O Ministério Público na Constituição de 1988

29/06/2016 às 11:58
Leia nesta página:

Diferentemente das Constituições Anteriores, a atual lei maior deu lhe capítulo próprio, esboçando-lhe minudentemente um arquétipo Constitucional.

1.O MINISTÉRIO PÚBLICO NAS CONSTITUIÇÕES ANTIGAS DO BRASIL

 

A posição do Ministério Público nas Constituições do Brasil tem sofrido alterações com o decorrer do tempo. Assim é que a Instituição já figurou como órgão do Judiciário e, quase sempre, como órgão do executivo, a exemplo do que aconteceu na Constituição de 1946. Em 1824, sob a égide do Imperialismo, não cuidou a Constituição em fazer referências ao Ministério Público.

A primeira constituição da República (1891) ainda não aludiu o Ministério Público como instituição, apenas fez referência à escolha do procurador-geral e a sua iniciativa na revisão criminal pro reo. Entretanto, diante do descortino de Campos Salles, que era o Ministro da Justiça no Governo Provisório, o Ministério Público passou a ser tratado como instituição no Decreto nº 848, de 11 de outubro de 1890, que organizou a justiça federal (todo o capitulo VI), o mesmo acontecendo com o decreto nº 1.030, de 14 de novembro de 1890, que organizou a justiça do Distrito Federal.

No Brasil, até então, a função do Ministério Público, em sede constitucional sempre teve tímida conotação, restando à legislação infraconstitucional o papel de definir-lhe o perfil. Entretanto, a partir da Carta Política de 1934, a categoria guindada a categoria a de instituição, nos seus arts. 95 a 98 que traçam as normas gerais de sua organização. Recita o art. 95 daquela Lei Maior:

“O Ministério Público será organizado na União, no Distrito Federal e nos territórios por lei federal e, nos Estados, pelas leis locais” Criou-se, a partir daí, pois, a Instituição do Ministério Público nas esferas federal e estadual.”

A Constituição Federal de 1937 (Estado Novo), também conhecida por Constituição “Polaca” manteve a posição do Ministério Público como auxiliar do Poder Executivo.

A Lei Fundamental de 1967 não se refere ao Ministério Público. Mas não o extinguiu ou alterou. Essa Carta tem por característica maior, ser de natureza autoritária. Retira as garantias da magistratura e as dos servidores públicos.

O Ato Institucional nº 05 de 1969 acabou com as garantias individuais e fechou o congresso. Não fala sobre o Ministério Público, que é, por isso, mantido nos moldes anteriores.

Na Emenda Constitucional nº 1/69, o Ministério Público era apresentado nos arts. 94 a 96 e pertencia ao Poder Executivo. O Ministério Público da União estava agregado ao Ministério da Justiça e, nos Estados, às Secretarias de Justiça. A verba orçamentária destinada ao Ministério Público dos Estados dependia de repasse que era feito por esta Secretaria. E as nomeações, promoções e aposentadorias dos membros da Instituição eram feitas pelo Poder Executivo. Como visto, até esta emenda, o Ministério Público era uma instituição fraca.

Com a Constituição Federal de 1988, o Ministério Público fortaleceu-se. Dela recebeu inúmeras garantias dentre as quais aquelas que já eram asseguradas aos membros do Poder Judiciário, tais como vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. A situação do Ministério Público passou a ser outra. Pode-se até dizer, sem exagero, que a instituição ressuscitou, trazendo, na mova encarnação, amplas garantias, como independência financeira, administrativa e funcional, mais atribuições para melhor trabalhar em favor dos menos protegidos da sorte, como as minorias ideológicas e aquelas representadas pelos índios, deficientes físicos, deficientes mentais, os “sem-terra" etc.

2.      O MINISTÉRIO PÚBLICO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

 

O Constituinte de 1988 alterou substancialmente a natureza jurídica do Ministério Público, dando-lhe uma nova feição institucional.

Como bem assinala Arthur Pinto Filho:[1]Não se tratou de simplesmente alterar uma instituição, mas de lhe traçar uma natureza completamente diferente daquela oriunda da carta de 1969”.

Diferentemente das Constituições anteriores, que pouco tratavam do assunto, deixando esta tarefa a cargo da legislação infraconstitucional, a atual Lei Maior deu-lhe capítulo próprio, esboçando-lhe minudentemente um arquétipo constitucional.

O fato é que o Constituinte originário quis alocar o Ministério Público, embora inserindo-o no aparelho do Estado, fora de quaisquer dos poderes, com estreita ligação à sociedade.

A partir daí sua destinação passou a ser a de “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

O Ministério Público brasileiro recebeu do Constituinte originário de 1988 um perfil institucional e um status político sem paradigma em todo o mundo. A partir daí, passou a ser o guardião do regime democrático, o defensor da ordem jurídica e do patrimônio público, num país de tamanhas desigualdades sociais (onde o espetáculo da miséria dilacera a consciência humana) e de débil tradição de respeito à coisa pública, notadamente de parte dos infratores poderosos, detentores do poder.  

De advogado do Governo a advogado da Sociedade, o Ministério Público sofreu profundas transformações, alcançando autonomia e independência funcional, frente aos poderes do Estado. De acusador criminal e de interveniente em algumas ações cíveis de pouca repercussão, transformou-se em instituição permanente, essencial ao regime democrático.

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Em face disto, assumiu a feição de alavanca propulsora da atividade jurisdicional, convertendo-se em instrumento primordial à efetivação do princípio constitucional do acesso à justiça, legitimado à proteção de bens e valores de interesse de toda a sociedade.

Para tanto, muniu-lhe o Constituinte de poderosos instrumentos jurídicos, como as ações penal e civil públicas e a ação de inconstitucionalidade, dentre outros.

Consequentemente, era preciso prover-lhe de um sistema de garantias dignas de ensejar a livre e independente atuação de seus órgãos, presos tão somente à consciência e à Lei, sem as amarras de outros poderes.

2.1 GARANTIAS INSTITUCIONAIS

Excetuados os casos expressamente previstos em lei, como a rejeição de arquivamento de inquérito policial ou de peças de informações, ou ainda do inquérito civil, os membros do Parquet, no exercício de suas atividades-fim não podem receber ordens, de quem quer que seja, para propor ou não propor ação judicial, interpor ou não interpor recurso de suas decisões judiciais, iniciar ou não uma investigação criminal, nem tampouco observar atos normativos, ainda que de seus órgãos superiores administrativamente, que violem sua consciência e os ditames da lei.

Com efeito, tais garantias, longe de representar privilégios pessoais, constituem prerrogativas imprescindíveis ao pleno exercício das graves funções institucionais.

Daí o fundamento normativo insculpido no artigo 128, §5º, inc. I, alíneas “a”, “b” e “c”[2], da Constituição Federal, assegurando a seus membros as seguintes garantias: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio, verdadeiros sustentáculos da ampla independência funcional.

A vitaliciedade dos membros do Parquet é primordial para combater a ingerência, mandos e desmandos de outros poderes no âmbito do Ministério Público. Evita a destituição do cargo por motivos políticos e garante, por outro lado, o bom desempenho institucional, em face dos governantes.

A inamovibilidade assegura a inafastabilidade desmotivada ou ilegal do Promotor ou Procurador de Justiça de suas funções institucionais. Diz respeito ao princípio do Promotor Natural. Por esta garantia, somente em casos específicos se pode remover o agente político de seu cargo, preservando incólume as condições necessárias ao pleno exercício de suas funções.

A garantia de irredutibilidade de subsídio, no magistério sempre abalizado de Hugo Nigro Mazzili: “visa assegurar padrão remuneratório condigno para os integrantes do Ministério Público. Pode-se vislumbrar finalidades múltiplas nessa garantia, tais como: busca-se não só recrutar bons Promotores de Justiça e mantê-los na carreira, como também assegurar condições condignas, para que os membros e a própria instituição não comprometam seu ofício em barganhas remuneratórias com as autoridades governamentais, nem tão pouco levem os membros do Ministério Público a uma atuação politicamente comprometida”.

Assim, as garantias institucionais do Ministério Público não visam constituir uma casta de privilegiados, mas, sobretudo, possibilitar a efetiva defesa da sociedade. Não podem, ademais, ser vistas como mera proteção ao cargo, mas como meios indispensáveis de proteção e segurança ao exercício das funções ministeriais


[1] In, Ministério Público – Intituições e Processo, Editora Atlas S/A, São Paulo-SP.

[2] § 5º Leis complementares da União e dos Estados, cuja iniciativa é facultada aos respectivos Procuradores-Gerais, estabelecerão a organização, as atribuições e o estatuto de cada Ministério Público, observadas, relativamente a seus membros:

I - as seguintes garantias:

a) vitaliciedade, após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial transitada em julgado;

b) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa; 

c) irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º, e ressalvado o disposto nos arts. 37, X e XI, 150, II, 153, III, 153, § 2º, I

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