A DUPLICATA, A PERDA E O EXTRAVIO

26/08/2016 às 13:36
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O ARTIGO APRESENTA ALGUMAS ANOTAÇÕES SOBRE A MATÉRIA.

~~A DUPLICATA, A PERDA E O EXTRAVIO

Rogério Tadeu Romano

I – OBRIGATORIEDADE DA EMISSÃO DA FATURA

A Lei  5.478, de 1968, determina em seu artigo 1º que, “em todo contrato de compra e venda mercantil entre as parte domiciliadas no território brasileiro, com prazo não inferior a 30 dias, contado da data da entrega ou despacho das mercadorias, o vendedor extrairá a respectiva fatura para a apresentação ao comprador”.
A lei em discussão tornou obrigatória a extração a fatura nas vendas a prazo entre partes  domiciliadas no Brasil. Assim considera-se venda a prazo aquela cujo pagamento é feito em época posterior a trinta dias, contando-se referido prazo não do momento em que o contrato é feito, mas da data da entrega ou do despacho das mercadorias.
À luz do artigo 191 do Código Comercial, os contratos de compra e venda mercantil aperfeiçoam-se, no momento em que as partes, comprador e vendedor, se acordam na cousa, no preço e nas condições. São os chamados contratos  meramente consensuais, já representando a execução, por parte do vendedor, de sua obrigação de transferir o domínio da coisa.
A fatura consiste numa nota  em que são discriminadas as mercadorias vendidas, com as necessárias identificações, sendo mencionados, inclusive, o valor unitário dessas mercadoriase o seu valor total. Se for de conveniência do vendedor, espelhar não só a venda feita como a entrega ou remessa das mercadorias ao comprador. Para extrair a fatura é necessário não apenas que  o contrato de venda tenha se aperfeiçoado, nos termos do artigo 191 do Código  Comercial como que o vendedor tenha cumprido a obrigação nascida do que é realizado, em virtude de se tratar de cousa móvel, com a entrega ou a remessa da mercadoria para o comprador.
Mas a Lei 5.474 tornou facultativa a emissão da duplicata que pela lei anterior era obrigatória.


II REQUISITOS DA EMISSÃO DA DUPLICITADA

 A duplicata conterá:
        I - a denominação "duplicata", a data de sua emissão e o número de ordem;
        II - o número da fatura;
        III - a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista;
        IV - o nome e domicílio do vendedor e do comprador;
        V - a importância a pagar, em algarismos e por extenso;
        VI - a praça de pagamento;
        VII - a cláusula à ordem;
        VIII - a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada pelo comprador, como aceite, cambial;
        IX - a assinatura do emitente.
        § 2º Uma só duplicata não pode corresponder a mais de uma fatura.
        § 3º Nos casos de venda para pagamento em parcelas, poderá ser emitida duplicata única, em que se discriminarão todas as prestações e seus vencimentos, ou série de duplicatas, uma para cada prestação distinguindo-se a numeração a que se refere o item I do § 1º deste artigo, pelo acréscimo de letra do alfabeto, em sequência.

IIII – REMESSA DA DUPLICATA AO COMPRADOR , O ACEITE E O PAGAMENTO

A  apresentação da duplicata ao comprador é ato que compete ao vendedor por si por intermediário, tratando-se de uma obrigação portáble, pois o vendedor deve procurar o portador para apresentar-lhe o título e não este procurar o vendedor para assiná-lo.
A remessa da duplicata para o aceite de comprador deve ser feita dentro de 30 dias, contados da data da emissão. 
A duplicata será enviada ao sacado, que é o comprador, ou diretamente ou por intermédio de pessoas que agirão em nome e por conta do vendedor. Essa remessa tem por fim levar o título à presença do comprador para que ele o assine, reconhecendo a sua exatidão e a obrigação de pagar o titulo.
Essa assinatura por parte do comprador dá-se o nome de aceite cambial.
É importante a observação de Fran Martins(Títulos de crédito, volume II, pág. 194) no sentido de que apesar de declarar a lei que a assinatura do comprador na duplicata é feita como aceite cambial, diverge, entretanto, essa assinatura daquela que o sacado apõe na letra de câmbio, porque neste título , o aceite e meramente voluntário, enquanto que na duplicata o aceite é obrigatório.
 Art . 8º O comprador só poderá deixar de aceitar a duplicata por motivo de:
        I - avaria ou não recebimento das mercadorias, quando não expedidas ou não entregues por sua conta e risco;
        II - vícios, defeitos e diferenças na qualidade ou na quantidade das mercadorias, devidamente comprovados;
        III - divergência nos prazos ou nos preços ajustados.
A duplicata deve ser paga à luz do que discriminam os artigos 9º, 10º e 11:
 Art . 9º É lícito ao comprador resgatar a duplicata antes de aceitá-la ou antes da data do vencimento.
        § 1º A prova do pagamento é o recibo, passado pelo legítimo portador ou por seu representante com poderes especiais, no verso do próprio título ou em documento, em separado, com referência expressa à duplicata.
        § 2º Constituirá, igualmente, prova de pagamento, total ou parcial, da duplicata, a liquidação de cheque, a favor do estabelecimento endossatário, no qual conste, no verso, que seu valor se destina a amortização ou liquidação da duplicata nêle caracterizada.
        Art . 10. No pagamento da duplicata poderão ser deduzidos quaisquer créditos a favor do devedor resultantes de devolução de mercadorias, diferenças de preço, enganos, verificados, pagamentos por conta e outros motivos assemelhados, desde que devidamente autorizados.
        Art . 11. A duplicata admite reforma ou prorrogação do prazo de vencimento, mediante declaração em separado ou nela escrita, assinada pelo vendedor ou endossatário, ou por representante com poderes especiais.
        Parágrafo único. A reforma ou prorrogação de que trata êste artigo, para manter a coobrigação dos demais intervenientes por endosso ou aval, requer a anuência expressa destes.
        Art . 12. O pagamento da duplicata poderá ser assegurado por aval, sendo o avalista equiparado àquele cujo nome indicar; na falta da indicação, àquele abaixo de cuja firma lançar a sua; fora desses casos, ao comprador.
        Parágrafo único. O aval dado posteriormente ao vencimento do título produzirá os mesmos efeitos que o prestado anteriormente àquela ocorrência.

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IV – PROTESTO

O protesto da duplicata é meio de prova, havendo três modalidades: o que se faz para provar a falta de aceite, o para provar a falta de pagamento e o referente a falta de devolução do titulo.
Não tendo sido a duplicata devolvida pelo comprador, no prazo especificado pela lei, sem que para essa não devolução haja um motivo justificado, o portador terá que tirar o protesto mediante simples indicações feitas ao Oficial de Protestos.
Declara a lei, ainda, que o fato e não ter sido exercido pelo portador a faculdade de protestar o titulo, por falta de aceite ou de devolução, não elide a possibilidade de protesto por atenção especial em virtude de o artigo 44 da Lei Uniforme sobre Letras de Câmbio e Notas Promissórias, dispor na alínea 4, que o protesto por falta de aceite dispensa a apresentação a pagamento e o protesto por falta de pagamento.
O protesto deve ser tirado na praça de pagamento constante do título.
 Art. 13. A duplicata é protestável por falta de aceite de devolução ou pagamento. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 436, de 27.1.1969)
        § 1º Por falta de aceite, de devolução ou de pagamento, o protesto será tirado, conforme o caso, mediante apresentação da duplicata, da triplicata, ou, ainda, por simples indicações do portador, na falta de devolução do título. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 436, de 27.1.1969)
        § 2º O fato de não ter sido exercida a faculdade de protestar o título, por falta de aceite ou de devolução, não elide a possibilidade de protesto por falta de pagamento. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 436, de 27.1.1969)
        § 3º O protesto será tirado na praça de pagamento constante do título. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 436, de 27.1.1969)
Importante é que se o portador que não tirar o protesto da duplicata em forma regular e dentro do prazo de 30 dias, contado da data de seu vencimento perderá o direito de regresso contra os endossantes, e respectivos avalistas.
A duplicata é titulo executivo extrajudicial a ser objeto de cobrança na forma do CPC de 2015. 

V – PERDA E EXTRAVIO DA DUPLICATA

A adoção da emissão de duplicatas obriga o vendedor a escriturar o livro de Registro de Duplicatas por ordem cronológica, todas as duplicatas emitidas, com o número de ordem, data e valor das faturas originárias e data de sua expedição; nome e domicílio do comprador; anotações das reformas; prorrogações e outras circunstâncias necessárias. Não poderá conter emendas, borrões, rasuras ou entrelinhas, deverão ser conservados no próprio estabelecimento. O livro poderá ser substituído por qualquer sistema mecanizado, desde que requisitos comentados sejam observados.
A perda ou extravio da duplicata obrigará o vendedor a extrair triplicata, que terá os mesmos efeitos e requisitos e obedecerá às mesmas formalidades daquela.
Para Fran Martins(obra citada) não sendo mais obrigatória a emissão das duplicatas mercantis, não será ainda obrigatória a existência do Livro de Registro de Duplicatas. Contudo todo comerciante que emitir duplicatas ou prestador de serviços nas mesmas condições, deverá possuir um livro para escriturar tais títulos, tornando assim obrigatório para esses comerciantes o Registro de Duplicatas.
No Registro de Duplicatas devem ser escrituradas, de forma cronológica todas as duplicatas emitidas com o numero de ordem, data e valor das faturas originaias, e data de sua expedição. O livro deverá conter anotações do nome e domicílio do comprador, das reformas, prorrogações ou ouras circunstâncias ou atos que venham a afetar ditas duplicatas. É uma  escrita especial que somente o comerciante que emite duplicata tem a obrigação de fazer, obedecendo o artigo 19, § 1º, para que os lançamentos sejam considerados sob o ponto de vista contábil válidos.
Assim o livro não deve conter rasura, emendas, borrões ou entrelinhas, devendo ser conservados nos próprios estabelecimentos dos comerciantes e podendo ser substituídos por qualquer sistema outro permitido em lei.
O Livro de Registro de Duplicatas será um livro de ordem fiscal que pode ser de meio de prova a favor ou contra o comerciante.
Determina o artigo 23 da Lei:
A perda ou extravio da duplicata obrigará o vendedor a extrair triplicata, que terá os mesmos efeitos e requisitos e obedecerá às mesmas formalidades daquela.
Aplicam-se à duplicata e à triplicata, no que couber, os dispositivos da legislação sôbre emissão, circulação e pagamento das Letras de Câmbio.
Importante o estudo do artigo 172 do Código Penal, diante da redação dada ao artigo 26 da Lei de Duplicatas:
Art. 172 - Emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado. (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)
Pena - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.  (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorrerá aquêle que falsificar ou adulterar a escrituração do Livro de Registro de Duplicatas. (Incluído pela Lei nº 5.474. de 1968)
Emitir, significa colocar em circulação o título.
O sujeito ativo do crime é quem expede a fatura, duplicata ou nota de venda. O sujeito passivo é o recebedor, seja ele quem desconta a duplicata ou a pessoa contra a qual saca-se a duplicata, fatura ou nota de venda. Não se inclui no tipo nem o avalista nem o endossatário, consoante doutrina majoritária.
Livro de registro de duplicatas é livro obrigatório de comerciante onde deve escriturar em ordem cronológica as duplicatas emitidas, contendo todos os dados que as possam identificar com perfeição. Parece-me essa a melhor interpretação dada por Nucci(Código penal comentado, 8ª edição, pág. 785) para efeitos penais.
A fatura é “a escrita unilateral do vendedor e acompanha as mercadorias, objeto do contrato, ao serem entregues ou expedidas”. É a nota descritiva dessas mercadorias, com indicação da qualidade, quantidade, preço e outras circunstâncias de acordo com os usos da praça. Na lição de Rubens Requião(Curso de direito comercial, volume II, pág. 430), na linha de pensamento de Carvalho de Mendonça, não é título representativo da mercadoria.
Por sua vez, a duplicata é o título de crédito  sacado com correspondência à fatura, visando a circulação, espelhando uma compra e venda mercantil.
Diversa é a nota de venda que é o documento por comerciantes para atender ao fisco, especificando a qualidade, a quantidade, a procedência e o preço das mercadorias que foram objeto de transação penal.
A triplicata é emitida em substituição á duplicata que tenha sido extraviada ou subtraída. É uma duplicata em segunda via, como informa Guilherme de Souza Nuccci(Código penal comentado, 8ª edição, pág. 784).
O crime previsto no artigo 172 do CP é infração que deixa vestígios materiais, motivo pelo qual não prescinde da apresentação do título, que constitui o elemento indispensável para a formação do corpo de delito.
Problema que pode ocorrer e que e de preocupação dos penalistas é a não correspondência à mercadoria vendida em quantidade ou qualidade ou ao serviço prestado.
Fala-se que a situação narrada pelo tipo penal representa uma falta de sintonia entre a venda efetivamente realizada e aquela que se estampa na fatura, duplicata ou nota de venda. Pode o comerciante alterar os dados quantitativa(vende um objeto e faz escrever ter vendido dois), ou qualitativamente(vende cobre e faz constar ter vendido ouro). O mesmo pode ser feito por prestador de serviços, que altera de forma significativa o que fez. Por imprecisão literal, e em respeito ao princípio da legalidade, deixou-se constar, de forma expressa, que no tipo que a emissão de fatura, duplicata ou nota de venda ou serviço inexistente também e crime.
O elemento subjetivo é o dolo. Mas não se exige dolo específico.
O crime é próprio, formal, comissivo, excepcionalmente comissivo por omissão(omissivo improprio), instantâneo, unissubjetivo, unissubisente.
A falsidade do tipo é ideológica, que significa alterar ou modificar de forma fraudulenta. Adulterar é viciar ou mudar o conteúdo.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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