Ações humanitárias realizadas pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha no Afeganistão após a invasão americana

02/04/2016 às 15:31
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Este texto tem por objetivo destacar as ações realizadas pelo Comitê da Cruz Vermelha no Afeganistão após a invasão dos Estados Unidos da América, no ano de 2001.

 

1. Distinção entre intervenção humanitária e assistência humanitária

 

Antes de estabelecer a diferença entre esses dois institutos do Direito Internacional Humanitário, analisar-se-á a evolução do instituto da intervenção humanitária.

A abordagem das intervenções para fins humanitários teve como nascedouro as Teorias de Guerra Justa, desdobrando-se na história por meio das correntes de pensamento predominantes em cada período de tempo (COTRIM, 2007).

Teóricos como, Aristóteles, Cícero, Santo Tomás de Aquino, Santo Agostinho, Hugo Grotius, Samuel Puffendorf e Emmirch Vattel, já discutiam acerca das intervenções humanitárias dentro do viés de Guerra Justa. Logo, o conceito de guerra justa é precípuo para a compreensão da evolução do instituto da intervenção humanitária.

Sua definição origina-se de postulados antagônicos – considera a guerra, por um lado, como um fenômeno perverso, mas que deve ser aceito para evitar males piores – surgidos no meio de uma religião com caráter essencialmente pacifista, mas que se comprometia, simultaneamente, com a missão de proteção do ocidente contra ameaças perigosas (GRÓCIO, 2004).

O período histórico da guerra justa se estende desde os escritos da Grécia antiga até alguns anos após a Paz de Vestfália.

A teoria de guerra justa, ao longo de sua evolução, buscou encontrar argumentos morais e jurídicos para legitimar a guerra (AREND; BECK, 1993).

Preceitua Marques (2007, p. 33):

 

As origens clássicas do que se tornou conhecido como intervenção humanitária provém das doutrinas do fim da Idade Média sobre guerra justa, desenvolvidas em sua maior parte pelos escolásticos, alcançando seu ápice nos estudos de Grócio em seu “O Direito de guerra e da paz”, de 1625. O direito internacional e consequentemente o direito à guerra, como concebido pelo autor foi mais baseado no corpo de doutrinas enraizadas das leis naturais (jus naturalis) do que em entendimentos legais. Influenciado por seus antecessores, como Suárez e Gentili, o trabalho de Grócio apresenta pela primeira vez a sistematização da prática e das regras atinentes ao direito de guerra (jus belli).

Dois aspectos essenciais que marcam as discussões teóricas acerca das intervenções humanitárias são suscitados na obra de Grócio (2004), quais sejam: a guerra como forma de punição e a guerra em defesa dos oprimidos.

O primeiro aspecto justifica-se por ter origem no denominado direito natural, que autoriza a punição contra aqueles que ocasionaram dano a outro Estado, bem como àqueles que impuseram dano aos seus súditos ou a qualquer individuo. Logo, todo soberano que comete atrocidades contra seus súditos fica suscetível posterior, a ser realizada por qualquer Estado que tenha o interesse de realizar justiça. Porém, para tal, deve haver violação do direito natural ou direito das gentes (GRÓCIO, 2004).

Em relação ao segundo aspecto – guerra em defesa dos oprimidos –, Grócio (2004, p. 150) aduz: “todo homem está autorizado a manter, não apenas o seu direito, mas também o direito de outra pessoa”. Continua: “as razões que permitem um home a conduzir guerra para ele próprio, permitem também defender as causas de outrem”. Entrementes, ele limita esse direito, colocando-o como possibilidade extremamente vinculada à conveniência, e não como um dever. Ademais, ele estabelece que as intervenções em favor de súditos de Estados alienígenas devem ser feitas somente em situações extremas, visto que determinados assuntos são de competência exclusiva dos Estados.

As modificações no cenário político geradas pelo Tratado de Vestfália, v.g, maior concentração de poder na figura do rei e enfraquecimento da influência da Igreja Católica, propiciaram condições para o nascimento do positivismo no Direito Internacional. O positivismo, com a retirada da ética do estudo do Direito Internacional, bem como a ruptura com tradicionalismo escolástico, permitiu que o princípio da não-intervenção fosse transportado para um elevado patamar (CHESTERMAN, 2001).

Cristian Wolff (1934) foi o primeiro autor a defender  aquilo que viria a ser conhecido como princípio da não-intervenção. Para ele, o direito de fazer guerra punitiva somente é aceitável (legítimo) quando promovida por um Estado que tenha recebido ofensa irreparável e ao haja outras formas de repará-lo. Entrementes, o autor admite intervenção, sem que haja o uso da força, em Estados em que seus súditos sejam vítimas de abusos por seus governantes.

Na mesma ideologia, Vattel (2004, p. 31) aduz: “os deveres de uma nação para com ela mesma não interessam senão à Nação. Nenhum poder estrangeiro tem o direito de nela se envolver, nem deve nelas intervir a não ser por seus bons ofícios, salvo se para tanto for solicitado ou razões especiais o demandem”.

Vattel (2004) prega o bom relacionamento entre as Nações e a obrigação de uma promover o aprimoramento das demais.

Mill (1967, p. 70)., teórico defensor do principio da não-intervenção, estabelece: “os súditos de um soberano opressor devem conquistar sua própria liberdade sem auxílio externo. Mesmo se não obtiverem sucesso nessa empreitada, devem sofrer as consequências de seu próprio fracasso”.

Coforme os ensinamentos de Mill (1967), nem mesmo uma repressão violenta é capaz de justificar uma intervenção militar, ainda que em caráter humanitário, pois tal prática violentaria a ideia de autodeterminação (base de qualquer comunidade política).

Brownlie (1974, p. 618) define o princípio da autodeterminação como sendo “o direito de grupos coesos de escolherem para si próprios uma forma de organização política e sua relação com outros grupos”.  Entende tal autor que, até pouco tempo a maioria dos teóricos acreditavam que esse princípio era desprovido de conteúdo jurídico.

Todavia, com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, tal princípio ganhou conteúdo jurídico, visto que a Carta da ONU referenciou-o em seus artigos 1º e 55º.

Walzer (2003, p. 146) aponta três hipóteses em que a autodeterminação e a não-intervenção aceitam exceções:

 

(1) Apoio a um movimento de libertação nacional que manifeste a identidade de uma comunidade política no ato de resistência; (2) defesa da integridade de uma comunidade que esteja sendo atacada, se essa comunidade só puder ser preservada mediante uma intervenção contrária; (3) escravização, genocídio, ou um governo criminoso que impeça a comunidade e os cidadãos de exprimir suas formas peculiares de vida, e assim preservar a sua identidade.

 

Portanto, conforme Walzer (2003), a intervenção para salvaguarda de direitos humanos pode ser considerada legítima, em casos de grave ofensa daqueles por um Estado.

O conceito de intervenção a partir do século XIX ganha o significado hodiernamente conhecido, mas sua utilização ainda continuou inexata – visto que em determinados casos fora utilizada como uma simples forma de intercessão diplomática e em outros representou um a verdadeira interferência ditatorial nos assuntos de outros Estados soberanos. Seu conceito somente foi vinculado ao uso da força no final do século XIX, quando o tema começou a ser justificado pelo Direito Internacional (CHESTERMAN, 2001).

A expressão “intervenção humanitária” foi utilizada pioneiramente no século XIX pelo escritor William Edward Hall em sua obra intitulada “International Law”. O termo “intervenção”, no âmbito das relações internacionais, tem como significado alguma forma de ação coercitiva do Estado agindo no território de outro Estado soberano para salvaguarda de direitos (HALL, 1880).

Hall (1880) refere-se às intervenções humanitárias com um cunho moral, ao criticar os defensores da utilização desse instituto com fim de fazer cessar massacres e crimes contra as populações, sob o argumento de que na ausência de consenso entre os Estados, não há  mecanismo legal internacional que autorize a sua prática.

Durante o século XIX não existe evidência que demonstre a utilização do instituo da intervenção por motivos humanitários na prática do Direito Internacional (MARQUES, 2007).

Conforme anota Chesterman (2001), nesse período, houve várias interferências de caráter não coercitivo que foram confundidas por alguns autores como intervenções humanitárias, bem como casos de intervenções justificadas com fins humanitários que possuíam em suas razões, argumentos mais voltados para os benefícios dos Estados interventores do que para a própria tutela dos que estavam sendo salvaguardados.

A declaração da Rússia de guerra à corte otomana, em 1877, sob a alegação de proteção das populações cristãs na Bósnia, Herzegovina e Bulgária, consiste em exemplo de intervenção justificada com intuito humanitário, mas com argumentos direcionados para o benefício do Estado interventor. Neste caso, a Rússia agiu sob a motivação de adquirir novos territórios nos Bálcãs (MOORE, 1998).

No início do século XX, a discussão em torno da legitimidade das intervenções humanitárias cede lugar para as discussões acerca das intervenções unilaterais ou coletivas. Apesar de não existir convergência sobre a legitimidade jurídica das intervenções humanitárias, sua prática de forma unilateral ou coletiva fora objeto de profundos debates. (MARQUES, 2007).

Segundo Chesterman (2001), as intervenções humanitárias sempre constituíram uma lacuna jurídica, desde o princípio do Direito Internacional. Não obstante as tentativas de teóricos, como Grócio (2004), o tema chegou até meados do século XX sem uma posição firme dentro do ordenamento jurídico internacional.

Todavia, com a promulgação da Carta das Nações Unidas, a hermenêutica do espaço ocupado pelas intervenções humanitárias o direito internacional ganhou outras proporções.

 

Preceitua Marques (2007, p. 84):

 

Não havendo posição doutrinária ou prática do direito internacional que pudesse regulamentar o direito às intervenções humanitárias, esta ação continuou na penumbra do debate político-jurídico, sem solução aparente, até a promulgação da Carta das Nações Unidas. Apesar de ao ter tratado especificamente do assunto, ao menos trouxe à luz temas que avançaram no campo da regulamentação das atividades dos Estados no que diz respeito ao uso da força nas relações internacionais. Nesse sentido, embora não ataque diretamente o emaranhando conceitual, teórico e prático, acumulado em séculos de discussão sobre as intervenções humanitárias, o sistema jurídico introduzido com a CNU, fez nascer um corpo de leis que efetivamente começou a balizar as relações entre Estados, restringindo ações unilaterais e impedindo ingerências.

             

Da análise das decisões tomadas pela Organização das nações Unidas durante a guerra fria – no que se refere à violação da soberania dos Estados em nome da proteção dos direitos humanos –, constata-se a mudança na valoração dos dois bens jurídicos que se contrapõem. O princípio da não-intervenção representou óbice à aceitação da intervenção humanitária como prática legitimada no cenário das relações internacionais, nos primeiros quarenta anos da ONU (BILL, 2006).

O princípio da não-intervenção somente recebeu aspecto jurídico positivado a partir da Convenção da Liga das Nações. A Carta da ONU, por sua vez, além de tutelar a integridade territorial, prevê mecanismos que vedam o uso da força e garante que Organização não se ocupará de assuntos exclusivos da jurisdição estatal (RODRIGUES, 2000).

O Capítulo VII da Carta da ONU fornece respaldo jurídico às intervenções humanitárias nos casos de ameaça à paz e à segurança internacionais. Sendo esta, a única possibilidade prevista na Carta, de violação da jurisdição de um Estado de forma legal. Nesta situação, cabe unicamente ao Conselho de Segurança da ONU tomar as providências cabíveis.

Logo, o princípio da não-intervenção sempre foi proclamado pela ONU  aos Estados membros como de estrita importância, porém,o consenso quanto aos aspectos gerais de sua conceituação e de seu alcance foi difícil de ser atingido (CAMPOS, 1999).

A Resolução da ONU de 1949 sobre os Fatores Essenciais da Paz, referindo-se a não-intervenção aos países membros: “abster-se de toda ameaça ou ato, direto ou indireto, que vise a prejudicar a liberdade, a independência ou a integridade de um Estado ou fomentar um conflito civil e a subverter a vontade do povo de qualquer Estado”. Por sua vez, a Resolução de 1950 vedava expressamente “a intervenção de um Estado nas questões internas de outro Estado a fim de mudar seu governo legalmente estabelecido mediante a ameaça ou o uso da força” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1949).

Em 1949, a Corte Internacional de Justiça proferiu sentença repugnando incisivamente a intervenção do Reino Unido na Albânia, em decorrência da disputa do canal de Corfu, declarando esta como sendo uma “manifestação de uma política de força, como aquela que, no passado, esteve na origem de muitos sérios abusos, e dessa forma, não pode encontrar lugar no direito internacional, quaisquer que sejam os defeitos da organização internacional” (CAMPOS, 1999, p. 222).

Porém, concomitantemente ao fortalecimento da defesa do princípio da não-intervenção, desenvolviam-se as normas de caráter protecionista aos direitos humanos na ONU. Gradativamente, as questões de paz e segurança foram cedendo lugar para as preocupações humanitárias, sociais e econômicas. Entrementes, as incipientes normas de direitos humanos não estabeleceram meios para fazer cumprir suas imposições, ademais, elas estavam profundamente dissociadas das medidas que permitiam o uso da força na Carta da ONU, limitando, desta forma, as tentativas de acabar com as violações e abusos perpetrados pelos Estados (RODRIGUES, 2000).

Em 1971, paquistaneses habitantes da região leste do país foram covardemente massacrados pelo Paquistão ocidental. O exército desse país realizou matanças em grande proporção. Tal evento levou à criação de Bangladesh a partir do que era o Paquistão Oriental. (COTRIM, 2007).

Durante a Guerra Fria, ocorreram vários eventos em que houve ofensa aos direitos humanos. Contudo, a intervenção humanitária ainda não se justifica nesse período.

Aduz Rodrigues (2000, p. 106):

 

[...] a situação de crise humanitária e amplo desrespeito aos direitos humanos eram transparentes, mas o comportamento e os discursos dos governos rechaçavam a ideia de intervenção humanitária feita sem o consentimento do Estado invadido. Esta atitude corresponde ao paradigma predominante durante a Guerra Fria, que privilegiava as prerrogativas soberanas do Estado diante das demandas de respeito aos direitos humanos [...].

 

No âmbito da ONU, a utilização (permissão) da força para salvaguarda dos direitos humanos era uma medida considera ilegítima. Na colisão entre a necessidade de tutela de indivíduos e grupos oprimidos pelo seu Estado e princípio da soberania estatal, este prevaleceu irrefragavelmente durante a Guerra Fria (COTRIM, 2007).

O cenário internacional Pós-Guerra Fria fora marcado por crises humanitárias de relevância, ocorridas, em sua maioria, como consectário de conflitos armados dentro dos Estados. Alvo de perseguições e chacinas pelas partes beligerantes – que várias vezes dificultaram o acesso da assistência humanitária -, a população civil foi quem sofreu com os efeitos dos conflitos armados (BILL, 2006).

Conforme Rodrigues (2000), o desrespeito aos dispositivos de direito humanitário representa uma das mais graves violações aos direitos humanos a medida que põe em risco não só a saúde e a vida da população, mas também a submete a condições de extremo sofrimento físico e psicológico.

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O desrespeito ao direito humanitário, e, por conseguinte, aos direitos humanos, a elevação do número de partes envolvidas nos conflitos – o que propicia maior dificuldade nas negociações e menor garantia de que os grupos respeitariam os termos acordados –, a mobilização da mídia internacional, levando ao conhecimento da população mundial os sofrimentos e atrocidades impostos às pessoas nos territórios em guerra –, gerando uma opinião pública favorável a intervenção da sociedade internacional nesses conflitos –, promoveram a alteração do trato dado pela Organização das nações Unidas aos conflitos internos dos Estados, surgindo, assim, a utilização da intervenção para fins humanitários de forma legítima (FARER, 2003).

Portanto, a tutela da camada civil passou a ser um das prioridades ações desempenhas pela ONU, que invocou o Capítulo VII da sua Carta para justificar intervenções militares nas localidades em que as condições humanitárias clamavam por auxílio da comunidade internacional.

Após, traçar-se a evolução do instituo da intervenção humanitária, é mister estabelecer o conceito dado a intervenção humanitária nos dias atuais.

Não há uma definição normativa prevista nos documentos internacionais para intervenção humanitária, embora já tenha sido definido de várias formas. A soberania estatal garante a não-intervenção de um Estado ou organização  noutro governo. Todavia, hodiernamente a intervenção humanitária passou a ser uma ação legítima da sociedade internacional em Estado que tratam seus súditos de forma brutal e há profundo sofrimento humano. A intervenção humanitária envolve uma situação em que os aspectos humanitários autorizam a sua prática (BILL, 2006).

Holzgrefe (2002, p. 18) define as intervenções humanitárias como sendo:

 

Ameaça ou o uso da força para além das fronteiras de outro Estado, por um Estado ou grupo de Estados, com o objetivo de prevenir ou cessar violações graves e generalizadas de direitos humanos fundamentais dos indivíduos que não sejam cidadãos da força interventora e sem a permissão do Estado cujo território seja objeto da intervenção.

Do conceito supramencionado, depreende-se os requisitos constitutivos do conceito de intervenção humanitária: a) força ou ameaça do uso da mesma devem  estar inseridos na ação; b) a intervenção somente poderá ocorrer se um ou mais Estados se mostrarem dispostos a enviar forças militares além de suas fronteiras físicas para atuarem noutro Estado soberano (força interventora); c) a intervenção deve ser realizada com o estrito propósito humanitário, ou seja, deve ser realizada somente para salvar vidas ou fazer cessar o sofrimento causado pelo desrespeito aos direitos humanos e individuais; d) a operação deve ser direcionada o resgate ou defesa de cidadãos do Estado que está sofrendo a intervenção.

A assistência humanitária, por sua vez, consiste no auxílio aos não-combatentes atingidos pelo conflito, com distribuição de alimentos, medicamentos e protegendo seus direitos fundamentais (realizada por Organizações como a Cruz Vermelha Internacional) (MARQUES, 2007).

Comumente utiliza-se a noção de assistência humanitária e caridade como sinônimas. Porém, a assistência humanitária rompe os limites da conceituação de caridade.

Associada com as ações desenvolvidas pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha, a assistência humanitária é definida por Verri (1988, p. 133) como “a assistência geral que o CICV deve garantir, junto com a proteção das vítimas dos conflitos armados; para que esta tarefa se realize, as Partes em conflito devem outorgar ao CICV todas as facilidades ao seu alcance [...]”.

Anota Sousa (2011, p. 77):

 

Outras organizações também se ocupam desta tarefa, como a própria ONU. Todavia, em razão do caráter pioneiro do CICV, é comum associar tão-somente a este organismo a atividade humanitária. Esta assistência não se dá apenas em casos de conflitos armados; também se evidencia em caso de catástrofes naturais ou ainda em razão do subdesenvolvimento que leva populações inteiras à miséria absoluta e ao abandono.

 

Na conceituação da assistência humanitária enquanto direito do indivíduo, é imperioso se levar em consideração mais as necessidades daquele que dela precisa (assistência humanitária) que as vontades políticas estatais quanto a oferta de assistência a outros Estados (SOUSA, 2011).

Para Espiell (1999) não resta dúvidas em classificar a assistência humanitária como direito individual e coletivo, afirmando ele que a ajuda humanitária deve ser reconhecida como norma jus cogens ante o que estabelece o art. 53 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados. Não obstante, ainda que vislumbre essa necessidade, o autor afirma que o direito à ajuda humanitária não encontra definição no Direito Internacional com precisão, pois, para ele, tal direito ainda encontra-se na fase de “gestação”.

Sousa (2011, p. 78) lembra que:

 

Importante não confundir direito à assistência humanitária com o direito à intervenção. O primeiro, ainda que não suficientemente regulamentado pelos instrumentos necessários, existe e é reconhecido. O segundo, controverso e infelizmente moldado à guisa de interesses políticos, é continuamente invocado pelos Estados para justificar atitudes nada solidárias.

 

Espiell (1999, p. 31) esclarece como ocorre a prestação de auxílio humanitário considerando-se este um direito dos indivíduos:

 

A ação que constitui a ajuda humanitária deve repousar sobre o respeito dos princípios e da igualdade soberana dos Estados. Deve ser solicitada ou concedida por estes e conduzida em conformidade com os princípios da humanidade, neutralidade e imparcialidade, de modo tal que a integridade do território e a unidade nacional não sofram violações nem ataques.

 

Convém lembrar que, os Estados não têm obrigação de fornecer assistência humanitária, a obrigação deles está relacionada fundamentalmente em facilitar a assistência humanitária eventualmente recebida. O que é não aceito é a oposição dos Estados em receber assistência humanitária (ZANGHI, 1999).

Segundo Schindler (1999), a recusa sem justificativa plausível dos estados em aceitar auxílio humanitário pode levar as organizações internacionais e os demais Estados a utilizarem de quaisquer medidas necessárias para garantir ajuda aos necessitados, exceto o uso da força, confirmando, portanto, o postulado de que o auxílio humanitário não pode ser encarado como intervenção, nem justificar essa iniciativa.

Conforme o até aqui exposto, verifica-se que a intervenção envolve situações em que os aspectos humanitários justificam a decisão da utilização de tal medida. A intervenção humanitária, de acordo com o capítulo VII da Carta da ONU, somente é legítima quando utilizada com o objetivo de solucionar crises humanitárias. Busca-se na intervenção humanitária desarmar a população e impor a paz. Consiste numa conjunção de atividades de cunho político, econômico e humanitário.

Noutro lado, a assistência humanitária objetiva prestar auxílio aos não-combatentes atingidos pelo conflito, pautando-se na observância dos princípios e o da igualdade sobera dos Estados.

Portanto, a possibilidade, na intervenção humanitária, do uso da força e a ausência de consentimento do Estado onde vai ocorrer, consiste na diferença fundamental entre aquela e a assistência humanitária.

 

2. Invasão Americana ao Afeganistão

 

No ano de 2001, o então Presidente dos Estados Unidos da América, George W. Bush anuncia ao mundo um movimento militar, em represália ao atentado contra as torres gêmeas, denominado de Guerra ao Terrorismo. A iniciativa consistia em uma estratégia de combate ao terrorismo que culminou na invasão americana ao Afeganistão (COTRIM, 2007).

Para compreender proclamação da Guerra ao Terrorismo, é necessário expor os fatos que ocasionaram o atentado de 11 de setembro de 2001 aos EUA.

Depois dos anos 80, o fundamentalismo islâmico ganhou notoriedade política, bem espaço em outros países da região, inclusive dentro do movimento palestino, que até então possuía o caráter nacional e laico. As ações do Hezbollah (Partido de Deus, dos xiitas libaneses), no sul do Líbano e os atentados promovidos pelo Hammas – movimento islâmico palestino –, nos territórios por eles ocupados, atraíram a atenção de uma população desesperada pela repressão, pobreza e pelo avanço das colônias judaicas (COTRIM, 2007).

Entretanto, o principal fator de internacionalização do fundamentalismo e sua capacitação de agir, de forma moderna e global, consistiram no estímulo da administração Reagan para a criação de uma cruzada islâmica internacional (Guerra Santa/Jihad) contra a União Soviética que ocupava o território do Afeganistão. Rapazes idealistas e mercenários deslocaram-se para os campos de treinamento do lado paquistanês da fronteira, treinados pela CIA a ISI (Serviço de Inteligência do Paquistão), com armas americanas e dinheiro advindo do petróleo dominado pelas monarquias (VIZENTINI, 2002).

Logo estavam prontas redes internacionais adestradas em finanças, armamentos, tecnologias e formas de organização sofisticadas.

Concomitantemente, aprenderam a se autofinanciar através do tráfico de drogas e armas e várias outras atividades ilícitas.

Com o fim da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), os EUA se desinteressaram pelo Afeganistão, sendo esses grupos abandonados à mercê da própria sorte. (COTRIM, 2007).

Com formação do regime talibã, esses grupos ganharam um lar nacional, como foi o que ocorreu com a Al-Qaeda. Como ressentimento pelo abandono, eles voltaram-se contra o mundo ocidental, principalmente contra os EUA (VIZENTINI, 2002).

É nesse contexto que, em 11 de setembro de 2001 as Torres Gêmeas do World Trade Center, localizadas na cidade de Nova York, foram atingidas por dois aviões. Um terceiro avião colidiu com o Pentágono, na Virgínia. O quarto avião caiu na região sul do estado da Pensilvânia, em decorrência do conflito entre alguns passageiros e os terroristas.  Cerca de aproximadamente três mil pessoas morreram. O líder da Al-Qaeda, Osama Bin Laden e seu grupo assumiram a autoria do atentando, iniciado a partir de então aquilo que se denominou de Doutrina Bush, que tinha como principal postulado a Guerra contra o Terrorismo (COTRIM, 2007).

Pelo fato dos grupos terroristas não representarem o exército oficial de um Estado, a ofensiva da guerra contra o terrorismo recaiu sobre os países que formavam o eixo do mal.

Assim, os EUA invadiram e ocuparam o Afeganistão, sob a justificativa de capturar o terrorista Osama Bin Laden.

A situação do Afeganistão que já era delicada, em virtude da seca sem precedentes que o assolava e o comando com mão-de-ferro do grupo fundamentalista do Taleban, somente piorou com a invasão Americana.

 

3. Ações humanitárias realizadas pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha no Afeganistão após a invasão Americana

 

O conflito no Afeganistão se intensificou e se expandiu em termos geográficos, durante 2010, gerando um número crescente de vítimas civis. A fragmentação das partes beligerantes, incluindo a formação de milícias locais e grupos ainda mais armados –, proporcionou desafios novos para a população afegã, bem como para os ajudantes humanitários que tiveram bastante dificuldade para encontrar as vítimas do conflito. Ademais, os ataques teleguiados continuaram nas áreas de fronteiras com o Paquistão. Com a luta se espalhando na maioria das províncias, explosões causadas por bombas, minas e dispositivos explosivos improvisados cresceram significativamente (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

Autoridades dos Estados Unidos e os parceiros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) comprometeram-se em retirar paulatinamente seus combatentes do Afeganistão até 2014.

Em um contexto de conflito e insegurança se intensificando, algumas partes do território do Afeganistão não foi abrangido pela atuação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Não obstante, devido ao seu diálogo com os beligerantes e a aceitação de sua aproximação com caráter neutro, imparcial e independente, o Comitê expandiu suas atividades, chegando a 31 das 34 províncias existentes no Afeganistão. (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

Para prestar assistência humanitária ao máximo de vítimas possível, o CICV contou com uma extensiva rede de voluntários da Sociedade do Crescente Vermelha Afegã, ativos em todas as províncias e fornecendo suporte financeiro, material e técnico, bem como treinamento para ajudar a construir a capacidade da Sociedade Nacional (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

Os delegados do CICV coletaram informações de violações de regras do Direito Internacional Humanitário, e fizeram representações secretas às partes envolvidas, a fim pôr fim a tais abusos. Eles reforçaram as autoridades que faziam parte no conflito e aos portadores de armas, suas obrigações para com as regras do Direito Internacional Humanitário, mormente a condução das hostilidades e o dever de proteção às pessoas não envolvidas no conflito. O Comitê forneceu apoio ao Exército Nacional Afegão integrando as normas de DIH, a sua doutrina, treinamento e operações, e promoveu a familiarização da policia e dos soldados com a legislação referente aos direitos humanos internacional (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

Os delegados do Comitê realizaram visitas as pessoas detidas pelas autoridades Afegãs, autoridades Americanas, da OTAN e dos grupos armados, a fim de monitorar os tratamentos e condições de vivência recebidos, e principalmente, a observância das garantias judiciais.  A especialidade do CICV em infraestrutura prisional ajudou as autoridades afegãs a usar seus limitados recursos para reabilitar prisões e promover a melhora nas condições de higiene e saúde dos presidiários (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

A aceitação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha por todas as partes beligerantes no conflito significou que ele foi frequentemente solicitado para atuar no papel de intermediário neutro durante a soltura dos reféns e a entre dos restos humanos aos familiares. Em virtude disso, o CICV utilizou toda a sua credibilidade e seus contatos para facilitar a atuação de outros grupos humanitários, tais como ONG’s que prestavam assistência médica (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

No que pertine especificamente a população civil, a mais de 330.000 (trezentos e trinta mil) pessoas foi oportunizado o acesso ao cosumo de água potável e aprenderam práticas de boa higiene, devido às instalações de água reabilitada e a um programa, a nível nacional, de promoção de higiene, promovidos com o apoio fundamental do CICV.  Nas áreas rurais, foram instaladas bombas manuais em poços, bem como foi ensinado a população os mecanismos de manutenção delas (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

Pessoas em áreas afetadas pelo conflito confiaram nos 10 (dez) centros de assistência primária à saúde do Crescente Vermelho Afegão apoiado pelo CICV, conforme o pacote básico dos serviços de saúde do país. A equipe recebeu treinamento, apoiado pelo Comitê, acerca de coleta de dados e análise para detectar e responder de forma célere a quaisquer tipos de deterioração da saúde pública (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

O CICV, com o auxílio da Cruz Vermelha da Noruega em relação ao treinamento de ajudantes de primeiros-socorros, providenciou assistência antes e após o natal e ensinou práticas de boa higiene a comunidade (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2010).

Devido a grande quantidade de óbitos, as partes beligerantes receberam informações de como lidar com os restos humanos, incluindo a preservação de dados para a futura identificação, no intuito de garantir a contabilização de pessoas mortas com o conflito.

No que tange especificamente as pessoas privadas de sua liberdade, desde janeiro de 2002 o CICV realiza visitas aos detidos alojados no centro de detenção de Parwan, que funciona em uma base área dos Estados Unidos, localizada ao norte da cidade de Kabul. As visitas começaram três meses após iniciado o conflito.  Dos aproximadamente 3.000 presos alojados nesse centro de detenção, a maioria são afegãos capturados pela aliança liderada pelos EUA no sul e no leste do Afeganistão. Além de Parwan, desde de 2008, o Comitê também tem acesso a pessoas presas em outros centros mantidos pelos EUA no Afeganistão, onde elas esses presos são mantidos de forma temporária, antes de serem liberados ou transferidos para o centro de Parwan (COMITÉ INTERNACIONAL DE LA CRUZ ROJA, 2012).

Conforme o acordo que estabelece a retirada paulatina dos Estados Unidos do Afeganistão, os centros de detenção e as presos neles mantidos serão transferidos para a administração das autoridades do governo afegão. O Comitê mantém um bom diálogo com as autoridades americanas e afegãs a fim de que sejam respeitados os direitos dos detidos, bem como que as autoridades judiciárias e penitenciarias afegãs se preparem de forma adequada para lidar com o aumento da população penitenciária do país (COMITÉ INTERNACIONAL DE LA CRUZ ROJA, 2012).

O objetivo geral das visitas realizadas pelo CICV é garantir que os detentos sejam presos em condições que evidenciem o devido respeito pela dignidade humana. Com as visitas repetidas, o Comitê averigua as condições matérias da prisão, bem as condições psicológicas dos detidos. Um Estado que retira do individuo sua liberdade, deve garantir ao mesmo o mínimo de bem-estar. E o CICV assegura, por meio de suas ações, que às autoridades cumpram com seus deveres e responsabilidades àquele respeito (bem-estar dos detidos). Ele ainda avalia o funcionamento do sistema prisional, no intuito de detectar potenciais lacunas e falhas que, se verificadas, serão tratadas diretamente com as autoridades competentes (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

As visitas realizadas pelo CICV seguem os padrões das modalidades discutidas e acordadas previamente com as autoridades do Estado. Aos delegados do Comitê, deve ser possível: a) ver todos os detentos sob qualquer autoridade; b) ter acesso a todas as partes da prisão onde os detentos são mantidos, bem como as outras áreas, v.g., banheiros, cozinhas, áreas de recreação; c) terem encontros com os detentos sem a presença dos guardas ou outro agente da prisão; d) repetir as visitas ao local de detenção, bem como se encontrarem com os detentos da sua escolha, tantas vezes os delegados achem necessário; e) estabelecer uma lista de detentos durante a visita (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

De acordo com o caráter neutro e imparcial de seu mandato, o CICV não realiza comentários ou discussões acerca dos motivos da detenção, preocupando-se exclusivamente com as condições humanitárias das detenções, bem como o tratamento dado aos prisioneiros (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

A composição da equipe do Comitê e a duração das visitas dependem dos objetivos da mesma e do tamanho das instalações a serem visitadas. As equipes podem ser compostas por delegados e intérpretes, assim como por especialistas, por exemplo: assessores jurídicos, médicos, enfermeiras, ortopedistas, assim como engenheiros sanitários e hídricos para.  As visitas realizadas pelo Comitê seguem um procedimento padrão. Elas começam com uma troca preliminar de pontos de vista com as autoridades dos presídios, seguindo por um passeio, de forma conjunta, por toda instalação prisional (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

No final de cada visita, os delegados expõem suas observações, constatações e recomendações para as autoridades, de maneira bilateral e confidencial. Ademais, se necessário, eles solicitam às autoridades que sanem as eventuais lacunas existentes no sistema prisional (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

O contato dos detidos com seus familiares é essencial para o bem-estar mental dos mesmos. O CICV, por meio de seu programa de reestabelecimento dos laços familiares, facilita o contato deles com seus entes queridos. Tal programa é composto por: a) mensagens da cruz vermelha; b) saudações orais; c) visitas das famílias e videoconferências (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

As mensagens da cruz vermelha consistem em cartas abertas trocadas entre os detidos e seus parentes próximos, contendo somente notícias da família. Antes da entrega, elas são submetidas a uma análise pelas autoridades prisionais.

Saudações orais são mensagens que significam “estou bem e seguro”, transmitidas pelo CICV através de telefone, a pedido dos detentos, com a autorização das autoridades, para os seus familiares.

O Comitê realiza avaliações nos serviços médicos prestados nos locais de detenção, objetivando certificar-se que o cuidado com a saúde possui o mesmo padrão que prevalece em outras partes do território afegão. Geralmente, o CICV não fornece cuidados médicos para detidos de forma individual, porém, em emergências médicas, v.g., princípio de uma epidemia ou no caso de um detido estar muito doente, necessitando de um cuidado específico, a equipe médica do CICV encontra-se pronta para fornecer auxílio, bem como apta para ajudar substancialmente as autoridades com auxílio técnico e material (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

Durante as visitas na detenção, os delegados verificam, também, as condições de higiene e da água para certificar-se que os detidos são beneficiados com água em quantidade e qualidade adequadas, condições sanitárias adequadas e bom funcionamento da cozinha.

Campanhas de cuidados higiênicos são direcionadas aos detidos e aos funcionários da prisão para prevenir o início de doenças contagiosas. Os agentes de saúde supervisionam e monitoram os esforços das autoridades da prisão para erradicar insetos transmissores de doenças (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

Nos casos em que as autoridades da prisão são incapazes de prover as mínimas necessidades, o CICV fornece auxílio direto aos detidos. A cada outubro, o Comitê fornece a todos os detidos um pacote de auxílio ao rigoroso inverno afegão, contendo cobertores, mantas e outros itens (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

Através do diálogo entre os detidos, as autoridades de detenção e membros do sistema judiciário, os delegados do CICV monitoram o andamento dos julgamentos detidos, bem como se os mesmos têm acesso a todos os direitos que asseguram um julgamento justo sob égide da lei interacional e afegã (INTERNATIONAL COMMITTE OF THE RED CROSS, 2012a).

Em relação às pessoas feridas e doentes,  muitos pacientes com ferimentos ocasionados por armas de fogo em uma das 29 províncias afetadas pelo conflito, receberam atendimentos em um dos 6.420 (seis mil quatrocentos e vinte) postos de primeiros-socorros estalados com auxílio do CICV.

 

 CONCLUSÃO

 

O Direito Internacional Humanitário, ramo do Direito Internacional Público, almeja tutelar as vítimas de conflitos armados ao redor do mundo, bem como os militares que não participam mais das hostilidades. Tal objetivo é realizado, principalmente, através das quatro Convenções de Genebra de 1949 e dos dois Protocolos Adicionais de 1977.

Conforme verificado, desde os primórdios existiam normas que objetivavam restringir a violência inerente aos conflitos armados, por exemplo, o Código de Manu, que vedava o uso de determinadas armas e os ataques a certas pessoas. No período medieval, a igreja estabeleceu a proibição de hostilidades em determinados dias, considerados santos, bem como a neutralidade de não-combatentes.

Contudo, foi somente a partir do século XIX que se deu a efetiva formação do Direito Internacional Humanitário.

O suíço Henri Dunant publicou, em 1959, o livro “Um Souvenir de Solférino” (Uma Lembrança de Solferino), onde relatou suas impressões acerca das atrocidades ocorridas na Batalha de Solferino Nessa obra, Henri defendia a necessidade de criação de normas internacionais voltadas a proteger à pessoa na guerra, bem como de grupos nacionais e de uma organização internacional que permitisse melhorar as condições de vida durante os conflitos armados e auxiliar as vítimas.

A partir dos pensamentos de Henri, resultaram, em 1863, o Comitê Internacional e Permanente de Socorros dos Feridos Militares, precursor do movimento que mais tarde passou a ser conhecido de Cruz Vermelha.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), sediado em Genebra, Suíça, é o principal órgão do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, composto ainda da Federação Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho e das Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.

O CICV tem sua natureza jurídica advinda das quatro Convenções de Genebra de 149 e dos Protocolos Adicionais de 8 de junho de 1977, que lhe conferem credenciamento com fins de laborar de forma neutra em conflitos armados internos ou internacionais.

Consistem em objetivos fundamentais do CICV: prestar proteção e assistência humanitárias as vítimas dos conflitos armados e de outras situações de violência; realizar medidas para responder as emergências e promover, ao mesmo tempo, o respeito do Direito Internacional Humanitário e sua aplicação na legislação nacional.

A assistência humanitária visa prestar auxílio aos não-combatentes atingidos pelo conflito, pautando-se na observância dos princípios e o da igualdade sobera dos Estados.

No dia 11 de setembro de 2001, Os Estados Unidos da América sofreram um atentado onde aproximadamente três mil pessoas faleceram. O terrorista Osama Bin Laden e seu grupo assumiram a autoria do atentado. O Afeganistão, acusado de apoiar o terrorista, tornou-se o principal alvo do governo americano.

Dessa forma, teve inicio em 7 de outubro de 2001 a invasão americana no Afeganistão, cujo o objetivo declarado era capturar Osama Bin Laden e outros líderes da rede terrorista Al-Qaeda.

Com guerra no Afeganistão instaurada, algumas partes do território afegão não foram abrangidas pela atuação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, porém, devido ao seu diálogo com partes envolvidas no conflito, o CICV expandiu suas atividades chegando a 31 das 34 províncias existentes no país.

Para garantir o respeito às normas de Direito Internacional Humanitário (DIH), os delegados do CICV coletaram informações de ofensas as regras do DIH e fizeram representações às partes beligerantes, a fim de pôr fim as violações; forneceram apoio ao exército nacional afegão, integrando as normas do DIH à sua doutrina, treinamento e operações; foram realizadas visitadas periódicas as prisões, no intuito de garantir o respeito à dignidade humana das pessoas privadas de suas liberdades; a sociedade civil recebeu ensinamento sobre as regras de Direito Internacional Humanitário, bem como sobre o caráter neutro, imparcial e independente das ações realizadas pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha.

O CICV oportunizou a mais de 330.000 (trezentos e trinta mil) pessoas foi acesso ao cosumo de água potável, bem como forneceu informações acerca de práticas de boa higiene, a fim de evitar a proliferação de doenças.

Foram instalados com a ajuda do CICV cerca de 6. 420 (seis mil, quatrocentos e vinte) postos de primeiros-socorros para fornecer atendimento às pessoas feridas e doentes. O CICV financiou o transporte de pacientes para a unidade de assistência à  saúde.

Voluntários do CICV forneceram auxílio aos pacientes nos leitos do Hospital de Mirwais, bem como treinaram a equipe afegã para melhorar os atendimentos nos casos críticos.

O CICV promoveu seminários sobre cirurgia de guerra aos médicos da localidade, a fim de que os mesmos aperfeiçoassem suas habilidades nessa área.

Portanto, a atuação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha foi deveras eficiente nesse conflito armado, contibruindo incisavamente na diminuição dos efeitos fatídicos gerados à população civil, bem como na busca pela observância das regras do Direito Internacional Humanitário, a fim de quer fosse garantido o mínimo de dignidade às pessoas envolvidas nesse conflito armado.

 

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Sobre o autor
Allan Cosme Marques Sousa

Graduado em Direito pela Universidade Federal do Maranhão

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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