As pessoas já tem uma concepção do que sejam drogas. Em simples linguagem, tem-se o significado de que seja algo ruim, algo imprestável, sem nenhuma qualidade. Por exemplo: “Ah, mas que droga!!!”; “Que droga de vida!“; ou ainda, “Droga, droga, mil vezes… droga!”.
A palavra “droga” se tornou sinônimo de algo ruim, àquilo que faz mal em situações indesejadas (BRITO, 2012). Já em termos técnicos da palavra, à luz da medicina, medicamento é sinônimo de droga. O termo é associado às substâncias que altera a mente, proporcionando experiências de prazer ou desprazer capazes de levar parte de seus usuários ao uso contínuo e à dependência (BRITO, 2012).
GÓIS e col. (2008), trazem a definição de drogas baseando-se no dicionário de Antônio de Moraes Silva apud CARNEIRO (11:12), datado em 1.813 definindo droga como: “todo gênero de especiaria aromática; tintas, óleos, raízes oficiais de tinturaria e botica – mercadorias ligeiras de lã ou seda”.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA (2013), definiu droga como substância ou matéria-prima que tenha finalidade medicamentosa ou sanitária.
Para a Organização Mundial da Saúde - OMS (1981), droga é qualquer entidade química ou mistura de entidades (mas outras que não aquelas necessárias para a manutenção da saúde como, por exemplo, água e oxigênio) que alteram a função biológica e possivelmente a sua estrutura.
Perdeu-se nos tempos a tradição do consumo de drogas – cada povo e cada cultura vai tendo as suas. Algumas vezes, o homem procurou nelas a nutrição física, outras andou à cata de remédio para as suas doenças, outras ainda, para alimentar sonhos ou alcançar o transcendente, influenciar o humor, buscar a paz ou a excitação, enfim, simplesmente para abstrair do mundo que o cerca e o perturba em dado momento da sua existência (MARTINS, 2007 apud KOUTOUZIS, 1986).
Nesse sentido, a definição dada anteriormente pela ANVISA sobre drogas, é de que trata-se de um produto medicamentoso, usado para aliviar as dores e as tensões nervosas. Certo dizer que, há indivíduos que fazem o uso abusivo de drogas para a buscar a felicidade. Sob a óptica do pensamento de ARENDT (2006), temos a seguinte afirmativa:
Agora, tudo o que ajuda a estimular a produtividade e alivia a dor e o esforço torna-se útil. Em outras palavras, o critério final de avaliação não é de forma alguma a utilidade e o uso, mas a “felicidade”, isto é, a quantidade de dor e prazer experimentada na produção ou no consumo das coisas. A “felicidades” de Bentham, a soma total dos prazeres menos as dores, é tanto um sentido interior que sente sensações e permanece alheio aos objetos do mundo quanto a consciência cartesiana, consciente de sua própria atividade. Além disto, a premissa básica de Bentham – de que o que há de comum a todos os homens não é o mundo, mas o fato de que a natureza humana, é a mesma para todos, o que se manifesta na igualdade dos cálculos e no modo idêntico pelo qual todos os homens são afetados pela dor e pelo prazer (…) O princípio de todo hedonismo, como vimos, não o prazer, mas a supressão da dor; e Hume que, ao contrário de Bentham, era ainda um filósofo, sabia muito bem que, quem deseje fazer do prazer o fim último de toda ação humana, é levado a admitir que não o prazer, mas a dor, não o desejo, mas o medo, são os seus verdadeiros guias. “Se... perguntares por que (alguém) deseja a saúde, ele responderá prontamente: porque a doença é dolorosa. Se insistires em saber mais e pedires uma razão pela qual ele odeia a dor, ele não te poderá apresentar nenhuma (A dor) é um fim último, sem qualquer subordinação a outro objeto”.(ARENDT, 2006:322).
Frisa-se, que homens e mulheres buscam uma felicidade que nada mais é que o puro prazer. Mas não um prazer conquistado a qualquer custo. Se o prazer causa danos à vida, esse prazer será cerceado (CARIOCA, 2011).
No período imperial, as drogas foram usadas como moedas de troca, independente das consequências que poderiam causar, bem como para os fins a que se destinavam.
Disse CARNEIRO (2009), que os vinhos, as cervejas e todos os fermentados alcoólicos, assim como muitas plantas entre as quais a papoula, o cânhamo, o chá, o café, a coca, o guaraná e centenas de outras drogas vegetais psicoativas, representaram na história da humanidade diversos papéis, todos com profunda relevância, pois alguns foram os grandes analgésicos, os inimigos da dor física e espiritual, os grandes aliados do sono tranquilo, mas outros também, com usos opostos, os estimulantes e provedores de energias para a caça, o combate e a resistência cotidiana aos males e os incômodos da vida.
Ao longo da história, os homens utilizaram os produtos naturais para obter um estado alterado de consciência, em vários contextos como o religioso, místico, social, econômico, medicinal, cultural, psicológico, militar e principalmente na busca do prazer. A alteração deste estado de consciência tinha por objetivo proporcionar maior ligação com o sobrenatural e/ou divino, como no caso do álcool que era usado para favorecer o contato com os deuses (SOUSA, 2012).
Cita SOUZA (2013), que até o começo do século XX, o Brasil não tinha nenhum controle estatal sobre as drogas que eram toleradas e usadas em prostíbulos, frequentados por jovens das classes média e alta, filhos da oligarquia da
República Velha.
E o autor continua, dizendo que:
(….) no início da década de 20, depois de ter se comprometido na reunião de Haia (1911) a fortalecer o controle sobre o uso de ópio e cocaína, o Brasil começou efetivamente um controle. Naquele momento, o vício até então limitado aos “rapazes finos” dentro dos prostíbulos passou a se espalhar nas ruas entre as classes sociais “perigosas”, ou seja, entre os pardos, negros, imigrantes e pobres, o que começou a incomodar o governo (SOUZA, 2013).
Na década de 20, precisamente no ano de 1.921, surgiu a primeira lei que restringia o uso de ópio, morfina, cocaína e heroína no Brasil, passíveis de punições para todo e qualquer tipo de uso que não seguissem as recomendações médicas.
O uso abusivo de drogas gera inúmeras consequências sociais, como por exemplo o comportamento descontrolado e a destruição dos laços sociais e afetivos.
O indivíduo com o passar do tempo e sob a influência das drogas, é levado à ações inconsequentes, na maioria das vezes, tendo um comportamento violento por não saber lidar com a frustração que muitos dependentes têm, por não ter dinheiro para a aquisição de novas porções e doses de drogas.
Dado esse consumo de danos e considerando que o consumo dessas drogas é totalmente prescindível, já que elas não têm aplicação médica, cabe ao Estado proibi-las. Para tanto, ele goza de legitimidade para perseguir e punir quem as produz, vende ou consome (FIORE, 2012).
Sobre a responsabilidade do Estado, no que tange o uso abusivo de drogas e com parâmetros no pensamento de FOUCAULT (1994), temos a seguinte assertiva:
(…) uma vez que o Estado é sua própria finalidade e que a finalidade exclusiva dos governos deve ser não apenas a conservação, mas também o fortalecimento permanente e o desenvolvimento das forças do Estado, fica claro que os governos não têm que se preocupar com os indivíduos quando eles apresentam algum interesse para essa finalidade: o que eles fazem, sua vida, sua morte, sua atividade, sua conduta individual, seu trabalho, e assim por diante. (…) Do ponto de vista do Estado, o indivíduo apenas existe quando ele promove diretamente uma mudança, mesmo que mínima, no poderio do Estado, seja esta positiva ou negativa.(...) Podemos dizer que, desde então, no fim do século XVIII a população se torna o verdadeiro objeto da polícia, ou em outras palavras, o Estado deve antes de tudo cuidar dos homens como população. Ele exerce o seu poder sobre os seres vivos como seres viventes, e sua política é, em consciência, necessariamente uma biopolítica. Sendo a população apenas aquilo de que o Estado cuida, visando, é claro, ao seu próprio benefício, o Estado pode, ao seu bel-prazer, massacrá-la (FOUCAULT, 1994)
Com a legitimidade conferida pela primeira premissa, o Estado deve agir em duas frentes: a primeira é impedir a produção e o comércio dessas substâncias, e a segunda é reprimir seus usuários (FIORE, 2012).
Na atualidade, a maior preocupação das autoridades é sobre o consumo indevido dos entorpecentes, tais como: a maconha, a cocaína, a heroína, o LSD e o crack. Essas substâncias têm um poder destruidor, principalmente os dois últimos – LSD e o “crack” (ARAÚJO, 2013).
A partir do momento em que o homem passou a dominar tecnologicamente a vida, passou a produzir drogas cada vez mais potentes e escravizantes, como pôde experimentar o século XIX através da espantosa variedade de drogas e estimulantes obtidos com a exploração de novas terras.
É exemplo disso o ópio e o tabaco, que foi disseminado em todas as classes sociais, e o álcool destilado, que passou a ser produzido e utilizado em quantidades cada vez maiores (JÚNIOR, 2013). Parte-se, portanto, da compreensão do consumo de drogas como prática histórica e social multideterminada.
Tal perspectiva indica para diferentes motivações para o uso abusivo de drogas, contribuindo na compreensão sobre o uso de drogas por adolescentes na contemporaneidade.
BIBLIOGRAFIA
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SOUSA, Igo Cássio. A contradição existente entre a natureza jurídica do artigo 33 da Lei n.º 11.343/06 e abenesse instituída pelo parágrafo 4º do referido artigo. 2012. Jurisway. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=8552. Acessado em 09/09/2016 às 22h53min.
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