Medidas atípicas de execução de obrigação de fazer e prisão civil

16/11/2015 às 20:06
Leia nesta página:

O exequente pode pedir a imposição de prisão civil como medida atípica de execução de obrigação de fazer?

1. INTRODUÇÃO

Existe uma grande discussão doutrinária acerca da possibilidade de imposição de prisão civil como medida atípica de execução de obrigação de fazer diante do poder geral de efetivação do juiz.

A doutrina diverge quanto à interpretação da vedação constitucional, razão pela qual merece estudo detalhado neste trabalho.

2. DESENVOLVIMENTO
 

O novo código de processo civil traz em seu art. 536, o poder geral de efetivação do juiz, segundo o qual o magistrado deverá tomar as medidas necessárias para garantir a efetivação da obrigação, podendo aplicar tanto as medidas coercitivas típicas (com previsão legal), quanto atípicas, posto que o rol do § 1º do dispositivo é meramente exemplificativo (“entre outras medidas”).

Surge, assim, a discussão acerca da possibilidade de, com base em tal poder e na não taxatividade do rol do art. 536, § 1º, CPC, aplicar a prisão civil como medida coercitiva atípica.

A Constituição Federal, em seu art. 5º, LXVII, determina que “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.

Ocorre que, por força do Pacto de São José de Costa Rica, não se admite mais no ordenamento brasileiro a prisão civil do depositário infiel, sendo matéria da súmula vinculante nº 25 e da súmula 419 do Superior Tribunal de Justiça.

A doutrina processualista civil discute a amplitude do termo “dívida” na vedação constitucional. Talamini e Ovídio Baptista entendem que o constituinte utilizou a palavra dívida como sinônimo de toda e qualquer prestação, assim, a única hipótese de prisão civil seria no caso de dívida alimentar. Fundamentam seu entendimento no fato de as exceções constitucionais serem de caráter diverso: a obrigação alimentar tem caráter pecuniário e a do depositário infiel tem caráter não pecuniário.

Marinoni critica o entendimento acima pelo fato de sempre colocar-se a liberdade do devedor acima de todo e qualquer direito do credor. Assim, entende que a melhor interpretação da norma constitucional é que o termo dívida foi utilizado como sinônimo de prestação pecuniária. Segundo essa corrente, admitir-se-ia a aplicação da prisão civil como medida coercitiva atípica nos casos de obrigação não pecuniária sempre que fosse considerada adequada mediante a ponderação entre a liberdade do devedor e o direito do credor a ser protegido.

Por fim, há uma terceira corrente, adotada pela Professora Paula Sarno Braga, de que o termo dívida seria sinônimo de prestação patrimonial, admitindo-se a prisão civil nos casos de prestação extrapatrimonial e mediante uma ponderação dos valores que estiverem em jogo, sempre que o direito do credor se demonstrar mais digno de proteção que a liberdade do devedor. Adverte a professora, todavia, que sempre deve-se ter em mente que a prisão civil é uma medida extrema e deve ser garantido o contraditório e a ampla fundamentação da decisão, de modo a evitar abusos.

A resposta à questão sob análise, portanto, depende da corrente doutrinária adotada. Particularmente, entendo que, de fato, há hipóteses no caso concreto em que o direito do credor sobrepor-se-á à liberdade do devedor, razão pela qual seria aconselhável a ponderação. No entanto, entendo que a norma constitucional não deixa margem interpretativa na forma defendida por Marinoni e Paula Sarno. Concordo com a primeira corrente de que o constituinte, ao excepcionar apenas a dívida alimentar e a obrigação do depositário infiel, que possuem caráter distinto, já fez a ponderação entre os direitos do credor e a liberdade do devedor, sendo incabível nova ponderação no caso concreto.

3. CONCLUSÃO

Dado o acima exposto, conclui-se que há grande divergência doutrinária acerca da possibilidade de imposição de prisão civil como medida atípica de execução de obrigação de fazer, dependendo da interpretação dada ao termo “dívida” utilizado no inciso LXVII do art. 5º da Constituição Federal.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 3 ed. São Paulo: MÉTODO, 2011.

DIDIER JR., Fredie. CUNHA, Leonardo J. C. BRAGA, Paula Sarno. OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Edições JusPODIVM, 2010, v. 5.

DIDIER JR, Fredie. Novo Código de Processo Civil: comparativo com o código de 1973. Salvador: Ed. JusPodivm, 2015.

Sobre a autora
Débora Alcântara Rodrigues

Defensora Pública do Estado do Maranhão.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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