Art. 41-a da Lei 9504/97: uma análise da captação ilícita do sufrágio (compra de votos) incluindo pesquisa de campo

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22/06/2016 às 20:32
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O Brasil ao longo de sua história tem tido significativa evolução no campo eleitoral, que pode ser comprovado através dos registros históricos que elencam inúmeros fatos como: corrupção eleitoral, fraudes, troca de favores, uso ilegal da administração.

INTRODUÇÃO

Importa refletir diante de uma maior e mais profunda compreensão acerca da captação ilícita do sufrágio, fenômeno conhecido popularmente como “compra de votos”, conduta que passou a ser tipificada com advento do art. 41-A da Lei 9504/97.

Com base em discussões atuais sobre da temática e considerando que a sociedade brasileira clama pela moralidade e honestidade de seus representantes políticos, fato observado, através de protestos nas ruas em diversas cidades do país, é, portanto, bastante oportuno compreender a forma de agir daqueles que disputam os pleitos eleitorais, uma vez que há a obrigatoriedade de obediência às regras e princípios eleitorais previstos no ordenamento jurídico vigente e de igual modo analisar a percepção do eleitor a respeito da prática ilícita e repugnante da compra de votos.

É importante reconhecer também que embora haja um arcabouço de leis e princípios para proteger o sistema eleitoral não é raro hoje em dia ouvir falar no meio social, tanto de candidatos, como de políticos já eleitos, também dos próprios eleitores, que é cada vez mais comum as idéias e os bons projetos de governo sucumbirem ao poder econômico dos candidatos e seus partidos no processo eleitoral. Opiniões que não são diferentes daquelas pronunciadas por especialistas e pesquisadores do assunto que apontam a compra de votos como uma prática bastante comum em nosso País, na atualidade.

Dessa forma é bastante oportuno discutir e compreender a captação ilícita do sufrágio numa perspectiva científica, tomando por base o pensamento doutrinário, o posicionamento dos tribunais e não menos importante ouvir diretamente parcela de eleitores, através de pesquisa de campo e nesta, o que pensam os jovens, pois estes são futuros eleitores e não podem ficar alheios ao processo eleitoral e nem de seus debates e tudo mais que gira em torno da democracia. As opiniões diretas acerca da temática manifestadas pela população, com aplicação de questionários, fortaleceram o presente trabalho, dando uma maior dimensão do problema.

Tudo isso é ponto basilar para compreender, de forma crítica, fatores que ocasionam vícios na vontade do eleitor, conforme a tipificação do art. 41-A da Lei 9504/97.

Não se deve olvidar de que meles que assolam nossa sociedade não tenham ligação direta com eleições de candidatos desonestos, desprovidos de qualquer moralidade, que se apropriam direta ou indiretamente dos recursos públicos, desviando-os da finalidade a que se destinam, como está sendo percebido através da Operação Lava Jato, ainda em curso.

A disputa pelos cargos públicos no Brasil remete a grandes paradoxos para o direito e para a sociedade. A disputa livre dos concorrentes deságua na realidade que hoje se evidencia, tendo o império domínio do poder econômico de alguns, impossibilitando que pessoas menos abastadas, possuidoras de boas idéias, mas destituídas de patrocínio financeiro, cheguem ao poder. Isso torna praticamente impossível que um candidato com esse perfil leve suas idéias a frente, a um grande número de eleitores, levando a óbito um debate político amplo e a real democracia.

Ultimamente tem sido demonstrado que as pessoas que já ocupam cargos públicos tendem a explorá-lo em benefício pessoal ou de seu grupo político, e, neste contexto, é muito difícil barrar a reeleição dos mandatários do povo para impedir que o grupo dominante participe da disputa pelo poder, além do mais, já há uma apropriação dos meios que geram reeleição.

O processo eleitoral tem um papel de extrema importância na democracia, pois dele decorre a função de organizar o acesso ao poder, de forma que a vontade do cidadão seja livre, no momento de escolher seus governantes. É por meio da preservação da lisura dos pleitos eleitorais que a democracia é firmada, tornando possível a ocorrência de eleições livres, justas, nascidas da ativa e verdadeira participação do cidadão. O direito eleitoral possui o escopo de regulamento dessa escolha, a ser realizada legitimamente pela sociedade.

Assim, a captação ilícita de sufrágio popularmente conhecida como "compra de votos", no Brasil tem direta ligação com o coronelismo, evidenciando uma prática sinônima de autoritarismo e impunidade. As raízes do coronelismo provêm da tradição patriarcal brasileira e do arcaísmo da estrutura agropecuária no interior do país. Os coronéis (chefes políticos) exerceram poder de modo distinto, e depois da Revolução de 1930, essas práticas perduraram até os dias atuais, empregadas por grandes fazendeiros, comerciantes, religiosos, industriais e profissionais liberais, dentre outros.

O presente estudo se justifica na necessidade de se por a baila o problema, implicado em vertentes que incitam a busca do justo-jurídico, dentro do que impõe o Estado Democrático de Direito.

Dentro desse conjunto, os instrumentos utilizados foram à pesquisa bibliográfica realizada em publicações atuais de autores especializados no assunto, bem como da jurisprudência, mormente a de âmbito da legislação eleitoral e, como dito, o trabalho de campo, possui igual importância porque expõe o problema de forma clara. Os dados levantados foram transformados em gráficos que estão demonstrados.

A abordagem é do tipo dedutivo, visto que parte de teorias e leis mais gerais para a ocorrência de fenômenos particulares. E ao mesmo tempo indutivo, porque estuda os fenômenos mais abrangentes, indo das constatações mais particulares às leis e teorias mais gerais.

Sob essa ótica, o presente trabalho possui o objetivo geral de fazer uma reflexão científica e igualmente crítica, tendo o suporte à doutrina, a jurisprudência e a percepção direta dos eleitores acerca do art. 41 da Lei n.° 9.504 de 30 de setembro de 1997. Os objetivos específicos se propõem a: Contextualizar o Direito Eleitoral, diferenciar Crime Eleitoral e Capitação Ilícita de Sufrágio e demonstrar de forma prática dados aferidos em trabalho de campo sobre a compra de votos em eleições.

É oportuno destacar que os detentores de mandatos eleitorais eleitos através de pleitos realizados ao arrepio da lei precisam ser combatidos, tendo como ponto de partida um processo eleitoral sem vícios, porque, do contrário, ter-se-á enraizado um arsenal de governantes descomprometidos, ausente qualquer responsabilidade com a coisa pública, deixando a população a mercê da própria sorte. E nada isso é compatível com a democracia e nem com a vontade da maioria dos brasileiros.


1. CONTEXTUALIZAÇÃO A CERCA DA CAPTAÇÃO ÍLICITA DE SUFRÁGIO(COMPRA DE VOTOS )

Historicamente o processo eleitoral brasileiro vem sofrendo atentados. Fato este que viciada a lisura do pleito dava lugar ao interesse privado daquelas pessoas que queriam chegar ao poder, manter-se nele, ou, ainda, eleger sucessores para de modo indireto continuar comandando.

Atualmente cresce a conscientização da sociedade, forçando para que seja obedecido o princípio da moralidade nas relações eleitorais em face do grave e explícito comportamento de, em muitas oportunidades, haver o uso de dinheiro em espécie, doação de cestas básicas, medicamentos, prestação de serviços médicos e outras vantagens com a finalidade de angariar votos.

Herval Sampaio Júnior considera o maior mal que aflige o processo eleitoral, a captação ilícita de sufrágio, ou como é conhecido popularmente compra de votos, que segundo o autor tem relação com diversos abusos no processo eleitoral, principalmente o econômico. (SAMPAIO JÚNIOR, 2014, p. 353).

Além da tipificação do art. 41-A da Lei 9504/97 é imperioso ressaltar que a moralidade é Princípio Constitucional expresso no art. 37, caput, da Constituição da República de 1988, presente também no artigo 14, § 9°, dentre outros, donde reabriram os debates referentes à repercussão da ética e da moral na prática das relações jurídicas, que aqui são destacadas as de natureza eleitoral. Assim, a exigência de eleições probas, não está no campo da abstração, haja vista a exigência do texto Constitucional.

Diante desta realidade este trabalho pretenderá ao final buscar respostas para o seguinte problema: ocorre compra de votos durante as eleições?

Considerando essa problemática em um momento ímpar de nossa história recente, mais precisamente, em fevereiro de 1997, a CNBB (Confederação dos Bispos do Brasil) lança o projeto “Combatendo a Corrupção Eleitoral”. Esse projeto deu continuidade a campanha da fraternidade de 1996 cujo tema foi fraternidade e política.

Isso porque:

a Campanha Eleitoral de 1996 foi marcada por inúmeros casos noticiados de compra de votos, uma forma de exploração das carências e misérias de um eleitorado, que entre a cruz e a espada optava pela subsistência, em detrimento da democracia e igualdade eleitoral (Cerqueira e Cerqueira, 2009, p. 379).

Conforme descrição de Thales Tácito Cerqueira e Camila Albuquerque Cerqueira a partir daí, em 1996, houve uma grande mobilização por todo o País com a realização de pesquisa de campo sobre compra de votos e, após isso, audiências públicas foram realizadas como a de Fortaleza-CE, ocorrida nos dia 11 e 12 de maio de 1998, onde se lançou a coleta de assinaturas para a sonhada iniciativa popular. A participação em massa foi fortalecida através da Rede Vida de Televisão e a rede Católica de Rádio. Tudo isso culminou com a coleta de mais de um milhão de assinaturas, resultado na Lei 9840/99, que incluiu o art. 41-A na Lei 9504/97, foi publicada no Diário Oficial da União em 29 de setembro de 1999, vigorando para as eleições de 2000 e seguintes. Neste cenário Cerqueira e Cerqueira (2009, p. 379) destacam: “a iniciativa, portanto, foi da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), junto de diversas outras entidades, inclusive não governamentais (ONGs)”.

A cerca do conceito, também conhecida como “compra de votos”, é o ato do candidato de doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, com o fim de conseguir votos, bens ou vantagens de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública.

Encontra-se prevista no art. 41-A da Lei n.° 9.504/97, tem a seguinte redação:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer ou entregar, ao eleitor, com o fito de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil UFIR, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n° 64, de 18 de maio de 1990.

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Tomando como base o texto legal, verifica-se que as condutas que caracterizam a infração consistem naquelas levadas a efeito pelo candidato e que denotem as ações de doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor, bem ou vantagem de qualquer natureza inclusive emprego ou função pública, com o fim de obter-lhe o voto, e que tenham sido praticadas no intervalo de tempo que medeia o registro da candidatura e o da eleição. Neste sentido, o Tribunal Superior Eleitoral entende que para a penalização, faz-se necessária a prova da participação, direta ou indireta, ou, ao menos, do consentimento do candidato:

[...]

2.2 O TSE entende que, para a caracterização da captação de sufrágio, é indispensável a prova de participação direta ou indireta dos representados, permitindo-se até que o seja na forma de explícita anuência da conduta objeto da investigação, não bastando, para a configuração, o proveito eleitoral que com os fatos tenham auferido, ou a presunção de que desses tivessem ciência.

[...]

(REspe n° 21.327, rel. Min. Ellen Gracie, de 04.03.2004)

[...]

2. A caracterização da captação ilícita de sufrágio pressupõe a ocorrência simultânea dos seguintes requisitos: a) prática de uma das condutas previstas no art. 41-A da Lei 9.504/97; b) fim específico de obter o voto do eleitor; c) participação ou anuência do candidato beneficiário na prática do ato.

[...]

(AgR-REspe n.° 815659, rel. Min. Nancy Andrighi, de 01.12.2011)

Na realidade não importa a natureza do bem ou vantagem que é colocada à disposição, oferecida, prometida ou entregue a alguém, com o fito de obtenção de voto, podendo ser de variadas espécies, desde aquelas representativas de valor econômico, financeiro, que possam ser quantificadas, individualizadas, materializadas, até mesmo aquelas que tenham conotação de benefício moral, com conteúdo imaterial, ou que se revelem em atos de apoio ou até mesmo prestígio.

Carlos Mário da Silva Velloso e Walber de Moura Agra, afirmam que constitui o crime de captação de sufrágio o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, sujeitando-se ao infrator a pena de multa e cassação do registro ou do diploma (VELLOSO e AGRA, 2014, p. 530-531).

Conforme esclarecimentos de Herval Sampaio Júnior para o TSE, em resumo, conceituou a captação ilícita de sufrágio como oferecimento de promessa ou vantagem ao eleitor, com o fim de obter voto (SAMAPAIO JÚNIOR, 2014, p. 354).

Carlos Mário da Silva Velloso e Walber de Moura Agra também lecionam que na disputa eleitoral, busca-se a captação do sufrágio, de maneira lícita, uma vez que faz parte da própria essência da propaganda política eleitoral. No entanto o que precisa ser reprimido é a captação adquirida de modo ilícito, com o uso de artimanhas, da compra de votos, tendo como intuito exclusivo vencer as eleições, pouco importando o meio de obtenção de votos, acarretando, assim, um resultado danoso ao processo eleitoral e a democracia brasileira.

Nesse contexto, considera-se que o reconhecimento da captação ilícita de sufrágio significou grande avanço da legislação eleitoral, tendo em vista o prestígio à liberdade de intenção de voto do eleitor. Daí ressaltar-se que a Lei 9504/97 veio mostrar à população a necessidade de se fazer protagonista no processo de participação e controle do poder político, no sentido de buscar, sempre, o aperfeiçoamento da democracia brasileira (VELLOSO e AGRA, 2014, p. 530 - 531).

Importante destacar os momentos para ocorrer à captação ilícita de sufrágio. Assim, lei estipulou termos a quo e ad quem, para ocorrer a Captação Ilícita de Sufrágio, ou seja, "desde o registro" até o "dia da eleição", é tema que desperta grande atenção da doutrina, se não vejamos:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, f"-.` prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar n° 64, de 18 de maio de 1990. (grifo nosso)

Marcos Ramayana (2010, p. 617- 618), sobre o assunto, manifestou o seguinte:

A questão é interessante, porque o Tribunal Superior Eleitoral registra entendimento de que o termo a quo é a partir do requerimento do registro de candidatura, e não do deferimento do mesmo (Acórdãos n° 19.229/01, Relator Ministro Fernando Neves, e n° 19.566/02, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo).

A mesma doutrina nos conduz ao entendimento segundo o qual a fixação, pelo legislador, de prazo inicial e final da captação ilícita de sufrágio não teria atendido a boa técnica redacional. Sustenta esse raciocínio alegando que nos anos que não ocorrem eleições, existiria a prática de clientelismo político. Assim, ocorrendo tais ilicitudes, ensejaria, unicamente, a análise do art. 299 do Código Eleitoral e, também, "a preparação para uma futura impugnação ao pedido de registro de candidatura, por abuso do poder econômico ou político." (RAMAYANA, 2010, p. 618).

É legítimo que, durante o processo eleitoral, os candidatos busquem angariar votos, mas para tanto devem observar as regras estabelecidas, com utilização dos instrumentos e meios que o ordenamento jurídico autoriza. Não podem ser levados a efeito técnicas, formas e instrumentos que promovam a desigualdade entre os candidatos concorrentes ao pleito eleitoral, nem tampouco podem ser desenvolvidas práticas e condutas ilícitas que levem os eleitores a adotar posições deturpadas ou distorcidas, incapazes de eleger qualquer candidato não fossem as ilicitudes perpetradas, não conducentes ao livre exercício do direito de voto.

Igualmente importante é delimitar atos que caracterizam captação ilícita de sufrágio na visão TSE. De tal sorte que o Tribunal Superior Eleitoral, já assentou que as hipóteses relacionadas a seguir caracterizam captação ilícita de sufrágio: a) doação de cestas básicas em troca de voto; b) fornecimento de carteira de habilitação em troca de votos; c) doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza — no período crítico compreendido do registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, presume-se o objetivo de obter voto, sendo desnecessária a prova visando a demonstrar tal resultado; d) distribuição de padrão de luz em troca de voto; e) manutenção em período eleitoral de "cursinho pré-vestibular" gratuito e outras benesses, às vésperas da eleição, revelam o intuito do candidato em obter votos; f) doação de telhas e pregos a eleitor em troca de voto, dentre outras várias situações.

Na ementa a seguir, podemos observar, entre outros aspectos, a concretização de uma das modalidades previstas no art. 41-A da lei 9.504/97, notadamente quanto à conduta de "doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública". Referida situação resta comentada, a seguir, no item de n.° 4, ao qual se destaca.

Pois vejamos:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2008. PREFEITO E VICE-PREFEITO. AIJE. PRELIMINARES REJEITADAS. MÉRITO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE SERVIDORES EM TROCA DE VOTOS. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ABUSO DO PODER POLÍTICO. CARACTERIZAÇÃO. POTENCIALIDADE. CASSAÇÃO DO REGISTRO APÓS A ELEIÇÃO. NEGADO PROVIMENTO.

1. A alegada ofensa ao art. 6° da Lei Complementar n° 64/90 não foi debatida no v. acórdão regional, carecendo, pois, do indispensável prequestionamento. Incidência das Súmulas nos 211/STJ e 282/STF.

2. A investidura de novo magistrado no exercício da jurisdição eleitoral insere-se nas exceções ao princípio da identidade física do magistrado, nos termos do art. 132 do Código de Processo Civil. Precedente.

3. Ao acusado cabe defender-se dos fatos delineados na inicial, independentemente da qualificação jurídica a eles atribuída. Ausência de violação aos arts. 128 e 460 do Código de Processo Civil. Precedentes.

4. O e. TRE/BA, soberano no exame do conjunto probatório dos autos, entendeu caracterizada a captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n° 9.504/97) pela contratação temporária de 25 pessoas, entre julho e novembro de 2008, por José Venâncio Sobrinho - então prefeito do Município de Ponto Novo/BA - em troca de votos em favor de Anderson Luz Silva e Nelson Maia, candidatos a prefeito e vice-prefeito. (Grifo nosso)

5. Configuração, ainda, do abuso do poder político (art. 22 da Lei Complementar n° 64/90), uma vez que o recorrente José Venâncio Sobrinho, valendo-se da condição de prefeito, beneficiou as candidaturas dos recorrentes Anderson Luz Silva e Nelson Maia, violando assim a normalidade e a legitimidade das eleições. (grifo nosso)

6. Existência de potencialidade apta a desequilibrar o pleito, considerando o quantitativo de pessoas contratadas e a pequena diferença de votos entre o primeiro e segundo colocados no pleito.

7. Para se afastar a conclusão do TRE/BA quanto à prática das referidas condutas e sua potencialidade, seria necessário o reexame de fatos e provas, providência inviável nas instâncias extraordinárias, a teor das Súmulas nos 7/STJ e 279/STF.

8. O art. 22, XV, da Lei Complementar n° 64/90 - vigente à época dos fatos - não se aplica ao caso concreto, uma vez que a captação ilícita de sufrágio acarreta a cassação do registro ou diploma, ainda que a decisão tenha sido prolatada após a eleição.

9. Recurso especial eleitoral desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral N° 2572-71.2010.6.00.0000 — Classe 32 — Ponto Novo — Bahia - Acórdão de 24.03.2011)

O Tribunal, de maneira unânime, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Após, temos destacado ementa em que ficou constatada captação ilícita de sufrágio, que se deu através de doação de cestas básicas:

RECURSO ORDINÁRIO. CAPTAÇÃO IRREGULAR DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N° 9.504/97. DOAÇÃO DE CESTAS BÁSICAS. PROMESSA DE VOTO. PROVIMENTO.

1. Captação ilícita de sufrágio comprovada, da análise do conjunto fático-probatório carreado aos autos, bem como do decidido no RO n° 741, Rel. Min. Gomes de Barros, DJ de 6.5.2005 e no RCED n° 616, de minha relatoria, julgado na sessão de 23.5.2006.

2. Recurso ao qual se dá provimento, para cassar o diploma de Roberto Barros Filho e aplicar-lhe multa de 25 mil UFIRs, nos termos do art. 41-A da Lei n° 9.504/97.

(Recurso Ordinário n°907 - Rio Branco/AC - Acórdão de 17/08/2006 — Rel. Min. José Augusto Delgado — pub. em 31/08/2006, Pág. 126)

O Tribunal, de maneira unânime, proveu o recurso, na forma que votou o relator. Outro, conforme ementa abaixo o Tribunal Superior Eleitoral entendeu como captação ilícita de sufrágio, o fornecimento de carteira de habilitação, com o objetivo de angariar votos:

RECURSO ORDINÁRIO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. FORNECIMENTO DE CARTEIRA DE HABILITAÇÃO EM TROCA DE VOTOS. ART. 41-A DA LEI N° 9.504/97. Hipótese na qual o contexto fático-probatório revela o intuito do candidato de angariar votos, mediante o fornecimento de carteiras de habilitação. Recurso desprovido.

(Recurso Ordinário n.° 777 - Macapá/AP - Acórdão de 06/04/2006 — Rel. Min. Gilmar Ferreira Mendes)

Neste caso o TSE, de modo unânime, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. Na ementa a seguir é apresentada decisão do TSE a respeito de doação de telhas e pregos a eleitor:

Recurso especial - Investigação judicial - Prefeito - Abuso do poder - Art. 22 da Lei Complementar n° 64/90 - Não-caracterização - Doação de telhas e pregos a eleitor - Captação vedada de sufrágio - Art. 41-A da Lei n° 9.504/97 - Configuração - Constitucionalidade - Cassação de diploma -Possibilidade. Gravações clandestinas Prova ilícita - Provas dela decorrentes -Contaminação. Ausência de ofensa aos arts. 22 e 23 da Lei Complementar n° 64/90 e aos princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, da proporcionalidade e da não-admissão das provas ilícitas. Art. 5°, incisos LIV, LV e LVI, da Carta Magna.

1. Não há intempestividade do recurso especial se, em decorrência de circunstâncias excepcionais, o recorrente, expondo óbice judicial anterior para interposição do apelo, postulou nova vista dos autos para tal fim, o que foi deferido pelo presidente do Tribunal Regional Eleitoral.

2. Rejeitam-se os pedidos de conexão deste feito com ação de impugnação de mandato eletivo em curso perante o juiz eleitoral, na medida em que as ações são autônomas, possuem requisitos legais próprios e conseqüências distintas, o que não justifica a reunião dos processos ou o sobrestamento desse julgamento. Precedentes.

3. A diplomação não transita em julgado enquanto houver, pendente de julgamento, qualquer recurso que possa atingi-la.

4. Reconhecimento de captação ilícita de sufrágio praticada pelo prefeito, nos termos do art. 41-A da Lei n° 9.504/97, comprovada por meio de prova testemunhal considerada idônea, não pode ser infirmado sem reexame de todos os fatos e provas constantes dos autos, vedado nesta instância especial.

5. Reconhecimento da ilicitude de gravações obtidas de forma clandestina tornam igualmente imprestáveis as provas delas decorrentes. Aplicação da teoria dos frutos da árvore venenosa.

6. A jurisprudência deste Tribunal Superior está consolidada quanto à constitucionalidade do art. 41-A da Lei das Eleições, que não estabelece hipótese de inelegibilidade e possibilita a imediata cassação de registro ou de diploma (Acórdãos nos 19.644 e 3.042).

7. Para a configuração do ilícito previsto no referido art. 41-A, não é necessária a aferição da potencialidade de o fato desequilibrar a disputa eleitoral, porquanto a proibição de captação de sufrágio visa resguardar a livre vontade do eleitor e não a normalidade e equilíbrio do pleito, nos termos da pacífica jurisprudência desta Corte (Acórdão n° 3.510).

(Respe - Recurso Especial Eleitoral n° 21248 - lpuaçu/SC - Acórdão n° 21248 de 03/06/2003 — Rel. Min. Fernando Neves da Silva)

Neste episódio o Tribunal Superior Eleitoral preliminarmente e por unanimidade afastou a preliminar de intempestividade do segundo recurso especial, mas dele não conheceu, e conheceu do primeiro, dando-lhe provimento, nos termos do voto do relator. Confirmou desta maneira o poder judiciário a compra de votos como presente no processo eleitoral brasileiro, fragilizando nossa democracia, elegendo pessoas sem escrúpulos, que fazem de tudo para obtenção do poder.

Importante que se destaque também que certos atos não caracterizam captação ilícita de sufrágio segundo o TSE. E neste sentido a Corte assentou não se cuidar de captação ilícita de sufrágio nas seguintes apresentas a seguir:

a) promessas genéricas ao eleitorado, sem objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não são capazes de atrair a incidência do art. 41-A da Lei 9.504/9714, v.g. promessa de pavimentação de via pública sem pagamento de contribuição pelos moradores:

Ação de investigação judicial eleitoral. Art. 41-A. [...J. Promessas genéricas ao eleitorado. Ausência de caracterização de captação de sufrágio. [...]." NE: Promessa de pavimentação de via pública sem pagamento de contribuição pelos moradores. Trecho do voto do relator: 11 As promessas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não são capazes de atrair a incidência do art. 41-A da Lei n° 9.504/97. [...J"

(Ac. n° 5.498, de 27.9.2005, rel. Min. Gilmar Mendes.)

Entendeu o Tribunal Superior Eleitoral que promessas de caráter genérico não caracterizam captação ilícita de sufrágio, tendo em vista que sem o objetivo de satisfazer o interesse particular do eleitor, não incidência da infração consubstanciada no art. 41-A da Lei das Eleições.

b) distribuição de "cheques moradia" e inscrição em programa habitacional de Prefeitura, realizados periodicamente por funcionários da municipalidade, como parte de convênio entre os governos estadual e municipal, sem a presença do candidato ou prova idônea de pedido de voto em troca do cheque:

[...]. Ação de investigação judicial eleitoral. Arts. 41-A da Lei n° 9.504/97 e 22 da Lei Complementar n° 64/90. Não demonstrada a ilicitude. Negado provimento." NE: Distribuição de "cheques moradia" e inscrição em programa habitacional da Prefeitura, realizados periodicamente por funcionários da municipalidade, como parte de convênio entre os governos estadual e municipal, sem a presença do candidato ou prova idônea de pedido de voto em troca do cheque.

(Ac. n° 743, de 24.8.2004, rel. Min. Peçanha Martins.)

Na ementa supra, o TSE compreendeu que não haver desrespeito ao art. 41-A da Lei 9.504/97, distribuição de "cheques moradia" e inscrição em programa habitacional da Prefeitura, realizados periodicamente por funcionários do município, sob a condição de não haver em hipótese nenhuma pedido de voto em troca do cheque.

c) caracterização da conduta vedada pelo art. 41-A da Lei 9.504/97 requer que a promessa ou entrega da benesse seja acompanhada de pedido expresso de voto. Doação de mangueiras de irrigação a eleitores integrantes de comunidade indígena:

Representação. Recurso ordinário. Cerceamento de defesa. Captação ilícita de sufrágio. Provas robustas. Ausência. [...]. A caracterização da conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n° 9.504/97 requer que a promessa ou entrega da benesse seja acompanhada de expresso pedido de voto."

NE: Doação de mangueiras de irrigação a eleitores integrantes de comunidade indígena.

(Ac. de 29.6.2004 no RO n° 772, rel. Min. Humberto Gomes de Barros; no mesmo sentido o Ac. de 9.3.2006 no REspe n° 25.579, do mesmo relator.)

Neste julgado ratificou o TSE, que para caracterizar a compra de votos faz-se necessário que a promessa ou entrega da benesse seja acompanhada de expresso pedido de voto.

d) promessas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não caracterizam a incidência do art. 41-A da Lei 9.504/97. Promessas de doação de aparelho de som e de construção de um novo tempo religioso realizadas por candidato dentro de uma igreja, para um grupo de pessoas:

[...]. As promessas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não são capazes de atrair a incidência do art. 41-A da Lei n° 9.504/97. [...]" NE: Promessas de doação de aparelho de som e de construção de um novo templo religioso realizadas por candidato dentro de uma igreja, para um grupo de pessoas.

(Ac. n° 4.422, de 9.12.2003, rel. Min. Fernando Neves.)

Conforme já assentado, segundo o TSE, as promessas genéricas não comprometem a conduta do candidato, pois as mesmas terão que satisfazerem os interesses individuais e privados dos eleitores.

e) explanação de plano de governo não caracteriza captação de sufrágio:

[...]. Representação. Captação ilícita de sufrágio. 1. A exposição de plano de governo e a mera promessa de campanha feita pelo candidato relativamente ao problema de moradia, a ser cumprida após as eleições, não configura a prática de captação ilícita de sufrágio. 2. Não há como se reconhecer a conduta descrita no art. 41-A da Lei n° 9.504/97 quando, a despeito do pedido de voto, não ficou comprovado o oferecimento de bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza. [...]

(Ac. de 30.11.2010 no AgR-Al n° 196558, rel. Min. Arnaldo Versiani.)

Pronunciou-se o TSE, que a exposição de plano de governo, bem como a mera promessa realizada pelo candidato no decorrer da disputa eleitoral, não incide compra de votos, este foi o entendimento da Egrégia Corte.

f) não configura a captação ilícita de sufrágios, objeto do art. 41-A da Lei 9.504/97, o fato, documentado no 'protocolo de intenções' questionando no caso, firmado entre os representantes de diversas igrejas de determinado município — travestidos de membros do conselho ético de um partido político — e certos candidatos a prefeito e vice-prefeito, que formalmente se comprometem, se eleitos, ao atendimento de reivindicações imputadas à 'comunidade evangélica' e explicitadas no instrumento, entre elas, a doação de um imóvel do patrimônio municipal, se não voltadas às promessas a satisfazer interesses patrimoniais privados:

[...]. II — Captação ilícita de sufrágios (Lei n° 9.504/97, art. 41-A): não-caracterização. Não configura a captação ilícita de sufrágios, objeto do art. 41-A da Lei n° 9.504/97, o fato, documentado no 'protocolo de intenções' questionado no caso, firmado entre os representantes de diversas igrejas de determinado município — travestidos de membros do conselho ético de um partido político — e certos candidatos a prefeito e vice-prefeito, que formalmente se comprometem, se eleitos, ao atendimento de reivindicações imputadas à 'comunidade evangélica' e explicitadas no instrumento, entre elas, a doação de um imóvel do patrimônio municipal, se não voltadas as promessas a satisfazer interesses patrimoniais privados.

(Ac. n° 19.176, de 16.10.2001, rel. Min. Sepúlveda Pertence.)

Importante registrar, que o fato exposto na ementa acima não caracteriza infração do art. 41-A da Lei Eleitoral, conforme entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, tendo em vista que as benesses prometidas não satisfazem interesses patrimoniais individualizados.

g) não configura conduta vedada pelo Art. 41-A da Lei 9.504/97 promessa de campanha no sentido de manter programa municipal de benefícios:

Benefício. Órgão público. Promessa de continuidade. Art. 41-A da Lei n° 9.504/97. Não-aplicação. Não configura conduta vedada pelo art. 41-A da Lei n° 9.504/97 promessa de campanha no sentido de manter programa municipal de benefícios. Recurso conhecido e provido.

(Ac. n° 2.790, de 8.5.2001, rel. Min. Fernando Neves.)

No caso, o TSE entendeu que promessas realizadas pelo candidato no decorrer do período eleitoral de dar continuidade de programa municipal de benefícios não configura desrespeito ao art. 41-A da Lei das Eleições.

Através da análise apresentada conseguiu-se apurar e comprovar, considerando abalizada doutrina e jurisprudência dos tribunais, que ocorre compra de votos nas eleições brasileiras, tendo em vista os vários casos encontrados na jurisprudência, em especial a do TSE, que mostram que há determinadas condutas que caracterizam captação ilícita de sufrágio e que há outras condutas que não caracterizam, não se encaixando na tipificação do art. 41-A, da Lei 9504/97. De tal sorte que os casos já comprovados refletem um dado importante e igualmente preocupante, no que pese a necessidade de refletir sobre que tipo de pessoas estão chegando ao poder para representar o povo e quais as conseqüências disso para a sociedade suportar em uma democracia jovem que muito precisa se fortalecer e avançar.

Importante também destacar que o ilícito do art. 41-A acarreta uma sanção cível diferente da tipificação do art. 299 do Código Eleitoral, este apurado no âmbito da esfera penal eleitoral.

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