O problema da inadimplência nos condomínio e às alterações do Novo Código de Processo Civil (lei nº 13.105/15)

23/03/2016 às 13:44
Leia nesta página:

A inadimplência nos Condomínios aumentou significativamente nos últimos anos, principalmente, com a redução da multa por atraso que era de 20% (vinte por cento), passando para apenas 2% (dois por cento) ao mês, devido a alteração do artigo 1.336, §1º, do Código Civil (Lei nº 10.406/2002), em vigor desde 11/01/2003.

Na prática, muitos condôminos deixavam de pagar ao Condomínio, pois preferiam pagar outras contas com taxas e encargos maiores (ex. cartão de crédito), o que acarretava sérios problemas financeiros ao Condomínio, uma vez que a conta não fechava e o síndico tinha que fazer rateios extras para conseguir honrar os compromissos diários, em especial o pagamento de funcionários. Tal fato ainda causava situação de injustiça, pois os condôminos adimplentes acabavam pagando pelos inadimplentes. E o Poder Judiciário também contribuía em muito para essa situação, diante do acúmulo das ações de cobranças que se arrastavam por longos anos, prestigiando apenas o devedor contumaz.

No Código de Processo Civil alterado (Lei nº 5.869/1973) a dívida condominial não era dotada de liquidez, certeza e exigibilidade. Atributos imprescindíveis para qualquer execução judicial, como ocorre na cobrança de cheque ou uma duplicata mercantil.

Vale dizer, a execução da dívida condominial só era possível após a formação de um “título executivo judicial”, formado por meio de uma sentença proferida pelo procedimento conhecido como “sumário” (art. 275, II, “b” do antigo CPC), mas que na prática era bastante demorado, pois o devedor tinha a possibilidade de ampla discussão sobre a exigibilidade da dívida, arrastando-se o processo por aos a fio até que fosse iniciada a constrição dos bens do devedor, com penhoras e arrematações que também representavam mais despesas ao Condomínio.

Importante alteração realizada pelo Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), em vigor desde 18 de março de 2016, foi a de encurtar o caminho até a fase executiva. Agora a despesa condominial foi incluída no rol de títulos executivos extrajudiciais, dispensando toda a fase de constituição da dívida (conhecimento), iniciando-se o processo já na fase executiva, confira-se:

Art. 784.  São títulos executivos extrajudiciais: X - o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas.

Vale destacar que mesmo com a alteração da Lei Processual, continua sendo exigindo aos síndicos que, por meio de seus advogados, realizem a execução da dívida com todos os documentos imprescindíveis para a comprovação do crédito, referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias, previstas na convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas.

Basicamente, será necessário para promover a ação de execução os seguintes documentos: i) cópia da convenção; ii) cópia da ata da assembleia que elegeu o atual síndico; iii) cópia da ata da assembleia geral ordinária que realizou a previsão orçamentária do exercício em débito; iv) demonstrativo do débito atualizado; v) dentre outros documentos que comprovam a inadimplência (ex. boletos).

É bom destacar, ainda, que o juiz irá análise todos os documentos, podendo até mesmo determinar a emenda à inicial e, segundo se extrai do artigo 785, do NCPC, “a existência de título extrajudicial não impede a parte de optar pelo procedimento de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial”.

Recomenda-se sempre a consulta a um advogado para fins de instruir a ação com todos os documentos necessários, para que o Condomínio não perca tempo. Lembre-se, ainda, que os Juizados Especiais Cíveis (Pequenas Causas) não aceitam demandas promovidas pelos Condomínios de maneira gratuita, devendo as ações serem propostas na Justiça Comum, recolhendo-se as custas processuais como de praxe.

A boa notícia aos síndicos é que ao invés do Condomínio ter de aguardar a expedição do mandado de citação, com prazo de 15 (quinze) dias para o oferecimento de defesa; pelo processo executivo, o condômino será citado para pagar o débito no prazo de apenas 3 (três) dias, sob pena de não o fazendo, o Oficial de Justiça poder retornar a diligencia e já proceder à penhora de bens de propriedade do condômino que encontrar, in verbis:

Art. 829.  O executado será citado para pagar a dívida no prazo de 3 (três) dias, contado da citação.

§ 1o Do mandado de citação constarão, também, a ordem de penhora e a avaliação a serem cumpridas pelo oficial de justiça tão logo verificado o não pagamento no prazo assinalado, de tudo lavrando-se auto, com intimação do executado.

§ 2o A penhora recairá sobre os bens indicados pelo exequente, salvo se outros forem indicados pelo executado e aceitos pelo juiz, mediante demonstração de que a constrição proposta lhe será menos onerosa e não trará prejuízo ao exequente.

Importante que o Condomínio já indique bens de propriedade do condômino devedor para que o Oficial de Justiça possa penhorá-los, agilizando o processo de expropriação (ex. veículos automotores).

Outra alteração oportuna diz respeito à tentativa de citação e intimação do devedor. Anteriormente, o condômino-devedor se furtava ao recebimento das correspondências e Oficiais de Justiças, inclusive, constrangendo e ameaçando funcionários do Condomínio (porteiros) com as mais variadas desculpas para se ocultar da Justiça, procrastinando o andamento da ação.

Segundo o artigo 248, §4º, do NCPC, será válida a entrega do mandado ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, in verbis:

Art. 248, § 4o Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, que, entretanto, poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente..

Também passou a ser obrigatória a designação de audiência de tentativa de conciliação antes da apresentação da defesa pelo condômino-devedor, o que é um avanço importante introduzido pelo novo diploma, devido à grande quantidade de ações distribuídas e que o Judiciário não dá conta, até porque são poucos os funcionários públicos e a máquina pública não vence a demanda diária da sociedade, confira-se:

Art. 334.  Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.

Crítica que se faz e, talvez não tenha sido observada por muitos colegas, diz respeito à autocomposição. Explicamos. No caso das ações executivas, em princípio, o título executivo já possui todos os atributos (certeza, liquidez e exigibilidade), logo, não haveria sentido ao Condomínio solicitar a realização de uma audiência de conciliação prévia, dispensando a citação de 3 (três) dias para pagamento e a possibilidade de dar início imediato à penhora dos bens do devedor, inclusive, penhora on-line.

Afinal, a quem interessaria um acordo parcelado se houvesse, por outro lado, a possibilidade de se penhorar em um único ato todo o numerário, corrigido e os encargos legais? Acreditamos que o devedor é quem seria o meio interessado.

Certamente que a tentativa de conciliação somente se daria nas ações promovidas pelo sistema antigo e não pela via executiva, esta última, mais vantajosa ao condomínio-exequente.

Ademais, o débito condominial não é um direito disponível passível de autocomposição pelo síndico, se este último não tiver prévia autorização da Assembleia de Condôminos para realizar qualquer tipo de acordo ainda que perante o Judiciário. Isso porque, a dívida cobrada pertence ao Condomínio, ou seja, é dinheiro dos condôminos e não do síndico. O síndico é apena o representante legal dos condôminos.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Logo, antes de realizar a audiência de conciliação, o síndico deverá estar previamente autorizado pela Assembleia, com a proposta de acordo votada pelos condôminos, sendo que eventual abatimento dos juros ou correção monetária também é um assunto muito polêmico e que poderá gerar “precedentes” contra o síndico, ao firmar um acordo favorável a determinado condômino em detrimento de outro.

Segundo se extrai do artigo 334, §4º, do novo CPC, a audiência de conciliação poderá ser cancelada se ambas as partes, expressamente, informarem desinteresse ou não for admitida a autocomposição:

Art. 334. (...) § 4o A audiência não será realizada:

I - se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual;

II - quando não se admitir a autocomposição.

Em que pese ser muitíssimo importante a autocomposição, com o propósito de evitar longas e caras demandas, entupindo o já entupido Judiciário, fato é que um acordo mal elaborado poderá gerar mais prejuízos ao Condomínio e, inclusive, a responsabilização do síndico com o ressarcimento decorrente da má gestão.

Recomenda-se, portanto, que o assunto seja antes deliberado em assembleia, definindo-se a “política de acordos” (mediante quórum simples) autorizando o síndico e conselheiros na realização de acordos judiciais e extrajudiciais, com limites de alçadas pré-determinados, como já ocorre há anos por qualquer empresa representada por prepostos.

É uma grande ilusão pensar que o processo de execução irá resolver todos os problemas de inadimplência nos Condomínios. Até porque, continuam sendo distribuídas ações de cobranças (e agora de execuções) de dívidas condominiais. A inadimplência - ao nosso modo de ver - é um problema social, devido à crise econômica, desemprego, etc. Também é um problema cultural do condômino que acaba se acostumando com a reincidência da sua inadimplência.

Não se pode esquecer que até na ação executiva, o devedor-exequente terá possibilidades de defesa, podendo alegar excesso de execução ou impugnar qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento (preliminares e ilegitimidades), confira-se:

Art. 914.  O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá se opor à execução por meio de embargos.

Art. 917.  Nos embargos à execução, o executado poderá alegar:

I - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;

II - penhora incorreta ou avaliação errônea;

III - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;

IV - retenção por benfeitorias necessárias ou úteis, nos casos de execução para entrega de coisa certa;

V - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;

VI - qualquer matéria que lhe seria lícito deduzir como defesa em processo de conhecimento.

Dizendo com outros falares, o processo de execução poderá ser vantajoso pela velocidade na citação e na expropriação dos bens do devedor, mas não irá eliminar a possibilidade de embargos ou impugnações do devedor, como visto acima.

Acreditamos que as constantes ameaças de penhoras, protestos e outras formas de constrições lícitas, será o fator que mais irá aterrorizar os devedores contumazes, retirando-lhes o sono. Isso porque, numa sociedade capitalista, em que ter “crédito” é o fator essencial para se viver com dignidade, toda e qualquer restrição ou indisponibilidade de bens, mostrar-se-á como único instrumento capaz de combater a inadimplência ou ao menos reduzi-la.

Por todas essas razões, acreditamos que não há “mágicas” para a cobrança eficaz do débito condominial, sendo que o novo Código de Processo Civil trouxe sim mudanças importantes, contudo, já ultrapassadas para o atual momento da sociedade. Os síndicos que pretendem reduzir ou acabar com a inadimplência nos condomínios, devem se utilizar das ferramentas jurídicas disponíveis, mas, sobretudo, insistirem na velha receita para o sucesso de qualquer cobrança: O ACORDO !!!

Sobre o autor
Alexandre Callé

Advogado especializado em condomínios e locações.OAB/SP 235.941 www.advocaciacalle.com.br [email protected] 11 9 7150-1188 11 2656-1022 Rua Nove de Julho, 22, sala 42, Centro, Guarulhos, SP, CEP 07010-040. Escritório na Avenida Paulista (para reuniões) Atendo em seu Condomínio, mediante agendamento.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos