Ações relativas ao cheque

25/04/2016 às 16:59
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Esse artigo trata especificamente de uma espécie de título de crédito, qual seja o cheque. Aqui, destacar-se-á, as ações relativas ao cheque que dividem-se em: ações movidas por falta de pagamento e ações que se direcionam para a relação que o originou.

1 INTRODUÇÃO

Os títulos de crédito são documentos que representam um direito creditício, são necessários para que tal direito se realize. Surgiram diante da necessidade do mercado de promover uma maior e mais rápida circulação de riquezas e se diferenciam dos demais documentos que representam uma obrigação por conta de três principais características, destacadas por Ulhoa, quais sejam a sua referência única a relações creditícias, sua fácil cobrança em juízo e a sua negociabilidade. São exemplos mais comuns de títulos de crédito, a letra de câmbio, a nota promissória, o cheque e a duplicata. Neste trabalho dar-se-á destaque ao cheque, observando alguns aspectos do seu conceito, contudo dando enfoque nas ações relativas à ele.

As ações relativas do cheque, em geral, são promovidas quando há algum problema quanto ao cumprimento da obrigação contida nele, ou seja, quando não há o devido pagamento do direito creditício advindo de uma relação jurídica que o originou.

As ações movidas por falta de pagamento, ou seja, que visam diretamente a cobrança do crédito são: a ação de execução, a ação de enriquecimento indevido (estas duas também classificadas como ações cambiais), ação monitória e a ação regressiva, sendo esta uma ação acessória, secundária, de execução exclusiva entre os coobrigados pelo pagamento do crédito.

As ações que se direcionam não mais para o direito contido no cheque, mas para a relação que o originou são: a ação ordinária de cobrança e a ação causal, sobre esta discute-se se ela é uma outra ação relativa ao cheque ou se na verdade é a mesma ação ordinária de cobrança. Neste viés, faz-se uma ressalva se, na verdade a ação de enriquecimento indevido também não seria voltada para a relação jurídica que originou o cheque ao invés do título.

O aspecto essencial para promoção de cada uma destas ações é a observância dos prazossob pena da perda total da pretensão jurídica.

2 Cheque

O cheque é uma ordem de pagamento à vista como preceitua o artigo 32 da Lei 7.357/1985 conhecida como Lei do Cheque (LC). Parte da doutrina caracteriza o cheque como um título impróprio, por possuir apenas algumas características pertinentes aos títulos de crédito, faltando-lhe prazo de pagamento e crédito, justamente por ser, como acima mencionado, ordem de pagamento à vista. Fábio Ulhoa Coelho menciona inclusive que Pontes de Miranda desconsidera totalmente sua existência como título de crédito, considerando-o simplesmente como um “instrumento de apresentação e resgate”, mas destaca que a maioria dos autores brasileiros o considera como sendo um título próprio estando sujeito a todas as regras de circulação e cobrança do direito cambiário.

O cheque traz algumas particularidades se comparado aos demais títulos de crédito, pois não requer aceite e é um título de modelo vinculado, ou seja, só pode ser emitido em papel fornecido pelo banco além disso,o sacado sempre será a instituição financeira.

O artigo 585, inciso I do Código Civil coloca ainda o cheque como um título de execução extrajudicial, mas a despeito desta classificação a Lei do Cheque prevê uma série de ações de prazos prescricionais para que haja satisfação do credor no que diz respeito ao seu crédito.As ações relativas ao cheque prelecionadas tanto na Lei do Cheque, quanto nos códigos civil e de processo civil são: ação cambial (de execução e enriquecimento ilícito), ação monitória, ação ordinária de cobrança, ação causal e ação regressiva.

3 Ações relativas ao cheque

O cheque, para que seja feita sua liquidação, deve ser apresentado ao sacado, banco ou instituição financeira, dentro do prazo determinado pela Lei do Cheque, que corresponde a 30 dias se de mesma “praça” e 60 dias se de “praças” diferentes. Se no momento em que o credor apresentar o cheque, não conseguir receber o que lhe é devido, resta a este executar as ações relativas ao cheque para garantir o seu “crédito”.

3.1 Ação Cambial

No momento em que o credor apresenta o cheque ao sacado para fazer a liquidação e este verifica que não existe fundos na conta do emitente para compensá-lo, pode o credor promover a cobrança judicial imediatamente fazendo o protesto do título no prazo de 30 dias (título da mesma praça) ou 60 dias (título de praça diferente). Nesta situação, independente de que se faça o protesto ou não, o direito de cobrança judicial é mantido pelo simples fato de que a declaração do sacado, atestando a insuficiência de fundos, ter o mesmo valor que o protesto. Tal situação não se aplica para situações de fins extracambiais, somente para conservação do direito de execução contra codevedores e avalistas.

Através da ação cambial, o demandado argui em sua defesa matérias que correspondam à sua relação com o demandante, fazendo a cobrança do que lhe é devido por meio da ação de execução e da ação de enriquecimento indevido.

3.1.1 Ação de execução

A ação de execução pode ser proposta, seis meses depois de findo o prazo de apresentação do cheque pouco importando a data em que este foi apresentado ao sacado ou a data de sua devolução. A regra da contagem do prazo prescricional tem exceções quando se trata do cheque pós-datado se apresentado antes do prazo escrito nele, pois a aplicação da regra geral beneficiaria o credor que descumpriu a obrigação de apresentar o título apenas na data combinada, logo os seis meses serão contados como se o saque tivesse sido feito na data da primeira apresentação ao sacado. A execução, como preleciona o artigo 47 da Lei do Cheque, pode ser feito “contra o emitente e seu avalista” e “contra os endossantes e seus avalistas, se o cheque apresentado em tempo hábil e a recusa de pagamento é comprovada pelo protesto ou por declaração do sacado, escrita e datada sobre o cheque, com indicação do dia de apresentação, ou, ainda, por declaração escrita e datada por câmara de compensação”.

3.1.2 Ação de enriquecimento indevido

A ação prevista no artigo 61 da Lei do Cheque é um benefício dado pelo legislador ao portador do cheque de mover uma ação para evitar o enriquecimento indevido do emitente cobrando o valor do título, corrigido e acrescidos dos juros moratórios. Perdido o prazo da ação de execução, o credor pode ainda promover a ação de enriquecimento indevido cujo prazo é de dois anos seguintes à prescriçãoda ação execução, a conta do dia em que se consumou a prescrição do cheque e pode ser feita contra o emitente, os endossantes e avalistas.Esta ação não é executiva e o portador vai pedir, através dela, a condenação judicial de qualquer um dos devedores sob a alegação e que houve enriquecimento indevido às suas custas.

Gladston Mamede diz que tal ação “trata-se de uma ação ordinária, de processo de conhecimento” porque aqui não existe mais uma declaração unilateral de vontade ou a busca de garantias cambiais, pois uma vez prescrito o cheque as relações puramente cambiais desaparecem e o que de fato que interessa é a relação jurídica em que o cheque foi emitido, ou seja, apenas as obrigações que resultaram do negócio permanecem. Sobre tal aspecto Ulhoatambém admite a possibilidade de arguir ações relativas ao negócio jurídico por meio de ação de conhecimento e destaca que na contestação poderão ser levantas tais questões se a ação de enriquecimento indevido for promovida pelo tomador contra o emitente, onde este vai poder sugerir tal questão, no entanto o emitente não terá esse direito se a ação contra ele foi movida pelo endossatário. Percebe-se portanto, que tal ação apresenta dois vieses, servindo tanto para cobrar apenas o direito creditício quanto para arguir direitos advindos da relação jurídica que originou o título.

Na ação de enriquecimento indevido há uma questão que traz divergência. Tal questão está relacionada às provas, pois há quem considere que em tal ação o cheque prescrito é prova suficiente com base no Art. 333, I, CPC, isso porque o STJ considera que para ação monitória o cheque é prova suficiente e tal ação tem sido preferida, por sua rapidez, como meio de evitar o enriquecimento indevido diante do cheque prescrito, contudoGladston Mamede ressalta queo cheque prescrito não é prova suficiente e devem ser produzidas, ao longo do processo, outras provas e neste contexto a causa do endividamento se torna aspecto importante.

3.2 Ação Monitória

Passado o prazo para promover as ações de execução e a de enriquecimento indevido pode o credor, promover a ação monitória.

Como preceitua o artigo 1.102.a, do Código de Processo Civil, “a ação monitória compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel”, ou seja, é feita não com base no título nas mãos do autor, apenas com um documento escrito sem força executiva. Espera-se, por meio desta ação, a formação do título em intervalo de tempo reduzido eliminando-se a demora que se tem no processo de conhecimento. Tal ação preocupa-se em investigar os fatos do processo, apoiando-se em provas escritas entregues juntamente com a petição inicial, que comprovem a obrigação do réu em pagar determinada quantia ao autor para poder adquirir a convicção do direito em favor de uma das partes, aqui o cheque prescrito é elemento suficiente para provar a existência da dívida. Uma vez instruída a petição inicial o juízo deferirá o mandado de pagamento ou de entrega de coisa móvel em um prazo de 15 dias, quanto a este prazo o réu poderá embargá-lo (artigos 1102-B e 1102-C, CPC). A ação monitória deve ser proposta no lugar do pagamento, no foro de eleição ou no foro de domicílio do réu. Deve-se ainda ficar atento ao seu prazo prescricional, que é de três anos de acordo com o Art. 206,§ 3°, VIII, CPC.

3.3 Ação Regressiva

É uma ação secundária, acessória. Um coobrigado tem em relação ao outro o direito de regresso caso pague a dívida em lugar do devedor principal ou no lugar de qualquer outro dos coobrigadosanteriores à ele com o acréscimo de juros que serão contados do dia em que ele efetuou o pagamento bem como serão incluídos nesse “ressarcimento”  as despesas que ele teve para iniciar a ação de regresso com direito a correção monetária. Para que possa exercer esse direito de regresso ele deve exigir a quitação e o título, se o autor da ação for um endossante tem ele o direito de cancelar o seu próprio endosso e os posteriores. A Lei do Cheque (7.357/85) determina que o prazo de prescrição para se promover a ação de regresso é de seis meses contados do dia em que o obrigado pagou o cheque ou que ele foi demandado para tanto.

3.4 Ação Ordinária de cobrança/ Ação causal

Perdendo o autor o prazo para promover as ações de execução, de enriquecimento indevido e a monitória, pode ainda promover a ação ordinária de cobrança, pois com a perda de tais prazos o cheque torna-se somente um meio de provas e o credor pode recorrer ao contrato firmado pelas partes e o cheque é esse contrato. O prazo de prescrição da ação de cobrança é de cinco anos a contar da data de emissão do título (Art. 206, §5°,I, CPC).

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Sobre a ação causal a quem a considere que ela é uma outra ação relativa ao cheque e outros que não a consideram assim. Adotando a visão de Fábio Ulhoa Coelho e o Art. 62 da Lei do Cheque a ação causal pode ser promovida quando prescrito o prazo para promover as ações cambiais e serve para discutir as obrigações advindas da obrigação originária uma vez que entre as partes não existe mais qualquer direito, podendo discutir apenas relações jurídicas que se referem, por exemplo, a responsabilidade civil. Tal ação só é excluída em casos que se prove que a emissão ou transferência do cheque caracteriza uma novação.

Contudo, nota-se que tais ações cabem quando o que se discute é a relação originária do direito creditício, logo pode-se considerar que são faces de uma mesma moeda e não ações distintas.

4 CONCLUSÃO

Depreende-se que o cheque pode ser exigido dos obrigados por meio de diversas ações. A ação cambial é proposta quando não há pagamento do cheque no tempo e modo previstos e é composta pela ação de execução, que pode ser proposta seis meses após o término do prazo de apresentação ou da data de emissão ou ainda da data de apresentação do cheque e pela ação de enriquecimento indevido, proposta quando perdido o prazo para promoção da ação de execução, o seu prazo de propositura é de dois anos a contar do termino do prazo da ação de execução, para tal ação o cheque é a própria causa de pedir sem necessidade de arguir sobre a relação jurídica originária do cheque.

Tem-se também a ação monitória, proposta quando perdido o prazo das ações de execução e de enriquecimento indevido, sua principal característica é a rapidez, o cheque é prova suficiente para iniciar a ação e seu prazo prescricional é de três anos contados da data de emissão do cheque.

A ação ordinária de cobrança, proposta quando perdido o prazo para as ações de execução, de enriquecimento indevido e a monitória. Nesta ação argui-se a relação jurídica que deu origem ao direito creditício, pois o cheque tornou-se mero meio de provas. Atrelada a esta ação tem-se a ação causal que também vem discutir as obrigações advindas da obrigação originária.

Quanto a ação regressiva, esta consiste na possibilidade dos coobrigados cobrarem a dívida entre si e para tanto tem que pedir a quitação no cheque, bem o próprio título para poder propor tal ação.

Portanto, existe uma série de meios que garantem o direito do beneficiário em receber o que lhe é devido, desde que obedecido prazos e o devido processo legal.

5 REFERÊNCIAS

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Vol.1. 16 ed. São Paulo:Saraiva, 2012.

MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: títulos de crédito. Vol.3. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2008.

MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil; medidas de urgência, tutela antecipada e ação cautelar, procedimentos especiais. Vol.3. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2007.

LEI DO CHEQUE. Lei nº 7.357, de 02 de setembro de 1985. Editora rideel (completo/VadeMecum).

CÓDIGO CIVIL. LEI nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Editora rideel (completo / VadeMecum)

 CÓDIGO D EPROCESSO CIVIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Editora rideel (completo / VadeMecum)

Sobre o autor
Mariana Costa

Graduanda em Direito pela Universidade Federal do Maranhão

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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