Construção do direito à profissionalização de adolescentes no ordenamento jurídico brasileiro

24/11/2016 às 14:43
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Objetiva-se trazer à baila discussão sobre o direito à profissionalização de crianças e adolescentes. As diversas normas tutelando esse direito, bem como, a adoção do Princípio da Proteção Integral pela legislação brasileira.

Resumo

Este artigo objetiva trazer à baila discussão sobre o direito à profissionalização de adolescentes. Para alcançar este propósito serão abordados aspectos históricos, sociais, posicionamentos doutrinários e jurídicos que expõem as normas proteção da criança ou jovem em relação ao trabalho. A metodologia utilizada será bibliográfica e virtual sobre o tema, a fim que se compreenda que o real objetivo desse direito ultrapassa fins econômicos. As diversas normas tutelando esse direito frente ao grande, bem como, a adoção do Princípio da Proteção Integral, em relação ao número de crianças exploradas em nosso país por seus responsáveis ou empregadores causou a escolha do assunto. E apesar do já consagrado avanço na legislação em relação ao assunto, tais normas não acompanham a realidade de muitas famílias brasileiras.

palavras–chave: Doutrina da Proteção Integral. Direito à profissionalização. Trabalho infantil.

ABSTRACT

This article aims to bring up discussion of the right to vocational training for adolescents. To achieve this purpose historical, social, legal and doctrinal positions that expose the rules protecting the child or young person in relation to the work will be addressed. The methodology is bibliographic and virtual on the topic in order to understand that the real objective of this law goes beyond economic purposes. Various rules tutoring that right opposite the large as well as the adoption of the principle of full protection in relation to the number of children exploited in our country by their parents or employers caused the choice of subject. And despite the progress already enshrined in legislation in relation to the matter, such rules do not follow the reality of many Brazilian families..

Keywords: Doctrine of Integral Protection. Right to vocational training. Child labor.

  1. INTRODUÇÃO

Durante muito tempo o vigor das crianças e dos adolescentes foi utilizado como mão de obra em ambientes de trabalho impróprios para sua condição de seres em desenvolvimento. Estes eram percebidos como adultos em miniaturas que tinham função utilitária para a sociedade de ajudar na economia doméstica, realizando tarefas e acompanhando seus pais nos seus ofícios.

Graças a essa dívida histórica, as sociedades organizadas passaram a se preocupar com tal questão. Assim, no plano internacional, além das primeiras ferramentas de proteção ao trabalho de crianças e adolescentes, com resultados tímidos, surgem a posteriori, as convenções da Organização Internacional do Trabalho - OIT, em especial as que estabelecem uma idade mínima para a admissão de emprego para crianças e Convenção n° 182 da OIT, ratificada pelo Brasil e promulgada pelo Decreto n° 3.597, de 12.09.2000, que proíbe as piores formas de trabalho infantil e estabelece ações para sua extinção, vistas adiante.

A proteção à criança e ao adolescente, numa órbita interna, está presente em diversos diplomas legais quais sejam a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA e a Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT.

Nossa Carta Magna, em especial, nos artigos 7º e no art. 227, este último de relevância imprescindível elenca os direitos trabalhistas, proibindo o trabalho infantil, aquele exercido antes da idade mínima estabelecida, a saber, dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz que é ao quatorze anos.

O ECA em seu Capítulo V trata do direito à profissionalização e à proteção no trabalho, enfatizando que formação técnico-profissional deve obedecer a certos princípios, vedando algumas formas de trabalho como o realizado em horário noturno, perigoso, insalubre e penoso (este não regulamentado ainda), e mesmo realizados de forma que, não permitam a frequência escolar, bem como em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social.

A CLT, por sua vez, não se calou diante do assunto, dedicando todo o Capítulo IV a regulamentar a relação de trabalho/emprego para adolescentes, mencionando algumas modalidades e condições de trabalho que atendam às necessidades desses agentes em desenvolvimento.

Por fim, cumpre entender, de maneira sistematizada, a profissionalização de adolescentes conforme o nosso sistema jurídico, assim como, sua aplicabilidade. Analisar, principalmente, o papel do Direito do Trabalho frente ao tema, quando este disciplina o exercício do trabalho pelo adolescente.

  1. BREVE HISTÓRICO DO TRABALHO INFANTIL

Inicialmente, insta trazer à baila uma breve reflexão acerca da noção de infância, tomando como base o trabalho do historiador Ariés (1981), o qual descreve a criança, no período medieval, como um ser em anonimato, que logo passaria para a fase adulta sem mesmo passar pela juventude. Seus valores, seus conhecimentos e todos os aspectos da sua profissionalização eram passados pelas Corporações de Ofício. No período onde as crianças eram retratadas como adultos em miniaturas, a educação era garantida pela aprendizagem, graças à sobrevivência da criança ou jovem com adultos, os chamados mestres, que trabalhavam com oficiais e aprendizes. Os primeiros recebiam salários, já os aprendizes, crianças e jovens, recebiam comida e casa.

Mascaro (2011, p. 891) menciona como um dos acontecimentos de maior destaque na Revolução Industrial, no século XVIII, a utilização das forças motrizes distintas da força muscular, permitindo a evolução do maquinismo. A utilização do vapor transformou o processo de produção, tendo início a industrialização. O labor infantil foi utilizado em grande escala, não havendo diferenciação em relação à execução deste ou mesmo na sua duração diária em comparação aos adultos.

Sobre a época, Marx (1867) afirma em sua obra que o capitalismo pregava que o emprego das máquinas tornava desnecessária a força operária de homens adultos, assim, a utilização de mulheres e crianças tornaria um meio mais viável aos patrões, já que era uma mão de obra mais barata, além disso, a forte onda de desemprego que assolava a Europa nessa época obrigava todos os membros da família a se submeterem a exploração dos grandes industriais para garantir um mínimo para sua subsistência.

A exploração dos empregadores não encontrava limites, pois, estes não se submetiam a nenhuma norma jurídica estatal ou mesmo regra moral. A inexistência de regulamentação cumulada com a busca desenfreada pelo ganho causou a deterioração física e mental das crianças da época. Os trabalhos eram realizados em ambientes insalubres, perigosos, os acidentes de trabalho faziam parte da rotina nas indústrias, bem como, as doenças relacionadas com as atividades exercidas. Eram frequentes as mutilações, envenenamento e intoxicações com produtos químicos, além das dores musculares que atingiam o corpo das crianças utilizadas como operários.

Diante do exposto, o clima de descontentamento tomou conta da classe operária. Não se poderia mais permitir que esse clima de opressão, brutalidade e omissão estatal perdurassem. Diversas insurreições surgiram pleiteando direitos políticos e melhores condições de trabalho. O Estado não poderia mais se abster em interferir nas relações trabalhistas, uma regulamentação jurídica precisava surgir.

  1. PROTEÇÃO CONTRA O TRABALHO INFANTIL EM ÂMBITO INTERNACIONAL

Depois da Primeira Guerra Mundial verificou-se que um ambiente de paz se instauraria se houvesse harmonia social, assim surgia um cenário propício para gerar os direitos sociais. Dessa forma, em janeiro de 1919 se instalou a Conferência da Paz, em Paris, e dela surgiu o Tratado de Versalhes. Mascaro (2011, p. 132) relata que o Direito do Trabalho ganhou relevância com este tratado.

O Tratado de Versalhes, em defesa as condições de trabalho inerente aos infantes, mencionou que: “Art. 6º: A supressão do trabalho das crianças e a obrigação de impor aos trabalhos dos menores de ambos os sexos as limitações necessárias para permitir-lhes continuar sua instrução e assegurar seu desenvolvimento físico”.

Neste tratado o projeto de organização internacional do trabalho foi iniciado, na parte XVIII do mesmo encontramos a constituição jurídica da Organização Internacional do Trabalho, complementada posteriormente pela Declaração da Filadélfia (1944) e pelas reformas da Reunião de Paris (1945) da OIT.

Além disso, em 1924, a Declaração de Genebra dos Direitos das Crianças, foi aprovada pela Assembleia das Ligas das Nações, sendo este o primeiro instrumento internacional de proteção das crianças. Contudo, observamos que não surtiu efeitos por não ter força cogente aos Estados, já que a Organização das Nações Unidas - ONU só foi criada depois da Segunda Guerra Mundial – em 1945.

Com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, verificou-se uma evolução, ainda que mínima, na percepção de proteção dos menores, principalmente no que diz respeito ao direito à vida, liberdade, segurança, saúde, e principalmente o direito da família de escolher o gênero de instrução dada aos filhos.

A Declaração Universal dos Direitos da Criança, de 1959, elaborou dez princípios, entre eles, encontramos o Princípio IX que diz que as crianças devem ser protegidas do abandono e da exploração no trabalho, sendo incabível que estas comecem a trabalhar antes da idade mínima adequada, alertando que sob nenhuma hipótese será permitido o exercício de atividades que ponha em risco sua saúde ou educação, impedindo seu desenvolvimento físico, mental ou moral.

3.1. PRINCIPAIS CONVENÇÕES DA OIT SOBRE TRABALHO INFANTIL

Sabemos que primeira geração de direitos assegurou a todo ser humano o direito à liberdade de possuir direitos fundamentais e de desfrutar dos mesmos: direito à vida, direito à segurança; direito de ir e vir e, também, de permanecer; direito à expressão à de pensamentos, direito à propriedade; direito ao devido processo legal e presunção de inocência.

Dessa forma, era necessário que normas que garantissem condições mínimas para o bom desempenho do trabalho, que coibissem a exploração da classe trabalhadora que na maioria das vezes é hipossuficiente. Conforme a Procuradora do Trabalho, Marisa Tieman:

Nascia, então, a segunda geração de direitos, denominados, direitos sociais e econômicos, sendo consagrados com a criação da OIT um rol de direitos do trabalhador, tidos por fundamentais e obrigatórios para todos os estados signatários do Tratado. "Um tratado internacional de remarcado relevo consagrava, assim, o Direito do Trabalho como um novo ramo da ciência jurídica." (TIEMAN, 1999.)

Sobre a criação da OIT, a sobredita autora ainda menciona que sua criação foi o prenúncio de uma ação legislativa abarcando relações de trabalho, sob a égide política, uma vez que era necessário se buscar paz social, de forma internacional; humanitária, pois inúmeras eram as relações de trabalho injustas, que patrocinavam a miséria, a exploração, desrespeito e econômicas, sendo a concorrência internacional o principal impedimento para a melhoria das condições sociais em escala nacional.

Mascaro (2011, p. 133) assevera que a atividade normativa da OIT é composta por Convenções, Recomendações e Resoluções, sendo que algumas dependem de ratificação pelos Estados, outras não necessitam. As Convenções Internacionais são instrumentos de cumprimento obrigatório pelos Estados, que assumem o compromisso de realizar suas determinações. Já as Recomendações são normas da OIT que não obtiveram um número considerado de adesões para tornarem-se convenções.

Percebemos que OIT elaborou algumas convenções com o objetivo de estipular idade mínima para a admissão de crianças e adolescentes em emprego: A primeira delas foi a Convenção nº. 5, que orientou que a idade mínima para admissão de emprego em empresas industriais seria de quatorze anos, proibindo expressamente o trabalho de menores que possuíssem idade inferior a esta. Outras convenções da mesma natureza abordaram o assunto, modificando apenas a espécie de estabelecimento que aceitaria os infantes.

      A Convenção n°. 138, de 1973 surgiu a partir da percepção da necessidade de um instrumento geral que unificasse todo o assunto e que substituísse, pouco a pouco, os já divulgados, com o desígnio de erradicar o trabalho infantil.

     A referida convenção aduz que a idade mínima para a admissão de jovens em empregos não poderá ser a idade inferior à conclusão da escolaridade obrigatória, ou, em qualquer hipótese, não inferior a quinze anos. Permite, ainda, que no caso do país-membro cuja economia ou condição de ensino não forem eficazmente desenvolvidas seria lícito definir a idade mínima, inicialmente, em quatorze anos, sendo necessária prévia consulta às organizações de empregadores e de trabalhadores concernentes.

A Convenção nº. 182, de 1999, por sua vez, em seu artigo 2° considera criança toda pessoa que possui idade inferior a dezoito anos e assevera, em seu artigo 3º, que o termo “piores formas de trabalho infantil” compreende: 1) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão; 2) a utilização, recrutamento ou a oferta de crianças para a prostituição, a produção de pornografia ou atuações pornográficas; 3) a utilização, recrutamento ou a oferta de crianças para a realização de atividades ilícitas; 4) o trabalho que por sua natureza ou pelas condições que é realizado poderá ser prejudicial à saúde, à segurança ou à moral das crianças. O Brasil regulamentou a convenção nº. 182 através do Decreto 6.481/2008.

     Para complementar a Convenção nº. 182, surgiu a Recomendação nº. 190 da OIT, devendo estar aplicadas em conjunto. A mesma conceitua trabalhos perigosos como: 1) trabalhos em que criança fique exposta a abusos de ordem física, psicológico ou sexual; 2) trabalhos subterrâneos, ou embaixo de água, em alturas perigosas ou em ambientes fechados; 3) trabalhos realizados em máquinas ou ferramentas perigosas ou com cargas pesadas; 4) trabalhos realizados em ambientes insalubres, e por fim, 5) trabalhos com condições dificultosas, como horários prolongados ou noturnos e que os obriguem a permanecer no local do trabalho.

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  1. PROTEÇÃO CONTRA O TRABALHO INFANTIL NO ÂMBITO NACIONAL

Em termos de legislação nacional a proteção contra o trabalho infantil e o direito à profissionalização se encontra em diversos diplomas. Entre eles a Constituição Federal, o ECA e a CLT, conforme veremos a seguir.

  1. NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Nossa Carta Magna aborda a importância do trabalho definindo-o como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito em seu art. 1º, IV; um fundamento da ordem econômica, conforme o caput do art. 170 e, por fim, a base da ordem social, segundo seu art. 193, sendo o trabalho um segmento tão relevante para o desenvolvimento do nosso país, não poderia o legislador constituinte originário ser omisso em relação ao trabalho infantil.

A Constituição Federal inovou ao adotar a teoria internacional da Proteção Integral das crianças e adolescentes, criando em sua estrutura, dispositivos que tutelam o tratamento diferenciado a esses agentes em desenvolvimento determinando que fosse dever da família, da sociedade e do Estado assegurar os direitos fundamentais das crianças e adolescentes, como podemos denotar da leitura do caput do art. 227, senão vejamos:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL. Constituição 1988. Constituição Federal, Brasília.)

Estes direitos fundamentais devem ser aplicados com absoluta prioridade, principalmente em relação à natureza dos sujeitos a qual são direcionados, pessoas em desenvolvimento, contudo, com a devida observação ao princípio da razoabilidade.

O parágrafo único do sobredito art. 227 determina, ainda, que o Estado terá que agenciar programas de assistência integral, sendo admitida a colaboração de entidades não governamentais, devendo obedecer tais preceitos, a saber: 1) aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil; 2)

Como direito fundamental, o artigo 227 da Constituição Federal trouxe a profissionalização objetivando, tão somente, priorizar a educação e a habilitação para o mercado de trabalho de adolescentes visando uma melhor preparação quando estes estiverem na idade adulta, indo além, determinando que o

Nossa Lei Maior ainda trouxe importantes determinações acerca dos direitos trabalhistas, vedando, expressamente, o trabalho perigoso, insalubre e noturno aos menores de dezoito anos e de qualquer trabalho aos menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz.

Ao empregado adolescente, na faixa de dezesseis a dezoito anos, são ainda asseguradas, as seguintes condições de trabalho, em razão de se tratar de pessoa em desenvolvimento, elencadas no artigo 7° da Constituição Federal:

XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;

XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos.

XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; 

 XXXIV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso.

     Dessa forma, percebemos a grande influência da doutrina internacional da Proteção Integral que influenciou nossa legislação, transformando os direitos inerentes às crianças e adolescentes em verdadeiras garantias constitucionais.

4.2 ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA

A Lei nº. 8.069/1990 reserva o capítulo V, Título II, para a regulamentação do direito à profissionalização e à proteção ao trabalho das crianças e dos adolescentes além de, fazer menção à profissionalização em outros pontos, de forma menos específica.

Para o Estatuto, conforme seu art. 2°, considera-se criança aquela pessoa que tem doze anos incompletos e adolescente, a pessoa que tem entre doze e dezoito anos de idade. Segundo o autor Liberati (2008, p.14), a distinção entre criança e adolescente feita pelo ECA é baseada somente no critério da idade, não se considerando os aspectos psicológicos e sociais.

O art. 3° do Estatuto assegura que:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

De acordo com Veronesse apud Muller (2011) o rol de direitos elencados no art. 227 de nossa Carta Maior são direitos fundamentais, de grande importância, tanto por seu conteúdo como por sua titularidade, que precisam, obrigatoriamente, ser garantidos pelo ECA e a concretização dessa garantia deu-se com o Estatuto da Criança e Adolescente, que tem a tarefa de materializar o preceito constitucional.

O art. 60 reforça o mandamento constitucional sobre proibição de trabalho aos infantes que possuem idade menor que quatorze anos, vejamos: É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz.

Contudo, simples leitura do artigo nos traz a errônea certeza que o trabalho pode ser permitido aos adolescentes que ainda não possuem quatorze anos, estando estes sobre a aprendizagem, contudo é um equívoco tal interpretação, é proibido qualquer trabalho antes dos quatorze anos.

Os preceitos encontrados no art. 62 e seguintes trazem o entendimento sobre aprendizagem, considerando-a como formação técnico-profissional ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação de educação em vigor. Assegura ainda, uma bolsa aprendizagem e todos os direitos trabalhistas e previdenciários.

Para Maranhão citado por Liberati (2008, p. 55) o aprendiz é aquele que trabalha e aprende simultaneamente, uma arte ou um ofício, sob a direção de outra pessoa.

É garantido pelo ECA ao adolescente em condição de aprendiz que sua formação técnico-profissional obedeça aos seguintes princípios: I - garantia de acesso e frequência obrigatória ao ensino regular; II - atividade compatível com o desenvolvimento do adolescente; III - horário especial para o exercício das atividades.

Dessa forma, é incabível que o aprendiz não frequente realmente a escola durante seu processo de aprendizagem, já que esta uma norma expressa do ECA, e também, uma condição. Além disso, a atividade que o mesmo for desempenhar necessita que seja compatível com sua condição de ser em desenvolvimento, afinal, o objetivo da aprendizagem é tão somente prepará-lo para a vida profissional.

O ECA foi leal a doutrina da proteção integral, assegurando às crianças e adolescentes os direitos inerentes à pessoa humana, da mesma forma, prezou pelos direitos à educação e profissionalização, quando regula instrumentos de proteção para esse fim, como a aprendizagem.

4.3 CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS – CLT

A CLT tutela em seu Capítulo IV as normas de proteção ao trabalho do menor, contudo alguns desses artigos perderam a vigência em razão da promulgação da Constituição Federal e outras leis infraconstitucionais, como a modalidade de trabalho do menor jornaleiro.

O art. 402, após sofrer alteração pela Lei n. 10.097/2000, passou a conceituar como “menor”, para a Justiça do Trabalho, aquele que tem de quatorze a dezoito anos.

Segundo Mascaro (2011, p. 896) o ordenamento jurídico pátrio prevê diversas formas lícitas de trabalho do menor, salientando que nem todas essas podem ser consideradas como relação de emprego, tais como o menor empregado, menor aprendiz empregado, menor aprendiz não empregado, trabalho familiar e menor jornaleiro.

Aduz ainda, o mesmo autor que o gênero trabalho do menor refere-se a mais de uma modalidade, a primeira delas seria o menor empregado, regido pela Constituição Federal e pela CLT. O menor empregado trabalha dentro de uma relação de emprego conforme prevê os artigos 2º e 3º da CLT, ou seja, presta pessoalmente serviço para empregador/empresa sob a direção e subordinação destes, de maneira não eventual, mediante remuneração.

O mesmo deve estar entre dezesseis e dezoito anos, conforme estabelece o art. 7º, XXXIII da CF. Além disso, a CLT preza pela anotação da Carteira de Trabalho e Previdência Social, vejamos:

 Art. 415 - Haverá a Carteira de Trabalho e Previdência Social para todos os menores de 18 anos, sem distinção do sexo, empregados em empresas ou estabelecimentos de fins econômicos e daqueles que lhes forem equiparados.

O art. 423 alude que na CTPS do adolescente somente constará informações sobre a data da admissão, sobre o salário, sobre as férias e a data da saída.

O art. 411 e seguintes tratam da jornada de trabalho do “menor” empregado, vejamos:

Art. 411 - A duração do trabalho do menor regular-se-á pelas disposições legais relativas à duração do trabalho em geral, com as restrições estabelecidas neste Capítulo.

 Art. 412 - Após cada período de trabalho efetivo, quer contínuo, quer dividido em 2 (dois) turnos, haverá um intervalo de repouso, não inferior a 11(onze) horas.

De acordo com o art. 405, I da CLT também é proibido o trabalho do menor em locais insalubres.

O art. 405, II da Consolidação também veda atividades de menores em lugares prejudiciais à sua moralidade e os considerados nocivos ao menor, o parágrafo 3º define quais os locais e alguns tipos de atividades prejudiciais desse tipo, vejamos:

 § 3º Considera-se prejudicial à moralidade do menor o trabalho: 

 a) prestado de qualquer modo, em teatros de revista, cinemas, buates, cassinos, cabarés, dancings e estabelecimentos análogos;

 b) em emprêsas circenses, em funções de acróbata, saltimbanco, ginasta e outras semelhantes; 

 c) de produção, composição, entrega ou venda de escritos, impressos, cartazes, desenhos, gravuras, pinturas, emblemas, imagens e quaisquer outros objetos que possam, a juízo da autoridade competente, prejudicar sua formação moral;

 d) consistente na venda, a varejo, de bebidas alcoólicas.

É vedado também, no parágrafo 2º, o trabalho exercido nas ruas, praças e outros logradouros públicos, salvo autorização prévia do Juiz de Menores, lê-se Juiz do Trabalho depois da EC 45/2004, contudo é entendimento do TST que essa exceção não foi recepcionada pela atual Constituição Federal, pois está incluída na lista TIP – Piores Formas de Trabalho, pois coloca a criança/adolescente a mercê dos perigos urbanos.

O art. 407 assevera que observado pela autoridade competente que o trabalho executado pelo menor é prejudicial à sua saúde, ao seu desenvolvimento físico ou à moral poderá obrigá-lo a abandonar o serviço, ou se couber, deve a empresa providenciar todas as facilidades para mudá-lo de função. Se observado também pelo responsável do adolescente o mesmo poderá pleitear a extinção do contrato de trabalho.

O art. 427, caput e parágrafo único, obriga o empregador a conceder ao menor tempo necessário para a frequência às aulas. Assegurando que os estabelecimentos situados em localidade onde a escola mais próxima tenha distância superior a dois quilômetros e que contenha mais de trinta menores analfabetos, de quatorze a dezoito anos, serão obrigados a manter local apropriado que ministre instrução primária. É garantido também ao menor salário mínimo integral, se for o caso, salário profissional, ainda que este seja menor de dezesseis anos de idade, uma vez que, ninguém pode enriquecer ilicitamente à custa do esforço alheio.

Já menor aprendiz empregado éo trabalhador com idade entre quatorze e vinte e quatro anos, matriculado em um curso profissionalizante e que tenha sido contratado para desempenhar um trabalho relacionado com seu curso.

A relação jurídica é regida pelo art. 428 da CLT e também pelas Recomendações nº 60 e nº 117, da OIT. O Decreto nº 5.598/2005 regulamenta a aprendizagem. É importante salientar que deve-se considerar os preceitos trazidos pelo ECA e que falaremos a seguir do mesmo instituto jurídico já citado anteriormente, trazendo à discussão alguns detalhes impostos pela CLT que melhor tutelam o a aprendizagem.

Conforme o doutrinador Pinto (2009, p. 613), os Decretos-leis nº 4.048/1942 e nº 8.621/1946 criaram, respectivamente, o Sistema Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI e o Sistema Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC, onde o primeiro visa organizar e administrar a aprendizagem para o setor industrial, estabelecendo uma quota de 5% de aprendizes em relação aos empregados de cada estabelecimento que demandasse formação profissional. Já o segundo, tem o objetivo de formar aprendizes para o setor comercial instituindo que para empresas com mais de nove empregados deveriam admitir menores aprendizes em 10% sobre o total de empregados de todas as categorias em serviço no estabelecimento.

 O art. 428 da CLT dispõe que:

Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.

 O aprendiz deve executar com zelo e diligência, as tarefas necessárias para a formação, sendo-lhe assegurado, no mínimo, salário mínimo hora, salvo condição mais favorável ao menor, como dispõe o art. 428, parágrafo 2º da CLT.

 O parágrafo único do art. 428 da CLT elenca como requisitos do contrato de aprendizagem: 1) a devida anotação na CTPS pelo empregador. Sendo válido somente o contato de aprendizagem por escrito; 2) matrícula e frequência do aprendiz em escola; 3) inscrição em programa de aprendizagem desenvolvido sob a orientação de entidade qualificada em formação técnico-profissional metódica.

Pinto (2009, p. ) aduz que a falta caso o aprendiz não frequente a escola estaria descaracterizado o contrato de aprendizagem.

O art. 430, II da CLT aduz que a contratação do aprendiz poderá se dá efetivada na empresa onde se exercerá as atividades ou nas Escolas Técnicas de Educação ou mesmo em entidades sem fins lucrativos, quando os Serviços Nacionais de Aprendizagem não oferecerem cursos ou ofereça vagas insuficientes, somente nesse caso.

O contrato de aprendizagem não poderá ser estipulado por mais de dois anos, com exceção de aprendizes portadores de deficiência, onde não há prazo máximo. Caso o contrato se prorrogue será considerado contrato por prazo indeterminado, como prevê o art. 451 da CLT.

Quanto à duração do trabalho, o art. 432 e seu parágrafo 1º da CLT estipula que a atividade do aprendiz não excederá seis horas diárias, sendo vedadas a prorrogação e a compensação de horários, contudo para os aprendizes que já completaram o ensino fundamental poderá haver uma ampliação para de oito horas diárias, se nelas forem computadas horas destinadas à aprendizagem teórica.

Encontramos no art. 433 da CLT as formas de extinção antecipada do contrato de aprendizagem, que poderá ser: 1) pelo desempenho insuficiente ou não adaptação do aprendiz; 2) falta disciplinar grave; 3) ausência injustificada à escola, que implique perda do ano letivo; 4) a pedido do aprendiz.

Mascaro (2011, p. 896) assevera que o menor aprendiz não empregado, regido pelo art. 431 da CLT, que é aquele aprendiz contratado para prestar atividades em entidades sem fins lucrativos, que objetivem a assistência ao adolescente e à educação profissional, devidamente registrada no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, não caracterizando relação de emprego, e sim, relação especial de aprendizagem.

A CLT faz menção sobre o trabalho familiar, com previsão no art. 402, parágrafo único, que o denomina como aquele em que o menor exerce atividades em oficinas onde trabalham exclusivamente pessoas de sua família, estando sob a direção do pai, mãe ou tutor.

Por se tratar de cooperação familiar inexiste aqui uma relação de emprego. É comum famílias proprietárias de pequenos empreendimentos comerciais, muitas vezes localizados na própria residência, ter crianças e/ou adolescentes atendendo ou mesmo entregando pequenas mercadorias a clientes, contudo para salvaguardar sua moral, saúde e integridade física algumas autoridades, como Conselho Tutelar Municipal, proíbem as crianças e adolescentes de exercerem essa atividade em locais que tenha a circulação de bebidas alcoólicas, cigarros e outros agentes nocivos.

Por fim, temos a figura do menor jornaleiro, previsto no art. 405, parágrafo 4º da CLT, que visa proteger o menor que trabalha em ruas, praças ou logradouros públicos, devendo ser exercida perante instituições de amparo aos menores.

A CLT foi aprovada pelo Decreto-Lei nº. 5.452 de 1943, portanto, posterior à adoção da Doutrina da Proteção Integral. Dessa forma, o legislador não se preocupou em criar normas que visassem erradicar o trabalho infantil, o “beneficiando” apenas com normas mais maleáveis em relação à sua condição de não adulto. Mesmo assim, após CF/1988 e do ECA em 1990, houve revogações de institutos que prejudicavam os direitos desses agentes.

5RECONHECIMENTO DO DIREITO À PROFISSIONALIZAÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA

A jurisprudência já reconheceu o direito da criança e adolescentes à profissionalização, assim como os demais direitos fundamentais inerentes a todos os seres humanos, conforme dispõe a Constituição Federal, vejamos:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. GUARDA PROVISÓRIA. DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL. INTERESSE DO MENOR. POSSIBILIDADE. MEDIDA LIMINAR. VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES. NECESSIDADE. O ART. 227, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, AO ADOTAR A DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL, ESTABELECE QUE É DEVER DA FAMÍLIA, DA SOCIEDADE E DO ESTADO ASSEGURAR À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE, COM ABSOLUTA PRIORIDADE, O DIREITO À VIDA, À SAÚDE, À ALIMENTAÇÃO, À EDUCAÇÃO, AO LAZER, À PROFISSIONALIZAÇÃO, À CULTURA, À DIGNIDADE, AO RESPEITO, À LIBERDADE E À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA, ALÉM DE COLOCÁ-LOS A SALVO DE TODA FORMA DE NEGLIGÊNCIA, DISCRIMINAÇÃO, EXPLORAÇÃO, VIOLÊNCIA, CRUELDADE E OPRESSÃO. A GUARDA TEM POR FINALIDADE REGULARIZAR A POSSE DE FATO, PODENDO SER, EXCEPCIONALMENTE, DEFERIDA PARA ATENDER A SITUAÇÕES PECULIARES. É SEMPRE DEFERIDA EM FAVOR DA CRIANÇA, NÃO SENDO DE SUA ESSÊNCIA A PERDA DO PODER FAMILIAR, PODENDO COM ELE CONVIVER OU DELE SE DESTACAR. PARA A CONCESSÃO DE LIMINAR NO AGRAVO DE INSTRUMENTO É REQUERIDA A COMPROVAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA DO DIREITO PLEITEADO; SUFICIENTE PARA LEVAR O JUIZ AO ENTENDIMENTO DE QUE À PARTE CABE A TITULARIDADE DO DIREITO MATERIAL DISPUTADO E, TAMBÉM, A VEROSSIMILHANÇA; A RELAÇÃO DE PLAUSIBILIDADE COM O DIREITO INVOCADO, OU SEJA, COM O FUMUS BONI IURIS. O FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO, POR SUA VEZ, CARACTERIZA-SE NO PERICULUM IN MORA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

(TJ-DF - AGI: 20130020174160 DF 0018292-13.2013.8.07.0000, Relator: ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, Data de Julgamento: 30/10/2013, 6ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 19/11/2013 . Pág.: 152)

O julgamento acima proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal exalta a importância da adoção do Princípio da Doutrina Integral, que assegura que o Estado, a sociedade e à família têm o dever de proteger às crianças e adolescentes de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e proteção, assegurado seus direitos.

Temos entendimentos ainda, que asseguram que os adolescentes devem ser assistidos por curador quando for percebido que existem riscos inerentes ao seu direito à educação e à profissionalização, ainda que eventualmente. Deve-se levar em consideração sempre o princípio do Melhor Interesse do Menor.

PEDIDO DE CURATELA - ADOLESCENTE ASSISTIDA PELA DEFENSORIA PÚBLICA - CURATELA ESPECIAL ADMINISTRATIVA - CABIMENTO - ARTIGOS 142 E 148 DO ECA - DIREITO À PROFISSIONALIZAÇÃO - MELHOR INTERESSE DO MENOR - RECURSO DESPROVIDO. 1. Nos termos dos artigos 142 e 148 do ECA, compete ao juízo da Infância e Juventude a nomeação de curador ao menor, ainda que eventual, sendo aferível o risco, no caso, aos direitos de profissionalização e educação, contrariando os interesses da adolescente.

(TJ-MG - AC: 10024121146757001 MG , Relator: Teresa Cristina da Cunha Peixoto, Data de Julgamento: 31/01/2013, Câmaras Cíveis Isoladas / 8ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 14/02/2013)

A jurisprudência trabalhista defende que à modalidade de trabalho do menor – aprendizagem - devem ser aplicadas de forma conjunta com direito fundamental à proteção integral e à profissionalização.

RECURSO DE REVISTA DA UNIÃO. CONTRATAÇÃO DE APRENDIZES. INCLUSÃO DOS EMPREGADOS MOTORISTAS NA BASE DE CÁLCULO DA COTA DE APRENDIZAGEM. POSSIBILIDADE. DIREITO À PROFISSIONALIZAÇÃO. PRINCÍPIO DA MÁXIMA EFETIVIDADE. O art. 429 da CLT dispõe que os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional. Nesse contexto, a base de cálculo do percentual mínimo estipulado para contratação de aprendizes deve ser interpretada em conjunto com o direito fundamental à proteção integral e à profissionalização do adolescente e do jovem. Diante da previsão expressa, no art. 10, § 2º, do Decreto nº 5.598/05, de que mesmo as atividades proibidas para menores devem ser computadas na base de cálculo para contratação de aprendizes, uma solução correta fundamentada nos direitos individuais é a de que não há redução do número de aprendizes em função da atividade (insalubre ou perigosa) eventualmente exercida na empresa, mas tão somente a limitação de idade do aprendiz contratado. Nesse contexto, a contratação de aprendizes para atividades insalubres ou perigosas está limitada aos jovens entre 18 e 24 anos, sendo que a contratação de jovens aprendizes na função de motorista, na qual se exige a idade mínima de 21 anos, está limitada aos aprendizes maiores de 21 anos e menores de 24 anos. Recurso de revista conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA DO SINDICATO. CONTRATAÇÃO DE APRENDIZES. INCLUSÃO DOS EMPREGADOS COBRADORES NA BASE DE CÁLCULO DA COTA DE APRENDIZAGEM. POSSIBILIDADE. Não viola o disposto nos artigos 5º, I, da CF e 428 da CLT decisão que entende pela inclusão dos cobradores na base de cálculo da cota de aprendizagem, limitando a contratação aos maiores de 18 anos por razões de segurança, uma vez que tais profissionais lidam diariamente com valores em ambiente externo . Recurso de revista não conhecido.

(TST - RR: 10241120115040012  1024-11.2011.5.04.0012, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 23/10/2013, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 25/10/2013)

Especificamente, no julgado acima, o Tribunal Superior do Trabalho no teor da decisão do Recurso de Revista, a 6º Turma entendeu que adolescentes que não possuem dezoito anos completos não podem trabalhar em atividades insalubres e perigosas, conforme prevê a Constituição Federal, asseverando que somente aprendizes que tenham entre dezoito anos e vinte quatro anos de possam trabalhar nesses locais prejudiciais à sua saúde e segurança.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observamos que é vasta a proteção jurídica contra o trabalho infantil, é ela que consequentemente oferece a inúmeros jovens a oportunidade de ter uma infância e juventude saudáveis, sendo preparados para desenvolver suas habilidades profissionais na idade cabível.

Nosso ordenamento jurídico foi sensível às reivindicações dos órgãos internacionais e de outros instrumentos legislativos que não aceitavam mais a exploração da mão de obra infantil em precárias condições de trabalho, sem acesso ao ensino e sem proteção da sociedade, tais como a ONU, Declaração de Genebra dos Direitos da Criança, Declaração Universal dos Direitos Humanos, Declaração Universal dos Direitos da Criança, Tratado de Versalhes, e mais especificamente, as Convenções da OIT.

 De maneira positiva, desde a promulgação da nossa Constituição Federal, em 1988, ao perceber a importância do trabalho em todos os aspectos da vida humana, nosso país deu todo suporte para que leis infraconstitucionais, como o ECA, considerando como trabalho infantil aquele exercido antes da idade mínima permitida, ou seja, antes dos dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, aos quatorze anos. Além disso, o art. 227 da CF ao cristalizar a Doutrina da Proteção Integral foi crucial para a defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes por parte de toda a sociedade.

 O ECA que também abraçou o referido princípio da Proteção Integral criou instrumentos que garantam mais eficazmente o direito amplo à formação profissional dos adolescentes, de maneira benéfica a sua saúde, integridade física e moral.

O referido princípio também refletiu na CLT trouxe algumas modificações, como a extinção de algumas modalidades de trabalho do menor, o retirando da vulnerabilidade das ruas.

É certo que, mesmo nossa legislação sendo tão rica e contando com inúmeras influências benéficas, a exploração, a desproteção e a vulnerabilidade de crianças, adolescentes e jovens ainda persiste. E uma observação superficial nos leva a perceber que um conjunto de fatores é responsável por esse lamentável fato, tais como a falta de fiscalização eficaz; a municipalização e interiorização de campanhas educativas que visem proibir e coibir o trabalho infantil ou irregular de crianças e adolescentes, bem como, melhores esclarecimentos sobre as já existentes; um maior comprometimento entre os setores para desenvolver políticas públicas, etc. Por fim, a erradicação do trabalho infantil ainda é algo esperado para o futuro.

REFERÊNCIAS

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BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de Revista Nº. 1024-11.2011.5.04.0012. Plenário. Relator: Aloysio Corrêa da Veiga. Julgamento: 23/10/2013. Disponível em: <http://tst.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24351705/recurso-de-revista-rr-10241120115040012-1024-1120115040012-tst>. Acesso em 29 maio 2013.

CAIRO JR, José. Curso de Direito do Trabalho: Direito Individual e Coletivo do Trabalho. 6.ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2011.

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CONSTITUIÇÃO DA OIT. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/decent_work/doc/constituicao_oit_538.pdf>. Acesso em: 29 maio 2013.

LIBERATI, Wilson Donizete. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 10. Ed. São Paulo. Malheiros, 2008.

LIMA, Débora Arruda Queiroz. Evolução da legislação que protege a criança do trabalho infantil. Jus Navigandi. Disponível em: <HTTP://jus.com.br/artigos/11163>. Acesso em: 10 out. 2013.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 25. Ed. São Paulo: Atlas, 2009.

MARX, Karl. O capital. São Paulo: Nova Cultural, 1988. Coleção Os economistas.

MULLER, Crisna Maria. Direitos Fundamentais: a proteção integral de crianças e adolescentes no Brasil. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 89, jun 2011. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9619>. Acesso em 10 out. 2013.

NASCMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito: história e teoria geral do trabalho: relações individuais e coletivas do trabalho. 26. Ed. . São Paulo: Saraiva, 2011.

RECENA, Luiz. Trabalho infantil, uma realidade nefasta. Disponível em: <http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/trabalho-infantil-uma-realidade-nefasta>. Acesso em: 28 maio 2014.

TIEMAN, Marisa. Trabalho Educativo pode ser trabalho Produtivo? Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_05/trab_educativo.htm>. Acesso em: 10 out. 2013.

Sobre a autora
Laryce Mayara de O. Araújo

Advogada. Pós-Graduanda em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela UNIRN. Bacharela em Direito pela Faculdade de Ciência e Tecnologia Mater Christi, Mossoró/RN.

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Artigo de Conclusão de Curso.

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