A SIMULAÇÃO, A RESERVA MENTAL E O ERRO

12/07/2016 às 13:11
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O ARTIGO FAZ ABORDAGEM DE FORMAS QUE VICIAM O NEGÓCIO JURÍDICO NO DIREITO CIVIL.

~~A SIMULAÇÃO, A RESERVA MENTAL E O ERRO

Rogério Tadeu Romano

Na simulação, as partes entram em acordo para fazer uma declaração deliberadamente diferente da verdadeira vontade, com o intuito de ludibriar terceiros. Isso causa a nulidade do contrato, pois o ordenamento jurídico não pode, obviamente, permitir que tais atos imbuídos de má-fé logrem alcançar seus distorcidos desígnios.

Há mais de um tipo de simulação, e aqui será feita uma breve análise de uma das formas de classificação do nosso objeto de estudo: simulação absoluta e relativa. A absoluta diz respeito ao caso em que as partes não desejam efetivamente realizar determinado ato, mas apenas fazer com que outros pensem que o ato foi concretizado. Só se observa o negócio jurídico simulado. Na simulação relativa, diferentemente, as partes realizam um negócio, mas é diferente daquele que verdadeiramente pretendem realizar. Neste caso, observamos dois negócios: o simulado, que as partes consolidaram na aparência, e não é verdadeiro, e o dissimulado, cujos efeitos as partes realmente almejavam.

Diverso é o negócio fiduciário, como explicou Gabriela Ponte Carvalho(Contratos simulado, fiduciário e indireto) O negócio fiduciário se caracteriza principalmente pelo fato de que a relação negocial eleita pelas partes extrapola, em seus efeitos, aqueles desejados por elas. Isso tudo acontece com a consciência de ambas as partes de que existe esse excesso no negócio escolhido para a realização de suas vontades.

Como explicou Eduardo Espínola(Sistema de direito civil, pág. 558) a reticência ou reserva mental é uma forma de simulação(lato senso) e consiste na divergência entre a vontade real do declarante e da qual a outra parte não tem conhecimento; seria, pois, uma simulação unilateral, na linha já traçada pelo artigo 116 do Código Civil alemão.

Dá-se a reserva mental, como ensinou Roberto de Ruggiero(Instituições de de direito civil, volume I, pág. 225), na linha de Kohler, Parella(La reticenza nei negozi giuridici, in Scritti in onore di A. Ascoli, pág. 373), quando o declarante quer intimamente uma coisa diversa de que se declara e tem a consciência e até o propósito de emitir uma declaração, desconforme, o que frequentemente se faz para induzir em erro aquele a quem tal declaração se dirige, ainda que não para fins desonestos.

Diversa é a simulação. Há também nesse caso uma deformação consciente e desejada da declaração de vontade, mas é ela levada a efeito com o concurso da parte à qual a declaração se dirige e para o fim de induzir em engano a terceiras pessoas. Se o conluio dá vida a um negócio, quando negocio algum se queira, a simulação é absoluta. Se dá vida a um negócio e se desejava outro de natureza diversa, se o negócio jurídico era declarado, mas era diverso um dos sujeitos ou se era diverso o objeto ou qualquer outro elemento, a simulação é relativa. O negócio é nulo.

Seja com a simulação, seja com a reserva mental, o negócio jurídico("define-se como qualquer estipulação de consequências jurídicas, realizada por sujeitos de direito no âmbito do exercício da autonomia da vontade. Seu fundamento é a manifestação de vontade das partes, isto é, dos sujeitos de uma relação jurídica) existe, mas não é válido e não tem como ter eficácia.

Por sua vez, a vontade declarada por gracejo, quando a declaração é feita  por gracejo, quando os sinais empregados bem indicam a intenção de não produzir efeitos jurídicos, não há que se constituir negócio válido.

Mas há o vício de consentimento que macula o negócio jurídico. O erro.

Ainda é Eduardo Espínola quem nos ensina que o erro induz falsa representação da natureza ou dos elementos de uma relação jurídica ou de algumas de suas consequências. Leva-se a conclusão exterior nos negócios que as partes nele envolvidas não quiseram.

Há o denominado erro impróprio, ensinado por Savigny, ou erreur obstacle, ou errore ostativo(Giorgi e a doutrina italiana) o qual incide sobre a determinação da vontade, impedido que haja um consentimento válido.

Fala-se num erro essencial que incide não sobre a determinação da vontade, mas sobre a declaração e seu conteúdo, viciando o consentimento.

Tem-se considerado que só merece consideração o caso de referir-se, no direito civil, o erro à divergência entre a determinação e a manifestação da vontade; em se tratando de algum outro elemento do negócio(capacidade das partes, objeto, causa, forma) a nulidade irá resultar de sua falta. Aliás, a causa é a razão detereminante da vontade e, para os negócios de conteúdo patrimonial, o fundamento objetivo que justifica a atribuição patrimionial, que são diversos dos motivos, as causas impulsivas, individuais e subjetivas.

Verificada a divergência, entende-se que o contrato não se constituiu or falta de consentimento.

Numa análise comparativa, vários códigos afastaram-se dessa doutrina, suprimindo qualquer distinção entre o erro sobre a determinação da vontade e sobre a declaração ou sobre o seu conteúdo, ao lhes dar igual tratamento.

Há uma tradição no sistema jurídico brasileiro pouco importando que se trate de erro, que a doutrina corrente dominante chama de erro obstáculo, que obste o consentimento, ou de erro que o vicie.

Fala-se no erro(assim como na coação em que há pressão moral ou psíquica na lesão em que há um lucro exagerado de uma parte em detrimento de outra seja por inexperiência ou necessidade econômica da outra, na fraude a credores ou no dolo em que há artifício ou manobra visando induzir a outra em erro com objetivo de tirar proveito para si ou para outrem) numa anulabilidade ao contrário da simulação em que há a nulidade.

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O negócio jurídico é nulo quando celebrado por pessoa absolutamente incapaz; for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto; o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito; não revestir a forma prescrita em lei; for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; tiver por objetivo fraudar lei imperativa; a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção (art. 166).

Por outro lado, será anulável o negócio jurídico, além dos casos expressamente declarados na lei, por incapacidade relativa do agente e por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores (art. 171).

O anulável, ao contrário do nulo, pode sanar-se, pode adquirir uma validade irrevogável. É a imperfeição menos grava do negocio a que a lei atribui a determinadas pessoas o direito de invocar a invalidade e provocar a anulação, sendo, em regras, as pessoas que sofrem a incapacidade, aquelas cujo consentimento foi viciado, as que representam o incapaz ou lhe assistem.

Fala-se nas diversas espécies de erro.

Para que o erro vicie a vontade, afastando-se do fim que alcançaria se fosse normal, é preciso que recaia sobre elementos essenciais, por cuja declaração se determinou o querer do declarante.

Pode haver erro substancial sobre o objeto da declaração de vontade, erro que recai sobre o próprio corpo ou sobre a substância e a qualidade. Estamos diante de um erro essencial.

Relevante é o erro que recai sobre a identidade do contraente, mas não é essencial o erro  que recai sobre o nome, simplesmente, ou sobre as qualidades que não individualizem a pessoa, por não influir na determinação da vontade.

Mas o erro essencial deve ser escusável, como ensinavam Chironi e Abello(Trattato di diritto civile italiano, pág. 475): o caráter essencial, que tem o erro determina a possibilidade objetiva; o ser escusável acentua a possibilidade subjetiva. Assim quanto ao falso conhecimento que teve, deve o agente estar em tal condição de conduta que não se lhe possa imputar ser responsável pelo erro.

Faz-se, por fim, uma dicotomia entre o erro de fato e o erro de direito.

Para Coviello(Manuale di diritto civile, volume primeiro e único, segunda edição, 1955, pág. 388) “o erro de direito é inteiramente equiparado ao erro de fato. Por isso pode-se anular qualquer negocio salvo os executados pela lei, tendo em vista sua própria natureza". Mas os casamentos não podem ser anulados, senão por erro de direito. Aliás, a doutrina, em sua maioria, considera inescusável o erro de direito, pois a ninguém é dado a ignorância da lei. Aliás, tratando-se de normas coativas considera-se inescusável o erro de direito.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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