A tutela dos recursos hídricos no Direito Brasileiro

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Em decorrência da preocupação presente em todo o mundo acerca dos recursos hídricos limitados, o Estado brasileiro garante em seu texto constitucional a água como patrimônio comum da nação. É dever de todos preservar recursos para seu garantir uso.

INTRODUÇÃO

Em decorrência da preocupação presente em todo o mundo acerca dos recursos hídricos limitados, o Estado brasileiro garante em seu texto constitucional a água como patrimônio comum da nação. Assim, todos os entes federativos têm sua devida importância para a manutenção viável desse bem, como também, todos aqueles que usam, devem preservar.

É válido destacar que diversos doutrinadores apontam o meio ambiente como direito fundamental de terceira dimensão, sendo este fundamental e de exigibilidade imediata, tendo em vista que a preservação deste bem é imprescindível para a manutenção de uma vida digna e saudável. Dessa forma, na legislação infraconstitucional a União estabelece uma estrutura presente em países desenvolvidos, para que, possa vir, junto a participação social, preservar os corpos d'águas.

Afinal, a água é um bem finito e essencial para a preservação do meio ambiente como um todo, pois diversas espécies de plantas e animais, inclusive o ser humano, dependem desse bem em condições de uso.

ABORDAGEM CONSTITUCIONAL DOS RECURSOS HÍDRICOS

Sabe-se da essencialidade dos recursos hídricos na manutenção da vida. Muitas vezes lembrada apenas quando a água está sem condições para o uso ou quando está escassa. Assim, é inegável a importância deste recurso ambiental, imprescindível para perpetuação de diversos ecossistemas, logo, cadeias alimentares e seres vivos.

Quando alterada afeta todo o ambiente, inclusive, direta ou indiretamente, a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a fauna e a flora; as condições estéticas e sanitárias do meio; e a qualidade dos recursos ambientais.

Dessa forma, pode-se aduzir que os recursos hídricos de qualidade e preservados, logo, o meio ambiente equilibrado é um direito fundamental de terceira dimensão, sendo relevante, até, para a preservação humana. Estes diferem dos de segunda, pois carece sua preservação, em vez de sua concessão.

Assim, a terminologia “cidadã” atribuída à constituição brasileira de 88 foi para designar de que tudo ali exposto e contemplado. Esta tinha por meta, entre outros, o bem-estar daqueles agraciados pelo texto.

Dessa maneira, o Capítulo VI – do Meio Ambiente, da Constituição federal de 1988 (CF/88), representa este “bem-estar”, mas não só momentâneo, porém, com evidência, por tempo indeterminado. Conforme Édis Milaré, “se os textos supremos anteriores a 1988 não se preocuparam com a questão ambiental, a nova ordem constitucional inaugurada com a carta cidadã pode ser considerada um dos sistemas mais abrangentes, atuais e avançados do mundo sobre a tutela do patrimônio natural” (2005, p. 184).

Seguindo essa tendência, aduz o art. 225, caput, da atual Carta Magna:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

É oportuno, aqui, reproduzir o “caput” do mencionado artigo, que evidencia a preocupação do constituinte para com o Meio Ambiente.

Assim, nos regimes constitucionais modernos, a proteção ao meio ambiente, embora sem perder seu vínculo original com a saúde, ganha identidade própria, sendo elevado à categoria de bem jurídico de per si (MILARÉ, 2005, p. 180).

A partir dessas palavras, inseridas em nossa Carta de 1988, formalizou-se a Tutela do Estado sobre o Meio Ambiente. Partindo daí, produziram-se os dispositivos infraconstitucionais, até então escassos.

Ao proclamar o meio ambiente como “bem de uso comum do povo”, foi reconhecida a sua natureza de “direito público subjetivo”, vale dizer, exigível e exercitável em face do próprio Estado, que tem também a missão de protegê-lo (MILARÉ, 2005, p. 186).

Com isto, o Estado chamou para si a responsabilidade maior, partindo para uma nova concepção na história do nosso país.

Não obstante, o próprio ordenamento constitucional prescreveu vários mecanismos capazes de assegurar aos cidadãos a defesa judicial do meio ambiente e o Estado como real garantidor de direitos fundamentais. Entre esses meios de defesa estão as seguintes ações judiciais: a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo; a ação civil pública; a ação popular constitucional; o mandado de segurança coletivo e o mandado de injunção, além, é claro, das ações de procedimento comum e das medidas ou ações cautelares respectivas.

Afinal, em decorrência do art. 225 da CF/88 na medida em que diz que é dever do Poder Público preservar o ambiente ecologicamente equilibrado, estabelecer um poder-dever, ou seja, é atribuído um poder fiscalizador, interventivo, ordenador ao Estado para atingir este difícil equilíbrio: manter o ambiente sadio e organizar as atividades.

É válido mais uma vez destacar o entendimento de Édis Milaré:

[…] o reconhecimento do direito a um meio ambiente sadio configura-se, na verdade, como extensão do direito à vida, quer sob o enfoque da própria existência física e saúde dos seres humanos, quer quanto ao aspecto da dignidade dessa existência – a qualidade de vida –, que faz com que valha a pena viver (MILARÉ, 2005, p. 158-159).

Dessa forma, é importante o papel reservado ao Poder Judiciário na tutela ambiental, pois é através dele que se exercerão os direitos da cidadania, uma vez que a ele serão submetidas as ameaças e lesões de direito perpetradas contra o ambiente.

 

COOPERAÇÃO ENTRE ENTES ESTATAIS

A constituição de 88 deixa clara a intenção do legislador constituinte quando divide a competência acerca dos recursos hídricos, em vista, que há uma cooperação entres os entes estatais. Assim, baseado na “geometria de kelsen” a União possui o poder centralizador e transfere aos demais entes federativos possibilidade de atuação no tema.

Dessa forma, a nova Carta atribuiu condição especial aos recursos hídricos: em seu art. 20, §1º, determina:

É assegurada, nos termos da Lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a Órgãos da Administração Direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração (BRASIL, 1997).

Outra determinação importante da Constituição foi a fixação da competência da União para instituir um sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos do uso da água, preceitua o artigo 21, XIX: “Art. 21. Compete à União: XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso (BRASIL, 1988)”.

Tal sistema aclamado pelo inciso foi proposto para o ordenamento jurídico brasileiro no ano de 1996, era baseado na organização dos recursos hídricos de países desenvolvidos que estavam com resultados significativos. Esse texto infraconstitucional, em vigor de 8 de janeiro de 1997 pela lei número 9.433, é melhor pontuado abaixo.

Estabelece, ainda, que a competência para legislar sobre água é privativa da União, embora União, estados, municípios e Distrito Federal tenham competência comum para registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de uso de recursos hídricos.

A Constituição Federal estabeleceu ainda, conforme o art. 20, inciso III:

Art. 20. São bens da União:

III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais (BRASIL, 1988);

Como também, estabelece no art. 26, inciso I: “Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados: I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União;”

Dessa maneira, com essas colocações as águas, antes tinham uma conotação do direito privado, passam a ser de domínio público: o domínio da União para os rios ou lagos que banhem mais de uma unidade da Federação ou que sirvam de fronteira interestadual ou internacional; e o domínio dos estados sobre as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, nesse caso, as decorrentes de obras da União, no âmbito de seus territórios. Os municípios não são contemplados com águas próprias.

 

LEI 9.433/97

O preceito legal que estabelece a Política Nacional de Recursos Hídricos, incorpora princípios, normas e padrões de gestão de água universalmente aceitos e já praticados em diversos países.

Tal lei, sancionada pelo Congresso Nacional, figura-se como o instrumento legislativo mais atuante na preservação e gestão dos recursos hídricos e inova à medida que a gestão de bacias hidrográficas toma forças. Logo, o que era uma política centralizadora (institucionalizada) toma por figura uma dinamização social, que clama por uma participação político-social daquele cidadão que está envolvido de alguma forma com a bacia hidrográfica.

A lei supracitada estabelece que a unidade de planejamento e gerenciamento de recursos hídricos é a bacia hidrográfica, que pode abranger vários Estados da Federação, no caso dos rios contidos nas grandes bacias hidrográficas. Nos casos em que os rios não fluem para outros estados-membros, a lei considera suficiente a existência do sistema estadual de outorga.

Dois instrumentos de gestão são previstos na lei: os comitês de bacia, que funcionam como um parlamento, com a participação de governos, de usuários e da sociedade civil, não tendo figura jurídica; e as agências de água, executoras das decisões dos comitês, que poderão adquirir a personalidade jurídica que melhor se adaptem às condições locais. Dessa forma, a cobrança pelo uso do recurso hídrico é um dos principais instrumentos de gestão criados pela lei. Afinal, visa estabelecer a água como um bem econômico, uma mercadoria, bem como criar um fundo financeiro que sustente as próprias ações de gestão e os investimentos de interesse coletivo na bacia.

Assim, os investimentos em bacias hidrográficas são geralmente elevados e compreendem reservatórios, sistemas de abastecimento e de esgotos, sistemas de irrigação, criação e fiscalização de reservas, etc. Portanto, as formas de financiar os investimentos em bacias hidrográficas são a cobrança pelo uso da água e o rateio dos custos dos investimentos entre os usuários ou beneficiários.

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Logo, o que se espera com esse modelo adotado, de integração social, é a criação de uma vontade política regional que, além de arrecadar recursos, tenha sucesso na administração pública, promovendo o uso e a proteção das águas.

Desse modo, o objetivo dos comitês de bacias hidrográficas é administrá-la de modo a evitar a sua deterioração, conservando suas características desejáveis e aprimorando aquelas que necessitam de melhorias.

Não obstante, um Comitê reduz os riscos de corrupção do ator que toma uma decisão individual a partir de interesses privados. Como também, limita o grau de liberdade de condutas arbitrárias e de exercício do poder. Portanto, esse órgão previne e reduz riscos de que o aparato público seja apropriado por interesses imediatistas, orientando as políticas públicas e formulando planos de desenvolvimento integrado.

 

ESTRUTURA PROPOSTA

Os instrumentos que o preceito legal referente aos Recursos Hídricos (9.433/97) definiu como necessários à boa gestão do uso da água, sendo que estes, seguem a tendência da vanguarda mundial na administração dos recursos hídricos.

Assim, o Plano Nacional de Recursos Hídricos solidifica os planos diretores desses recursos de cada bacia hidrográfica, sendo sua elaboração de responsabilidade da Secretaria de Recursos Hídricos (SRH), do Ministério do Meio Ambiente.

Vale ressaltar que a cobrança é o meio essencial para manter o equilíbrio entre a oferta e demanda pelo bem, serviço efetuado pelas as Agencias de Água, estas órgão do comitês da bacia. Como também, imprescindível é a classificação dos recursos hídricos destinadas ao uso, visto que, é uma forma necessária à manutenção de um sistema de vigilância sobre a qualidade da água.

O instrumento, dessa maneira, pelo qual o usuário recebe uma autorização, concessão ou permissão, conforme o caso, para fazer uso da água é a Outorga do Direito de Uso dos Recursos Hídricos. Esta constitui o elemento central do controle para o uso racional dos recursos hídricos.

Assim, o Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos compreende a coleta, a organização, a crítica e a difusão da base de dados referente aos recursos hídricos, seus usos e o balanço hídrico de cada bacia, para prover os usuários e gestores com informações para o planejamento e a gestão.

O Conselho Nacional Recursos Hídricos é o órgão superior da hierarquia administrativa da gestão de águas, responsável pelas grandes questões do setor e pela resolução de contendas maiores e pelo gerenciamento, tais quais, os conselhos estaduais e distritais.

Os Comitês de Bacias Hidrográficas são um tipo novo de organização no Brasil, embora bastante conhecidos em países desenvolvidos com gestão de recursos hídricos. Estes, contam com a participação de usuários, das prefeituras, de organizações civis e de representantes estaduais e federais. Os membros do comitê exercem o papel de um parlamento das águas da bacia, pois é o local de decisões sobre as questões relativas à bacia.

Afinal, percebe-se a integração de ações entes os organismo criados, tanto os da União no âmbito estadual, visto que, não há uma subordinação direta, mas um vínculo para que discipline e garanta o uso do bem comum.

CONCLUSÃO

Com efeito, note-se que, uma vez que a tutela ambiental foi elevada ao nível de direito fundamental, as respectivas disposições constitucionais tem aplicação imediata. Assim, salvaguardar o meio ambiente é uma forma de conferir real efetividade à vida humana e sua dignidade, provavelmente os principais valores da ordem normativa inaugurada com a Carta de 1988. Tal como, preservar uma vida digna aos seres humanos que necessitam de um espaço que ofereça minimamente condições aceitáveis de preservação ambiental e de recursos hídricos de qualidade, tanto para gerir uma boa saúde, quanto para o desenvolvimento social sustentável.

A política pública acima conta com a participação da sociedade, pois o modelo anterior, que concentrava responsabilidades unicamente nas mãos do Estado, encontra-se superado. Essas políticas constituem, assim, uma novidade no campo normativo ao contemplar a sociedade civil como parte do poder de decisão, juntamente com o Estado e os Municípios onde se encontra a bacia hidrográfica.

Portanto, no Direito Ambiental, se observa uma enorme variação de dispositivos legais que, em conjunto, refletem a preocupação social pelo bem da natureza, ou melhor, pela preservação, defesa e melhoria de qualidade. Contudo, a proteção ambiental, consequentemente, dos recursos hídricos não é algo já determinado de fácil solução, mas essencial para o bem-estar do homem, enfim, para a vida no planeta.

REFERÊNCIAS

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_______. Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9433.htm>. Acesso em 02 de dezembro de 2013.

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Sobre os autores
Lucas Mendes Cordeiro da Cruz

Graduando em Direito.

Laíne Pontes de Mesquita

Estudante do Curso de Direito - Bacharelado 2014.1 da Universidade Estadual do Vale do Acaraú

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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