assegurar um meio ambiente equilibrado.

O conceito de compras públicas sustentáveis baseia-se no fato de que os governos têm grande influência no estabelecimento de padrões de consumo e de produção. A aquisição de bens e serviços por agentes públicos tem impacto significativo na promoção do desenvolvimento sustentável. No caso brasileiro, as compras governamentais representam 16% do Produto Interno Bruto – PIB (RIO + 20, 2012, p. 42, grifo próprio)

Levando em conta estas características peculiares do governo como grande comprador e consumidor de recursos naturais, os quais não são perpétuos, e, além de não serem renováveis, alguns poluem e agridem o meio ambiente. Desta feita “como o governo compra muito poderia estimular uma produção mais sustentável, em maior escala, além de dar o exemplo” (MENEGUZZI, 2011, p. 21).

O Estado além de garantidor do meio ambiente equilibrado é grande demandante dos meios de produção, realizando contratações de grande monta por meio de procedimentos licitatórios que visam à escolha da proposta mais vantajosa.

 Procedimentos que por via da Lei Federal 12.349/2012, que modificou o art. 3º da Lei 8.666/93 em comento, inserindo no texto exordial das licitações públicas a promoção do desenvolvimento nacional sustentável.

Os Estados devem cooperar com vistas ao fortalecimento da capacitação endógena para o desenvolvimento sustentável, pelo aprimoramento da compreensão científica por meio do intercâmbio de conhecimento científico e tecnológico, e pela intensificação do desenvolvimento, adaptação, difusão, e transferência de tecnologias, inclusive tecnologias novas e inovadoras. (ONU, 1992, Princípio 9)

No entanto, o texto infraconstitucional não deixa a Administração Publica vinculada às predisposições de sustentabilidade, “como se pode ver das regras básicas para o procedimento licitatório, não há qualquer preocupação com a caracterização ambiental da área a ser submetida ao certame” (ANTUNES, 2013, p. 1292).

Importante análise recai sobre o princípio da obrigatoriedade da intervenção estatal, uma vez que, como visto, o Estado deve atuar de modo compulsório para defesa do meio ambiente. A Administração Pública, se não é a maior, está entre as maiores contratantes do país, o que a torna, certamente, capaz de viabilizar novas formas de produção e induzir a certas práticas no mercado consumidor. Em outras palavras: cabe à administração pública liderar pelo exemplo (PEDRA, 2014, p. 2)

            Desta forma, o Estado estaria como agente passivo da política de sustentabilidade, indo além de um assegurador do meio ambiente equilibrado com forca coercitiva perante terceiros, atuando tanto no campo econômico como parte garantidora quanto campo obrigacional como titular de direitos no campo do direito ambiental.

A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170VI) (STF, ADI 3540 DF, Min. CELSO DE MELLO, 01/09/2005, DJ 03-02-2006 PP-00014 EMENT VOL-02219-03 PP-00528)

Por esta razão, a inserção da previsão das licitações públicas sustentáveis no texto constitucional, de forma explícita emanando seus efeitos jurídicos por todo o sistema normativo infraconstitucional, pois o Estado como personagem de grande importância no senário econômico do país deve:

Introduzir um novo modelo de gestão ambiental integrado às ações setoriais de governo, numa estrutura matricial, instituindo mecanismos de controle preventivo e corretivo das atividades e processos impactantes, priorizados a partir da consideração da capacidade de suporte dos ecossistemas e não apenas para cumprir um rito burocrático. (Agenda 21, 2004, p. 76)

Este novo modelo de gestão da Administração deve abordar a política de sustentabilidade em toda sua sistemática, inserindo no corpo do estatuto normativo os preceitos objetivos para a máxima eficácia das metas de tutela do meio ambiente, visando além de outros objetivos à aquisição de bens e serviços elaborados por procedimentos de menor impacto ambiental bem como a participação de agentes integrantes de políticas de produção sustentável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A promoção do desenvolvimento nacional aliado à sustentabilidade constitui objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, que estabeleceu na Constituição o dever de proteção do meio ambiente como bem de todos.

Como órgão incumbido constitucionalmente da proteção do meio ambiente, conforme estabelecido na Constituição, o poder público tem o dever de assegurar o meio ambiente equilibrado como bem irrestrito de todos. Entretanto, esse dever é aplicado com maior efetividade e rigor à atividade econômica de entidades privadas, intervindo nos meios de produção de poluidores e na reparação do meio ambiente degradado.

Sendo assim, apesar de ser uma política instituída dentre os direitos difusos, o Estado não exige de si mesmo o atendimento desse dever em sua atividade estatal. Os dispositivos normativos que tratam do meio ambiente no âmbito da administração pública não estipulam um objetivo concreto para atendimento das políticas de sustentabilidade em suas esferas, estabelecendo, de forma limitada, apenas uma diretriz que não determina metas a serem seguidas.

Dessa forma, observa-se que o único meio pelo qual a administração exerceria, com plenitude, a política de sustentabilidade seria a edição de normas pertinentes ao tema, partindo da disposição constitucional.

A licitação pública é o instrumento pelo qual a função administrativa teria a aplicabilidade da sustentabilidade na sua atividade estatal, por meio de delimitação de bens e serviços que não deteriorem o meio ambiente.

Com base nas políticas de desenvolvimento econômico sustentável, a constitucionalização das licitações públicas sustentáveis oferece base fundamental para efetivação das metas de tutela do meio ambiente. Adicionalmente, o Estado é um agente de grande importância no senário econômico nacional, pois detém grande parte da economia relacionada à aquisição de bens e serviços, além de se apresentar como peça fundamental para aplicação das políticas de sustentabilidade, haja vista sua participação econômica nos meios de produção.

REFERÊNCIAS

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BONAVIDES, Paulo. Do país constitucional ao país neocolonial. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

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BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Função Ambiental da Propriedade. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1998.

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_____, Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão. Instrução Normativa nº 01, de 19 de janeiro de 2010, dispõe sobre os critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 20 de janeiro de 2010. Disponível em: <http://www.comprasnet.gov.br/legislacao/legislacaoDetalhe.asp?ctdCod=295>. Acessado em: 20/10/2014

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Sobre o autor
Mário Rômulo Calado de Souza

Advogado, especialista em Direito Processual Civil. Atua no direito público com ênfase no direito Administrativo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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