O novo Código Civil brasileiro: Em busca da “ética da situação”
Introdução
O novo código, contendo 2046 artigos, é resultado do anteprojeto realizado pela comissão de juristas emcabeçada por Miguel Reale. Com idéias da descodificação civil (advinda da Europa) e contrário ao “individualismo possessivo”. Marcado por suas preocupações sociais, promoveu mudanças no Direito da Família, reintroduziu o Direito das Obrigações, rejeitou o formalismo excessivo do código civil de 1916.
I. Estrutura e sistema do novo código civil
A. A divisão em parte geral e parte especial
Adotando o “plano germânico”, é dividido em parte geral e parte especial, sendo formado por cinco livros. O livro I diz respeito ao Direito das Obrigações, o livro II trata do Direito Empresarial, o livro III versa sobre o Direito das coisas (Direito Real), o livro IV traz o Direito de Família e o livro V finaliza com o Direito das Sucessões.
A Parte Geral é quem opera a ligação entre todas as partes que compõe a estrutura codificada. Promove um “sistema de estrutura móvel”, senda esta parte a que assegura a unidade do código. Nesta parte vem pormenorizado as disposições gerais aplicáveias ás pessoas. A técnica utilizada na sua redação foi a das cláusulas gerais, que permitem tanto a ligação intra-sistemática quanto a conexão intersistemática e mesmo a extra-sistemática.
No livro II, na regulação dos bens, o novo código inova ao distinguir os acessórios e as pertenças. Já o livro III trata dos Fatos Jurídicos, e é neste livro que se encontram as maiores inovações do novo código, trata sobre Negócios Jurídicos (inclusive seus defeitos) e do “estado de perigo”.
A Parte Geral encerra com as regras relativas á prova dos fatos jurídicos, regulamentando a confissão e admitindo quaisquer reproduções mecânicas e eletrônicas como prova. É importante ressaltar que a estrutura calcada numa Parte Geral e numa Parte Especial promove certa unidade lógica e conceitual, denominada de “diretriz sistemática”.
O novo Código distingue as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos (associações) das com fins econômicos (sociedades).
No livro IV destacam-se grandes inovações no Direito da Família, sendo substituido o pater poder pelo poder da família, ou seja homens e mulheres possuem igual importância como chefes de família e a regulação da união estável.
B. A noção de sistema que acolhe: o código como “eixo central” do sistema de direito privado
O antigo código civil, baseado nos çodigos totais oiticentistas eram notáveis pelo seu preciosismo linguístico e imobilidade. O projeto do noco código adota diversos pressupostos metodológicos, que atuam atravéz de duas soluções: a primeira é a responsabilidade da jurisprudência (numerosas cláusulas gerais) e a segunda é a tarefa do legislador de editar leis, ou seja, dando maior mutabilidade aos imperativos de ordem social e econômica, fazendo uma ligação dos conceitos genéricos (da norma) com os valores sociais.
1. Pressupostos metodológicos
Permite a constante incorporação (e solução) de novos problemas. Sendo um código não-totalitário tem janelas abertas para a mobilidade da vida, pomtes que ligam a outros corpos normativos (possuindo “conceitos jurídicos indeterminados”). Uma das funções das cláusulas gerais é a de permitir a mobilidade externa do sistema (como fórmulas genéricas e flexíveis). Adicionando a interpretação das normas conceitos integradores da compreensão ética (“ética da situação”).
É incorporado o conceito, no novo código, de vários papeis sociais do ser humano, com o princípio constitucional da pessoa humana, aspecto exemplificado no próximo tema.
2. Um caso exemplar de “abertura e mobilidade” do sistema: os danos á pessoa
O novo código preve e viabiliza a permanente e crescente reconstrução do modelo jurídicoda responsabilidade civil por danos á pessoa, ou danos aos direito de personalidade. É previsto além de uma tutela indenizatória, uma tutela preventiva da imagem (devido entre outras coisas á industria do marketing). Foi inovado, portanto, o Direito Geral da Personalidade (o valor da pessoa humana como “valor fonte de todos os valores” ou “valor fonte do ordenamento”).
II. O conteúdo do novo código em suas diretrizes fundamentais
Foi idealizado por Miguel Reale quarto diretrizes fundamentais: a sistematicidade (ja abordada), a operabilidade (tabém ja abordada), a eticidade e a da sociabilidade. Falaremos destas duas últimas, a saber que as regras dotadas de alto conteúdo social são fundamentalmente éticas, assim como as normas éticas têm afinidade com a sociabilidade.
A. A eticidade como fundamento das normas civis
Direito civil é o direito das pessoas que vivem na cive, em comunidade, traça as regras para a pessoas enquanto pessoas, ou seja, dos homens enquanto homens. O conteúdo do direito privado está muito proximo ao valor dado ás pessoas e suas relações com os demais bens da vida, seja de patrimonio ou nao, nas esferas do ser (direito da personalidade e direito pessoal de família), do ter (direito de propriedade) e do agir (direito das orbigações, dos contratos e da empresa).
Portanto o direito passa a tutelar as regras da própria existência humana em sociedade, ressaltando a dimensão ética das normas jurídicas. Então o direito civil reassume a sua direção etimológica e do fireito dos indivíduospassa a ser considerado o direito dos civis, dos que possuem os valores da civilidade. Cria-se assim a exigência da eticidade que deve pautar as relações extrapatrimonias entre os homens.
O novo código civil traz uma norma de comportamento leal, com a valorização dos pressupostos éticos, como a proteção da confiança, o mandamento de equidade e o dever de proporcionalidade. A boa-fé objetiva vem posta como princípio central do moderno Direito das Obrigações. Este pode ser interpretado como uma norma impositiva de limites ao exercício de direitos subjetivos.
Já o princípio da confiança domina o Direito Empresarial, impondo aos administradores deveres de tutela e de consideração aos reais interesses dos socios e da sociedade. Aqui o princípio da boa-fé se transforma em princípio da consideração.
Percebe-se portanto que no novo código civil a equidade que é tradicionalmente associado ao direito natural se transforma em norma posta, em direito positivo. Alguns direitos, como o da propriedade, são de dificil classificação entre éticos e sociais, tendo que ser regidos pelo princípio da boa-fé e da função social (próximo tema).
B. A sociabilidade como característica do Direito Civil contemporâneo
No estudo da socialidade está a verdadeira função social do direito, sendo a função do direito civil transforma-lo em concreto instrumento de ação. Essa instrumentalização ocorre em três específicos domínios: o do contrato, o da posse e o da propriedade.
1. A função social da propriedade e da posse.
Para contrapor a codificação oiticentista, extremamente individualista, o novo código civil está pautado na ideologia de que se deve atribuir uma função social á propriedade (aspecto advindo do movimento da funcionalização dos direitos subjetivos). Busca-se um novo equilíbrio entre os interesses dos particulares e as necessidades da coletividade.
Historicamente atribuiu-se limites ao poder absoluto dos proprietários devido aos abusos de direitos (feitos por eles) em cima dos trabalhadores e outros. Transformando a noção de direito subjetivo em real noção de “função social”, a propriedade não mais tem uma função social mas sim é uma finção social. Gerando a idéia de que o direito privado deve estar orientado pelo conceito de direito subjetivo, enquanto poder reconhecido a uma pessoa de impor a sua vontade ás demais.
Conhecido como “efetivas utilidades”, ou em outras palavras, a função social exige a compreensão da propriedade privada como um conjunto complexo de situações jurídicas reais, que englobam um conjunto de situações jurídicas subjetivas., nas quais se encontram tanto graus de publicismo quanto de privatismo. Isso explica que a propriedade não ppode ser considerada apensa como um bem do direito privado nem como um bem do direito público mas sim um aglomerado complexo de ambos. Caracterizando essa propriedade não so como a propriedade de terra ou dos bens de produção mas também a propriedade imaterial e a propriedade empresarial. Não sendo apenas atribuidas funções negativas de limitações mas também positivas, de deveres, perante a propriedade.
Já no assunto de função social de posse, deve ser dito que o novo código possui não apenas uma concepçào abstrata mas sim uma noção autônoma. Além de mera ocupação do bem, conhecida como “posse qualificada”, há também a “posse-trabalho”, na qual vem acompanhada um ato criador do trabalho humano, que deve ser mais protegida do que a primeira.
2. A função social do contrato
No Direito dos Contratos, em conjunto com a boa-fé e a probidade, vigora o princípio: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função socialdo contrato”. Isso significa que os contratos utrapassam a mera esfera dos interesses individuais, pois está atribuido a eles também, e ao exercício do poder negocial, funções negativas (de limitação) e positivas (de deveres).
Os contratos sendo o instrumento fundamental de circulação de riquezas, ou de tranferência de riquezas, atual ou em potencial, desempenha sim uma função social. Visto que a circulação de riqueza, seja em pequena ou larga escala, não interessa somente a particulares mas a todos.
III. Bibliografia
· MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes teóricas do novo código civilbrasileiro. Editora Saraiva. São Paulo. 2002.