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A declaração da insolvência do franqueador: efeitos da falência nos contratos internacionais de franchising

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4. A FALÊNCIA EM EMPRESAS INTERNACIONAIS E SUA CAPACIDADE DE COMPROMETER A EFICÁCIA DOS CONTRATOS DE FRANCHISING, À LUZ DO PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL

Conforme relatado anteriormente, o contrato de franquia é caracterizado pela relação obrigacional entre franqueador e franqueado, pela autorização do uso da marca e a disponibilização dos benefícios que o contrato em questão traz, como fornecimento de táticas administrativas, matéria-prima e know-how. Nesta feita, Gladson Mamede (2004) afirma que não obstante as franqueadoras e as franqueadas estejam interligadas por um elo contratual obrigacional, nada obsta que estas sejam independentes daquelas. Aduz ainda, que tal independência é elencada no plano do Direito Civil, sendo totalmente cabível alegar que em um processo de falência, a decretação da falência do franqueado não leva à falência do franqueador, como vice-versa, tendo em vista que se trata de pessoas jurídicas diferentes.

Tanto são pessoas e personalidades jurídicas diferenciadas, que cada uma tem um patrimônio jurídico próprio e existência própria, embora estejam vinculadas através do contrato de franquia. No entanto, pode-se afirmar que o fato da decretação da falência da franqueadora não induzir a falência da franqueada, em razão desta independência que estas têm entre si, há de se prosperar apenas no âmbito processual, e não na realidade fática das relações mercadológicas.

Isto é, a decretação da falência de uma franqueadora que oferece para suas franqueadas know-how, técnicas de administração e, sobretudo, matéria-prima – no caso do McDonald’s, por exemplo, pães e carne de hambúrguer – irá obstar o envio destes benefícios para as franqueadas em razão da impossibilidade do franqueador de continuar com as suas atividades empresárias ou pela impossibilidade de manter a produção por ausência de capital. Assim sendo, se tais benefícios não puderem ser enviados ou fornecidos pelo franqueador, de que forma a franqueada irá prosperar no mercado pela falta dos produtos que identificam a marca da franquia?

Nesta feita, sem dúvidas, a decretação de falência pode interferir em contratos internacionais de franquias ainda vigentes, dessa forma, pode-se dizer que a imagem pejorativa que estigmatiza e assombra o franqueador pode prejudicar o bom desenvolvimento das atividades realizadas pelo franqueado, causando prejuízos diretos e indiretos que podem ser irreversíveis. Assim sendo, a falência do franqueado pode produzir danos que ultrapassem a barreira obrigacional, haja vista que seus efeitos se tornam imprevisíveis, e por isso mais difíceis de serem controlados, em cenários internacionais.

Destarte, é notável a existência de uma “energia magnética” proveniente do processo de falência, que causa efeitos a todos que possuem alguma relação jurídica com a empresa que está passando pelo processo de falência, atraindo assim todas as obrigações da mesma. Diante disso, vale trazer à baila o entendimento do doutrinador Gladston Mamede, que considera que essa “atração fundamenta-se na necessidade de dar ampla proteção a todos que mantenham relações jurídicas com o devedor, além dos que tenham interesse sobre a empresa, designadamente os interesses difusos de trabalhadores, da comunidade em geral e do Estado, destacando a sua função social” (2009, p. 294-295)

Seguindo nessa esteira, resta caracterizado o princípio da função social na franquia internacional, pois uma vez decretada a sua falência, o interesse sobre a empresa estaria afetado, o que causaria efeitos diretos na sua economia, o que por sua vez acarretaria desde uma eventual demissão de funcionários até a desistência do exercício das atividades empresariais do franqueado. Sintetizando a questão:

o princípio compreende a continuidade das atividades de produção de riquezas como um valor que deve ser protegido, sempre que possível, reconhecendo, em oposição, os efeitos deletérios da extinção das atividades empresariais, que não só prejudica o empresário ou sociedade, prejudica todos os demais: trabalhadores, fornecedores, consumidores, parceiros negociais e o Estado”. (2009, p.317)

Chega-se a conclusão então, que os prejuízos decorrentes da decretação de falência em uma empresa transnacional vão muito além da questão econômica, influenciando também, a depender da magnitude da franquia, na vida de milhares de pessoas, sejam elas trabalhadores da empresa ou pessoas que de alguma maneira se utilizam dos serviços prestados por ela, originando assim perdas incalculáveis e incontroláveis. Diante do exposto, pode-se dizer que a maneira mais adequada de proteger uma franquia internacional que está a beira da falência, seria buscar reverter a situação por meio de um processo de recuperação que pode variar de país para país.


CONCLUSÃO

Não é novidade, que a franquia é um dos institutos mais relevantes do direito empresarial hoje em dia, seja porque representa a possibilidade do franqueador expandir seus negócios e estabelecer padrões em sua empresa que devem ser respeitados; seja, porque ela permite ao franqueado adquirir um negócio que traz certa estabilidade, haja vista que seguindo os padrões estabelecidos e respeitando os costumes e necessidades daqueles que podem vir a se utilizar dos produtos ou serviços prestados pela franquia, é difícil que uma franquia venha a passar por um processo de falência.

Entretanto, existem coisas que fogem do controle do franqueado, como por exemplo, no caso de franquia transnacional, onde as decisões tomadas pelo franqueador, a depender dos costumes e do cenário socioeconômico no qual está inserida aquela franquia, podem causar uma quebra na estabilidade do negócio, quando, por exemplo, determinada franquia não se adapta aos anseios e necessidades de determinada população, ou quando por vezes ocorrem descuidos em casos isolados que podem tomar proporções imensas, prejudicando a imagem da franquia.

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Posto isso, conclui-se que a declaração de insolvência do franqueador, especificamente em termos de franquias internacionais, de fato prejudica o bom desenvolvimento das atividades a serem realizadas pelo franqueado, sobretudo porque passa uma imagem de fragilidade e deficiência do negócio, tornando-o menos atraente para os interessados que desejam de alguma forma usufruir daquele serviço. Sendo assim, se mostra necessário que a franquia passe por um processo de recuperação o mais rápido possível, a fim de que a situação seja revertida o quanto antes para que os prejuízos causados pelo fato da empresa ter chegado á beira da falência, sejam os menos gravosos possíveis.


REFERÊNCIAS

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HARADA, Kiyoshi. Aspectos Tributários da Nova Lei de Falências. Curitiba: Juruá, 2006.

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MOLINA, Ana Carolina Vivarelli; LUZ, Rodrigo Rodrigues da. O Franchising como Modalidade de Investimento Estrangeiro e de Transferência de Tecnologia. São Paulo: 2010.

NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa, 2ª ed. São Paulo, SP. Saraiva, 2007.

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PACHECO, José da Silva. Processo de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência. 2ª Ed. Rio de Janeiro, RJ. Editora Forense, 2008.

REQUIÃO, Rubens. A crise do direito falimentar brasileiro: a reforma da lei de falências. Revista de Direito Mercantil, nº 14. set\out. 2000

SIMIONATO, Frederico Augusto Monte. Tratado de Direito Falimentar, 1ª Ed. Rio de Janeiro, RJ. Forense, 2008.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Contratos em espécie. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2012.


Notas

1 Associação Brasileira de Franchising. Desempenho 2012-2013: Dados disponíveis em: <https://www.portaldofranchising.com.br/numeros-do-franchising/desempenho-2013-2012> Acesso em 7 de abr de 2014.

Sobre os autores
Mayara Fanjas Colares

Acadêmica de Direito

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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