Da responsabilidade civil pela guarda da coisa e pelo animal

18/05/2016 às 23:52
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Um estudo sobre a Responsabilidade Civil que o indivíduo detentor do poder de guarda ou comando assume pela coisa inanimada ou do ser irracional, quando esses lesionarem a esfera jurídica patrimonial de terceiros, além das situações em que ele é eximido.

RESUMO: O seguinte escrito tem por escopo realizar um estudo, sem esgotar o tema, sobre a Responsabilidade Civil que o individuo detentor do poder de guarda ou comando assume pela coisa inanimada ou do ser irracional, quando esses lesionarem a esfera jurídica patrimonial de terceiros, assim como também, as situações em que mesmo ocorrendo o dano, o guardião será eximido da responsabilidade. A priori serão levantados conceitos essenciais para o entendido da disciplina, tomando como referência os posicionamentos diversificados de doutrinadores do Direito pátrio, sem prejuízo do que prevê o Código Civil Brasileiro de 2002. A posteriori serão analisados casos práticos, situações cabíveis de reparação, de ressarcimento assim como os casos de isenção da responsabilidade de quem deveria manter a guarda, tendo sempre à vista o que entende a jurisprudência nacional através dos seus julgados.

Palavras-chave: Direito, Responsabilidade, Guarda, Coisa, Animal

1 PRELIMINARES E ASPECTOS GERAIS

A passagem de uma sociedade simples para uma sociedade organizada de maneira complexa e tecnologicamente avançada trouxe inúmeros confortos aos seres humanos, mas também instaurou um ambiente constantemente hostil, repleto de riscos.

Ainda que todo esse aparato tenha corroborado com o apogeu da dita sociedade do risco, é antiga a preocupação com os danos físicos e mentais causados por elementos inanimados e por animais, revelando que viver em sociedade, embora seja extremamente vantajoso, também é perigoso, porque é tênue a linha distingue os direitos dos indivíduos que compõe determinado grupo, de modo que a tentativa de conciliar as esferas jurídicas dos sujeitos envolvidos numa questão jurídica é uma tarefa delicada.

Portanto, tendo em vista a coesão social o Direito nos exige uma postura de vigilância e atenção em relação ao que temos sob nosso domínio, seja ele animado ou inanimado, para que possamos usufruí-los sem atingir o nosso semelhante, sob pena de nos obrigarmos a indenizá-lo caso um descuido provoque uma lesão física ou psíquica. Mas, nem sempre o direito foi concebido dessa forma.

Sendo o Direito Ocidental herdeiro direito do Direito Romano, devemos nos reportar à produção romana para evidenciar a origem do entendimento sobre a responsabilidade sobre o fato da coisa e pelos animais. Embora, na Roma Antiga tenham se iniciado os trabalhos sobre a responsabilidade civil voltada aos seres irracionais e coisas inanimadas, na época não foi desenvolvido um trabalho contundente, mas tão somente era respeitada a noção do dominus que ligava o proprietário aos itens, animais ou coisas. Contudo, bastava que o dono abdicasse desse poder de domínio para eximir-se da responsabilidade por quaisquer eventualidades, uma vez que não se tinha ideia das modalidades de culpa, de modo que a matéria não foi disciplinada durante um longo intervalo histórico.

Realizando um salto histórico e nos direcionando a produção francesa, a doutrina civilista da responsabilidade pelo fato da coisa e pelos seres irracionais passa a ter mais notoriedade. Foi a partir da jurisprudência daquele país, que tal ramo do direito civil adquiriu contornos normativos, com construção de uma teoria e a edição do Código Frances, no bojo do artigo 1384, o qual tinha o condão de responsabilizar pelo dano não somente quem lhe deu causa por fato próprio, mas também aquele o causou por fato de pessoas por quem deve responder pelas coisas que tem sob a sua guarda. Foi um grande avanço na tecnologia jurídica, uma vez que o direito passou a entender esses elementos como extensões daqueles que tem a sua custódia.

No Brasil, os atuais doutrinadores do direito e pensadores da ciência jurídica apontam como o pioneiro a tratar do tema, de maneira sistemática, foi o professor Teixeira de Freitas por volta de 1865 em seu Esboço. Embora o trabalho do professor Freitas não tenha despertado tanta atenção dos operadores do direito na época, é inegável que ele abriu as cortinas para um novo contexto jurídico posteriormente.

Somente durante a República Velha que a responsabilidade civil pelo fato da coisa e pelo animal passou a ser normatizada pelo Código Civil de 1916, já com características semelhantes ao que o nosso ordenamento jurídico dispõe atualmente.

Hodiernamente, o Código Civil de 2002 contempla a responsabilidade civil pelo animal e pelo fato da coisa nos artigos 936 a 938.

Destarte, o entendimento basilar acerca da responsabilidade civil está fundado no dever que o sujeito tem de responder pelo dano provocou diretamente à esfera jurídica de outrem, e quando possível, também arcar pelas consequências da conduta de terceiro quando sobre seu comando, pelo animal ou pela coisa inanimada sob sua guarda.

Portanto, a responsabilidade civil alcança o dano provocado pelo autor imediato, assim como os danos causados de maneira mediata pelo animal e também pela coisa estando sob o seu domínio.

2 A RESPONSABILIDADE PELO DANO CAUSADO PELO ANIMAL

Corriqueiramente, os noticiários veiculam matérias sobre animais, que por determinado atacam pessoas, provocando situações risco que geralmente findam em lesões físicas ou morais, ou até danos extremos como a própria morte da vítima. São ataques de cães ferozes, gados e equinos que invadem as rodovias, etc; cabendo ao direito regular tais fatos.

Cediço, a responsabilidade pelos danos gerados por animais remonta-nos ao Direito Romano e galgou importantes avanços com a jurisprudência Francesa. Já no direito pátrio, a responsabilidade civil pelos fatos provados pelo animal em relação a terceiros encontra-se prescrita no artigo 936 do Código Civil de 2002; in verbis:

Art. 936. O dono, ou o detentor animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.

O teor do artigo supracitado se direciona a duas figuras que podem assumir a responsabilidade praticada pelo animal. Nesses termos, tanto o dono quando o detentor da criatura poderão ser responsabilizados pelos danos que bicho der causa. Entende-se como dono, a pessoa proprietária do animal, aquela que exerce o dominus sobre esse, enquanto que o detentor é um mero possuidor da guarda do ser irracional, tendo sobre ele um poder de vigilância e cuidado temporário quando comparado ao dono.

Maria Helena Diniz[1], em sua obra de responsabilidade civil relata que:

Ao exercer seus poderes sobre o animal, o seu dono ou detentor poderá causar, indiretamente, dano tanto aos bens pertencentes a terceiros como à integridade física de alguém, caso em que deverá ser responsabilizado, tendo obrigação de indenizar os lesados.”

No mesmo sentindo entende Carlos Roberto Gonçalves[2], admitindo ser também o possuidor do animal, portanto responsável, até mesmo o ladrão que tirar o bicho do domínio do seu dono:

A responsabilidade ainda compete ao dono quando o animal se encontra sob a guarda de um seu preposto, pois este age por aquele. Pode, no entanto, passar ao arrendatário, comodatário ou depositário, a quem a guarda foi transferida. Ou mesmo ao ladrão, quando o dono é privado da guarda em virtude de furto ou roubo.”

Ainda no que tange o conceito de dono e possuidor do animal, por questões terminológicas Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho[3] adotam o termo guardião para designar o responsável por restituir a(s) vitima(s) do dano:

Em nosso entendimento, o responsável pela reparação do dano proveniente da coisa ou do animal é o seu ‘guardião’. Por guardião entenda-se não apenas o proprietário (guardião presuntivo), mas, até mesmo, o possuidor ou o mero detentor do bem, desde que, no momento do fato, detivesse o seu poder de comando ou direção intelectual.”

Outro aspecto importante descrito no artigo 936 do CC/2002 é o mérito da culpa. Extrai-se do preceito que a culpa do guardião (dono ou possuidor) é presumida, ou seja, está grafada na forma de responsabilidade objetiva, eximindo-se do dever de ressarcir somente quando provar a culpa da vítima. Leciona Maria Helena Diniz, quanto ao mérito da culpa do responsável, que:

Sua responsabilidade causada pelo animal na integridade física ou patrimonial de outrem tem por base a presunção de culpa, (…) estabelecida no fato de que lhe incumbe guardar e fiscalizar o animal (…).

Dessa forma, se o dano ocorre quando o ser irracional está sob o domínio do seu proprietário, é indiscutível que esse seja o responsável pelo ressarcimento. Reforça o entendimento do Carlos Roberto Gonçalves:

A responsabilidade do dono do animal é, portanto, objetiva. Basta que a vítima prove o dano e a relação de causalidade entre o dano por ela sofrido e o ato do animal. Trata-se de presunção vencível, suscetível de prova em contrário. Permite-se, com efeito, ao dono do animal que se exonere da responsabilidade, provando qualquer uma das excludentes mencionadas: culpa da vítima ou força maior.”

Todavia, se o proprietário transferiu a posse, de modo que um terceiro passe a ter a detenção do animal, entende-se que este será o seu responsável, podendo o proprietário ter sua responsabilidade afastada da questão. É o caso do amestrador de animais.

No que cinge o afastamento da responsabilidade do guardião do animal, o artigo 936 é taxativo ao expressar que são causas excludentes do dever de ressarcir: culpa exclusiva da vítima ou força maior. É o que diz a doutrina de Carlos Roberto Gonçalves:

Assim, aos donos ou detentores dos animais causadores de acidentes incumbe provar, se pretenderem exonerar-se de tal responsabilidade, que o acidente ocorreu por imprudência da vítima ou por força maior.”

Em virtude da culpa descrita no preceito ser objetiva, se o dono do animal causador do dano pleitear a extinção do dever restituir, ele deverá provar ter sido a vítima a única culpada pelo dano, tenha ela instigado o animal a atacá-la ou não ter tomado os devidos cuidados. Ver a seguinte jurisprudência:

RESPONSABILIDADE CIVIL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – AUTOR MORDIDO POR CÃO DE PROPRIEDADE DO RÉU QUE SE ENCONTRAVA AMARRADO EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL – FATO OCORRIDO NUM DOMINGO QUANDO O LOCAL ESTAVA FECHADO AO PÚBLICO – PERÍCIA TÉCNICA QUE CONSTATOU A EXISTÊNCIA DE PLACA INDICATIVA DE ANIMAL FEROZ NO LOCAL – DEPOIMENTO TESTEMUNHAL QUE CONFIRMA O FATO DO AUTOR TER ADENTRADO NO PÁTIO E SE APROXIMAR DO CÃO – CONDUTA IMPRUDENTE – SUPOSTA OMISSÃO DO RÉU NÃO CARACTERIZADA – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DOS ARTS. 159 E 1.527 DO CÓDIGO CIVIL/1916 (CORRESPONDENTES AOS ARTS. 186 E 936 DO CC/02) E 927 DO CÓDIGO CIVIL/02 - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA REFORMADA - RECURSO PROVIDO.

Não obstante os incômodos sofridos pelo autor em razão dos fatos narrados na inicial, estes não chegaram a configurar ilícito passível de indenização, uma vez que a mordida do cão, por si só, não enseja dano moral quando ausente a prova de que houve omissão por parte do dono do animal (SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível nº. 2007.000234-2. Rel. Des. Marcus Tulio Sartorato. Florianópolis, 08 de maio de 2007).

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Portanto, provocar o animal ou até mesmo pôr-se no ambiente que o animal encontra-se, não levando em consideração avisos, placas indicativas sobre a presença de determinado animal perigoso no recinto, não confere o direito de indenização àquele que sofreu o dano, afastando a responsabilidade do guardião, responsável pelo bicho, caracterizando a culpa exclusiva da vítima.

Um exemplo equiparado e aceito como força maior, que exime o detentor do dever de ressarcir, é o caso de ladrão que furta animal e após tê-lo tirado do domínio de seu dono, o bicho causa dano a outrem, exonerando-se o dono.

Resta ainda, esclarecer o caso de animal solto na pista, ou que por descuido do seu dono invada a rodovia provocando acidentes e danos a quem trafega. Quando o animal for identificado ou identificável, de modo que seja possível determinar o seu dono ou demais responsáveis, essa pessoa ou afins tem a obrigação de restituir e/ou indenizar os terceiros lesados pela sua cria. Vide julgado:

Ação de reparação de danos – Acidente de veiculo provocado por animal solto na pista – Prova de que o animal pertencia ao réu, confirmada pelo seu próprio filho - Prova constitutiva do direito da autora demonstrada – Art. 333, I do CPC - Prejuízos comprovados - Sentença mantida - Recurso improvido.

(TJ-SP - APL: 992080626113 SP , Relator: Cristiano Ferreira Leite, Data de Julgamento: 19/04/2010, 33ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/04/2010)

A jurisprudência atual tem admitido que, quando o animal que invadiu a rodovia não tiver seu proprietário identificado, a vítima do dano terá o direito de pleitear indenização da concessionária ou administrador da rodovia também considerados responsáveis pelo acidente, respeitando o direito de regresso contra o dono do animal quando for identificado, como prolata o julgado a seguir:

ACIDENTE EM RODOVIA – ATROPELAMENTO DE ANIMAL – RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA – LEGITIMIDADE DE PARTE – A empresa que explora a concessão de rodovia responde objetivamente pelos prejuízos que forem causados aos usuários por acidentes que envolvam animais soltos na pista, cabendo ação regressiva contra seu proprietário. ACIDENTE EM RODOVIA – COLISÃO CONTRA ANIMAL – DANO MORAL – Não se pode classificar com simples susto, ou mero dissabor, uma trombada com animal, à noite, em rodovia que deveria oferecer segurança aos usuários, com as conseqüências que se vislumbram das provas colhidas aos autos.

(TJ-SP - APL: 992080206467 SP, Relator: Ronnie Herbert Barros Soares, Data de Julgamento: 05/07/2010, 31ª Câmara de Direito Privado E, Data de Publicação: 19/07/2010).

Adita-se ainda ao tema a casos onde fato causado por animais é fruto de uma relação de consumo. Como é o caso das empresas circenses ou de outras em que animais sejam utilizados como parte de um evento ou espetáculo. Neste caso, além da atribuição da responsabilidade objetiva, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor pelo fato da empresa ter o dever de garantir a segurança dos demandantes na prestação do serviço.

3 DA RESPONSABILIDADE PELA GUARDA DA COISA

A responsabilidade pelo fato da coisa alcança todos os danos provocados por itens inanimados que deveriam estar sob a vigilância, cuidado e manutenção do seu proprietário ou possuidor. A norma do Código Civil 2002 que faz referência a essa responsabilidade está contida no bojo dos artigos 937 e 938. O primeiro versa sobre a ruína do imóvel por falta da reparos e quando houver manifesta vontade repará-lo, ao passo que, o segundo artigo versa sobre as coisas que se desprenderem do edifício.

Dessa maneira, quando um imóvel ameaçava desmoronar os encarregados de aplicar a justiça podiam e tinham legitimidade para obrigar os proprietários, que de certa forma dessem uma caução, a título de prestação para o caso dela ocorrer, se não preferisse abandoná-lo. Teor do artigo 937, do Código Civil de 2002:

Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.

O embate doutrinário quanto ao que prescreve esse artigo reside no aspecto da responsabilidade ser objetiva ou subjetiva. Autores que entendem ser subjetiva, balizam-se no aspecto de que a culpa pode ser afastada quando é discutido o mérito se o prédio ruiu por falta ou não de reparos e manutenção, ou ainda se a vontade de repará-lo foi manifesta.

Entretanto, nos parece o coeso o entendimento de autores que doutrinam ser objetiva a responsabilidade pela ruína do edifício, uma vez que, se o imóvel ruiu, o mesmo deveria ter sido supervisionado, independente da vontade de repará-lo ter sido ou não manifestada, por questões lógicas de segurança. É o que leciona Pablo Stolze e Pamplona Filho:

Longe de querermos pacificar a questão, mas apenas esboçando o nosso pensamento, cuidaremos de registrar que, em nosso entendimento, essa regra consagra indiscutivelmente a responsabilidade civil objetiva do dono do edifício ou construção.

Observe que falamos em “dono”, e não em simples possuidor ou detentor. Se, por exemplo, a construção do imóvel alugado desmorona, óbvio que responderá o seu proprietário, podendo assistir-lhe uma eventual ação regressiva, no caso de culpa do locatário.

E a vítima, para obter a devida compensação, não precisará provar a sua culpa na ausência de reparos que causou o desfecho fatídico.”

Seguindo o mesmo entendimento que a responsabilidade é objetiva, reforça Carlos Roberto Gonçalves:

Há uma presunção de responsabilidade do dono do edifício ou construção, quando a casa cai sobre as propriedades vizinhas ou sobre os transeuntes. Ressalva-se, apenas, a ação regressiva contra o construtor. Facilita-se a ação de reparação para a vítima, que só precisa provar o dano e a relação de causalidade. Embora o dispositivo em estudo dê a impressão de que a vítima tenha de provar também que a ruína do edifício ocorreu devido à falta de reparos cuja necessidade era manifesta, Aguiar Dias entende que a manifesta falta de reparos decorre do simples fato de ter havido a ruína: ‘tanto necessitava de reparos que caiu’(DIAS, Aguiar apud GONÇALVES, Carlos R.).”

Há também quem entenda que preceito legal começa por estatuir uma responsabilidade anônima, impessoal e objetiva, mas,  evidentemente podemos constatar que de fato existem contradições inseridas no preceito com uma dose de subjetividade na qual procura conciliá-lo com a teoria da culpa.

No mais, coloca-se em evidência que o código é taxativo ao expressar o “dono”, e não em simples detentor ou possuidor evidentemente, é importante ressalvar que se por ventura, a construção do imóvel alugado vier a desmorona, responderá o seu proprietário, podendo assim se preferir assistir-lhe uma eventual ação regressiva, no caso de culpa do locatário. Vide julgado:

APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CONDENATÓRIA. DANOS MATERIAS, MORAIS E PENSÃO. ROMPIMENTO DE LAGOAS ARTIFICIAIS. MORTE. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. I – RUÍNA DE EDIFÍCIO OU CONSTRUÇÃO. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.528, CC/1916. II - CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR. IMPREVISIBILIDADE E INEVITABILIDADE. ANEMIA PROBATÓRIA. RECONHECIMENTO IMPOSSÍVEL. III – CULPA CONCORRENTE. RESPONSABILIDADE DETERMINANTE DOS RÉUS. EXCLUSIVIDADE. PRETENSÃO AFASTADA. IV – DANOS MATERIAIS. RECIBOS E ORÇAMENTOS. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. ABUSIVIDADE NÃO EVIDENCIADA. SANCIONAMENTO BEM LANÇADO. V – PENSÃO MENSAL. FILHO MENOR (5 ANOS). FAMÍLIA DE BAIXA RENDA. PRESUNÇÃO DE APOIO AOS GENITORES. SALÁRIO MÍNIMO. 2/3 ATÉ OS 25 ANOS. VALOR ADEQUADO. VI – DANOS MORAIS. QUANTUM. INSURGÊNCIA COMUM. MINORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MONTANTE AQUÉM DO PARADIGMA DESTA CÂMARA. MAJORAÇÃO. POSSIBILIDADE. – SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS DOS RÉUS DESPROVIDOS. RECURSO DOS AUTORES PARCIALMENTE PROVIDO. I - Na perspectiva do art. 1.528 do Código Beviláqua: "O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier da falta de reparos, cuja responsabilidade fosse manifesta." (correspondente no CC/2002: art. 937). Propriedade inconteste, na espécie. II - Se o índice pluviométrivo na região é, sabidamente, intenso (e que, muitas vezes, resultam trágicas enchentes) e não demonstram os réus, como lhes cabia por força do art. 333, inciso II, do Código de Processo Civil, anormalidade extraordinária e invencível, não há se falar em inevitabilidade ou em imprevisibilidade, circunstâncias que afastam o reconhecimento de força maior ou de caso fortuito. III - Eventual construção (da casa das vítimas) em local inadequado (irregularidade inicialmente administrativa), se não contribui para o evento danoso, não exime ou diminui a culpa dos réus. Os danos são resultado exclusivo da construção/manutenção falha de lagoas artificiais (causa determinan [...]

(TJ-SC - AC: 20090567758 SC 2009.056775-8 (Acórdão), Relator: Henry Petry Junior, Data de Julgamento: 05/09/2012, Quinta Câmara de Direito Civil Julgado)

A legislação também teve a preocupação de atentar para dano causado pelas coisas caídas ou lançadas de edifícios, que atinjam lugares e pessoas, indevidamente. É o que cuida o artigo 938 do CC/2002:

Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.

Analisando o dispositivo, a responsabilidade civil pelas coisas caídas ou lançadas não é obrigatoriamente do proprietário da construção consolidando assim que é da responsabilidade de quem habita, e dessa forma alcançando também, o possuidor, locador, comodatário.

É importante atentar que para efeito de reparação do dano, dispensa qualquer discussão relacionada a culpa por se tratar de responsabilidade objetiva. Para ilustrar, segue o julgado:

APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO -CONDOMÍNIO – OBJETOS LANÇADOS - REPARAÇÃO DE DANO – ART. 938, CC/2002 - DISPOSITIVO QUE NÃO CONTEMPLA NECESSIDADE DE CULPA, BASTANDO, O NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O ATO E O DANO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AGRAVO RETIDO – ILEGITIMIDADE ATIVA AFASTADA – DESNECESSÁRIA A PROVA DA PROPRIEDADE DO BEM DANIFICADO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – REDUÇÃO AFASTADA. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 – A indenização é devida no valor do menor dos orçamentos apresentados pelo prejudicado, sendo pacífica a jurisprudência nesse sentido, e irrelevante ao dever de indenizar, a comprovação do efetivo desembolso do valor pretendido. 2 – A responsabilidade civil extracontratual do condomínio diz respeito às questões que envolvem terceiros, ou seja, aqueles que não são condôminos. Desta forma, o condomínio deve ser responsabilizado, mesmo que desconhecido o agente que praticou o ato. O atual art. 938 do Código Civil estabelece a solidariedade da massa condominial, ao dispor que responde pelo dano proveniente das coisas que caírem ou forem lançadas do prédio aquele que habitá-lo. 3 – Não havendo motivos relevantes capazes de modificá-los, os honorários advocatícios prudentemente fixados pelo juiz da causa devem ser mantidos.

(TJ-PR - AC: 5832897 PR 0583289-7, Relator: Arquelau Araujo Ribas, Data de Julgamento: 05/11/2009, 10ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 275)

Sendo assim, baseado no artigo apresentado e no entendimento jurisprudencial, o responsável pelos danos de coisas caídas ou lançadas é aquele que habita no prédio, isto é, independentemente de ter sido ele o causador ou autor material do fato. 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do que foi tratado, é possível entender que o convívio em sociedade fez com que o homem estipulasse regras para conciliar os interesses jurídicos dos indivíduos componentes de um grupo. Mais do que regras formais, e sim regras que alcançassem de maneira satisfatória as diferentes situações que a mudança de uma sociedade simples foi agregando na medida em que se tornou complexa e tecnologicamente avançada. Pois a mesma sociedade que protege seus indivíduos, é a mesma sociedade que cria constantemente situações de riscos e danos.

Pois sim, o direito positivou essa norma que contempla determinada atenção que devemos ter em relação a nossa conduta social, desde por meio de atos próprios assim como subsidiados por outros elementos sob nosso domínio, para que todo sujeito que pratica um ato, ou se dispõe omissivamente de modo que provoque um dano ao semelhante, deve suportar as consequências do seu feito imediato ou mediato. Trata-se de uma de manter a harmonia social a partir de uma questão de responsabilidade, atribuindo alguém o dever restabelecer a ordem por tê-la maculado.

Por fim, as normas da responsabilidade civil pelo fato da coisa e do animal, não tem somente caráter patrimonial ao prever indenização pelo dano proporcionado a vítima, antes disso tem o condão de política social, apoiada em um plano moral e ético, de caráter preventivo, contendo condutas nocivas ao grupo social, condita no espírito do direito que é o bem comum.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Código civil, 2002. Presidência da República. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 10.406, Institui o Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em 20 de dez. 2013.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 17 ed. São Paulo: Saraiva. 2007

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 4: Responsabilidade civil. 7. ed. – São Paulo: Saraiva. 2012.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume 3: Responsabilidade civil / Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho. 10. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva. 2012.

SCWARTZ, Diego.Responsabilidade civil pelo fato da coisa e do animal. Disponível em: < http://www.esmesc.com.br/upload/arquivos/4-1246975592.PDF>.  Acesso em 20 de dez. 2013.


[1] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 17 ed. São Paulo: Saraiva. 2007

[2] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 4: Responsabilidade civil. 7. ed. – São Paulo: Saraiva. 2012.

[3]GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume 3: Responsabilidade civil / Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho. 10. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva. 2012.

Sobre o autor
Janselmo Melo Braga

Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito pela Universidade Estadual do Maranhão – UEMA.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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