INTRODUÇÃO
A economia e a globalização traz mudanças ao direitos sociais muitas vezes insatisfatórias, nesse sentido, este trabalho irá abordar alguns impactos e desigualdades que a globalização traz aos direitos sociais e trabalhistas. Será discutida também a relação intrínseca que existe entre crescimento econômico e crescimento social, além de demonstrar como o princípio da vedação ao retrocesso social é uma proteção aos direitos assegurados constitucionalmente diante da economia globalizada.
DA ECONOMIA GLOBALIZADA E SEUS IMPACTOS
Ao decorrer do tempo, mudanças em todos os sentidos foram visualizadas referentes à economia mundial, principalmente a partir do século XX, onde ocorreu uma maior acentuação do fluxo comercial do mundo inteiro, ocasionado por transformações tecnológicas, maior acesso e utilização de computadores além do desenvolvimento das telecomunicações e dos transportes.
Não existiam mais fronteiras entre países ou Estados. A fase pós industrial é caracterizada por uma maior informação e acessibilidade do conhecimento, por isso aumentando a produtividade das empresas levando em conta a competição entra elas, e o consumismo descomedido e a crescente elevação demográfica (ROMITA, 2005, p. 199)
A economia globalizada não tem origem recente, apenas nos dias de hoje que esta veio a ser chamada globalização, pois é entendido que a economia passou por diversas fases históricas, e nesse sentido desenvolveu-se e tomou as formas que hoje é conhecida.
José Eduardo Faria (2004, p. 86) chama de “sociedade informacional” a sociedade que formou-se por todos esses meios globalizados de conhecimento e informações tecnológicas. Mas faz a ressalta de que antes mesmo da economia ter se tornado globalizada esta passou por momentos de profundas crises, como “a estagnação, a inflação e a deterioração das condições de lucratividade dos capitais financeiro e produtivo trazidas pela crise do padrão monetário internacional”, além das crises ocasionadas pelo petróleo. Para ele os impactos deixados pelas dificuldades econômicas da época foi uma espécie de mola propulsora para o início da globalização.
Graças as formas inéditas de transação, disseminação, distribuição, conexão e intercâmbio das inovações científicas e das descobertas tecnológicas, potencializando as características isomórficas dos novos produtos e gerando sistemas de processamento que se incorporam como elementos de circuitos e cadeias produtivas cada vez mais sofisticadas e complexas, os baixos custos da programação permitem modificações rápidas nas máquinas e equipamentos, habilitando-os a fabricação de uma extensa gama de produtos distintos, sempre com alto grau de eficiência. (FARIA, 2004, p. 83)
O conceito de globalização funda-se na anulação de limites culturais e econômicos entre os países. Por isso ela pode ser caracterizada como a fundação de uma ligação mundial de posicionamentos nacionais e tem como ideologia matriz o neoliberalismo (HOLANDA, 2013, p. 41)
A globalização em todas as suas formas poderá ser vista por ângulos negativos e positivos, pois é sem duvidas representação do capitalismo descontrolado, além de tornar desfavorável o pensamento neoliberalista, que trata da minimização do Estado como forma de instrumento político e econômico, apoiando o livre comércio e a produção de bens. O certo é que muitas são as modificações que as novidades globais acarretam, e com o direito não é diferente. O direto torna-se dinâmico porque a cada dia são editadas novas leis em que o legislador tenta acompanhar a sociedade globalizada e novas resoluções de conflitos até então não existentes.
Os reflexos da economia globalizada também atingiram os direitos sociais e conseguintemente os direitos do trabalhador, mas como foi dito anteriormente essa causa não trata-se de uma novidade, apenas o que ocorre é a forma como o direito é impactado, sendo que a cada dia ocorre transformações atenuantes.
As bases do direito do trabalho emergente desse padrão de industrialização – fundamentalmente nos países de industrialização avançada e de democracia consolidada - , eram: a) trabalho fixo, unidirecional e de longa duração; b) jornada plena; c) contratação coletiva por setores e centralizada (da cadeia produtiva para a empresa); d) poucas formas de contratação; e) fortes restrições aos despedimentos; f) remuneração fixa; g) formação profissional específica mas pouco exigente quanto ao aperfeiçoamento e atualização (NETO, 1999, p. 242)
O autor acima refere-se a um sistema antigo de trabalho, onde este era costumeiro reiterado e controlado por um inflexível comando hierárquico, e que no caso não cabe mais em uma situação atual. Nesse sentido a globalização transferiu pontos positivos para o trabalhador, pois assegurou além de um trabalho digno o seu bem estar social.
Os direitos sociais trabalhistas no âmbito globalizado, se deram principalmente pela “articulação de políticas públicas com a atuação dos sindicatos, associações empresariais” sem esquecer a liberdade da contratação coletiva de trabalho, e por conta dessa última tornou-se visível o desenvolvimento dos níveis empresariais nos âmbitos “setoriais, intersetoriais, nacionais, regionais e por empresa” (NETO, 1999, p. 243).
José Francisco Siqueira Neto (1999, p. 243), relata que os primeiros efeitos de uma economia globalizada se deram com maior força na Europa, onde foi visto por meio das leis de trabalho uma harmonia na contratação coletiva por parte do poder público. Contudo no Brasil quando ocorreu um maior crescimento econômico, é bem verdade que o aumento de empregos dinamizou a economia, mais a maioria dos empregadores por possuírem muitos trabalhadores pagavam salários baixos, e com isso a renda brasileira em meados dos anos 60 passou a ser uma das mais injustas do mundo.
Atualmente a realidade é outra, e os trabalhadores possuem bem mais direitos assegurados na Constituição Federal, e em leis ordinárias específicas, conforme já foi explicitado com os artigos referentes aos direitos sociais no capítulo passado. Hoje existem formas do trabalhador requerer seus direitos, além de serem assistidos pelos sindicatos e possuir associações e entidades de classes como instrumento de defesa e promoção desses direitos, e por isso são direitos exigíveis judicialmente.
Porém a economia e a globalização não se estagnaram em nenhum momento, pelo contrário, de acordo com Gilberto Dupas (1999, p. 14) houve uma “integração dos mercados financeiros mundiais e um crescimento singular do comércio internacional – viabilizado pelo movimento de queda generalizada de barreiras protecionistas, principalmente dentro dos grandes blocos econômicos.” Com a globalização e o crescimento da economia, é certo que quem sofre os impactos maiores são as empresas e por conseqüência os trabalhadores.
Apesar das leis estarem consolidadas e asseguradas aos trabalhadores a globalização cria situações que as relações sociais não estão completamente abarcadas, pois a economia encontra-se mundializada, assim como os sistemas industriais cada dia mais complexos e as tecnologias mais sofisticas, o que causa a desestabilização das relações sociais muitas vezes gerando desigualdades e crises econômicas e sociais.
A destayloriazação não se faz sem dificuldades. Os trabalhadores resistem: nem sempre dominam os conhecimentos básicos necessários. A criação de empregos mais qualificados, o trabalho em grupo, tudo isso obriga a mudança de hábitos e a reflexão, quase nunca obtendo a adesão espontânea dos que são atingidos pela nova ordem de coisas. Um novo contrato social se impõe: integração técnica, subcontratação, fabricação por encomenda horários modulados, distribuição “telemática”, gestão “stock zero” ou “just in time”, exigem um entendimento entre empresários e sindicatos, pautado por compromissos claros e explícitos, assentados sobre bases sólidas e duradouras. (ROMITA, 2005, p. 200-201)
Um ponto importante que Arion Sayão Romita (2005, p. 201) abordou trata-se dos sindicatos em relação aos efeitos da globalização. Estes acreditam que o fenômeno da globalização traz ao trabalhador certas desigualdades como o desemprego, além de restringir o poder sindical.
Desde a origem dos sindicatos, estes reivindicam por todos os trabalhadores, apesar disso, acontece por influência da economia desenfreada que os trabalhadores estão preservando o seu trabalho e o protegem, mesmo que não esteja em uma situação favorável frente ao seu empregador, ou encontrem-se em uma relação danosa, pois com o aumento do desemprego o trabalho torna-se um bem escasso, e o empregado precisará do seu sustento e dos valores financeiros que recebe.
Para os sindicatos o crescimento do comércio internacional é incompatível com a proteção dos trabalhadores, ou seja, a ampliação contínua e sucessiva do livre comércio, e o princípio da não discriminação que tem como finalidade o tratamento igual entre nações nacionais e estrangeiros, se tornam lesivas as condições sócias trabalhistas. Ainda sobre o pensamento de Romita (2005, p. 202), este acredita que o desemprego é a principal agravante para a desigualdade social, ele surpreende os sindicatos dos trabalhadores porque eles não se encontram aparelhados para enfrentar tamanho desafio.
O desemprego individual ou de um pequeno grupo é corriqueiro no sistema capitalista. No entanto, como as crises econômicas apresentam impacto de bomba atômica no mercado interno também sofrem imediatamente com o incremento da inadimplência, da redução do consumo e da menor margem de arrecadação decorrentes do arrefecimento do nível da atividade econômica. A legislação atual, contudo não prevê regras específicas procedimentais para a demissão em massa. Em razão de absurdo silêncio legal, situações de grandes dimensões econômicas e sociais foram levadas ao Judiciário trabalhista, no intuito de fazer o Estado enxergar as diferenças gritantes entre os desligamentos individuais e os coletivos e assim, passar a tratá-los de forma diversa. (FERNANDES, 2013, p. 201)
O autor Rayneider Brunelli Fernandes (2013, p. 201) traz a tona outros meios de desemprego, que é o desemprego em massa, ocasionado por crises econômicas geradoras de uma deficiência na saúde financeira, além de desigualdades sociais. Na verdade são impactados todos da população em geral, mais o comércio e a indústria são setores que giram em torno da economia, e por isso qualquer mudança é sentida e torna-se prejudicial para a área empreendedora.
Outro meio para a desigualdade e a exclusão social foi o surgimento da transnacionalização, fruto também da chamada globalização, que trata da mobilidade de empresas que não apresentam maiores “compromissos com os países que sediam suas atividades” o que gera “maior poder de barganha” entre os Estados. Com isso, o governo tenta aumentar as competitividades nacionais para garantir que o país continue com o seu crescimento econômico sem ter que “gerar restrições na obtenção de novos recursos tributários” (HORTA, 2009, p. 6)
Onde lhes é conveniente, utilizam mão-de-obra familiar e pagam por peça; outras vezes, contratam nos moldes convencionais de trabalho – com estabilidade, benefícios e garantias. Em outros países, preferem ainda utilizar mão-de-obra em tempo parcial, com contratos mais precários ou terceirizando parte de suas atividades; ao fazê-lo, transferem para terceiros a responsabilidade da contratação e das relações com trabalhadores que, de outra forma, estariam sob sua ordem e responsabilidade. Uma vez que a relação intracapital também vem sofrendo alterações, torna-se difícil falar em uma empresa, sendo mais adequado falar em grupos ou, como denomina François Chesnais, “cachos de empresas”. Além disso, tem havido crescente alianças dos mais diversos tipos: desde parcerias tecnológicas, que visam mitigar o gigantesco custo do desenvolvimento de novas tecnologias, até associações na comercialização e na distribuição. Nessas alianças, quando as transnacionais escolhem parceiros locais, consolida-se um novo espaço para pequenas e médias empresas no mundo globalizado. Elas podem, assim, orbitar em torno das grandes corporações, subordinadas e alimentadas por sua lógica. Embora este seja um dos poucos nichos sólidos que elas ainda podem ocupar, muitas vezes até esses espaços são preenchidos por outros grandes grupos transnacionais. A partir dessa nova realidade, as fronteiras nacionais são a todo momento transpostas e passam a ser encaradas, em certo sentido, mais como obstáculos à livre ação das transnacionais do que como referências limitadoras” (DUPAS, 1999, p.15).
As transnacionais desenvolvem-se por meio de processos de desintegração e desagregação entre vários países, em face de filiais e de fornecedores, de forma que o resultado final é obtido através de um produto global que foi desenvolvido confeccionado em vários países, desfrutando de benefícios convenientes dos determinados países. O que é observado nas transnacionais é que estas, aproveitam-se de diferentes países e das melhores oportunidades para fabricarem seus produtos. (HORTA, 2009, p. 5-6)
Conforme o entendimento acima de Gilberto Dupas as transnacionais utilizam meios visando apenas o seu desenvolvimento econômico, deixando de lado os direitos assegurados na Constituição que visam a melhoria da vida dos trabalhadores, com contratos por tempo determinado e precários, muitas vezes quando é conveniente pagando apenas pelas peças feitas. Nesse sentido, as transnacionais não consubstanciam um meio para o fim do desemprego ou de qualquer desigualdade que venha a surgir, mas sim uma vertente para um maior impacto e exclusão social, tornando-se um ponto negativo da globalização.
CRESCIMENTO ECONOMICO X CRESCIMENTO SOCIAL
No art. 1º, inciso III da vigente Constituição Brasileira está assegurado o princípio da dignidade humana, este tem como fundamento o Estado Democrático de Direito, isto que dizer que o Estado deve procurar formas para certificar a proteção do homem assim como sua cidadania.
Não é tarefa fácil regular a dignidade da pessoa humana em todos os aspectos sociais, pois torna-se necessário proteger as condições de trabalho e a renda do ser humano. Além disso, não satisfaz a sociedade apenas assegurar essas condições no papel, a dignidade deve ser realmente efetivada no caso concreto. Com isso, no art. 170 da Constituição Federal de 1988 é relatado que “a ordem econômica deve ser fundada na valorização do trabalho e na livre iniciativa com o objetivo de assegurar a todos uma existência digna”, com essa garantia do constituinte é possível vislumbrar o crescimento social e econômico.
Mesmo nas atividades econômicas entre particulares precisa existir a necessidade de garantir a dignidade humana, pois a garantia do trabalho e da renda do trabalhador são fontes primárias do princípio da dignidade além de fazer parte do rol dos direitos fundamentais sociais. “Tais direitos têm por objetivo assegurar ao trabalhador proteção contra necessidades de ordem material, além de uma existência digna” (ROMITA, 2005, p. 253).
André Gustavo Corrêa Andrade (2004, p. 56) entende que, o uso do “direito à dignidade” deve ser afastado, sendo que a utilização de tal expressão é inapropriada. O ser humano por si só já nasce com direito a dignidade, tendo que portanto ser requerida apenas o seu respeito ou sua proteção.
Com a globalização, o aumento das transnacionais e a expansão da economia o princípio da dignidade humana foi de certa forma afastado das relações privadas, pois houve um aumento do desemprego, da má distribuição de renda e em razão disso também da pobreza em larga escala, essa situação faz surgir um novo princípio também orientador dos direitos sociais, o direito do Bem Estar Social.
Sônia Mirian Draibe faz uma análise entre as relações econômicas e sociais, especialmente sobre os aspectos que influenciam as classes sociais nas condições atuais de globalização e indaga a questão do bem estar social como uma revalorização da “dimensão sistêmica da política social”.
A análise integrada, em suas recentes e variadas versões, avançou e amadureceu através de amplo debate sobre as relações entre a economia e a política social, entre a economia e a política social, especialmente sobre os aspectos cambiantes e desafiantes do crescimento econômico nas condições atuais de globalização, confrontadas com as potencialidades e limites da política social [...] Por outro lado, revalorizou-se a “dimensão sistêmica da política social”, ou seja, são os sistemas de políticas sociais ou, mais especificamente o Estado de bem estar os focos a partir dos quais elaboram as análises, sempre e quando se trata de pensar articuladamente o desenvolvimento econômico e a política social (DRAIBE, 2007, p. 32)
A prioridade social, a visão do bem estar social e a proteção a dignidade da pessoa humana são pontos importantes para que se possa examinar o funcionamento do desenvolvimento econômico. Assim também é o pensamento de José Eduardo Faria quando expõe que o plano econômico integrado é responsável muitas vezes pela desvalorização do homem e da sociedade. O que deixa claro que para o bom funcionamento da globalização, desenvolvimento econômico e desenvolvimento social precisam estar interligados.
A integração sistêmica no plano econômico é responsável, desta maneira por um crescente processo de ruptura das redes de solidariedade e de desagregação nos planos social e nacional. No plano social porque, dada a já mencionada substituição da “sociedade de homens” pela sociedade de organizações” [...] Dito de outro modo, como o fenômeno da globalização levou o espaço da produção a se irradiar sobre os demais, levando as condições de vida e de trabalho a serem condicionadas pelas relações, processos e estruturas de apropriação econômica, quem nele não consegue incluir-se estaria, por conseguinte, excluído da vida social; evidentemente, uma exclusão em termos de mercado de trabalho, ocupação profissional, acesso ao consumo, fruição de direitos (FARIA, 2004, p. 247-248)
Ademais o autor também fala sobre a exclusão social que existe quando os fatores sociais não conseguem acompanhar os econômicos, assim como por exemplo a ocupação profissional ou o acesso ao consumo.
Asa Briggs (2006, p. 16), assim como Sônia Mirian Draibe (2007, p. 32) adotam a política do Welfare State para explicar o que seria a política do bem estar social. A primeira autora traz a idéia do que seria esse fator, explicando como um “jogo de forças de mercado” para assegurar a renda, e minimizar as adversidades sociais que possam vim a surgir, utilizando-se de serviços sociais como meio para igualar as classes sociais. Para a segunda autora, o Welfare State torna-se mais amplo, por atingir a sociedade o Estado e a economia, induzindo a um crescimento na economia, assim como acontece por virtude disso um aumento também nos empregos e salários.
Tal como outras correntes, esta concepção valoriza o tipo de política social que contribui para ampliar o crescimento econômico e a participação das pessoas na geração da própria renda. Entretanto, sua mais alta ambição – a de instituir um novo modelo de Welfare State foi criticada exatamente por reduzir o bem estar a pouco mais que algumas regras morais e normas de conduta, com forte desprezo das questões de justiça social, universalidade e igualdade, com o que, em última instância, encobriria sob roupagens da pós modernidade um real ataque do Estado de bem estar. É de se notar que, mesmo não tendo alcançado objetivos tão ambiciosos, a perspectiva disseminou-se amplamente, orientando reformas e inovações de programas sociais no mundo todo, e sob governos de mais variadas orientações (DRAIBE, 2007, p. 31)
A proteção social, assim como a visão do bem estar social são pontos importantes para que se examine e entenda como funciona o desenvolvimento econômico. A autora explica que o Welfare State apesar de ser uma espécie de reforma com vistas a proporcionar uma melhor valorização do crescimento social e ter orientado reformas e inovações em todo mundo, este foi criticado por não ter levado o bem estar social a um patamar mais elevado, e por isso não te conseguido atingir objetivos ambiciosos. O bem estar social portanto, torna-se medida padrão para o crescimento econômico pois é a partir de um mercado equilibrado que é possível resguardar as garantias para o desenvolvimento social, assim como este é instituto primário para o desenvolvimento econômico.
Conforme os ensinamentos de Oliveira Vianna (1951, p. 23), essa nova visão econômica resultou em “um marco no desenvolvimento das relações trabalhistas no Brasil, na busca laboriosa da reversão do quadro do retrógrado político e econômico que ignorava a questão social”.
Nesse sentido, o crescimento econômico deve andar sempre ao lado do crescimento social. Não bastando somente os indivíduos viverem em uma economia globalizada e usufruir da melhor tecnologia e os melhores meios. Os direitos sociais também devem ser visados como pressuposto de equilíbrio na balança de mercado.
DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO SOCIAL
O princípio da vedação ao retrocesso social, ou proibição ao retrocesso dos direitos sociais apresenta-se como forma de proteção jurídica, e tem sido muito bem aplicada na prática, no que diz respeito a evolução dos direitos trabalhistas.
Canotilho entende que é inconstitucional qualquer que seja a medida que proporcione aos direitos sociais já resguardados na Constituição Federal de 1988, sem gerar outras formas optativas e adequadas a contrabalancear a anulação desses direitos. Desta maneira, somente seria concebível imaginar a revogação desses direitos sociais se fossem “criados mecanismos jurídicos capazes de mitigar os prejuízos decorrentes da sua supressão” (CANOTILHO, 2002, p. 336)
Esse também é a percepção de George Marmelstein quando diz que o Estado deve atuar sempre no sentido de aumentar progressivamente a eficácia das garantias já implementadas pela segurança da vedação do retrocesso social.
A idéia por trás do princípio da proibição de retrocesso é fazer que o Estado sempre atue no sentido de melhorar progressivamente as condições de vida da população. Qualquer medida estatal que tenha por finalidade suprimir garantias essenciais já implementadas para a plena realização da dignidade humana deve ser vista com desconfiança e somente por ser aceita se outros mecanismos mais eficazes para alcançar o mesmo desiderato forem adotados. Esse mandamento está implícito na Constituição brasileira e decorre, dentre outros, do art. 3º da Constituição de 88, que inclui a redução das desigualdades sociais e a construção de uma sociedade mais justa e solidária entre objetivos da República Federativa do Brasil, sendo inconstitucional qualquer comportamento estatal que vá em direção contrária a esses objetivos (MARMELSTEIN, 2008, 267-268)
Felipe Derbli (2007, p. 202) acredita que a especialidade do princípio em questão está pois, no domínio da sua natureza negativa. Contudo existe também uma natureza positiva que surge no momento que se diz que “é dever do legislador manter-se no propósito de ampliar, progressivamente e de acordo com as condições fáticas e jurídicas o grau de concretização dos direitos sociais.” Ressalta-se que o princípio da proibição ao retrocesso social não tem por finalidade apenas o status, mas sim tem objetivo o avanço social.
Destaca-se que o desenvolvimento nacional é pressuposto para que o Estado esteja em constante progresso. Nesse sentido o Estado deverá agir para que seja executado os pontos negativos e positivos na realização dos direitos garantidos constitucionalmente.
A jurisprudência também concorda com o cumprimento das medidas positivas asseguradas pelo Estado, assim decidiu o Supremo Tribunal Federal:
[…] A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. – O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. – A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculos a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de terná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos sociais já concretizados.- (ARE 639337 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 23/08/2011, DJe-177 DIVULG 14-09-2011 PUBLIC 15-09-2011 EMENT VOL-02587-01 PP-00125).
De acordo com Canotilho (2002, p. 338-339), os direitos sociais e econômicos quando obtêm um “determinado grau de realização passam a constituir simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjetivo.” Isso quer dizer que o princípio da proibição ao retrocesso social não pode impedir o surgimento de recessões, os impactos das crises econômicas, ou até mesmo os efeitos da globalização desenfreada, mas constitui uma forma de limitar “a reversibilidade dos direitos adquiridos” quando as mudanças no âmbito econômico torna-se uma “clara violação do princípio da proteção da confiança e da segurança dos cidadãos no âmbito econômico, social e cultural, e do núcleo essencial da existência mínima inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana.”
A relevância que se dá ao princípio em questão é de “proteção adicional á outorga pela ordem jurídica constitucional que vai além da proteção tradicionalmente imprimida pelas figuras do direito adquirido bem como das demais vedações específicas de medidas retroativas.” (SARLET, 2005, 327).
A vedação do retrocesso social é mais que um simples princípio, pois assegura todos os demais princípios proteção a mudanças ou minimizações, além de ratificar todos os direitos sociais que são concretizados pelo Estado, mesmo diante das desigualdades fruto de uma economia globalizada.
CONCLUSÃO
O crescimento econômico de um Estado se perfaz pela mão de obra existente nele. Assim como o crescimento social só existirá se o país estiver bem economicamente, com meios de prover e assegurar as políticas públicas aqueles que necessitam, assim como os direitos trabalhistas. Não existindo esse equilíbrio entre crescimento social e econômico o país encontra-se desprotegido e a partir daí resulta as crises econômicas, acarretando desigualdades como a má distribuição de renda, desemprego e pobreza.
Finalizando o entendimento, é possível concluir com a presente pesquisa que os direitos sociais não podem retroceder no tempo e nem serem minimizados, sem uma previsão equivalente para servir de compensação. Os direitos trabalhistas sendo caracterizados como cláusulas pétreas não podem ser reduzidos como meio de adequar-se a globalização e as praticas desenfreadas da economia.
O que poderia ser feito na realidade, seria uma flexibilização desses direitos levando em conta a não restrição desses, sendo que a partir da situação do caso concreto que o direito trabalhista for flexibilizado precisará ocorrer a institucionalização de meios para que sejam assegurados direitos equivalentes ao que foi flexibilizado, havendo assim o respeito a Carta Magna Brasileira e os princípios.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ARE 639337 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 23/08/2011, DJe-177 DIVULG 14-09-2011 PUBLIC 15-09-2011 EMENT VOL-02587-01 PP-00125
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