A proteção integral prevista na legislação e a urgência no combate à violência contra a criança e o adolescente

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É consabido a expressiva lesão ocasionada à infância e à juventude em face do deslinde de violência perpetrada em desfavor de crianças e adolescentes tende a violar direito ínsitos a tenra idade de tais pessoas, desconsiderando tratar-se de ser humano.

Enfocando a proteção legal de crianças e adolescentes, analisamos serem estes objeto de tutela pelo ordenamento jurídico brasileiro, que é pautado pela Doutrina da Proteção Integral. Dispõe Pedro Lenza, analisando a situação da criança e do adolescente perante a ordem jurídica e aos preceitos constantes na Constituição Federal de 1988:

A Constituição de 1988 avança na proteção à criança e ao adolescente, estabelecendo diversos direitos fundamentais. A proteção às crianças e adolescentes é reforçada pela Convenção sobre os Direitos da Criança e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90).

Ao tecer comentários acerca da previsão legal de amparo jurídico da criança e do adolescente, dispõe Tiago Emboaba Dias:

A Constituição Federal de 1988 concebeu um novo enfoque sobre os princípios pelos quais as normas anteriores que regulavam direitos e garantias de crianças e adolescentes se norteavam, assimilando a doutrina da proteção integral em seu bojo, segundo a qual a criança é vista como cidadã, não mais se afigurando como mero objeto de assistência ou pessoa em potencial, mas sujeito de direito, destinatário de proteção específica e prioritária, necessária ao seu desenvolvimento.

No mesmo sentido da norma constitucional, o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei 8.069/1990) prevê como um de seus princípios basilares a proteção integral instituída à criança e ao adolescente, posto que se faz necessária a orientação pelo entendimento de que são pessoas em desenvolvimento, sendo esta característica de natureza peculiar.

Acerca da doutrina da proteção integral, preleciona o ECA em seu artigo 1º: "Esta Lei disporá sobre a proteção integral à criança e ao adolescente."

Assim sendo, a legislação infraconstitucional e a própria norma constitucional respaldam a total proteção da criança e do adolescente, optando por coibir qualquer forma de abuso ou exploração que estes porventura possam vir a sofrer.

Ademais, a Carta Magna de 1988 é precisa, dispondo em seu bojo de forma explícita a tutela dos direitos dos menores, estabelecendo, caber a todos - família, Estado e a sociedade - viabilizar a efetivação dos direitos inerentes à criança e ao adolescente.

Em seu art. 227, § 4º, a CF/1988 faz, ainda, uma ressalva, prevendo que qualquer forma de abuso ou exploração de cunho sexual será efetivamente punido:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. [...]

§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.

Sobre a viabilização dos direitos fundamentais instituídos a crianças e adolescentes na Norma Constitucional e no ECA, narra o ministro Nilson Naves, em estudo acerca do tráfico e da exploração sexual de crianças e adolescentes: "Apesar de estarem previstas em normas jurídicas as condições para o desenvolvimento saudável das crianças e dos adolescentes, no dia a dia dos brasileiros a efetivação de seus direitos parece bem distante."

Analisando a denominação "criança e adolescente", detecta-se que o legislador norteou-se exclusivamente pelo critério etário, segundo dispositivos constantes no Estatuto da Criança e do Adolescente. Disciplina seu art. 2º: "Considera-se criança, para efeitos dessa Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre treze e dezoito anos de idade."

Contudo, apesar de observarmos a existência de nítida previsão legal à tutela jurídica da criança em face da exploração sexual, verificamos no contexto social que a prática atinge contornos assombrosos e índices alarmantes sob os mais diversos modos, tais como incesto ou violência sexual intrafamiliar, estupro, atentado violento ao pudor, assédio sexual, pornografia e prostituição infantil.

Dispôs o ministro Nilson Naves, em 2003, sobre os dados do estudo acerca do tráfico e exploração sexual de crianças e adolescentes: "[...] revela que cem crianças morrem por dia no Brasil vítima de maus-tratos, violência física, abuso sexual e psicológico."

A incidência da exploração sexual infantil no estado do Ceará apresenta índices ainda mais alarmantes, segundo informações de 2008 da promotora de justiça Edna Lopes Costa da Matta: "Só na Vara dos Crimes Contra Criança e Adolescente, cerca de 55% dos 1.100 processos em tramitação são referentes a abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes."

A exploração sexual infantil constitui-se, por conseguinte, num crime sexual de natureza sui generis, haja vista englobar várias formas de violência que se mostram violadoras dos direitos fundamentais do menor: agressão de natureza física e psicológica, sendo várias vezes de consequências graves e irremediáveis.

Há de se destacar, ainda, entendimento de Gustavo Leal (2001, apud Antônio Cezar Lima Fonseca 2001):

A exploração sexual, por seu turno, é toda a forma de aproveitamento sexual sobre sua pessoa. Pode ser a exploração de forma comercial ou não. É todo tipo de atividade onde alguém usa o corpo de uma criança ou de um adolescente para tirar vantagens de caráter sexual, como diz o sociólogo uruguaio Gustavo Leal.

Concluindo o raciocínio acerca das especificidades que circundam as várias formas de exploração sexual, prossegue o referido autor, entendendo que a exploração sexual seria uma das categorias de abuso sexual, assim dispondo Lourensz e Powell (2000, apud Antônio Cezar Lima da Fonseca 2001):

Lourensz e Powell referem que a exploração sexual é uma das duas categorias de abuso sexual, sendo definida como: a) condutas ou atividades relacionadas à pornografia retratando menores; b) promoção ou tráfico de prostituição de menores ou c) coerção de menores à participação de atos obscenos.

Assim sendo, segundo entendimento de Antônio Cezar Lima da Fonseca, a exploração sexual seria o gênero do qual se originam as demais espécies de violência sexual, assim dispondo:

Neste aspecto, a exploração sexual seria um gênero, do qual sobressairiam as espécies previstas nos arts. 240 e 241 do ECA. Destarte, podemos entender que, pelo princípio da especialidade, toda exploração sexual de crianças e adolescentes que não estiver tipificada nos arts. 240 e 241 do ECA, ou nos dispositivos do Código Penal, caberá neste art. 244-A.

Detectamos, pois, serem bastante amplas as hipóteses de abuso e exploração sexual de menores, perfazendo-se a conduta delitiva dos crimes sexuais contra crianças e adolescentes sob as mais variadas nuances. Antônio Cezar Lima Fonseca elenca outras formas de agressões de caráter sexual que afligem crianças e adolescentes:

A criança e o adolescente não sofrem apenas pela prostituição e pela exploração sexual, mas também por outras agressões sexuais: estupro (art. 213, CP), atentado violento ao pudor (art. 214, CP).

Fazendo uma análise sociojurídica da realidade brasileira quanto ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes, verificamos ser indiscutível o entendimento de que medidas urgentes de combate têm de ser tomadas, tanto no âmbito legislativo como no jurídico e no social. É preciso que a exploração e o abuso sexual de crianças e adolescentes torne-se algo distante da nossa realidade social. Isso requer a inserção e o empenho de todos, em um conjunto harmônico, em consonância com os preceitos básicos traçados pela Norma Constitucional, que estatuiu ser dever de todos zelar pela proteção integral de crianças e adolescentes.

No entanto, para que ocorram com eficácia o combate e a prevenção ao abuso e a exploração sexual de menores em nosso País, é necessária a verificação de vários problemas delineados no bojo do ECA, bem como no Código Penal, de modo que se possa punir com presteza o infrator no delito de crime sexual contra crianças e adolescentes.

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Optando por uma análise crítica pautada em aspectos diversos, buscando expor o entendimento que viabiliza a aplicação da norma já existente como forma de combate à exploração sexual de menores, dispõe o ministro Nilson Naves:

Dentro do seu território, ainda que o Brasil possa orgulhar-se de contar com uma legislação atualizada sob alguns aspectos, urge continuar o aperfeiçoamento das leis (embora eu ache que a questão de maior relevo seja a de fazer cumprir eficazmente as leis já existentes, aperfeiçoando os segmentos governamentais e não-governamentais competentes para prevenir e reprimir ações ilícitas), mais ainda quando se sabe que várias delas datam de quarenta anos e que, nestas seis décadas, houve mudanças significativas na estrutura social. Os crimes de natureza sexual aqui cometidos contra crianças e adolescentes estão a reclamar políticas públicas e a atuação imprescindível da sociedade civil organizada - o dever é antes de tudo da sociedade e do Estado - para medidas urgentes a fim de prevenir, coibir e, quando necessário punir severamente a exploração sexual de menores de dezoito anos.

Ao traçar análises referentes aos parâmetros ensejadores da exploração sexual contra crianças e adolescentes no País, bem como delinear as possíveis hipóteses de solução a esta triste realidade que "rouba" a infância de nossas crianças, dispõe Tiago Emboaba Dias:

A despeito da norma constitucional, um dos obstáculos ao combate à exploração sexual infanto-juvenil e suas variadas dimensões é a falta de dispositivos legais específicos na legislação infraconstitucional, que vislumbrem todas as suas nuances. De um lado temos o Código Penal, datado de 1940; de outro, temos a Lei nº 8.069 de 1990, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Porém, nenhum deles é capaz de suprir com absoluta eficácia as complexidades inerentes a esta modalidade criminosa.

No que se refere ao Código Penal, é possível constatar que o mesmo encontra-se defasado da realidade há mais de seis décadas. Muitas alterações foram feitas e muitas propostas estão sendo submetidas ao trâmite legal, porém, sua base filosófica continua a mesma de mais de sessenta anos atrás, o que enseja uma série de discussões para a sua atualização.

Ressaltamos ser cabível uma reflexão sobre o tema em questão, visto sua relevância social. Precisamos descobrir e praticar formas eficazes de combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes. Contudo, para poderem ser efetivamente punidas e combatidas as formas de violência sexual infantil, é necessária a participação de todos, seja por meio da família, da sociedade ou do Estado, pois a exploração sexual infantojuvenil deve ser efetivamente banida do nosso contexto social.

Sobre as autoras
Semiramys Fernandes Tomé

Mestranda em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR. Docente do Curso de Direito do Centro Universitário Católica de Quixadá lecionando as disciplinas de de Prática Civil, Direito Penal II, Direito Penal IV, Direito Processual Penal I e Direito Civil VI (Sucessões) desde 2012.2. Docente convidada do Módulo de Direito Penal - Parte Especial do curso de pós-graduação em Direito e Processo Penal em 2014.2 da Faculdade Católica Rainha do Sertão - FCRS. Advogada atuante no Estado do Ceará, inscrita na OAB/CE sob o nº 22.066. É especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Vale do Acaraú- UVA (2010). Possui graduação em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR (2009.1). Possui experiência na área de Direito, com ênfase em Direito e Processo do Trabalho e Direito e Processo Penal. Bolsista Funcap. Membro do grupo de pesquisa Mulheres e Política junto ao CNPQ. É autora de diversos artigos e capítulos de livro sobre temas de significativo relevo na área jurídica.

Carla Cibele da Silva Martins

Graduanda em Direito do 9º semestre do curso de Direito do Centro Universitário Católica de Quixadá - Unicatólica

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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