Motivação ou condicionamento das massas?

15/03/2016 às 16:07
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Os esforços de marketing realizados pelas empresas geram fortes impactos nas relações sociais, e estes são muito mais presentes do que se acreditam.

O Planeta vive uma nova época. É a era das “customizações” dos produtos de massa, dos fastfoods e das informações. Em tempos de globalização e internet, a facilidade e a conveniência são as grandes conquistas. As pessoas conseguem acessar o mundo a partir de suas casas. Da palma da mão é possível as mais inesperadas realizações.

                Se o período da renascença colocou o homem no centro do mundo, a segunda década do Século XXI não tem precedentes na história. A confiança depositada na tecnologia e nas ciências ultrapassam quaisquer expectativas geradas no período conhecido como a “Belle Époque”, no Século XIX. Muito em breve não haverá limites ao humano, no entender de alguns.

                As revoluções, industrial e tecnológica, contribuíram com as novas possibilidades de industrialização. Os eventos ocorridos no pós-guerra permitiram as grandes revoluções sociais. Esses movimentos foram possíveis a partir do “empoderamento”. Nos dias atuais, as pessoas mudam seus traços, fazem cirurgias, têm acesso aos bens de última geração e mais possibilidades de escolher os rumos de suas próprias vidas.

Se comparados aos jovens de outras épocas, o adolescente de hoje tem mais chances de escolher a faculdade e a profissão. Naqueles tempos até o casamento era imposto. As pessoas podem cuidar mais de si. Não se perde mais tempo em afazeres rotineiros. Os mercados oferecem alimentos quase prontos ou chegam para ser consumidos nas casas. As máquinas de lavar roupa fazem o trabalho pesado e existe uma infinidade de aparelhos domésticos.

 As pessoas têm condições de construir mundos particulares. A individualização dos aparelhos tecnológicos assegura a privacidade. Não é preciso dividir o telefone ou o televisor. Os computadores que atendiam toda coletividade nas instituições de ensinos; e as longas filas de espera; no começo da década passada, foram substituídos por notebooks que os próprios alunos carregam consigo.

Mas, se as pessoas conquistaram mais conforto e comodidade, quais são as razões para tanta insatisfação? Por que tantos casos de depressão? Por que o volume de vendas de livros de autoajuda? E finalmente, por que se fala tanto de motivação? Uma breve pesquisa em sites ou revistas de gestão permite encontrar um “sem número” de artigos falando sobre os temas. Por outro lado, poucas novidades foram trazidas desde a década de 1990.

Desde 1950 as empresas utilizam as técnicas de marketing para obter melhores relacionamentos junto aos consumidores. A partir delas, desenvolvem-se produtos e procuram atender as pessoas de inúmeras formas. Baseados em conceitos da psicologia, o marketing lança mão de recursos ligados ao emocional, cognitivo e ao comportamento das pessoas. Não é mais uma questão de atender as necessidades. O processo de compra e consumo passou a ser visto como um ato prazeroso.

A sociedade do Século XXI

Os esforços de marketing têm o objetivo de transformar os desejos em necessidades. Como estão no centro de todo esse conjunto, os membros da sociedade tornam-se verdadeiros hedonistas. As promoções de marketing, características dos produtos e as facilidades de pagamento os levam a agir por impulsos, tirando a faculdade que difere os homens dos animais: a razão.

Os estudiosos da psicologia, corretamente, entendem as necessidades humanas como ilimitadas, ao passo que os recursos financeiros sofrem limitações: salários, cartões de créditos, limites bancários, entre outros. Porém, o mais importante é compreender que consumir os objetos de desejo é uma utopia. É impossível!

O filósofo grego Platão dizia que o desejo está na medida que falta. Ou seja, ao conquistar algo, este deixará de ser desejo, criando um lapso que será substituído por outro, acarretando em uma eterna e insana corrida, como a do personagem mitológico Sísifo, condenado a rolar uma pedra da base ao topo da montanha, durante a sua existência.

Além disso, para atingir os resultados, as organizações valem-se dos mais distintos recursos. Os estímulos combinam cores, sons, sabores, aromas e texturas. Tudo em harmonia e capaz de tornar as relações de consumo uma experiência cada vez mais atrativa e surpreendente. Nos jargões de marketing, essas ações buscam o encantamento do público.

A comunicação deve ser agradável, cujas informações possam ser captadas com facilidade. Mas, na prática, todo esse ambiente destoa da realidade, principalmente do que envolve as relações humanas. Na medida em que todos querem ser tratados com exclusividade, não há como atender a essa expectativa, fazendo gerar mais frustrações nesse quesito.

O Mundo não está preocupado com você

O resultado é uma sociedade fragilizada, cujos membros são incapazes de assumir as responsabilidades pela própria vida, esperando de terceiros as ações necessárias para corrigir o que não está correto. Espera-se mais do governo e das empresas. Por exemplo, a maioria das pessoas não compreende mais a obrigação das organizações como a de gerar empregos, pagar os salários e distribuir produtos. Esperam muito mais delas.

Para os colaboradores, esses entes devem motivar seus funcionários para produzir. Os chamados fatores higiênicos; aqueles suficientes para manter as boas condições e o andamento do trabalho; não bastam. E quando os caprichos não são atendidos, as promoções ou os aumentos de salários não acontecem, o quadro de desmotivação está criado.

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As pessoas deixam de cumprir suas obrigações, afirmando estarem desestimuladas. E o pior! As desavenças ocorridas dentro das organizações são levadas ao ambiente externo; como se justificassem comportamentos inadequados; sob o rótulo do stress.

Esse mesmo pensamento pode ser inserido no âmbito da educação. O conhecimento a ser transmitido virou um elemento secundário nos locais de aprendizagem. Cobram dinamismo dos professores e instrutores. Esses profissionais são convidados a fazer uso de inúmeros recursos para manter a atenção dos seus orientados. O acessório passa a ser o principal, ao aplicar o lúdico e os recursos multimídias de forma desmedida e sem critérios.

O mesmo raciocínio é perceptível nas relações entre o Governo e os cidadãos. As Leis devem abraçar as causas específicas de cada classe, sob a égide da desigualdade. Exige-se, no código penal, a imputação de penas duras aos crimes praticados contra determinados grupos sociais, mas as condutas que exigem a participação e o engajamento, a fim de obter melhores condições de vida à coletividade, não tem a adesão sequer de 10% das pessoas. Fala-se muito em Leis naqueles casos e esquecem-se da ética em todos eles.

Esperam muito dos outros e tiram o peso da responsabilidade dos próprios ombros. A vida é feita de escolhas, pois as decisões são inevitáveis, e conviver com elas é um processo natural. Para tanto, a coragem é fundamental. Etimologicamente, essa palavra deriva de coração e está ligado ao ânimo e a vontade. É daí que os estímulos nascem, entretanto só os reconhecem aqueles que buscam o autoconhecimento.

A motivação, para qualquer coisa, é um fator intrínseco e de responsabilidade individual. Deveria ser tratada como algo íntimo, ligado ao relacionamento do sujeito consigo mesmo e com as pessoas próximas. Ao tratar de uma questão tão peculiar, em temas de interesses coletivos, o indivíduo não só delega aos outros os rumos da própria existência, mas incorre no risco de tornar-se marionete.

Sobre o autor
Ernesto Thurmann

Bacharel em direito, advogado. Formado em administração de empresa, especialista em marketing e em gestão de negócios, áreas em que atuou como docente.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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