A estrutura federativa dos Municípios na perspectiva da Constituição Federal de 1988

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O artigo visa compreender o novo papel do ente federativo municipal a partir do advento da constituição federal de 1988, na atual conjuntura político administrativo do Brasil.

RESUMO

Este artigo visa a compreender o novo papel do ente federativo municipal a partir do advento da Constituição Federal de 1988 na atual conjuntura político-administrativa do Brasil. Assim, o Município, ao assumir o status de ente federativo, foi assegurado a sua independência, sua competência e sua autonomia no atual ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido, a Constituição Federal de 88 proporcionou a repartição de competência entre os entes federativos, assegurando aos entes municipais a capacidade de se auto-organizarem e os muniram de poder local caracterizado por autonomia, emancipando os municípios em relação ao Estado-membro e a união. A metodologia adotada neste artigo foi a pesquisa bibliográfica, utilizando-se dos seguintes autores Pereira (2014), Silva (2011), Ferrari (1993 e 2005), Meireles, (2003), Ferreira Filho (2009), Leal (2012), dentre outros, adotou-se documentos oficias, como a Constituição Federal de 1988, que subsidiaram teoricamente o presente estudo. Ao longo deste estudo, analisar-se-ão a estrutura federativa e a organização administrativa dos municípios a partir da Constituição Federal de 1988 e sua contribuição para a implementação de um Estado Democrático de Direito. Portanto, pode-se inferir a grande importância e contribuição da estrutura federativa do Município em relação ao processo de descentralização político-administrativa alicerçado em princípios constitucionais e preceitos positivados no ordenamento jurídico pós 88, que se propôs conceder a legitimidade do ente municipal no fenômeno da sua auto-organização no atual contexto político estabelecido com a promulgação da Constituição Federal de 88.

Palavras-Chave: Constituição Federal de 88. Entes Federativos. Municípios.

ABSTRACT

This article aims to understand the new role of municipal federative entity from the advent of the Constitution of 1988 in the current political and administrative conditions in Brazil. Thus, the Municipality, by assuming the status of federal entity, was assured its independence, competence and autonomy in the current Brazilian law. In this sense, the Constitution of 88 provided the division of powers between the federal entities, assuring loved city the ability to organize themselves and muniram local government characterized by autonomy, emancipating the municipalities in relation to the Member State and the unity. The methodology used in this article was the literature, using the following authors Pereira (2014), Silva (2011), Ferrari (1993 and 2005), Meireles (2003), Ferreira Filho (2009), Leal (2012) among others, was adopted official documents such as the Constitution of 1988 that theoretically subsidized the present study. Throughout this study, we will analyze the federative structure and administrative organization of municipalities from the Federal Constitution of 1988 and its contribution to the implementation of a democratic state. Therefore, one can infer the importance and contribution of the federal structure of the municipality in relation to the process of political and administrative decentralization grounded in constitutional principles and precepts positivized post law 88, which proposed to grant the legitimacy of the municipal entity in the phenomenon of self-organization in the current political context established with the enactment of the Federal Constitution of 88.

Keywords: Federal Constitution of 88. federal entities. Counties.

1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 veio estabelecer como novidade o fenômeno da emancipação dos Municípios, tornando-os entes autônomos e componentes de uma estrutura federativa, a partir do artigo 1º, da CF/88, e, logo em seguida, com o artigo 18, que estabeleceu a organização política e administrativa da República Federativa brasileira. Nessa perspectiva, os Municípios assumiram novas funções e competências na conjuntura político-administrativa estabelecida pela Constituição Federal.

Com o surgimento das competências e atribuições, os Municípios passaram a adquirir maiores obrigações e responsabilidades no âmbito federativo. A partir desta perspectiva constitucional, configurou-se o processo de descentralização administrativa, política e financeira entre os entes da federação, gerando, consequentemente, gerando autonomia dos entes municipais em diversos aspectos.

A reflexão partiu das seguintes indagações: Quais as competências do Município na perspectiva da Constituição Federal de 1988? Quais as consequências das atribuições e competências dos entes municipais na organização político-administrativa da República Federativa brasileira? Qual a concepção que a Constituição Federal de 1988 adotou para ampliar as competências dos entes municipais na conjuntura política, econômica e social da época? Assim, tais questionamentos nortearam as discussões acerca do presente tema ao longo deste artigo.

O presente estudo se propõe refletir e elucidar, a luz dos fundamentos constitucionais, legais e doutrinários, acerca do novo ente federativo de âmbito municipal, advindo com a promulgação da Constituição Federal de 88, a partir de transformações introduzidas pelo princípio da autonomia municipal, proporcionando a inovação quanto ao fato de atribuir status de personalidade política ao Município. Com o processo de descentralização, instituiu-se um novo modelo federativo que consistiu na ampliação da competência material e legislativa dos Municípios.

Este artigo se estrutura numa pesquisa bibliográfica, a qual tem como fundamento principal os conhecimentos disponíveis em fontes bibliográficas, como livros, artigos científicos, doutrinas e jurisprudências nacionais acerca da estrutura administrativa e política dos Municípios na perspectiva da Constituição Federal de 1988.

Portanto, pretende-se com o presente estudo ampliar o conhecimento nesta linha de pesquisa a fim de compreender a competência e atribuições dos Municípios com o advento da Carta Magna de 1988 e a sua repercussão na organização administrativa, política e financeira da federação.

2 A CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA QUANTO AO PAPEL DOS MUNICÍPIOS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS DE 1824 A 1988

A primeira constituição brasileira data do ano de 1824 instituiu, a partir do seu artigo 168, as Câmaras Municipais nas cidades e nas vilas existentes no Brasil. Nessas Câmaras se caracterizavam pelo seu caráter seletivo e eram presididas por vereadores a partir da votação. No artigo 169, da Constituição de 1824, determinou-se que as Câmaras Municipais eram regulamentadas por Lei Ordinária, sendo esta lei que disciplinava o processo de escolha dos vereadores, descriminando os direitos e deveres de cada membro, bem como também estabelecia a subordinação desta Câmara ao Presidente de cada Província (MEIRELLES, 2003).

Com a Lei nº 01/1828, especificamente em seu artigo 24, veio estabelecer que a referida câmara tinha funções meramente administrativas, não podendo exercer nenhuma jurisdição, ou seja, as Câmara municipais não tinham autonomia em relação à gestão local e sem influência política (CAMPANHOLE, 1976).

Segundo Meirelles (2003), na época do Império, os Municípios não tinham nenhuma autonomia, com o promulgação da Lei de nº 16/1834, implementou-se o processo de descentralização, a fim de conceder mais poderes aos entes municipais e proporcionar mais autonomia na organização administrativa-política. Em contrapartida, a lei em epígrafe “incorreu em igual erro ao subordinar as Municipalidades às Assembleias Legislativas provinciais em questões de exclusivo interesse local” (MEIRELLES, 2003, p. 563).

Segundo Pereira (2014, p. 18):

Com a Lei 105, de 12.05.1840, deu-se interpretação mais ampla aos dispositivos da Lei 16/34, tentando-se restituir algumas franquias ao Município. Entretanto, essa nova disposição nada adiantou, uma vez que a Lei Regulamentar de 1928, não previa órgãos adequados aos Municípios para o exercício de suas funções.

De acordo com o autor supramencionado, observa-se que se tentou ampliar os poderes dos Municípios, mas não disponibilizou também a criação de órgãos para que ocorresse o adequado funcionamento dos municípios, possibilitando a execução de funções que propiciassem uma maior autonomia administrativa, política e financeira a estas municipalidades. Na verdade, os Municípios, por não deterem nenhuma função política e judicial, se tornavam politicamente subordinados tanto ao Império como às províncias, exercendo a função meramente de caráter administrativo, econômico e cunho político.

Nessa perspectiva, também se pode inferir que, na época do império, as Câmaras Municipais se restringiam: a administrar a província, organizando o seu funcionamento, com atos de cunho administrativo; a gerenciar a economia, controlando e fazendo cumprir as regras para o comércio e para a economia; e a gerenciar politicamente cada órgão municipal. Portanto, é perceptível que, nesse momento da política brasileira, as Câmaras Municipais se caracterizavam por ser um órgão da província meramente ligado à administração a fim de controlar a execução de regras econômicas e políticas impostas pelo Império e pela província.

Ainda de acordo com Meirelles (2003), com a Constituição de 1891, época republicana, em seu artigo 68, estabeleceu que a organização estatal deveria assegurar, principalmente, a autonomia dos Municípios em relação aos interesses restritamente local, ou seja, os Municípios tinham autonomia em tratar de assuntos relacionados de ordem e de caráter municipal. Dessa forma, proporcionou que as Constituições Estaduais estruturassem o funcionamento dos Municípios de acordo com os seus interesses, a fim de garantir uma maior ou menor participação na administração local.

Na perspectiva de Leal (2012), os Municípios se transformaram um instrumento de grande interesse dos coronéis, uma vez que estes se tornaram instrumentos de manobras para as eleições, sempre com a finalidade de, com os apoios dos coronéis, manterem os governadores estaduais no poder. Além disso, ressalta que a problemática dos Municípios está relacionada à carência de autonomia que foi constante em todas as épocas da História brasileira.

Ao estudarmos a autonomia municipal no Brasil, verificamos, desde logo, que o problema verdadeiro não é o de autonomia, mas o de falta de autonomia, tão constante tem sido, em nossa história, salvo breves reações de caráter municipalista, o amesquinhamento das instituições municipais. A atrofia dos nossos municípios tem resultado de processos vários: penúria orçamentária, excesso de encargos, redução de suas atribuições autônomas, limitações ao princípio da eletividade de sua administração, intervenção da polícia nos pleitos locais etc (LEAL, 2012, p. 68).

Embora a Constituição de 1981 tenha proposto a autonomia municipal no Brasil, pode-se inferir que este fenômeno, na prática, não se concretizou, já que tais entes não eram estruturados e muito menos dependentes, sendo certo que muitos eram vistos como propriedade particular e curral eleitoral dos coronéis, que manipulavam as eleições a fim de atender seus interesses pessoais. Assim, os Municípios restringiam as suas funções a atender os interesses de uma classe dominante (MEIRELLES, 2003).

Com a promulgação da terceira constituição datada de 1934, observou-se que não bastava somente manter a autonomia dos Municípios, mas era necessário provê-los de rendas a fim de que tais entes realizassem os seus serviços públicos e, consequentemente, possibilitar o progresso do Município. No artigo 13, desta Constituição, ficou determinado que os Municípios deveriam ser organizados de forma a manter a sua autonomia no que se refere ao seu interesse, exclusivamente, quanto às eleições para prefeitos e vereadores; decretação dos impostos e arrecadação e; a organização administrativa dos serviços de competência exclusiva do Município. Nessa Carta Magna, criou-se um sistema de arrecadação pautado na divisão e/ou partilha dos impostos entre os diversos entes federados.

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Entretanto, observa-se que, na Constituição em epígrafe, a escolha dos prefeitos para administrar os municípios não era de caráter democrático, mas tal procedimento era de livre nomeação do Governador do Estado. Assim, ainda tentava se manter, no âmbito dos Municípios, uma dominação do Estado em relação aos Municípios, implementando medidas antidemocráticas, a partir da escolha de seus representantes (PEREIRA,2014).

A Constituinte de 1946 também ressaltou a importância da autonomia municipal, a partir dos aspectos de ordem política, administrativa e financeira. Dessa forma, os constituintes da época vieram propor a criação de mecanismos de distribuição de poderes, a fim de proceder ao processo de descentralização, ou seja, na nova ordem constitucional, retirou-se o grande poder concentrado pelo Poder Executivo. Assim, ocorreu uma distribuição de poderes entre a União, Estados e Municípios. Meirelles (2003) ressalta que esse fenômeno não chegou a comprometer a ordem federativa e muito menos feriu as autonomias de âmbito estadual e municipal. No âmbito municipal, ocorreu a integração do sistema eleitoral e ocorreu à disposição de seus órgãos sempre em simetria com os poderes da nação.

A Constituinte de 1967 e a Emenda Constitucional nº 01 de 69 apresentaram e adotaram pensamentos retrógrados quanto às normas constitucionais, pois se implementou normas caracterizadas pela centralização e pautada no acúmulo de poderes no Executivo. Ao contrário das demais Constituições, nesse período, os atos e as Emendas Constitucionais vieram propor a limitação do poder dos Municípios nos âmbitos político, administrativo e financeiro. Assim, pode-se concluir que, nesse período, os Municípios novamente tiveram os seus poderes e sua autonomia reduzidos, uma vez que o Estado brasileiro resolveu implementar medidas que resultaram na restrição das funções dos Municípios.

Por fim, a Constituição Federal de 1988 ampliou a autonomia dos Municípios nos aspectos político, econômico e político, outorgando-lhe a capacidade e competência de elaborar a sua legislação local denominada de Lei Orgânica. Assim, estabelece o artigo 29, da CF/88: “O município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará” (BRASIL, 1988). Dessa forma Pereira (2014, p.24, apud Felisbino) afirma o seguinte:

Esse artigo coloca o município, em relação a sua autonomia, em uma posição privilegiada, uma vez que não está mais subordinado a qualquer autoridade estadual ou federal no desempenho de suas atribuições. Os municípios, ainda, dentro de sua competência privativa, podem “legislar sobre assuntos de interesse local” (conforme o disposto art. 30, I), em substituição à tradicional expressão “peculiar interesse”, que acompanhava todas as Constituições anteriores.

Nesse âmbito, ressalta-se que, com a Constituição Cidadã de 1988, os Municípios se apoderaram de mais atribuições, poderes e de uma autonomia política, econômica e legislativa, uma vez que o Estado brasileiro estabeleceu mecanismos capazes de reduzir a subordinação dos entes municipais a qualquer outro ente de âmbito estatal ou federal, principalmente, com a oportunidade de poder legislar sobre assuntos relacionados ao seu interesse de ordem local.

3 A REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS DOS ENTES FEDERATIVOS NA CONSITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Neste capítulo, busca-se, inicialmente, fazer uma análise acerca do papel do Município na perspectiva da Constituição Federal de 1988, procurando ressaltar as suas principais competências no atual contexto constitucional relacionado à promulgação da Constituição de 1988. Assim, faz-se necessário realizar uma análise acerca do avanço constitucional quanto à elevação do Município ao status de ente federativo da República Federativa do Brasil e a ampliação da autonomia dos entes municipais em relação aos demais entes federativos.

3.1 O Município da Constituição Federal de 1988

De acordo com Lima (2014), com o advento da Constituição Federal de 1988, tronou-se perceptível a ampliação da autonomia do Município, especialmente, referente à sua condição de ente federativo. Tal status ficou evidenciado no artigo 1º, da Carta Magna de 1988, em que ficou estabelecido que a República Federativa do Brasil é constituída pela união de caráter indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal. Ademais, no artigo 18, verifica-se que, quanto à organização político e administrativa, a República brasileira é constituída de União, Estado, Distrito Federal e os Municípios, ressalvando que todos são autônomos. Dessa forma, pode-se inferir que o Município se apresenta equiparado formalmente aos Estados e à União, surgindo como uma terceira dimensão do Federalismo brasileiro.

Na perspectiva de Silva (2011), esta ampliação fica visível nos artigos 29 e 30 da Constituição de 1988, estabelecendo que o Município se torne o principal prestador de serviços de saúde e de educação fundamental, cabendo aos Estados e à União apoio de ordem técnica e financeira.

A Constituição atual vem também conceder aos Municípios o poder de auto-organização, bem como exterminou a possibilidade do governador nomear prefeitos, ficando completa a capacidade de se autogovernar. Por outro lado, manteve-se a intervenção federal nos Estados, devendo estes obediência ao princípio constitucional da autonomia municipal. Ademais, também se manteve a intervenção dos Estados nos Municípios, conforme previsão do texto constitucional (SILVA, 2011).

De acordo com Silva (2011), a grande diferença entre as Constituições anteriores e a atual quanto à autonomia municipal é que, nas anteriores, a concessão era direcionada aos Estados, sendo que eram estes que organizavam os Municípios, a fim de manter e assegurar a autonomia estatal. Em síntese, alargou-se a autonomia municipal, resultando na condição de ente federativo aos Municípios.

3.2 As Competências Constitucionais dos Municípios

Segundo Almeida (2000), a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 30, determinou que as competências legislativas e materiais são consideradas privativas e concorrentes. No inciso I, em que se trata da competência legislativa privativa, versa sobre as matérias de interesse local em que os Municípios podem legislar. Já no inciso II, que trata da competência concorrente, determinou que o Município tem competência para legislar de forma suplementar a legislação federal e estadual, sempre sendo necessário tratar-se de interesse local. Nos incisos III, IV, V e VIII, aborda a competência material privativa, que são: arrecadar impostos e aplicá-los; criar, organizar e suprimir distritos; organizar e prestar serviços públicos de interesse local; e promover o ordenamento territorial. Por fim, os incisos VI, VII e IX, refere-se às competências de ordem material comum, que são saúde e Educação Infantil e Ensino Médio.

Ademais, a Constituição Federal de 1988, no campo das competências exclusivas resolveu não especificá-las, tendo em vista que os entes municipais tendem a legislar sobre assuntos relacionados ao interesse local, tendo sido enumerada algumas competências denominadas de privativas. É importante ressaltar que outra parte das competências dos Municípios está implícita, sendo sempre estas pautadas no âmbito do interesse local (ALMEIDA, 2000).

Outro ponto considerado importante é a discussão entre a jurisprudência e a doutrina acerca da substituição o termo peculiar interesse por interesse local. Segundo Ferreira Silva (1990, apud Almeida, 2000), esta substituição reduziu a autonomia do ente municipal, pois afastou de sua competência, matérias relacionadas aos interesses de outros entes da federação. Já na concepção de Meirelles (2000), a adoção do termo interesse local não significa interesse que seja meramente exclusivo do ente municipal, mas corresponde ao interesse predominante do município em relação aos demais entes da federação. Nessa concepção, o interesse local está relacionado aos assuntos que os Municípios podem tratar que estão relacionados diretamente à realidade deste ente, sendo necessário legislar e tomar as providências cabíveis.

Por fim, quanto à distribuição de competência, pode-se concluir que o Município obteve grandes ganhos, não só pelo reconhecimento de ente federal, mas pela concessão da autonomia de se auto-organizar. Entretanto, na prática, Mohn (2006) esclarece que os dispositivos constitucionais ainda estão bastante distantes da realidade, visto que ainda há o poder centralizador que impõe políticas nacionais para serem executadas pelos Estados e pelos Municípios, em razão destes estarem muito próximo das questões políticas, econômicas e financeiras.

3.3 A Autonomia Municipal no Âmbito Político, Administrativo e Financeiro

Na Constituição Federal de 1988, a autonomia dos Municípios ficou estabelecida no artigo 18, sendo disciplinada nos arts. 29 e 30. Nesse aspecto, determinou-se a capacidade dos entes municipais de se auto-organizarem, autolegislarem, autoadministrarem e de autogovernarem, a fim de conceder a autonomia municipal de que tanto necessitavam para se tornar um ente federativo (FERRARI, 1993).

Segundo Ferreira (2005), a autonomia municipal se fundamenta em cinco bases, que são as seguintes: 1. auto-organização, a partir de uma Constituição Municipal denominada de Lei Orgânica; 2. Autogoverno, a partir de eleições de Prefeito, Vice-prefeito e de Vereadores; 3. Legislativa própria, mediante leis municipais, trata-se de competência de ordem exclusiva e suplementar; 4. Autoadministração, concessão de poder para administrar a prestação de serviços e a realização de serviços locais e; 5. Financeira, para decretar os seus tributos e aplicação de suas rendas.

Segundo Ferrari (2005), a Constituição Federal de 1988 trouxe como uma grande conquista a capacidade dos entes municipais de elaborarem suas próprias leis, as quais vieram estabelecer a vida dos Municípios, devendo estes observarem os limites estão previstos na Constituição Federal e Estadual. Dessa forma, pode-se entender que a autonomia advinda da Constituição de 1988 se refere à capacidade de organização no âmbito político, administrativo e financeiro.

Ferreira Filho (2009, p. 55) ressalta o seguinte:

A existência real da autonomia depende da previsão de recursos, suficientes e não sujeitos a condições, para que os Estados possam desempenhar suas atribuições. Claro que tais recursos hão de ser correlativos à extensão dessas atribuições. Se insuficientes ou sujeitos a condições, a autonomia dos Estados-Membros só existirá no papel em que estiver escrita a Constituição. Daí o chamado problema de repartição de rendas.

No plano político, Pereira (2014) destaca que esta autonomia se fundamenta na capacidade de se estruturar os Poderes Executivo e Legislativo. No texto Constitucional, estabeleceu-se que a Lei Federal não tem predominância sobre a municipal, pois qualquer norma que venha invalidar a competência do ente municipal é considerada inconstitucional. Quanto ao aspecto da organização municipal, cabe a Lei Orgânica disciplinar, sempre devendo esta respeitar as normas estabelecidas na Constituição Federal e Estadual. Por fim, é no artigo 29, da Constituição Federal de 1988, que há uma série de pressupostos dão margem a este tipo de autonomia, que são: eleições de Prefeitos, Vice-prefeitos e Vereadores, no período de 04 anos; disciplinamento do número de vereadores a partir do princípio da proporcionalidade; subsídios do Poder Executivo e Legislativo Local, dentre outros.

Na vertente administrativa, ressalta-se a capacidade dos Municípios de se autogerirem, conforme o estabelecido no artigo 30, da Constituição Federal de 1988, no qual se estabelece a competência de administrar o Município a fim de garantir os serviços considerados essenciais para os munícipes.

Por fim, na área financeira, de acordo com o artigo 30, III, da CF/88, compete ao município “instituir e arrecadar os tributos de sua competência, como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas ou publicar balancetes nos prazos fixados em lei”. Nesse âmbito, o Município, a partir da sua própria arrecadação, pode dispor de rendas para realizar as despesas necessárias sem ser necessária a interferência dos demais entes federativos (PEREIRA, 2014).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao realizar este estudo, pode-se inferir, inicialmente, que o arcabouço jurídico nacional disciplinou a autonomia dos Municípios quanto à sua autonomia e competências a fim de criar condições no âmbito dos Municípios, a partir de suas competências e na autonomia municipal com o propósito de favorecer a implementação de ações galgadas no cumprimento de normas estabelecidas pela atual Constituição Federal 1988.

Em razão das grandes transformações sociais, econômicas e políticas que o Brasil vem passando,deve-se ressaltar o avanço no âmbito das Constituições Federais quanto à elevação de ente federativos dos Municípios, tendo em vista a ampliação deste ente em atuar em matérias referentes ao interesse local. Diante da evolução no ordenamento jurídico brasileiro, os Municípios incorporaram novas atribuições e competências no âmbito de sua capacidade política, administrativa e financeira.

Dessa forma, a distribuição de competências com o advento da Constituição Federal de 88 proporcionou grandes contribuições ao Município, não somente pela sua integração como ente federativo, como também pelo acréscimo quanto ao fato de se auto-organizarem. Em contrapartida, a realidade, esta nova condição de ente federativo concedido aos Municípios se refere apenas ao processo de descentralização somente no plano jurídico-administrativo, deixando o aspecto político de lado, uma vez que impõe aos Municípios a responsabilidade de simplesmente executar as políticas de cunho nacional.

Ademais, a partir da égide da Constituição Federal de 1988, pode-se afirmar que a realidade municipal sofreu profundas transformações. Tia transformações favoreceram a implementação do fenômeno da descentralização das políticas públicas, conferindo aos municípios novas responsabilidades no âmbito político e administrativo a fim de que estes entes exercitassem com autonomia os assuntos referentes ao interesse local devido ao seu novo papel de organização adquirido com a promulgação da última Constituição Federal.

Ainda há muitos obstáculos a ser superados para ocorrer a implementação dos preceitos constitucionais quanto às competências do ente municipal, uma vez que, na prática, é fundamental que o próprio Estado crie condições para que realmente o Município coloque em prática sua autonomia alcançada com a Constituição Federal de 88.

Portanto, é primordial que os demais entes federativos admitam e reconheçam o Município como membro integrante da República Federativa do Brasil, a fim de criar condições para os Municípios exercerem as suas responsabilidades como agente responsável por implementar ações pautadas no interesse peculiar e local de cada território municipal.

Espera-se que este trabalho científico contribua para uma reflexão acerca do novo papel do Município com o advento da Constituição Federal de 1988, principalmente, quanto à sua autonomia e competência no âmbito dos preceitos e de normas constitucionais.

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