~~A COMPETÊNCIA PARA JULGAR CRIME COMETIDO PELA INTERNET COM RELAÇÃO A PORNOGRAFIA INFANTIL
ROGÉRIO TADEU ROMANO
Procurador Regional da República aposentado
Discuto, aqui, divergência jurisprudencial em relação a acórdãos em matéria de crime de exposição de fotografias e de filmes retratando a prática de crimes libidinosos envolvendo crianças.
Reporto-me ao julgamento no HC 24.858/GO, Relator para o acórdão o Ministro Fontes de Alencar, que foi julgado em 18 de novembro de 2003.
Naquele julgamento foi lembrado que o ato de fotografar criança e ou adolescente, durante a prática de atos de sexo explícito ou pornográficos, configura o crime previsto no artigo 241 da Lei 8.069/90.
Discutiu-se ali a competência da Justiça Comum Federal para instruir e julgar tais crimes em caso em que os autores fotografaram, filmaram e publicaram, na rede internacional de computadores, imagens de menor, retratando a prática de atos libidinosos, inclusive sexo explícito.
Ora, compete à Justiça Comum Federal, a teor do artigo 109, V, da Constituição Federal, o processo e julgamento de crime previsto ¨em tratado ou convenção internacional, quando iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro.¨
No caso há um compromisso internacional do Brasil consoante os termos do Decreto n. 5.007, de 8 de março de 2004, relativo ao Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança.
No caso daquela discussão objeto do acórdão referenciado, ao consumar o crime, publicando, na internet, fotografias, contendo cenas pornografias de sexo explícito, envolvendo crianças e adolescentes, foi dado causa ao resultado da publicação legalmente vedada, dentro e fora do território nacional.
Foi reconhecida corretamente a competência da Justiça Comum Federal para julgamento desses crimes.
Posteriormente, em julgamento do CC 62.949, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu pela competência da Justiça Comum Estadual para julgar caso que se tratava de divulgação, via e-mail, de fotografias com pornografia infantil, obtidas em site estrangeiro, sob o argumento de que tanto o resultado quanto a execução teriam ocorrido em território brasileiro. Ora, onde está a internacionalidade da conduta, ainda que virtual, via internet? Não se aplicou, data vênia, o citado Decreto 5.007, de 8 de março de 2004, o que dá ensejo a competência da Justiça Federal para instruir e julgar o caso.
Assim pensou o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 86.289, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, julgado em 6 de junho de 2006, DJ de 20 de outubro de 2006, pág. 62.
Levo em conta a ementa do julgamento:
¨PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA. CRIME TIPIFICADO NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CONSUMAÇÃO E EXAURIMENTO NO EXTERIOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. I – Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes cuja consumação se deu em território estrangeiro(art. 109, V, CF). II – O crime tipificado no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, consubstanciado na divulgação ou publicação, pela internet de fotografias pornográficas ou de cenas de sexo explícito envolvendo crianças ou adolescentes, cujo acesso se deu além das fronteiras nacionais, atrai a competência da Justiça Federal para o seu processamento e julgamento.¨
Trago, à luz do que foi enfrentado, jurisprudência no sentido da competência da Justiça Federal para instruir esses crimes de publicação de pornografia envolvendo criança ou adolescente através da rede mundial de computadores:
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PROCESSUAL PENAL. PUBLICAÇÃO DE PORNOGRAFIA ENVOLVENDO CRIANÇA OU ADOLESCENTE ATRAVÉS DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES. ART. 241 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. CONSUMAÇÃO DO ILÍCITO. LOCAL DE ONDE EMANARAM AS IMAGENS PEDÓFILO-PORNOGRÁFICAS. 1 - A consumação do ilícito previsto no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente ocorre no ato de publicação das imagens pedófilo-pornográficas, sendo indiferente a localização do provedor de acesso à rede mundial de computadores onde tais imagens encontram-se armazenadas, ou a sua efetiva visualização pelos usuários. 2 - Conflito conhecido para declarar competente o Juízo da Vara Federal Criminal da Seção Judiciária de Santa Catarina.
(STJ Processo CC 29886/SP CONFLITO DE COMPETENCIA 2000/0057047-8 Relator(a) Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (1131) Órgão Julgador S3 - TERCEIRA SEÇÃO Data do Julgamento 12/12/2007 Data da Publicação/Fonte DJ 01/02/2008 p. 427 RT vol. 871 p. 517)
PENAL. RECURSO CRIMINAL. ARTIGO 241 DA LEI Nº 8.069/90. DELITO PREVISTO EM CONVENÇÃO INTERNACIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. 1. Procedimento de quebra de sigilo telemático instaurado para apurar delito de veiculação de imagens de cunho pornográfico, com menores e adolescentes pela internet. 2. Convenção sobre os direitos da criança incorporados ao direito pátrio pelo Decreto Legislativo Nº 28, de 24.09.90 e Decreto Nº 99.710, de 21.11.90. 3. Divulgação de fotos pornográficas de menores pela rede mundial de computadores (internet). Delito que produz efeitos além do território nacional. 4. Configurado o crime previsto em tratado internacional (art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente), aplica-se o disposto no artigo 109, V, da Constituição Federal. 5. Recurso a que se dá provimento, para reconhecer a competência da justiça federal e determinar o processamento do feito perante a 8ª Vara Federal criminal de São Paulo. (TRF 3ª R.; RCCR 3450; Proc. 200361810009276; SP; Primeira Turma; Relª Juíza Vesna Kolmar; Julg. 30/11/2004; DJU 10/02/2005; Pág. 81) (Publicado no DVD Magister nº 15 - Repositório Autorizado do STJ nº 60/2006 e do TST nº 31/2007)
EMENTA - CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO PARA CONCLUSÃO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. OCORRÊNCIA. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. IMPROCEDÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A Justiça Federal é a competente para processar e julgar os crimes previstos nos artigos 228, parágrafo 3º, 230, 231, parágrafo 3º e 288 (favorecimento a prostituição, rufianismo, tráfico de mulheres e formação de quadrilha), todos do Código Penal Brasileiro. 2. "A divulgação de fotos pornográficas de menores na internet, é crime previsto em convenção internacional, o que firma a competência da Justiça Federal para o seu processamento independe do resultado ter ou não ocorrido no estrangeiro (artigo 109, V, da Constituição Federal. " (HC nº 24858/GO, Sexta Turma, julg. em 18-11-2003, DJ de 6-9-2004, p. 311, Rel. Paulo Medina). 3. Prova nos autos de que, da data em que o Paciente foi preso em flagrante (25-10-2204) até a da impetração deste habeas corpus, já transcorreram aproximadamente 140 dias; e da impetração até hoje 14-4-2005 (data do julgamento do writ), mais de 160 dias, sem que tenham sido praticados alguns atos processuais, tal como, a designação de data para a outiva das testemunhas listadas pelas partes. Atraso na conclusão da instrução criminal imputável à atuação judicial. Ordem concedida. (TRF 5ª R.; HC 2121; Proc. 2005.05.00.006434-8; CE; Terceira Turma; Rel. Des. Fed. Geraldo Apoliano; Julg. 14/04/2005; DJU 22/04/2005; Pág. 603)
EMENTA - CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. PENAL. COMPETÊNCIA. ART. 109, V, DA CF. ART. 6º E ART. 7º, II, "A", DO CP. ART. 241, CAPUT DO ECA. DEC. 5.007/04. "CRIME À DISTÂNCIA". EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA DA LEI PENAL BRASILEIRA. PUBLICAÇÃO DE FOTOS LASCIVAS DE MENORES NA INTERNET. SÍTIO DE ORIGEM ALEMÃ. PROVEDOR (INTERNET PROTOCOL) DE NACIONALIDADE BRASILEIRA. SUBSUNÇÃO AO ART. 241 DO ECA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO MINISTERIAL PROVIDO. I - Extraterritorialidade condicionada da Lei Penal brasileira (art. 7º, II, "a", do CP) concernente ao princípio da justiça universal ou cosmopolita. Aplicação concomitante da teoria da ubiqüidade em relação ao lugar do crime eis que delito de execução transnacional (art. 6º do CP). II - A execução e consumação ocorreu através da internet, englobando, ao menos, dois países: Brasil e Alemanha. Fato que, aliado à existência de acordo internacional tratando do tema, conduz à competência da justiça federal para processamento e julgamento do feito. III - Crime instrumentalmente conexo à rede telemática, considerando-se a utilização da rede mundial de computadores para consecução da prática criminosa (delito informático impróprio). lV - A conduta ora sub examen amolda-se perfeitamente no preceito primário do art. 241 do ECA, eis que há subsunção integral da conduta ao preceito primário do tipo mencionado. V - A previsão de combate internacional à pornografia de menores, prevista em Decreto, encontra, em seara legislativa interna, consonância e arrimo no delito previsto no art. 241 do ECA, antes e depois da redação dada pela Lei nº 10.764/03. (lex certa). (TRF 3ª R.; RCCR 3680; Proc. 200403000489363; SP; Segunda Turma; Relª Juíza Cecilia Mello; Julg. 28/09/2004; DJU 15/10/2004; Pág. 345)
EMENTA - PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE DIVULGAÇÃO DE IMAGENS PORNOGRÁFICAS ENVOLVENDO CRIANÇAS E ADOLESCENTES. LEI N.º 8.069/90 (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE), ART. 241. UTILIZAÇÃO DA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES (INTERNET). CONDUTA TÍPICA, MESMO ANTES DO ADVENTO DA LEI N.º 10.764/2003. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO MINISTERIAL PROVIDO. 1. Mesmo antes do advento da Lei n.º 10.764/2003, a conduta de veicular, pela rede mundial de computadores (internet), imagens pornográficas envolvendo criança ou adolescente já configurava o crime previsto no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. Considerando-se o disposto nos artigos 19 e 34 da convenção sobre os direitos da criança (Resolução n.º 44 da assembléia geral da organização das nações unidas, de 20 de novembro de 1989, incorporada no território pátrio pelo Decreto Legislativo n.º 28/90 e pelo Decreto n.º 99.710/90), bem assim a regra do inciso V do art. 109 da Constituição Federal, compete à justiça federal processar e julgar o crime de divulgação de imagens pornográficas envolvendo crianças ou adolescentes (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 241), quando praticado por meio da rede mundial de computadores (internet). 3. Recurso ministerial provido. (TRF 3ª R.; RCCR 3541; Proc. 200461810006632; SP; Segunda Turma; Rel. Juiz Nelton dos Santos; Julg. 31/08/2004; DJU 24/09/2004; Pág. 395)
EMENTA - PENAL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (LEI Nº 8.069/90). ARTIGO 241. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ART. 109, V, DA CF/88. CONVENÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA. DECRETO LEGISLATIVO Nº 28/90 E DECRETO Nº 99.710/90. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. DIVULGAÇÃO DE IMAGENS PORNOGRÁFICAS DE MENORES PELA INTERNET. FIXAÇÃO DA PENA. ATENUANTE DA MENORIDADE. PRESCRIÇÃO DA AÇÃO. 1. O Congresso Nacional, através do Decreto Legislativo nº 28, de 24.09.90, bem como o governo federal, por força do Decreto nº 99.710, de 21.11.90, incorporaram ao direito pátrio os preceitos contidos na convenção sobre os direitos da criança, que prevê, entre outras coisas, que os estados partes darão proteção legal à criança contra atentados à sua honra e a sua reputação (art. 16), bem como tomarão as medidas que foram necessárias para impedir a exploração da criança em espetáculos ou materiais pornográficos (art. 34). 2. A justiça federal é competente para o processamento e julgamento da causa, aplicando-se à hipótese o disposto no art. 109, V, da CF/88, pois o delito praticado (art. 241 do ECA) encontra previsão no citado tratado, bem como sua execução teve início no país. Quanto ao resultado, levando-se em conta que o meio de divulgação utilizado foi a rede mundial de computadores (internet), as fotos podem ter alcançado todos os países que tem conexão com a rede, ou seja, praticamente todo o planeta. 3. Tendo o réu se conformado com a decisão que lhe negou a suspensão do processo, não é possível, já em fase recursal, quando toda a instrução probatória já foi realizada, bem como todos os atos processuais, se falar em suspender o processo. Preliminar não conhecida por se tratar de questão preclusa. 4. Comprovadas a materialidade e a autoria do delito pelo farto conjunto probatório, é de ser reconhecida a responsabilidade penal do réu pelo cometimento do ilícito previsto no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois o mesmo utilizava-se de seu site na internet para divulgar pornografia infantil, através da publicação de fotos pornográficas envolvendo crianças, que eram enviadas a ele por correio eletrônico (e-mail). 5. Em havendo concurso entre uma circunstância agravante (art. 61, II, 'a' do CP - Motivo torpe) e uma atenuante (art. 65, I do CP - Menoridade) e sendo ambas preponderantes, deve prevalecer a circunstância legal da menoridade, conforme o entendimento do STF (HC 71323/SP, 1ª turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, decisão unânime, DJU de 19/05/1995). 6. Fixada a pena definitiva em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. 7. Fixada definitivamente a pena e comprovada a menoridade do réu ao tempo do fato, cumpre reconhecer a prescrição da pretensão punitiva. Tendo havido sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, a prescrição regula-se pela pena aplicada (cfe parágrafo 1º do art. 110 do CP). Nos termos do art. 115 do CP, o prazo de prescrição reduz-se à metade quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de vinte e um anos. Uma vez comprovado que o réu iniciou a atividade criminosa antes dos 21 anos, é indiferente que tenha ele completado a maioridade antes de encerrada a conduta criminosa (art. 4º do CP), devendo incidir a redução prescricional pela idade. 8. Condenado o réu à pena de um ano e seis meses de reclusão, transcorreu lapso temporal superior a dois anos entre os fatos delituosos, que ocorreram no período de dezembro de 1997 a 22 de abril de 1998, e o recebimento da denúncia, que se deu em 20 de junho de 2000 (fl. 04), impondo-se a declaração da extinção da punibilidade face à ocorrência da prescrição da pretensão punitiva (Código Penal, arts. 107, V e 109, VI, 110, § 1º, c/c 115). (TRF 4ª R.; ACR 10033; Proc. 200204010331897; PR; Sétima Turma; Rel. Juiz José Luiz B. Germano da Silva; Julg. 29/04/2003; DJU 21/05/2003)
Em recente julgamento, no RHC 31.491/RS, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe de 4 de setembro de 2013, num caso envolvendo a divulgação de imagens ou fotografias com conteúdo pornográfico infantil(artigo 241 do estatuto da criança e do adolescente), utilizando-se programa de compartilhamento de arquivos, entendeu o Superior Tribunal de Justiça que para firmar a competência da Justiça Federal não basta que o Brasil seja signatário de Convenção Internacional, sendo imprescindível a comprovação da internacionalidade da conduta atribuída ao acusado.
Para fixar a competência da Justiça Federal seria necessário que na atividade ilícita de pedofilia, inclusive por meio de internet, o crime se consuma com a publicação ou divulgação, ou qualquer outra das ações previstas no tipo penal do artigo 241, caput, e § § 1º e 2º, da Lei 8.069/90, na rede mundial de computadores, de fotografias ou vídeos de pornografia infantil, dando o agente causa ao resultado da publicação, que é vedada por lei, dento e fora dos limites do território nacional.
Naquele caso em discussão o agente utilizou-se do Programa eMule, cuja característica é o compartilhamento de arquivos e que teria divulgado imagens ou fotografias com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo crianças ou adolescentes, o que faria evidenciar a competência da Justiça Federal para julgamento da ação penal, sendo o material proibido acessível para computares localizados em diversas partes do mundo.
Naquele caso, citou-se, inclusive, o compromisso do Brasil perante a comunidade internacional, ao aderir aos termos da Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, promulgada no ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto 99.710/1990.
O julgamento aqui trazido a colação está em convergência a outro em que foi Relatora a Ministra Assusete Magalhães, DJe de 22 de março de 2013, CC 103.011/PR, onde identificou-se, naquele momento, que o material de conteúdo pornográfico não ultrapassou os limites dos estabelecimentos escolares nem tampouco as fronteiras do Estado brasileiro. Identificou-se que, não obstante, a origem do material em questão fosse, em tese, advinda da internet, a conduta que se pretendia apurar consistia no download realizado, pelo investigado, e na armazenagem de vídeos, em computadores de escolas municipais, amoldando-se ao crime previsto no artigo 241, § 1º, II, da Lei 8.069/90, cuja redação vigente é anterior a Lei 11.829/08, inexistindo indícios de que o investigado tenha divulgado ou publicado o material além das fronteiras nacionais.
Para aquele caso não restou evidenciada a transnacionalidade do delito, tendo em vista que a conduta do investigado restringiu-se, até aquela época, à captação e ao armazenamento de vídeos, de conteúdo pornográfico, ou de cenas de sexo explícito, envolvendo crianças e adolescentes, nos computadores de duas escolas, fixando o Superior Tribunal de Justiça a competência para instruir e julgar o caso para a Justiça Estadual.
Por fim, o Supremo Tribunal Federal entendeu que a Justiça Federal é competente para processar e julgar a prática de crime de publicação, na internet, de imagens com conteúdo pornográfico envolvendo criança ou adolescente. Esse entendimento é extraído do julgamento do Recurso Extraordinário 628624, em tema de repercussão geral reconhecida.
O RE questiona o acórdão da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF-1) que determinou a competência da Justiça Federal para processar e julgar a suposta prática do crime de publicação de imagens com conteúdo pornográfico envolvendo adolescentes (artigo 241-A da Lei 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente), quando cometidos na internet. Em síntese, o autor do RE sustenta que a matéria seria de competência da Justiça estadual, uma vez que não existiria qualquer evidência de que o acesso ao material pornográfico infantil, disponível na rede mundial de computadores, tenha ocorrido fora dos limites nacionais.
O relator da matéria, ministro Marco Aurélio, deu provimento ao recurso extraordinário, considerando não haver tratado endossado pelo Brasil prevendo o crime, mas apenas a ratificação do Brasil à Convenção sobre os Direitos da Criança da Assembleia Geral das Nações Unidas. Ele concluiu que a ausência de tratado específico confirmado pelo Brasil impossibilita atribuir competência da Justiça Federal para julgar o fato. Segundo o ministro, o delito foi totalmente praticado no Brasil – início e consumação – “porquanto o material veio a ser inserido no computador que se encontrava no país, não tendo sido evidenciado o envio ao exterior e a partir dessa publicação é que se procederam vários acessos”. Dessa forma, ele votou no sentido de reformar o acórdão da 4ª Turma do TRF-1, determinando a remessa do processo à Justiça estadual de Minas Gerais. O voto do relator foi seguido pelo ministro Dias Toffoli.
O ministro Edson Fachin abriu a divergência e foi seguido pela maioria do Plenário. Ele negou provimento ao recurso extraordinário e entendeu que a matéria é de competência da Justiça Federal, conforme disposição contida no artigo 109, inciso V, da Constituição Federal.
Segundo ele, há três requisitos essenciais e cumulativos para a definição da competência da Justiça Federal na matéria: que o fato seja previsto como crime em tratado ou convenção; que o Brasil seja signatário de compromisso internacional de combate àquela espécie delitiva; que exista uma relação de internacionalidade entre a conduta criminosa praticada e o resultado produzido [ou que deveria ter sido produzido].
“Do exame que fiz, compreendi como preenchidos os três requisitos”, ressaltou o ministro Edson Fachin. De acordo com ele, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é produto de tratado e convenção internacional subscrita pelo Brasil “exatamente para proteger as crianças dessa prática nefasta e abominável que é a exploração de imagens na rede mundial, internet”.
Com isso, salvo melhor juízo, entende-se que a questão(ponto controvertido) objeto de julgamento em sede de repercussão geral, tem uma solução pela competência da Justiça Federal para julgar crime de publicação on line de conteúdo pornográfico infantil.