Contradição no DF.: GDF cobra tributos com base na posse sem oferecer nenhuma contraprestação e impede a posse nos condomínios em processo de regularização

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A cobrança de IPTU/TLP/CIP nos Condomínios em processo de regularização, situados em áreas consideradas públicas no D.F. enseja total contradição ante a ausência de implementação de infraestrutura urbana no local por parte do GDF.

A cobrança de IPTU/TLP/CIP nos Condomínios em processo de regularização, situados em áreas consideradas públicas no D.F. enseja total contradição ante a ausência de implementação de infraestrutura urbana no local por parte do GDF, especialmente quando se observa o impedimento, pelo Estado, de uso, pelo contribuinte, da área tributada, promovendo derrubadas desses imóveis tributados. Se a área é pública, há imunidade de impostos. E se o particular que detém a posse não manifesta intenção de obter o domínio (ser dono) da área dita possuída, então não se pode manter a cobrança do IPTU/TLP/CIP, devendo cessar a exação fiscal em caso de renúncia, comprovada ausência ou impedimento da posse ao particular. Além disso, muitas das áreas ditas públicas ou urbanizáveis do D.F. são, na verdade, áreas rurais, que deveriam sofrer incidência de ITR, ao invés de IPTU.

 

Há anos tem-se presenciado situação inusitada no D.F. A cobrança de impostos de contribuintes cadastrados pelo Governo como responsáveis pelo pagamento de IPTU/TLP/CIP, além da TEO - Taxa de Execução de Obras, devida à AGEFIS, sobre imóveis situados em áreas por vezes públicas, ora em conflito ou com sobreposição de registros entre áreas públicas e particulares, e outras tantas particulares propriamente ditas, não desapropriadas, situadas em Condomínios considerados irregulares por não possuírem escritura pública, nem matrícula.

Além do IPTU devido ao Estado, a cada novo imóvel nesses Condomínios a AGEFIS cobra a TEO, mas apesar das taxas e impostos pagos, os imóveis são alvo de grandes operações de derrubadas com base no § 1º do art. 178 da Lei nº 2.105/98 (COE/DF), sob alegação de que a área é pública, quando, em sua maioria, trata-se de áreas com sobreposição de registros e de domínio incerto, não devendo ser aplicado indistintamente o dispositivo invocado, especialmente diante do pagamento das taxas devidas à AGEFIS e dos impostos cobrados pelo GDF.

Recentemente, em 31/3/2016, foi promulgada a Lei Distrital nº 5.646/2016, de autoria da Deputada Telma Rufino, objetivando assegurar o contraditório e a ampla defesa, exigindo, antes de qualquer derrubada, notificação prévia pela Administração Pública aos ocupantes de imóveis edificados em área pública que preencham as seguintes condições: a) deve ser unidade unifamiliar habitada (uma única habitação domiciliar por terreno); b) construído em área que já tenha processo de regularização iniciado ou incluído no PDOT (Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal - instrumento básico da política de desenvolvimento urbano e expansão urbana criado pela LC 17/97, revisado pela LC 803/2009 e atualizado pela LC 854/2012); c) em área urbana, para famílias com renda de até 5 salários mínimos, que não tenham sido beneficiadas em programas habitacionais, residentes no DF há mais de 5 anos e que não possuam outro imóvel no DF; d) em lote que já possua IPTU, com pagamento em dia.

Com receio da amplitude na aplicação dessa Lei, o que poderia tornar moroso e, quiçá, inviável o processo de desocupação de algumas áreas públicas no D.F., a Procuradoria-Geral de Justiça do D.F. e o MPDFT ingressaram com duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADIN (ADI nº 2016.00.2.007685-3 e nº 2016.00.2.007708-5) as quais obtiveram liminar favorável, à unanimidade, no Conselho Especial do TJDFT, formado por 17 Desembargadores, em julgamento recente ocorrido dia 19/4/2016, suspendendo-se a eficácia da Lei com efeito ex nunc (dali por diante).

Para suspensão dessa importante Lei foi considerado o risco de invasões de áreas públicas e a limitação do poder de polícia da AGEFIS, pois, sendo obrigada a notificar previamente os invasores que preencherem os requisitos da Lei nº 5.646/2016, poderia não conseguir atender às demandas a tempo de coibir novas invasões, o que mostra-se um retrocesso, já que muito mais risco correrá o cidadão ocupante de um imóvel em processo de regularização que poderá ter sua moradia derrubada sem prévia notificação formal e sem direito de sequer se defender sobre o ato de derrubada promovido pelo Estado em áreas muitas vezes de domínio incerto, no qual não se sabe, ainda, se de fato são públicas ou particulares, porque não detém habite-se, alvará de construção, nem matrícula do imóvel no cartório de registro de imóveis, já que para obter tais licenças, necessita antes da regularização pelo Estado.

Fato é que, a exação fiscal e cobrança de taxas sobre lotes em regularização no D.F., em si, servem ao menos como meio de se evitar a clandestinidade, a precariedade, demonstrar a boa fé do adquirente do imóvel que esteja em dia com sua obrigação de contribuinte, além de viabilizar o conhecimento pelo Estado do possuidor do imóvel, de modo que o contribuinte não seja confundido com invasor, criminoso ou “grileiro”, seja de área pública ou particular.

Além disso, a posse com animus domini (expressão em latim que significa “intenção de agir como dono”) é fato gerador do IPTU, conforme prevê o artigo 34 do Código Tributário Nacional, justificando a cobrança pelo Fisco. O fato gerador do IPTU é a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município ou do Distrito Federal.

O questionamento e legalidade da cobrança desses impostos (IPTU/TLP/CIP) pelo GDF aos condôminos de Condomínios irregulares (sem escritura) decorre do fato de serem cobrados TLP/CIP/IPTU, mas, por outro lado, recebem a mínima, ou na maioria dos casos, nenhuma contrapartida do Estado no sentido de urbanização e regularização de áreas onde situam-se tais Condomínios em processo de regularização no D.F., os quais formam atualmente quase 24% da população de todo o D.F., estimando-se que dentre os 545.651 habitantes que vivem em condomínios habitacionais, cerca de 533.561 cidadãos brasilienses vivem hoje em imóveis irregulares dentre os 513 parcelamentos informais catalogados, dos quais 379 são urbanos (74% do total de parcelamentos informais) e 134 são rurais (26% do total).

Apesar de ter ocorrido invasões de áreas públicas no D.F., fato este notório, consolidando-se durante anos a fio grandes Condomínios e até mesmo Bairros ao redor do plano piloto, com a conivência ou omissão do Estado, que nada fez para impedir essas expansões na época, fato é que, muitas outras áreas ocupadas não decorrem de áreas públicas, mas sim, de áreas particulares advindas das enormes fazendas que existiam na área rural do D.F. quando ainda integrava o Estado de Goiás. Outras áreas que o GDF alega serem públicas por terem sido supostamente desapropriadas em proveito e benefício da TERRACAP, na verdade não possuem a documentação de desapropriação, estando em áreas de domínio incerto, cuja delimitação e natureza, se público ou privada, aguarda definição em longos entraves no Poder Judiciário, sendo que o Estado deveria se empenhar para delimitar suas áreas adequadamente, mas não o faz.

Aparentemente, a TERRACAP, com o fito de exercer domínio sobre as áreas mais valiosas ou interessantes para sua área de negócio, recusa-se ou evita investir recursos na demarcação das áreas desapropriadas em comum com a União ou desapropriadas parcialmente, nas quais o domínio é partilhado com particulares, o que acaba estimulando as ocupações de áreas públicas ou de domínio incerto, já que não se sabe exatamente o que é terra de quem.

Deste modo, uma vez que o Estado omitiu-se na maior parte dos casos, durante anos, deixando ocupações irregulares tornarem-se grandes Condomínios, bem como o próprio GDF reconhece estas áreas como urbanas, impondo exação fiscal por meio das cobranças de IPTU/TLP/CIP aos condôminos desses lotes, espera-se, no mínimo, uma contraprestação adequada do Estado no sentido de implementar infraestrutura básica de urbanização dessas áreas, mediante instalação de iluminação pública, saneamento básico, fornecimento de água tratada, coleta de lixo pública e seletiva, pavimentação nas vias de acesso e nas vias internas dos Condomínios, colocação de meio fio nas pistas, placas, entre outros benefícios próprios da arrecadação de impostos e relacionados especialmente ao fato gerador dessa espécie de imposto atribuído à urbanização e limpeza pública.

Para os efeitos deste imposto, é contribuinte o proprietário do imóvel; o titular do seu domínio útil; ou o seu possuidor a qualquer título. Esse último somente quando demonstrado o animus domini. Este é o maior embate, pois o GDF vem catalogando aqueles que se intitulam proprietários de imóveis ou possuidores em razão de cessões de direito obtidas referente a lotes em Condomínios irregulares, que ainda não possuem escritura pública, nem habite-se, estando, ainda, em fase de regularização, porém, muitos proprietários ou possuidores desses lotes sequer estão podendo exercer seu direito de posse/propriedade sobre o imóvel, ficando impedidos de construir por ser a área supostamente pública, ou por não possuírem escritura, consequentemente a obra edificada não possui alvará, ensejando derrubadas e, por vezes, a truculenta atuação do Estado com uso de força policial para impedir a ocupação e uso.

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O cadastramento de tais imóveis, ainda que com fim único de incidência dos tributos, produz alterações na condição jurídica dos seus possuidores, sendo, uma delas, o afastamento da clandestinidade que em geral pesa sobre essas modalidades de apossamentos diretos. Ora, se o Governo pretende atribuir ao particular proprietário de lote, ou ao menos possuidor e adquirente de boa fé mediante cessão de direito, portanto, condôminos de Condomínios em processo de regularização, a qualidade de contribuinte do IPTU/TLP e CIP, o GDF deve, obrigatoriamente, seguindo o comando do artigo 32, § 1º e seus cinco incisos do CTN, observar o requisito mínimo de área urbana para impor a exação fiscal.

Além disso, é uma total contradição impedir a construção, posse, detenção e moradia do cidadão que alega ser dono ou possuidor do imóvel, e ainda assim cobrá-lo anualmente do encargo fiscal de IPTU/TLP e CIP. De fato, muito se questiona a incidência do IPTU sobre imóveis irregulares quando não edificados, no caso, lotes vazios, quando sabe-se, de antemão, que não será expedida licença do poder público para construção em determinado parcelamento irregular de solo. Isso porque, a cobrança válida desse imposto pressupõe, ao menos, que o imóvel do qual se origina a cobrança possa, a qualquer tempo, se atendidos os reclamos ordinários das normas de edificações, ter sua área disponível regularmente edificada, do contrário, se não haverá nem mesmo a possibilidade ou reconhecimento do Estado em uma futura regularização da área, não haveria por que se cobrar o imposto, já que o contribuinte em questão sequer pode dispor ou usufruir do imóvel.

Para agravar ainda mais a situação, a alíquota do IPTU para a chamada “terra nua” é de 3% (sem construção), logo, bem maior do que a cuja área estiver construída mediante alvará de obra, a qual é reduzida para 1% se o terreno for comercial e 0,3% se for residencial, justamente para se incentivar o uso da propriedade com o fim de atender à função social, evitando-se o mero caráter ou intuito econômico sobre o imóvel.

Então o Estado cobra o imposto com base na posse com animus domini, mas nega a posse pretendida sob o pretexto de tratar-se de área pública? Se a área é pública então não há a incidência do imposto! E se há incidência do imposto em razão da posse, deve-se ao menos resguardar a manutenção dessa posse ao contribuinte cobrado anualmente do imposto.

Logo, o Governo somente deve tributar desse imposto o contribuinte que de fato pode usufruir do imóvel, seja na qualidade de proprietário, seja na qualidade de detentor do domínio, ou ainda, seja na qualidade de possuidor desde que com vontade e intenção de exercer o domínio sobre a coisa (animus domini), de modo que a cobrança contra sujeito passivo que sequer pode dispor do imóvel por impedimento do próprio Estado torna-se verdadeiro confisco e enriquecimento sem causa do erário.

A cobrança de IPTU/TLP/CIP nos Condomínios em processo de regularização, situados em locais considerados de patrimônio público no âmbito do D.F. enseja total contradição ante a ausência de implementação de infraestrutura urbana no local por parte do Governo, especialmente quando se observa o impedimento, pelo Estado, de uso, pelo contribuinte, da área tributada, promovendo derrubadas desses imóveis tributados. Se a área é pública, há imunidade de impostos. E se o particular que detém a posse não manifesta intenção de obter o domínio (ser dono) da área dita possuída, então não se pode manter a cobrança do IPTU/TLP/CIP, devendo cessar a exação fiscal em caso de renúncia, comprovada ausência ou impedimento da posse ao particular. Além disso, muitas das áreas ditas públicas ou urbanizáveis do D.F. são, na verdade, áreas rurais, que deveriam sofrer incidência de ITR, ao invés de IPTU.

Por todo exposto, é importante buscar-se medidas para sanar tal irregularidade nas áreas ocupadas por Condomínios irregulares ou em processo de regularização no D.F., devendo-se avaliar a possibilidade de edição de Lei Distrital para tratar das limitações sobre a imposição do IPTU/TLP/CIP aos possuidores e proprietários de lotes em Condomínios irregulares no D.F., bem como a possibilidade de edição de Lei Complementar pela União Federal, a fim de tratar sobre as limitações da tributação em questão. O Ministério Público ou a OAB/DF também poderiam intervir manejando competente Ação Civil Pública com LIMINAR exigindo a declaração de inexistência de relação jurídica para os casos em que não deva ocorrer a tributação, podendo os valores devidos a título de IPTU serem depositados em juízo.

Leia a íntegra em: http://alencardomingues.adv.br/?p=407

Sobre o autor
Ronald Alencar Domingues da Silva

Advogado Sócio do Escritório Alencar Domingues Advogados Associados,

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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