Estabilidade, Avaliação Periódica de Desempenho e Administração Gerencial. A descentralização administrativa como forma de concretizar uma antiga perspectiva.

11/08/2016 às 17:47
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Propõe a descentralização das avaliações periódicas de desempenho como passo imprescindível à efetivação de um modelo gerencial, pensado ainda nos anos 90, para a Administração Pública.

 

INTRODUÇÃO

 

Partindo da premissa de que o Estado não foi criado para os agentes públicos, em primeira ordem, mas à sociedade, propõe-se repensar formas, limites, fundamentos e princípios pelos quais a Administração deve se orientar para realizar a avaliação periódica de desempenho.

Nessa ótica, acredita-se que os servidores, conforme a literalidade do nome entrega, devam ingressar nos quadros de pessoal com a ideia de servir, justamente porque a estabilidade aproveita ao Estado, às funções estatais, ao invés do enriquecimento contínuo e desmedido de agentes públicos.

Pleitos por elevações salariais, num tempo de crise econômico financeiro e de alto desemprego, se mostram conflitantes com os princípios administrativos e objetivo primordial de criação do Estado.

Nessa senda, há tempos a sociedade cobra uma nova postura na forma de administrar, cada vez mais próxima do comportamento da iniciativa privada, reinvidicando maior responsabilidade, compromisso e baixo custo.

Com isso, o estudo sugere como solução para os problemas do fraco desempenho administrativo a criação de uma entidade autônoma e especial, visando implantar de modo imparcial e meritocrático o modelo administrativo pensado nos anos 90.

 

ORIGEM DO INSTITUTO

                

De acordo com a teoria contratualista de Rousseau[1], para viver harmonicamente as pessoas precisam abrir mão de sua liberdade, numa espécie de pacto social. Noutra visada, para a análise econômica do Direito[2], o Estado surge com o intuito de dividir o ônus de um sistema de altos custos, de interesses comuns.

De uma forma ou de outra, certo é que o objetivo Estatal é, em primeiro lugar, o atendimento de uma estrutura coletiva, justamente para que, em última análise, haja a satisfação particular.

A par de interesses heterogêneos, essa estrutura modifica-se com o passar dos tempos e, no Brasil, mais precisamente na década de 90, após soltura de amarras ditatorias e de um período de instabilidade financeira, a Administração se reinventa abrindo a economia, atenuando seus monopólios, substituindo a burocracia existente por rapidez e eficiência.

Surge, então, num Estado Neo Liberal, a Administração gerencial, cuja ideia privilegia a filosofia de empresas privadas. Por óbvio, sua implantação, igualmente às sociedades particulares, depende do trabalho desempenhado por indivíduos munidos de um conjunto de atribuições, agindo como verdadeiros braços do Estado.

Essa é a teoria do órgão e aqueles são os agentes públicos, em sentido latu, a quem se conferiu garantias com vistas a eliminação de interferências externas. Trata-se da estabilidade, cuja origem é oriunda da América do Norte[3], pensada para limitar as mudanças ocorridas quando da alternância partidária no comando de um país onde sabidamente ainda se mantêm duas classes políticas dominantes: Democratas e Republicanos.

Com efeito, alternado o poder, operadas as demissões em massa dos conhecidos adversários políticos, e percebendo-se que a máquina via-se às voltas com a incapacidade operacional, tornando-se lenta, precária e ineficaz - fosse pela dificuldade de adaptação imediata ao serviço pelos novos contratados, ou até mesmo pela ausêcia da própria qualificação técnica exigida para o trabalho do pessoal substituído - vislumbrou-se a necessidade de criação de um mecanismo capaz de proporcionar  mobilidade estatal, além de propiciar ao servidor o direito a manifestações sem relatiações posteriores.

No nosso país, há indícios da estabilidade desde a Constituição de 1824[4], concedida a procuradores e fiscais que não podiam ser destituídos. De modo expresso, as Constituições de 1934[5], 1937[6] e 1946[7] orientaram este direito ao servidor público.

Nos moldes atuais, as Constituições de 1967 e de 1969 passaram a condicionar a garantia à aprovação prévia em concurso[8].  Em 1988, tem-se a vinculação da estabilidade apenas aos servidores efetivos.

Pois bem, a par dessas considerações, vê-se que a estabilidade surgiu para fortalecer o Estado, suas atividades, sua estrutura. Sob nenhuma hipótese foi pensada, em primeiro plano, para a proteção dos servidores, muito menos como escudo àqueles desiduosos, negligentes e ineficientes.

A estabilidade nao é absoluta, e como prova disso se verifica a possibilidade de perda do cargo através de sentença judicial, processo administrativo e, de modo particular, por meio das avaliações periódicas de desempenho, na esteira da redação dada ao artigo 41 pela Constituição da República[10].

Na contramão, no entanto, se percebe o sentimento desvirtuado que se instalou em grande parte da população brasileira: para um número considerável de pessoas, o interesse pelo serviço público está atrelado à possibilidade de se rebelar e de desempenhar as atividades sem pressão ou exigência de metas firmes e progressivas como as que se tem na iniciativa privada.

Em verdade, a idéia parte da premissa equivocada de que mesmo cometendo deslizes ou nao cumprindo com todas as obrigações lhe dirigidas, o servidor pode vir a permanecer ocupando o cargo público.

Passado o estágio probatório, e sob esse viés interpretativo desfocado - deixando-se de lado toda aquela teoria e objetivos iniciais da administração gerencial e das regras e condutas próprias de uma empresa, portanto - verifica-se, na assunção de cargos públicos, ao reverso, verdadeiros semideuses que passam simplesmente a aguardar suas aposentadorias e a exigir elevação desmedida e continuada de seus salários.

Como remédio, ter-se-iam as avaliações periódicas de desempenho, mas contrariamente, percebe-se um obstáculo. As avaliações sao feitas, hoje, em grande medida, pelos chefes imediatos dos avaliados. Assim, na sistematização arquitetada pelos órgãos públicos, superiores e subordinados mantêm relação interpessoal há décadas e isso acaba contribuindo para a formação de um laço de amizade que interfere, não há dúvidas, na própria atribuição final de notas.[11]

Some-se a isso o fato de que, pertencendo a um mesmo quadro, há a comunhão dos mesmos entendimentos, dos mesmos anseios, e das mesmas críticas à estrutura do órgão e às suas carreiras, por exemplo, fatos que tendem a contribuir para a ausência de necessária imparcialidade nas avaliações[12].

Desta maneira, convém repensar o modelo adotado, criando-se entidade externa, especializada e autônoma, verdadeira descentralização, para tornar detalhada e imparcial a verificação da necessidade daquele servidor à Administração Pública. Uma Autarquia, por ente, talvez, com expertize nessa averiguação.

Nessa esteira, a outorga de tal competência, desapegada do sentimento psicológico da afinidade, do coleguismo, e como diria Sergio Buarque de Holanda, da ideia do homem cordial, é imprescindível à concretização de uma administração de gerência.

Dar-se-ia até como forma de fomentar novos critérios de avaliação, objetivos, subjetivos, fossem como fossem, para cada função, podendo-se utilizar, inclusive, o esboço estabelecido através do Decreto Federal n.º 7.133/2010.

Caberia a essa nova entidade a aglutinação de determinados grupos de especialistas, os quais ficariam responsáveis por orientar e, principalmente, por fiscalizar o desempenho dos servidores de todo um Ente público.

A participação dos próprios colegas de setor, em determinada medida, no que se convencionou chamar de avaliação 360º[13], seria um dos critérios utilizados, cumulado com outros como a quantidade e a qualidade de serviço desempenhado, o grau de complexidade da tarefa, o tempo despendido, enfim, mecanismos pensados e estudados por especialistas que vivenciam, vivenciaram em algum momento de suas trajetórias profissionais, ou que se debruçaram sobre livros e teorias compartilhadas por quem já as vivenciou, semelhante tarefa.

Estudiosos e também profissionais mais antigos, numa mescla de técnica e experiência como meio de proporcionar um cenário equilibrado de avaliações, adequados núcleos de gerência, como se tem nas empresas particulares e como a Administração Pública, desde a década de 90, se propôs a fazer.

De modo fundamental, insista-se, profissionais desvinculados do quadro de pessoal a ser avaliado.

 

CONCLUSÃO

 

Passados todos esses anos, portanto, não se permite que o serviço público continue com idéias advindas do período colonial, com indivíduos acomodados no desempenho de suas funções, simplesmente porque alcançaram o limite máximo permitido para suas remunerações.

Mais do que isso, não se concebe que esses mesmos indivíduos se mantenham onerando os cofres públicos, sem dar o retorno devido, sob a certeza de que se tratam de seres “imexíveis” e “inavaliáveis”, ou apenas avaliáveis por pessoas com alto grau de afinidade. 

O problema da herança cultural da época do império não se sustenta mais, principalmente se for levado em conta a crise econômico financeira que hoje assola o país. Os recursos são finitos e se apresentam escassos, sendo certo que num Estado capitalista e liberal, o serviço de excelência deve ser buscado a todo custo, assim como o corte de desperdícios e de mão de obra inerte, como forma de impulsionar seu crescimento.

Por óbvio, se de um lado a alta rotatividde de pessoal, de forma não planejada, causa desorganização, pane e oxidação do ente Estatal, não há dúvidas que, de outro, o engessamento de um corpo de servidores sem serventia para o Estado causa dupla problemática: a morosidade aliada ao alto custo da máquina pública.

O importante, assim, é que a atividade Estatal não sofra interrupções, que se implemente de maneira efetiva e célere, mesmo que para isso alguns desses servidores incompatíveis, tenham que impositivamente deixar seus cargos, cedendo lugares.

Para isso, não há dúvidas de que as avaliações periódicas de desempenho têm que ser realizadas por intermédio de entidade autônoma, especializada e imparcial, como forma de implementar essa mudança.

 

REFERÊNCIAS

 

PESSOA, André Magalhães. Apuração disciplinar de atos praticados por servidores celetistas em atividade perante entes federais de direito público. Disponível em <http:// http://www.agu.gov.br/page/download/index/id/16111026&rct=j&frm=1&q=&esrc=s&sa=U&ved=0ahUKEwiT8K_8zv_NAhUGUZAKHeIBBzsQFggUMAA&usg=AFQjCNFZGoYVKqYsN3in4pEEX2xAh0-7> Acesso em 19/07/2016.

ROSA DOS SANTOS, Luiz Felipe. Avaliação de desempenho do servidor público. Entre o princípio da eficiência e as garantias do servidor cidadão. Disponível em http: //www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/BUOS-92VGC6/disserta__o_luizfelipe1.pdf%3Fsequence%3D1&rct=j&frm=1&q=&esrc=s&sa=U&ved=0ahUKEwi6qe-A0P_NAhWGFpAKHVoFDZoQFggUMAA&usg=AFQjCNGOXB5umEcUfB3vU9eDvQIAKRqn_Q . Acesso em 19/07/2016.

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PEIXER, Élcio. BARATTO, Jussara Salete May. Avaliação de desempenho do servidor público.Disponível em: <http://tjsc25.tj.sc.gov.br/academia/arquivos/Elcio_Peixer_-_Jussara_Salete_May_Baratto.pdf> Acesso em 19/07/2016.

FERRÃO, Maurício Oliveira; OLIVEIRA, Deymes Cachoeira de. O instituto da estabilidade do servidor público frente ao princípio constitucional da eficiência. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 4, n.3, p. 888-906. 3º Trimestre de 2013. Disponível em: www.univali.br/ricc - ISSN 2236-5044905. Acesso em 19/07/2016.

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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao67.htm>. Acesso em:
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BRASIL. Decreto nº 7.133, de 19 de março de 2010. Regulamenta os critérios e
procedimentos gerais a serem observados para a realização das avaliações de desempenho individual e institucional e o pagamento das gratificações de desempenho de que tratam as
Leis nos 9.657, de 3 de junho de 1998 e 10.484, de 3 de julho de 2002.Acesso em 19/07/2016.

 

 

 

 

 

 

 


[1] Rousseau, p. 18, 2006. Rousseau define que, para “encontrar uma forma de associação que defenda e proteja de toda força comum a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual, cada um, unindo-se a todos, não obedeça senão a si mesmo e permaneça tão livre como anteriormente”

[2] Análise Econômica do Direito seria o emprego dos instrumentais teóricos e empíricos econômicos e ciências afins para expandir a compreensão e o alcance do direito, aperfeiçoando o desenvolvimento, a aplicação e a avaliação de normas jurídicas, principalmente com relação às suas conseqüências.

[3]DINIZ, Paulo de Matos Ferreira. Tudo Sobre a Reforma Administrativa e as Mudanças Constitucionais. Coletânea Administrativa Pública. Brasília: Brasília Jurídica, v.4, 1998

[4]PRAZERES, Alexandre Hilário. O Instituto da estabilidade como instrumento para a manutenção do interesse público. Disponível em http://br.monografias.com/trabalhos3/estabilidade-instrumento-manutencao-interesse-publico/estabilidade-instrumento-manutencao-interesse-publico4.shtml

[5] Art. 169. Os funccionarios publicos, depois de dois annos, quando nomeados em virtude de concurso de provas, e, em geral, depois de dez annos de effectivo exercicio, só poderão ser destituidos em virtude de sentença judiciaria ou mediante processo administrativo, regulado por lei, e no qual lhes será assegurada plena defesa.

Paragrapho unico. Os funccionarios que contarem menos de dez annos de serviço effetivo não poderão ser destituidos dos seus cargos, senão por justa causa ou motivo de interesse público.

[6] Art. 156. O Poder Legislativo organizará o Estatuto dos funcionários Públicos, obedecendo aos seguintes preceitos desde já em vigor:

c) os funcionários públicos, depois de dois anos, quando nomeados em virtude de concurso de provas, e, em todos os casos, depois de dez anos de exercício, só poderão ser exonerados em virtude de sentença judiciária ou mediante processo administrativo, em que sejam ouvidos e possam defender-se;

[7] Art. 188. São estáveis:

I - depois de dois anos de exercício, os funcionários efetivos nomeados por concurso;

II - depois de cinco anos de exercício, os funcionários efetivos nomeados sem concurso.

Parágrafo único - O disposto neste artigo não se aplica aos cargos de confiança nem aos que a lei declare de livre nomeação  e demissão.

[8] Art. 99. São estáveis, após dois anos, os funcionários, quando nomeados por concurso.

§ 1º Ninguém pode ser efetivado ou adquirir estabilidade, como funcionário, se não prestar concurso público.

§ 2º Extinto o cargo, o funcionário estável ficará em disponibilidade remunerada, com vencimentos integrais, até o seu obrigatório aproveitamento em cargo equivalente.

[9] STF. RE 589998.

[10] Giancarlo Bremer Nones e Silvane Medeiros Venson. O princípio da eficiência e a estabilidade dos servidores públicos. Disponível em < http://tjsc25.tjsc.jus.br/academia/arquivos/Giancarlo_Bremer_Nones_-_Silvane_Medeiros_Venson.pdf>

[11] PEIXER, Élcio. BARATTO, Jussara Salete May. Avaliação de desempenho do servidor público. Disponível
em: <http://tjsc25.tj.sc.gov.br/academia/arquivos/Elcio_Peixer_-_Jussara_Salete_May_Baratto.pdf>

[12] Ana Lúcia Dias da Silva. Avaliação de Desempenho nas organizações públicas brasileiras com enfoque especial no Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro. Disponível em < http://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=1589eaf8-75e0-4104-929c-6b5eb8ad6ac3&groupId=10136>

[13]Gustavo Periard. Avaliação 360 graus – O que é e como funciona. Disponível através do endereço <http://www.sobreadministracao.com/avaliacao-360-graus-o-que-e-e-como-funciona/>. A avaliação 360 graus é um método de avaliação de desempenho muito utilizado pelas empresas, que tem por objetivo principal contribuir para o desenvolvimento de competências essenciais dos colaboradores. Na avaliação 360º, conhecida também como Feedback 360 Graus, Feedback com Múltiplas Fontes, e Avaliação Multivisão, o colaborador recebe feedbacks simultâneos de diversas fontes ao seu redor (daí o nome 360º). Ele pode ser avaliado por seus pares de trabalho, superiores, subordinados, clientes internos e externos. Neste tipo de avaliação é considerada também a avaliação que o próprio funcionário faz de si mesmo

Sobre o autor
Diego Antônio Diniz Lima

Advogado, Consultor Jurídico do TCE/RN. Pós-graduado em Direito Constitucional, Pós-graduando em Direito Administrativo, Direito Público, Políticas Públicas e Controle Externo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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