Prova ilícita no processo do trabalho:validade e valoração

24/08/2016 às 12:38
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O estudo realizado é fundamental para que possamos entender a validade da prova ilícita no processo do trabalho.

INTRODUÇÃO

            O presente artigo visa analisar as provas obtidas por meios ilícitos no processo do trabalho como também a sua validade no ordenamento jurídico e a valoração das provas realizadas pelo magistrado. A produção de prova é um propósito fundamental do processo, pois é um meio de busca pela verdade. Entretanto, a verdade real é abstrata, não sendo possível restaurar os fatos anteriores que deram origem a determinados conflitos.

            É importante destacar que ao se tratar do assunto provas no processo do trabalho, devemos fazer uma abordagem no seu aspecto constitucional. No art. 5, XXXV, da Constituição Federal, é garantido o direito de ação e consequentemente o direito de produzir provas para o convencimento do magistrado, tratando-se de direito fundamental, também não podemos esquecer do inciso LIV do mesmo artigo; que é assegurado o princípio do devido processo legal, e é justamente dele que decorre outros princípios de grande importância como; o contraditório e a ampla defesa, que estão consagrados no inciso LV, do art. 5, da Constituição Federal.

            Sendo assim, os princípios e direitos constitucionais que foram citados acima, é que vão tratar das provas ilícitas no processo do trabalho.

PROVA

            Antes de iniciar o assunto, é essencial que saibamos o que venha a ser prova, e qual o seu conceito e objetivo. Prova nada mais é do que, a demonstração no processo da realidade fática que se discute uma determinada causa, ou seja, é a transportação para dentro do processo por meios legítimos e admissíveis, em que as partes estão apresentando ao juiz para que ele possa chegar a uma conclusão final, e entregar as partes a tutela jurisdicional. Em razão da importância da prova, ela já foi chamada por Carnelutti de “coração do processo”. Isso porque ela tem o condão de convencer o magistrado a respeito dos fatos alegados pelas partes, isto é, demostrar a certeza dos fatos aduzidos em juízo.

            A prova tem como objetivo a comprovação dos fatos controvertidos, pertinentes e relevantes ao esclarecimento do processo. Dessa forma, não se busca a comprovação do direito, visto que o juiz já o conhece, mas sim dos fatos. Todavia, admite-se a prova do direito, como ocorre nas hipóteses de comprovação dos direitos municipal, estadual, estrangeiro ou consuetudinário, quando exigido pelo juiz, art. 376 do Código de Processo Civil. Diante dessa situação o magistrado poderá solicitar a comprovação de seu teor e de sua vigência. No processo do trabalho a legislação trabalhista também exige a comprovação do direito quando decorrente de normas coletivas, regulamentos de empresa e sentenças normativas, art. 818 da CLT c/c art. 373, I, do Código de Processo Civil.

            É importante observar que, nos termos do art. 374 do Código de Processo Civil, alguns fatos não dependem de provas como; fatos notórios, fatos confessados, fatos incontroversos ou em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade. Todos esses exemplos citados também se aplicam no processo do trabalho. Segundo Fredie Didier Jr, “a principal finalidade da prova é permitir a formação da convicção quanto à existência dos fatos da causa”. Já Vicente Greco Filho, dizia que “no processo a prova não tem um fim em si mesma ou um fim moral e filosófico; sua finalidade é pratica, qual seja, convencer o magistrado”.

MEIOS DE PROVA

            Para Pontes de Miranda, “meios de prova são os informes sobre fatos ou julgamentos sobre eles, que derivam do emprego daqueles meios”

            O nosso ordenamento jurídico admite todos os meios de prova, desde que legal ou moralmente legítimos, art. 369 do Código de Processo Civil. De qualquer forma, os meios de prova se classificam da seguinte forma.

  • Quanto ao objeto, as provas se classificam em diretas ou indiretas. As diretas se referem ao próprio fato que senta sendo provado, já as indiretas não se referem ao fato propriamente dito, mas a outro que poderá ser alcançado mediante raciocínio lógico.
  • Quanto à fonte, as provas podem ser pessoais ou reais. As pessoais é um depoimento que se extrai uma afirmação pessoal, as reais nada mais são do que os documentos.
  • Quando à forma as provas serão orais, documentais e materiais. As orais é a afirmação pessoal, as documentais é a afirmação escrita ou gravada, e as materiais consiste em qualquer materialidade que sirva de prova dos fatos.

E por fim, a prova composta é aquela que resulta de diversos meios probantes, ou seja, é a adaptação de vários meios de provas.

A doutrina estabeleceu alguns meios de prova típicos, os quais são, interrogatório e depoimento pessoal, confissão, prova testemunhal, prova documental, prova pericial e inspeção judicial. O destinatário direto das provas obtidas no decorrer do processo é do juiz, que por meio do livre convencimento motivado, deverá analisar cada uma delas, isso quer dizer que o magistrado terá o livre convencimento de verificar o conjunto de provas produzidas nos autos, motivando quais foram capazes de comprovar os fatos alegados pelas partes.

PROVA ILÍCITA / VALIDADE

            Vale lembrar que a matéria referente as provas ilícitas não foram abordadas pela legislação trabalhista, sendo assim, em conformidade com o art. 769 da CLT, “o direito processual comum será fonte subsidiaria do direito processual do trabalho”.

            Embora a CLT seja omissa quanto as provas ilícitas, a Constituição Federal em seu art. 5, LVI, proíbe tal conduta, “é vedada as provas obtidas por meios ilícitos”. Por ser uma norma inerente à teoria geral do direito, ela se aplica em todos os ramos do processo inclusive no direito processual do trabalho. A proibição das provas ilícitas é justamente para assegurar o devido processo legal e a dignidade do processo.

            Atualmente, temos doutrinadores que distinguem prova ilícita de prova ilegítima, a prova ilícita é quando a prova obtida violar direito material, já a ilegítima é quando a prova obtida violar direito processual.

            É importante destacar que existe uma discussão doutrinaria, no âmbito trabalhista, a respeito da validade das provas obtidas de maneira ilícita como meio de comprovar as ilegalidades trabalhistas, certamente não é autorizado, caso se verifique que uma prova consta nos autos foi obtida por meio ilícito, com expressa violação da norma constitucional, essa prova deve ser considerada nula. Sendo assim, a prova ilícita não é admitida no processo judicial brasileiro. Todavia, a inadmissibilidade não é absoluta no processo do trabalho.

PROVA ILÍCITA / VALORAÇÃO

            A valoração da prova é o peso que o magistrado dará para cada uma das provas obtidas no decorrer do processo, o direito processual brasileiro adotou o sistema da persuasão racional, que é aquele em que o magistrado irá se convencer pela valoração das provas que constam nos autos, mas o convencimento deve ser de forma racional e fundamentada.

            Partindo dessa premissa, conforme vem sendo estudado, a prova ilícita que ingressar no processo, deverá ser desentranhada imediatamente. Isso significa que o magistrado não poderá determinar nenhum valor probatório em relação àquela prova, pois se fundamentar sua decisão com base em uma prova ilícita, a sentença será nula. Mas se a decisão for fundamentada em uma prova licita, será aceita sem maiores problemas, desde que seja comprovada a fonte independente.

            Por outro lado, não podemos deixar de acreditar, que quando houver uma prova totalmente ilícita no processo e o juiz determinar o seu desentranhamento, automaticamente ela já tomou conhecimento do conteúdo dessa prova, sendo assim, o julgamento daquele conflito não será mais o mesmo. É incontestável que a contaminação do magistrado efetivamente aconteceu, o maior afetado por essas provas é o juiz, ainda que inconscientemente.

PERSUASÃO RACIONAL

            O princípio da persuasão racional do juiz envolve o sistema de valoração das provas que foram produzidas durante o processo. Embora o juiz seja livre no seu convencimento para julgar, ele deve respeitar as provas que foram produzidas e ainda, motivar as suas decisões, art. 93, IX, da Constituição Federal.

O USO DA PROVA ILÍCITA NA VISÃO DOUTRINARIA

            A principal discussão atualmente, é acerca da admissibilidade da prova ilícita em juízo, parece ser relevante, pois irá demonstrar a existência ou não de determinados fatos alegados no processo. Entretanto, existem algumas teorias que tentam apresentar seus pontos de vista de maneira bastante distinta.

            Alguns doutrinadores defendem a ideia de que uma prova ilícita só pode ser retirada dos autos quando a lei expressamente determinar. Sendo assim, a ilicitude da prova acontece apenas na sua obtenção, ou seja, é a forma como for adquirida que será passível de punição.

            Todavia, o conteúdo da prova que foi obtida por meio ilícito será aproveitado para comprovar os fatos alegados no processo. De acordo com o professor José Carlos Barbosa, “o interesse da justiça na verdade real deve prevalecer sobre a prova obtida por meio ilícito, já que a ilicitude não tem o condão de retirar o conteúdo probatório da prova”. Essa corrente também tem como fundamento o livre convencimento do magistrado dando preferência para a investigação da verdade em detrimento a formalidade do procedimento.

            Seus principais defensores são Carnelutti, Franco Cordeiro, Alcides Mendonça Lima, Tornagh e Yussef Cahali.

            Por outro lado, temos doutrinadores que entendem que a prova ilícita não deve ser admitida sob nenhuma hipótese, em momento algum deverá dar credibilidade para esse tipo de prova, pois fere o ordenamento jurídico como um todo e viola o princípio da moralidade administrativa. Portanto, a prova ilícita deverá ser sempre rejeitada, pois não é apenas uma afronta ao direito, mas sim aos princípios que são garantidos pela Constituição Federal.

            Para o ministro Celso de Melo “a prova obtida por meio ilícito deve ser repudiada do processo, por mais relevante que seja o conteúdo da prova”. A prova ilícita não tem nenhuma utilidade para o processo, jamais poderá ser utilizada.

            Os adeptos dessa corrente são Nuvolone, Vescovi, Frederico Marques, Humberto Teodoro Jr e João Batista Lopes.

            E por fim, existem doutrinadores que acreditam que as provas ilícitas poderão ser admitidas em casos excepcionais.

            Como já foi mencionado, a inadmissibilidade da prova não é absoluta no processo do trabalho, não são raras as vezes em que os tribunais superiores vêm admitindo as provas obtidas por meio ilícito, utilizando-se de critérios de ponderação e valores, como a razoabilidade e a proporcionalidade. A justificativa é simples, não havia outro meio de aquisição da prova, sendo está de suma importância para a resolução do conflito.

            De acordo com Nelson Nery Júnior “admitir uma prova ilícita para um caso de extrema necessidade significa quebrar um princípio geral para atender a uma finalidade excepcional justificável”.

            Os tribunais estão julgando dessa forma, por entender que essa última teoria tem uma melhor aplicabilidade no caso concreto.


ACÓRDÃO
PROVA ILÍCITA. MITIGAÇÃO DA INVALIDADE ABSOLUTA FRENTE AOS VALORES FUNDAMENTAIS EM RISCO.
É certo que o ordenamento constitucional brasileiro repudia a aceitação das provas obtidas ilicitamente (art. , LVI, da CF/88). Porém, não menos certa se mostra a mitigação do rigor dessa inadmissibilidade absoluta, prestigiando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, quando em risco valores fundamentais também assegurados constitucionalmente. Cotejando os princípios que envolvem a lide, como os princípios das garantias constitucionais à inviolabilidade da intimidade e da privacidade (art. , X, da CF/88) e os princípios da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, do acesso à informação inerente ao exercício profissional e da ampla defesa (art. , incisos III e IV e art. , incisos XIV e LV, da CF/88), resta plenamente válida a aceitação da prova obtida pelo autor.  (TRT-15-RO:  50188   SP    050188/2010,   RELATOR: MANUEL SOARES FERREIRA CARRADITA. Data da publicação:  03/09/2010)

            O acórdão acima mencionado, se trata de um recurso ordinário onde o empregador alega que os documentos apresentados pelo reclamante são de exclusiva propriedade da reclamada de circulação interna, e jamais poderiam ter sido subtraídos de seu estabelecimento.

            É evidente que nessa situação a prova obtida foi por meio ilícito, é irrefutável, entretanto, o Tribunal Regional do Trabalho entendeu que esse foi o único meio de prova que o reclamante conseguiu obter, caso contrário, não conseguiria comprovar os fatos alegados na reclamação.

            Seus principais defensores são Ada Pelegrini Grinover, Antônio Scarance, Antônio Magalhães G. Filho, Barbosa Moreira, Moniz Aragão, José Roberto Bedaque, Alexandre de Moraes, Fernanda Pinheiro, Gisele Goés, entre outros.

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CONCLUSÃO

            Diante o exposto, podemos concluir que a prova é um elemento fundamental para a resolução de conflitos existentes no mundo do direito, até porque, são a partir delas que os julgadores irão resolver o mérito processo.

            Vale ressaltar que as provas ilícitas, em regra, não tem validade no sistema processual brasileiro, porém, no direito processual do trabalho as provas ilícitas não tem sua invalidade absoluta, podendo ser admitida em casos excepcionais, desde que o juiz fundamente a sua decisão de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, o que nos traz a ideia da teoria mista ou intermediaria, que seria a teoria mais coerente a ser adotada, por há interesses de maior relevância, através da obtenção da prova ilícita, como por exemplo, as gravações telefônicas, gravações ambientais, monitoramento de e-mail, documentos, entre outros. É essencial que haja essa flexibilização para que ocorra uma prestação da tutela jurisdicional mais justa e eficaz.

            É evidente que esse entendimento é o que mais se associa do caráter público do processo, uma vez que, violados os direitos e garantias individuais poderá trazer diversas consequências irreparáveis.

BIBLIOGRAFIA


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- CLT.
- Código de Processo Civil.
- Constituição Federal.
 

Sobre o autor
Luís Fernando

Advogado - Atuante na área Cível, Criminal e Direito do Trabalho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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