Conflitos de Direito Internacional com o Direito Interno

04/06/2016 às 10:14
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Os conflitos do Direito Internacional com o Direito Interno são resolvidos pelas normas dele próprio e pelos mecanismos de Direito Interno, notadamente pelos institutos como a arbitragem, as corte internacionais e a diplomacia, mediação, dentre outros.

Resumo

 O Direito Internacional por representar a vontade de vários Estados estrangeiros facilmente se conflita com o Direito Interno dos Estados signatários e para dirimir estas divergências os próprios Estados ao inserir no ordenamento jurídico interno as normas de direito internacional já os mune de instrumentos capazes de dirimirem as controvérsias. Porém se ainda persistir divergências estas são resolvidas com a utilização de instrumentos jurídicos próprios como a diplomacia e vários outros instrumentos não jurisdicionais e os jurisdicionais como a arbitragem e as corte internacionais. O Brasil signatário de vários tratados por disposição doutrinária e jurisprudencial adotou a teoria dualista para recepção dos acordos que é signatário.

Palavras-Chave: Direito Internacional. Direito Interno. Tratados Internacionais. Filhos. Arbitragem. Corte Internacional de Justiça.

Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Meio de Solução Pacífica. 3.1. Institutos Não Jurisdicionais de Solução de Controvérsias. 3.1.1. Negociação Diplomática. 3.1.2. Bons Ofícios. 3.1.3. Mediação. 3.1.4. Investigação. 3.1.5. Conciliação. 3.2. Instrumentos Jurisdicionais de Solução de Controvérsias. 3.2.1. Arbitragem. 3.2.2. Cortes Internacionais. 3.2.2.1. Corte Internacional de Justiça. 4. Pressupostos Processuais. 4.1. Legitimidade das Partes. 4.2. Interesse de Agir. Conclusão. Referências Bibliográficas.

1. Introdução

Este artigo irá abordar os Conflitos de Direito Internacional com o Direito Interno. Tendo como objetivo apresentar conceitos, soluções pacíficas, aplicação das teorias dualista e monista, a problemática e suas divergências. O método de pesquisa foi em parte bibliográfico, em livros, artigos científicos e reportagens. Os quais retratam os principais conceitos que norteiam o tema e a necessidade de se estabelecer meios pacíficos para a resolução.  A principal problemática envolve as questões da guerra, descrevendo as suas formas de solucionar os litígios que envolvem o direito internacional e o direito interno.

2. Conceito

Segundo o conselho de Haia, chamaremos de conflito internacional ou litígio internacional todo “desacordo sobre certo ponto de direito ou de fato”, assim como toda “contradição ou tese jurídica ou de interesse entre dois Estados”. (REZEK, Francisco, p.202) 

As soluções de controvérsias feitas pelos Estados são resolvidas, na maioria das vezes, por meios pacíficos, ou seja, sem o uso da força. A Carta da ONU traz expresso que os Estados devem resolver os seus litígios de forma pacífica, para evitar ameaça à paz internacional.

3. Meios de Solução Pacífica

3.1. Instrumentos não jurisdicionais de solução de controvérsias

No rol dos mecanismos não jurisdicionais de solução de controvérsias entre os Estados estão listados: a negociação diplomática, os bons ofícios, a mediação, a investigação e a conciliação.

3.1.1. Negociação diplomática

Neste caso, os Estados envolvidos irão escolher a melhor forma para resolverem os seus conflitos, sem que terceiros intervenham na solução. Este procedimento encontra-se regido por usos e costumes internacionais, os quais se caracterizam por sua informalidade. A regra geral é a liberdade dos Estados em escolher qual mecanismo de solução de controvérsias será utilizado para o caso específico. O artigo 33 da Carta da ONU é ilustrativo dessa liberdade e, de fato, os Estados preferem utilizar os meios diplomáticos de solução de conflitos mais do que os instrumentos jurisdicionais. No entanto, os Estados são obrigados a negociar, porque a não negociação pode conduzir à guerra, o que o direito internacional tem como objetivo geral, evitar. Em alguns casos, para impedir uma ameaça à paz internacional, quando há resistência dos Estados, a comunidade internacional pode induzir os Estados em litígio a adotarem um determinado instrumento de solução de controvérsias. (VARELLA, 2012, p. 402)

3.1.2. Bons ofícios

Neste caso trata-se de negociações feitas entre dois Estados que não mantém relações diplomáticas. Aqui será necessário a interferência de um terceiro, chamado de prestador de bons ofícios, o qual não irá propor soluções para o conflito, mas tentará aproximar as partes de forma neutra para que elas possam negociar.

3.1.3. Mediação

Na mediação o mediador propõe uma base jurídica que fundamentará todo o processo de negociação, busca diminuir os dissensos e aproximar as distintas soluções desejadas pelas partes. Muitas vezes, o mediador prepara o ambiente para a negociação, colaborando desde o seu início e até o seu desfecho, podendo oferecer uma solução ao litígio, não definitiva. Seu objetivo principal, além de restabelecer relações diplomáticas, é fazer com que a mediação seja conduzida por chefes de Estado, por autoridades religiosas, o que não exclui, todavia, a possibilidade de tal mediação ser conduzida por Organizações Internacionais, como o Conselho de Segurança da ONU ou mesmo por uma organização não governamental de prestígio. (VARELLA, 2012, p. 403)

3.1.4. Investigação

Também é conhecida como inquérito. O objetivo da investigação é apurar os fatos e direitos relativos a um conflito. Conduzidas por comissões semelhantes as de conciliação, na qual é composta por representantes das partes e investigadores neutros.

3.1.5. Conciliação

É um procedimento facultativo de negociação, no qual é conduzido por uma comissão de conciliadores, sendo esta composta por representantes dos Estados em conflito e elementos neutros. Cada litigante indica dois conciliadores de sua confiança, sendo necessariamente dois conciliadores nacionais dos Estados em conflito e após a composição dos quatro personagens, estes apontam um quinto conciliador, a quem será confiada à presidência da comissão. Os conciliadores fixam as bases para a negociação.

3.2. Instrumentos Jurisdicionais de Solução de Controvérsias

Por outro lado, os conflitos podem ser dirimidos por instrumentos jurisdicionais, quais sejam, a arbitragem e a decisão jurisdicional.

3.2.1. Arbitragem

A arbitragem é uma via jurisdicional de solução pacífica de conflitos internacionais, na qual o arbitro escolhido pelas partes, tem o poder decisório sobre a solução dada ao conflito. Quando ocorre uma decisão as partes devem obedecer ao seu cumprimento, pois de acordo com o princípio pacta sunt servanda o acordo feito deve ser cumprido. Insta ressaltar que o arbitro pode solucionar conflitos que envolvam interesses econômicos e estratégicos importantes, pois é um instrumento aceito pelos Estados. O órgão arbitral é de livre composição dos Estados, devendo ter um número impar de membros para evitar empates nas votações. Existem diferentes possibilidades:

Arbitro único: neutro, escolhido de comum acordo entres as partes.

Comissão mista: com dois representantes de cada Estado, os quais, em comum acordo, irão eleger um quinto membro, cuja singularidade é a neutralidade.

Tribunal colegial: com diversos membros, tanto dos Estados, como neutros, mas sempre em número equitativo e ímpar. Os árbitros neutros são em geral maioria e coordenam os trabalhos. (VARELLA. 2012,p. 407)

3.2.2. Cortes Internacionais

Quando um conjunto de Estados cria um tribunal internacional, há uma atribuição de capacidade do direito interno ao direito internacional. Atribui-se à corte o poder de rever determinados atos ou interpretações jurídicas, comprometendo-se a se submeter as suas próprias decisões. Cada corte terá suas próprias competências e, dessa forma, exercem uma função jurisdicional, tendo por objetivo indicar o direito aplicável a determinado caso.

3.2.2.1. Corte Internacional de Justiça

A Corte Internacional de Justiça (CIJ) é o principal órgão judiciário das Nações Unidas. Ela foi criada em junho de 1945 pela Carta das Nações Unidas e começou a funcionar em 1946. Sua sede fica no Palácio da Paz em Haia (Holanda).

 A função da Corte é de solucionar, em concordância com o direito internacional, disputas legais submetidas por Estados, além de oferecer pareceres consultivos sobre questões legais apresentadas por órgãos autorizados da ONU e outras agências especializadas.

A Corte é composta de 15 juízes, que são eleitos para mandatos de nove anos pela Assembléia Geral da ONU e pelo Conselho de Segurança. Ela é apoiada por um corpo administrativo e seus idiomas oficiais são o inglês e o francês.

A Assembléia Geral e o Conselho de Segurança votam simultaneamente, mas separadamente. Para ser eleito, um candidato deve receber a maioria absoluta dos votos dos dois órgãos. Para que se mantenha certo nível de continuidade, um terço da Corte é eleito a cada três anos, sendo que um votação especial pode ser feita caso algum dos juízes venha a falecer ou afastar-se do cargo. Todos os Estados partes no Estatuto da Corte têm o direito de propor candidatos, só que não por meio de seus governos, e sim por um grupo formado por membros da Corte Permanente de Arbitragem designada pelo Estado. Os juízes eleitos devem ser pessoas de alto caráter moral, que possuam as qualificações necessárias para ocupar os mais altos cargos no judiciário de seu próprio país ou ser jurisconsultos de competência reconhecida em direito internacional público.

Nenhum membro da Corte poderá ocupar outro cargo durante seu mandato. Não poderá exercer nenhuma outra função política ou administrativa, nem agir como agente, conselheiro ou advogado em nenhum caso. E mesmo não havendo a obrigação da Corte em estar permanentemente em sessão, seu Presidente é obrigado a morar na Haia. Juízes brasileiros que ocuparam a Corte Internacional de Justiça: Rui Barbosa (eleito, mas não tomou posse), Epitácio Pessoa, Filadelfo de Azevedo, Levi Carneiro, José Sette Câmara e José Francisco Rezek.

A Corte pode receber dois tipos de casos: disputas legais submetidas por Estados (casos contenciosos) e pedidos por pareceres consultivos a respeito de questões legais apresentadas por órgãos das Nações Unidas ou agências especializadas (pareceres consultivos). Para os casos contenciosos, as decisões da Corte são definitivas e obrigatórias a todos os Estados que aceitam sua jurisprudência (Estados partes do seu Estatuto), e derivam da lei internacional – derivada de tratados ou convenções – do costume internacional e dos princípios do direito.

4. Pressupostos Processuais Comuns

4.1. Legitimidade das partes: São sujeitos de direito internacional, as Organizações Internacionais e os Estados, apenas esses tem capacidade postulatória.

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4.2. Interesse de agir: É preciso mostrar interesse de agir para fazer parte de um processo internacional, nenhum Estado ou organizações têm a liberdade para entrar em um processo se não tiver esse interesse ou se não for caso de repercussão geral ou de oponibilidade erga omnes.

5. Conflitos Internos e do Direito Internacional Público

A doutrina formulou duas teorias acerca da relação entre o Direito Internacional e o Direito Interno.  Defende a teoria dualista que o Direito Internacional e o Direito Interno são dois sistemas jurídicos distintos e independentes, regulando o último as relações entre os Estados e, por conseguinte, não originando obrigações para os indivíduos.

Já a teoria monista determina que o Direito é único tanto nas relações do Estado para com a sociedade, quanto nas relações entre Estados. Esta teoria ainda divide-se em duas correntes. A denominada Monismo internacionalista prevê que, existindo dúvida entre a aplicação de normas do Direito Internacional em face do Direito Interno a norma internacional prevalecerá sobre a interna. A outra, chamada de Monismo nacionalista defende que nesta mesma situação, a primazia será do direito Interno sobre o Direito Internacional.

A Constituição Federal é silente quanto à teoria adotada pelo Brasil. Contudo, o Supremo Tribunal Federal se posicionou no sentido da aplicação da Teoria Dualista moderada, recebendo o Tratado Internacional status de Lei Ordinária, por disposição constitucional, salvo os casos de Tratados sobre Direitos Humanos, cujo § 2º do artigo 5º da Constituição Federal lhes atribui eficácia de norma supralegal.

O traço distintivo da teoria dualista reside no entendimento de que a fonte do direito interno é a vontade de um só Estado, ao passo que a fonte do direito internacional é a vontade dos Estados em conjunto; além disso, eles não regem as mesmas relações; desse modo, o direito internacional e o direito interno são não somente parte ou ramos distintos do direito, mas sim sistemas jurídicos diferentes, razão pela qual é impossível que haja uma concorrência entre as fontes desses dois sistemas jurídicos.

Como se vê, para a teoria dualista, o direito internacional e o direito interno têm fontes, destinatários e objetos diferentes, razão pela qual, tecnicamente, não há possibilidade de conflito entre eles. Pelas teorias monistas, o direito internacional é apenas a versão do direito interno que o Estado aplica em âmbito internacional ou vice-versa. Assim, a repercussão na ordem jurídica interna de normas constantes de tratados faz-se a título de vigência plena e não a título de transformação material em direito interno, ao contrário do que sustenta a teoria dualista.

A principal diferença entre a teoria monista e a teoria dualista reside na necessidade ou não de transformação da norma internacional por meio de um ato interno (ou de criação de norma interna, na pureza da tese dualista), para que a norma internacional passe a ter validade no âmbito interno de cada Estado. De acordo com a teoria monista, não há necessidade de uma "incorporação" da norma internacional no direito interno, exatamente porque não há separação absoluta entre direito interno e direito internacional. A recepção é, por assim dizer, automática, pois a norma internacional vale por si mesma no ordenamento jurídico interno. O que existe são normas internacionais (tratados) e normas internas (leis), que poderão estar em choque, hipótese em que será dada prevalência a uma ou outra.

De acordo com os adeptos da teoria monista nacionalista, há prevalência da norma interna; já os adeptos da teoria monista internacionalista sustentam que a prevalência é da norma internacional. Para a teoria dualista, ao revés, existe sim a necessidade de incorporação da norma internacional em direito interno. A recepção da norma internacional em direito interno não é automática, é preciso que exista um ato de incorporação. A norma internacional deve ser "transformada" em direito interno, pois o que vale no direito interno é o ato interno e não o tratado internacional. Não há choque entre a norma internacional e a norma interna. Por isso, de acordo com a teoria dualista, não há conflito entre lei e tratado: o que existe é conflito entre a lei interna e a norma interna que incorporou no direito interno o tratado internacional.

A Constituição do país deverá dizer se a norma internacional, que foi incorporada ao direito interno, tem hierarquia maior, menor ou idêntica às leis internas. A ratificação do tratado não gera efeitos perante o direito interno brasileiro, necessitando que exista decreto do Presidente da República para a entrada em vigor do tratado perante o direito interno, é no sentido de que o direito constitucional brasileiro adota a teoria dualista, no sentido de que não há recepção automática das normas de direito internacional, sendo necessária a "transformação" da norma de direito internacional em direito interno, ou melhor, de criação de norma interna para dar eficácia ao tratado, ainda que vários doutrinadores possam criticar essa posição política. Contudo, de acordo com o magistério de Alberto Xavier, o tratado é válido no âmbito do direito interno do Brasil ainda que não tenha existido decreto do Presidente da República a incorporá-lo como norma interna, a conclusão deve ser no sentido de que o Brasil é monista em matéria de direito internacional.

A opção constitucional pelo monismo ou pelo dualismo (isto é, existência ou inexistência de cláusula de recepção automática) não diz respeito à prevalência da norma internacional ou da norma interna. A norma internacional pode estar em dissonância com a norma interna. Nisso reside o conflito entre a norma internacional e a norma interna. Ambas regulam abstratamente uma mesma questão jurídica, mas as soluções por elas previstas são distintas. A solução do conflito reside na análise da possibilidade de revogação de uma norma por outra. Apenas para se utilizar uma nomenclatura correta, caso se adote a teoria monista, é tecnicamente acertado dizer que o tratado poderá revogar a lei interna, pois o tratado internacional validamente celebrado é parte, por si só, do ordenamento jurídico interno do Estado. Adotando-se a teoria dualista, não é possível dizer que o tratado revoga a lei ou que a lei revoga o tratado, uma vez que de acordo com essa teoria cada uma dessas normas está em ordens distintas e incomunicáveis. A par dessa questão terminológica, que tem como fundo exatamente da discussão doutrinária das mencionadas teorias, o primado da norma internacional ou das leis internas não se circunscreve à discussão entre as teorias dualista e monista, cujo ponto interessante é unicamente quanto à necessidade de incorporação da norma internacional por ato formal (tese dualista) ou pela desnecessidade de qualquer ato, uma vez que a norma internacional vale por si só, enquanto norma jurídica, perante o direito interno (teses monistas).

Para resolver o problema de conflito entre direito internacional e direito interno não é preciso avaliar qual das teorias apontadas é a correta. Este ponto, assim, é fundamental: tanto pela teoria dualista como pela teoria monista é possível solucionar o conflito de normas pela prevalência do direito internacional ou pela prevalência do direito interno. A solução para o conflito reside na análise das normas do direito internacional e do direito interno. Na verdade, tanto o direito interno como o direito internacional estabelecem formas de resolução dos conflitos entre a norma internacional e a norma interna, de modo que a prevalência de uma ou de outra pode ter resultados distintos de acordo com o direito interno e com o direito internacional.

De acordo com o sistema jurídico brasileiro, o que se pode discutir é se a lei interna pode revogar a norma interna que consubstancia o tratado internacional ou suspender a eficácia do tratado internacional no âmbito interno. Com efeito, se o tratado internacional não foi posto em vigor no âmbito do direito interno não é logicamente possível a revogação do ato de incorporação pela lei interna. A questão da possibilidade ou impossibilidade de revogação de um tratado (ou do ato interno que incorporou o tratado ao ordenamento jurídico nacional) por uma lei interna reside na análise da existência ou inexistência de hierarquia entre lei e tratado internacional.

Além disso, é preciso compreender que os tratados celebrados pelos Estados podem consistir na criação de obrigações para si, entendendo-se a expressão "Estado" como sinônimo de pessoa jurídica. Por outro lado, os tratados celebrados pelos Estados podem consistir não na criação desse tipo de obrigação, mas sim na criação de normas jurídicas de direito privado ou mesmo de direito público, que irão reger relações entre particulares no âmbito dos respectivos Estados, ou mesmo relações entre particulares e um dado Estado signatário ou ainda relações entre os Estados signatários.

Assim, os Estados signatários se comprometem a inserir, nos respectivos ordenamentos jurídicos (direito interno), as regras oriundas do tratado em questão. Cada ordenamento jurídico, por óbvio, terá suas próprias regras de transformação ou inserção da norma positiva internacional no direito interno (criação de norma interna, de acordo com a terminologia da teoria dualista). Feito isso, a norma de direito internacional passa a ser também norma de direito interno. Disso pode decorrer choques, pode um tratado internacional, após ter sido convertido em direito interno, revogar uma lei interna? Pode uma lei interna superveniente revogar um tratado internacional convertido em direito interno? É pacífico na doutrina brasileira que os tratados internacionais, inseridos no direito interno pelos procedimentos próprios, tem o condão de derrogar ou revogar a norma legal pretérita conflitante.

A divergência surge no tocante à possibilidade da lei superveniente à promulgação do tratado ser capaz de alterá-lo. É certo que a Constituição Federal de 1988 não determina ao menos de forma expressa, que tratados internacionais sejam hierarquicamente superiores às leis. Podemos imaginar que a lei não pode alterar um tratado internacional, posto que a forma de alteração de um tratado é por meio de um protocolo, e a extinção do tratado é por meio da denúncia. Nesse sentido, a revogação, por meio de um ato interno, da norma de direito internacional incorporada ao direito nacional criaria um constrangimento nas relações entre os Estados, posto que haveria um descumprimento das obrigações estabelecidas. Isso consistiria em um ilícito internacional, sujeitando o país a sanções internacionais e, em casos extremos, até mesmo à guerra.

A maior parte da doutrina brasileira afirma que a lei não pode "revogar" o tratado internacional ou, melhor dizendo, revogar a norma interna que dá eficácia ou incorpora o tratado internacional no direito interno. Embora reconheça a ausência de dispositivo constitucional expresso a determinar a prevalência do tratado internacional pretérito em face da lei superveniente, sustenta a maior parte da doutrina brasileira que a prevalência da norma internacional reside no critério da especialidade, ou seja, a norma internacional é norma especial em relação à lei interna e no princípio de que os contratos (no caso, o tratado) devem ser cumpridos (pacta sunt servanda).

Outros doutrinadores vão além, afirmando que nem mesmo uma mudança da Constituição teria o condão de revogar o tratado. Uma segunda posição vai a sentido oposto: exatamente porque nossa Constituição não estabelece que o tratado é norma hierarquicamente superior à lei, poderia a norma superveniente revogar a norma pretérita. Assim, um tratado ou a norma interna que dá aplicabilidade ao tratado poderia revogar ou suspender a eficácia da lei e vice-versa. Qual posição é tecnicamente correta? Ou melhor, é possível afirmar que apenas uma determinada posição doutrinária ou apenas uma interpretação de determinada norma jurídica, dentre várias outras possíveis, é a única tecnicamente "correta"? Por todas essas razões, parece que a interpretação tecnicamente mais adequada é que a norma internacional convertida em direito interno (norma interna, portanto), pode ser revogada ou alterada pela lei superveniente, ou seja, pode a lei superveniente suspender, no âmbito interno, a eficácia do tratado internacional.

Isso não significa, de acordo com o direito brasileiro, que a lei posterior estará a revogar ou a alterar, o tratado, mas sim que ela revoga a norma de direito interno que consubstancia, nesse direito interno, a norma internacional. No plano externo, por óbvio, o tratado continua íntegro, até que seja denunciado pelas partes que o criaram.

Assim, os tribunais brasileiros, diante da aplicabilidade da legislação brasileira, de acordo com as normas do direito internacional privado, deverão aplicar o direito interno, reconhecendo a existência, por parte da lei superveniente, da suspensão dos efeitos do tratado ou revogação do ato interno que incorporou o tratado no direito interno. O mesmo deverá ocorrer se um tribunal estrangeiro, que pelas normas do seu direito internacional privado, for aplicar o direito brasileiro. Porém, um tribunal estrangeiro, que pelas normas do seu direito internacional privado, deva aplicar o seu direito local, ou um tribunal brasileiro, que pelas normas de direito internacional privado brasileiro, deva aplicar o direito estrangeiro, deverá aplicar a norma de direito internacional (o tratado) tal como inserida no direito interno do país estrangeiro – na verdade, deverá aplicar norma de direito interno, do país estrangeiro, que poderá ser a decorrente do tratado - ao qual a norma de direito internacional privado remeteu. Em outras palavras, fora do âmbito do direito interno do Brasil, a "revogação" do tratado ou a revogação do ato interno que o incorporou ao direito nacional poderá não ter qualquer efeito.

Evidentemente, o ato ilícito internacional, decorrente do descumprimento do tratado, poderá existir, dependendo do que dispuser o direito internacional, que normalmente não acolhe a possibilidade de revogação do tratado ou da suspensão dos seus efeitos por ato interno de um país. Estará o Estado que, por ato interno, revogou a norma internacional internalizada, sujeito a sanções internacionais. Mas nada disso se confunde com a validade, no plano interno, das disposições da lei superveniente que suspendeu a eficácia do tratado no plano interno ou revogou a norma interna decorrente do tratado internacional.

Para a Jurisprudência brasileira, o julgamento do Recurso Extraordinário nº 80.004/SE, julgado em 10/06/77, representou um marco importante que admite hoje a possibilidade, pela lei superveniente, de revogação do ato que incorpora o tratado internacional ao direito interno ou suspensão dos efeitos da norma internacional no direito interno. Lembra o ministro Francisco Rezek que esse julgamento valeu-se de precedentes do próprio STF, fundamentando que a Constituição Federal não prevê privilégio hierárquico do tratado internacional sobre as leis internas, razão pela qual o Judiciário deve dar prevalência à norma posterior. Contudo, a Emenda Constitucional nº 45 introduziu o § 3º ao art. 5º da Constituição Federal, estabelecendo status aos tratados internacionais sobre direitos humanos que passaram a ter hierarquia de norma constitucional. Portanto, a partir de agora, os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. Isso não significa, evidentemente, que os tratados já incorporados ao ordenamento jurídico interno passam a ter status constitucional. Para tanto, é necessária a aludida aprovação em cada Casa do Congresso, em dois turnos, por três quintos dos votos. Até que isso ocorra, o tratado (ou a norma interna que o incorporou ao direito interno) continua valendo com força de lei.

A partir de então os tratados internacionais que versarem sobre direitos humanos serão introduzidos no ordenamento jurídico interno por aprovação em dois turnos de três quintos dos membros de cada uma das casas do Congresso Nacional e terá status de Emenda Constitucional, neste caso a teoria aplicada é a dualista. Nas demais matérias já que a Constituição não definiu, poderá os tratados serem introduzidos no ordenamento jurídico por instrumento jurídico diverso ou até mesmo por nenhum instrumento e aí evidencia a aplicação tanto da teoria dualista (se houver instrumento) ou monista se não houver nenhum instrumento.

No Brasil, porém, entendem tanto a doutrina como a jurisprudência que a teoria adotada é a dualista e ainda que os conflitos entre tratados internacionais e direitos internos são resolvidos no âmbito de abrangência do cada instituto jurídico (direito interno e do direito internacional).

6. Conclusão

Os Estados signatários de tratados internacionais têm envidado esforços para dirimirem os conflitos entre o Direito Internacional e o Direito Interno. É bem verdade que os conflitos afloram das relações entre os entes internacionais e derivam dos mais diversos interesses.

As ferramentas colocadas à disposição dos Estados são diversas e são utilizadas geralmente sob a coordenação da Organização das Nações Unidas e conseguem dirimir a maioria dos conflitos entre as nações.

Entretanto não raras vezes os conflitos se delongam por vários anos e geram guerras sangrentas e inexplicáveis que chegam a exterminar seres humanos e tudo que estiver ao alcance das armas destruidoras.

Estamos assistindo conflitos como o caso da Síria, Líbano, Afeganistão, entre outros que vem expulsando famílias inteiras à busca de paz, alimentos e de lugares pacíficos capazes de lhes proporcionarem uma vida digna.

Temos instrumentos eficazes como a diplomacia que não vem conseguindo estancar estas barbáries, e o que assistimos é violências cada vez maiores.

Com relação aos tratados internacionais os instrumentos são mais eficazes uma vez que os interesses são discutidos antes da formalização dos instrumentos jurídicos internacionais. Desta forma a introdução das normas internacionais no direito interno torna-se mais amena.

No Brasil a Constituição até o advento da emenda 45, não havia manifestado quanto à teoria adotada para recepção dos tratados internacionais. Afirmam a doutrina e a jurisprudência que a teoria que adotamos é dualista e isto restou claro pelo menos com relação aos tratados que versam sobre direitos humanos que foram alçados ao status de norma constitucional, porém necessitam de aprovação pelo Congresso Nacional com as mesmas exigências das Emendas Constitucionais.

Porém quando da introdução destes instrumentos jurídicos há conflitos com as normas de direito interno. Segundo a doutrina e a jurisprudência estes conflitos são dirimidos internamente com a aplicação das normas de interpretação jurídica e a nível externo com as regras de direito internacional, ou seja, para alteração ou extinção de tratado internacional é através de protocolo ou denúncia.

Referências Bibliográficas

Corte Internacional de Justiça - Biblioteca Virtual de Direitos Humanos - <http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Corte-Internacional-de-Justi%C3%A7a/o-que-e.html>. Acesso em: 31 maio. 2016.

ACCIOLY, Hidelbrando; SILVA, G.E. do Nascimento e. Manual de Direito Internacional Público . 15ª ed. rev. E atual. São Paulo: Saraiva, 2002.

 REZEK, José Francisco. Direito internacional público. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 106-107.

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 82-83; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. O STF e os conflitos entre tratados internacionais e leis internas. In "Direito & Justiça", suplemento do jornal "Correio Braziliense". Brasília, 5 de agosto de 2002, p. 3.

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DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 48.

QATHAFI, Muammar al. O livro verde. Tripoli: Empresa Pública de Edição Publicidade e Distribuição, p. 31-33.

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. Saraiva, São Paulo, 2ª edição, 1998, p. 122.

VARELLA, Marcella. Direito Internacional Público. Saraiva, 4ª edição, 2012.

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Sobre a autora
Munick Ferreira Mandrani

Acadêmica de Direito do Centro Universitário de Brasília - UniCEUB.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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