O processo legislatico perante a atuação dos profissionais de relações governamentais

Discentes: Horácio Lessa Ramalho – Petrus Muniz Daniel Carsale Queiroga Leonardo Nesso Volpatti - Victor Corrêa Leal –

19/09/2016 às 14:23
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Resumo: O presente texto visa tratar, brevemente, de modos de atuação e a percepção das interações entre o processo legislativo, perante o Congresso Nacional, e os interesses defendidos por profissionais de relações governamentais.

  1. Introdução

 

O Congresso Nacional atua como uma arena onde são demandados os pleitos da sociedade e onde há o exercício político de fiscalização das propostas e anseios do poder executivo. Assim sendo, a cabe a este texto, a missão de esclarecer o papel do profissional de relações governamentais na defesa dos pleitos de diversos grupos da sociedade e sua interação perante as regras do processo legislativo.

 

  1. Estado Brasileiro e as relações Governamentais

                A República Federativa do Brasil se constitui em um Estado Democrático de Direito, previsto no Art. 1º da constituição Federal. Neste processo democrático, todos tem o direito de se manifestar e peticionar suas propostas ao governo.

            As decisões políticas são resultantes de várias interações, e entre os players estão também os grupos de interesses, que constantemente interagem diretamente nas instituições estatais (executivo, Legislativo e Judiciário).

Vários desses grupos, sejam públicos ou privados, defendendo interesses individuais ou coletivos, podem ser representados por um, ou mais profissionais de Relações Governamentais.

Estes profissionais podem representar estes interesses de seus clientes desde a formulação das estratégias de atuação, passando pelo acompanhamento das proposições ligadas a área de atuação, até a defesa diante dos órgãos de interação, principalmente o Governo.

A atenção especial que daremos neste trabalho será focado principalmente para as principais funções exercidas pelos Relações Governamentais, de forma direta no Poder Legislativo, atuando favorável ou contrariamente na defesa de seus interesses.

            Dentre as várias ações realizadas, podemos citar:

  • Acompanhamento de matérias ligadas ao setor nas casas legislativas;
  • Realização de audiências públicas, levando informações relevantes;
  • Mapeamento dos principais Stakeholders que possam influenciar seu pleito – positiva ou negativamente;
  • Apresentação de uma proposição, um projeto de lei ou emenda ao parlamentar sensível a causa defendida;
  • Preparação de discursos para o parlamentar interessado;
  • Apresentações de relatórios com critérios técnico-legislativos

 

Apesar de todas estas ações serem legitimas no Brasil, a falta de regulamentação mesmo diante de vários projetos tramitando nas casas legislativas abordando o tema Lobby (como o PL no. 1202/2007 do Dep. Carlos Zarattini), ainda existe muita desconfiança em relação as atuações destes profissionais, principalmente pela maneira equivocada de interpretação que a mídia e boa parte da sociedade fazem, diante dos vários escândalos envolvendo os atos corruptos presentes.

Com um debate aberto, regulamentado, transparente e profissionalização de toda a categoria, a sociedade terá a oportunidade de defender seus interesses, dando voz aos suas necessidades e preocupações.

 

  1. Defesa de interesses perante o poder legislativo

Quando falamos das funções do Poder Legislativo, a primeira coisa que nos lembramos é da elaboração das leis, isto é, das normas jurídicas que irão nos dizer o que podemos ou não fazer, quais são os nossos direitos e os direitos dos outros. Em resumo, as regras de cumprimento obrigatório que norteiam uma determinada sociedade. O papel de legislar é, indubitavelmente, a função primordial dos Parlamentos modernos.

A partir disto, podemos entender que o profissional de relações governamentais possa representar grupos de interesse que buscam participar deste processo de tomada de decisões, contribuindo para a elaboração das políticas públicas de cada país. Para isso, os grupos de interesse exercem pressão política a fim de alcançar seus objetivos. Sendo assim, há todo um envolvimento do ator político no processo de produção legislativa, que compreende desde o monitoramento dos projetos apresentados, a análise técnica das propostas, até a tomada de posição diante das proposições mais relevantes para o grupo de interesse.

Como o profissional de RELGOV pode se inserir no contexto legislativo otimizando a produção normativa:

a) identificação do problema e do objetivo pretendido;

b) construção e compreensão do cenário político brasileiro atual;

c) monitoramento legislativo;

d) análise do monitoramento legislativo;

e) monitoramento político;

f) criação da estratégia de ação, que consiste em identificar como resolver o problema ou otimizar a oportunidade, apresentando uma proposição, projeto de lei ou emenda; traçar uma estratégia de comunicação, marcando audiências, levando os tomadores de decisão a eventos educacionais ou visitas às instalações dos grupos de interesse; apresentando informação imparcial e confiável, baseada em estudos acadêmicos e pareceres técnicos e

g) execução do corpo-a-corpo, momento por excelência da pressão e que consiste em procurar aliados e inimigos dos interesses defendidos, a fim de convencê-los a contribuir para o alcance do fim pretendido.

Em se tratando de Poder Legislativo, o sucesso de uma ação empreendida por um grupo de interesse e/ou pressão pode se traduzir tanto na aprovação da proposição elaborada pelo grupo ou por um de seus aliados quanto pela rejeição, retirada ou arquivamento da proposição à qual os interesses do grupo eram contrários

 

  1. Papel do professionais de Relações Governamentais e o processo legislativo

Entre as atribuições do profissional de Relações Governamentais está a função de agrupar a demandas, projetos e atores principais, de um determinado setor e transformar esse conjunto de ideias e propostas em uma norma jurídica que possa contribuir para a elaboração de uma proposta a ser debatida no Congresso Nacional. Essa atuação começa antes mesmo de a proposta tomar corpo.

Nesse sentido, há levantamento e apresentação de dados para que determinado tema seja debatido em audiências públicas; convite para que especialistas apresentem exposições que fortaleçam o pleito desejado; busca de contato com parlamentares com interesse intrínseco à causa ou que possam endossar iniciativas; e apelo à opinião pública, com divulgação de ideias e proposição de debates relacionados à causa; com a finalidade de embasar argumentos políticos por meio de fundamentos e evidências.

A partir dos levantamentos dos agentes diretamente envolvidos nesse processo de atuação do profissional de Relações Governamentais, faz-se uma proposição, reunindo os principais pontos considerados essenciais à demanda defendidas, que será encaminhada às funções chaves da tramitação, notadamente o parlamentar que se proponha a apresentar a proposta e o relator do projeto apresentado, designado pelo presidente da comissão associada à temática em discussão.

Outras estratégias, como uso de instrumentos que possibilitem dar celeridade à tramitação de uma proposta, também são importantes. Um parlamentar afim à causa pode, por exemplo, sugerir caráter de urgência a uma análise. Na outra extremidade, um integrante de comissão pode propor a suspensão de uma discussão, postergando o encaminhamento de uma proposta.

O artigo 24 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados prevê a competência das comissões permanentes para discutir e votar as proposições que lhes forem distribuídas, enquanto o artigo 57 prevê as normas a que estão submetidos os colegiados permanentes para análise de proposições. Já o artigo 32 informa as comissões permanentes e os respectivos campos temáticos ou áreas de atividades aos quais as proposições podem ser submetidas. Já as competências do presidente de comissão, entre as quais designação de relatores e distribuição de matérias, estão previstas no artigo 41.

 

  1. Atuação perante as Comissões temáticas do Congresso Nacional– Fase Constitutiva

Às Comissões de Mérito acabam por se valer de deputados que se especializam de alguma forma nos temas de sua competência. À estas, cabem a discussão mais aprofundada em relação à um determinado tema, se valendo de convocação de Audiências Públicas para instrução da matéria com convidados de notório saber acerca do tema, produção de relatórios através de designação de relatores das matérias e promoção de discussão. Estes espaços configuram, hoje, arenas de aguda atuação e pressão dos profissionais de Relações Governamentais, devido ao grande acumulo de informações especificas que as diferentes organizações civis proponentes de discussão e possível regulação acumulam, realizando insumos informacionais aos deputados e senadores. Em cada expertise das Comissões à um novo arranjo de parlamentares e organizações atuantes, podendo expressar opiniões contrárias e favoráveis à determinado tema de formas e em graus diferentes.

Após a definição das áreas temática que um Projeto de Lei Ordinário (PL) passará, definidas pelo art. 32 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados - RICD, o profissional de Relações Governamentais deverá analisar em cada arena de debates quais são as potenciais forças aliadas e contrárias à matéria que defende. A cada ano as composições das Comissões Permanentes da Câmara dos Deputados se alteram, respeitando a proporcionalidade partidária da Casa, bem como a composição da Mesa. Assim, existe uma análise constante da composição das Comissões e de seus aliados.

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A partir de parlamentares aliados é possível garantir a constante negociação acerca da matéria defendida, negociando com as presidências das Comissões a designação de relatoria para relatores que sejam mais receptivos a pressões externas e ao tema defendido.

A convocação de Audiência Pública convida organizações da sociedade civil que representem diferentes pontos de vistas sobre as temáticas debatidas e representam ao profissional atuante o mapeamento de stakeholders aliados e contrários. Assim é formado um processo de retroalimentação, enquanto o processo legislativo dentro da Casa se beneficia da discussão de entidades externas aos quadros eleitos, as próprias entidades aglutinam mais informações a partir do exposto dentro dos espaços de discussão criado pelo processo legislativo.

A decisão de determinada Comissão de mérito, ou seja, o parecer por ela definido como seu, é passível de pressão e insumo de informações. A partir da definição de um determinado parlamentar como relator, cabe ao Relações Governamentais analisar seu posicionamento com base em seu histórico de decisões parlamentares e suas opiniões expressas e se este posicionamento é alinhado ao tema defendido. Por vezes é possível o auxílio à formulação de relatório diretamente, fornecendo posicionamento de setor bem como informações relevantes ao tema.

Ao final da análise de mérito pelas Comissões pertinentes, há análise terminativa da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania – CCJC – para se expressar quanto à constitucionalidade, juridicidade e técnica legislativa da matéria. Aqui há um natural constrangimento dos espaços de atuação do profissional de relações governamentais, pela natureza especifica do parecer e à sua especialidade jurídica. Porém, ainda há possibilidades de adequação e conformação de demandas sob a forma de melhor arranjo da norma proposta dentro da realidade jurídica vigente.

  1.  Fase Complementar do Processo Legislativo

Na fase conclusiva a atuação dos profissionais de relações governamentais/institucionais se dá em plenário, hora para manter o que veio das comissões ou para alterar o que for necessário, pois lá é a última oportunidade de atuação.

Como o acesso é muito restrito ao plenário, que tem prerrogativas de acesso está em posição de privilegio na capacidade de influência.

Por fim, e a título de exemplo, cito um caso bem interessante que envolveu um nível diferente de atuação dos profissionais de relações governamentais/institucionais foi o da recente renegociação das dívidas dos estados, onde a atuação direta de diversos governadores foi importantíssima, nesse caso eles eram os próprios agentes de “RelGov.”, a atuação começou ainda no PDC 311/2016, do Dep. Esperidião Amin PP/SC. Diante do projeto o governo federal se viu obrigado a renegociar as dívidas e em seguida enviou o PLP 257/2016, que com a mudança de governo teve um substituto apresentado para fazer uma nova proposta do novo governo, o relator em plenário foi o próprio Dep. Esperidião Amin. Nesse caso houveram diversos tipos de atuações e interações entre governos via os profissionais para que fosse garantido o interesse de todos. Mostrando que a atuação bem-sucedida das pretensões exige um grande conhecimento de regimento interno e das regras que podem ser feitas perante os pleitos dos grupos de interesse.

  1. Conclusão

Existem diversas estratégias que podem ser tratadas para a defesa de uma matéria em tramite no Congresso Nacional. O processo decisório nas Casas, tanto do Senado Federal quanto na Câmara dos Deputados, possui, em sua maioria, decisões colegiadas. Assim sendo, a capacidade de diálogo e de trânsito do profissional de relações governamentais é fundamental para a defesa de um pleito de interesse. Assim sendo, conforme as regras dos regimentos internos, há diversas ocasiões em que tais defesas podem ocorrer institucionalmente, ou seja, audiências públicas que buscam legitimar uma pauta/ discursos perante o plenário; discussão em comissões temáticas/plenário; direito de réplica e de aparte; enfim.

Tais atuações dos parlamentes são reguladas pelos regimentos internos de cada Casa do parlamento e sofrem o controle do judiciário quando há abuso do exercício dessas regras. Outrossim, é resguardado o direito de obstrução; encerramento de sessão/reunião; recontagem dos votos; votação nominal; visando garantir o direito das minorias parlamentares a defenderem pautas minoritárias.

Por fim, o estudo do regimento interno do Congresso Nacional e das duas Casas é tido como fundamental para a formulação de estratégias do profissional de relações governamentais, assim como no processo de mapeamento de oportunidades.

 

Bibliografia:

Brasil. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Regimento interno da Câmara dos Deputados [recurso eletrônico] : aprovado pela Resolução n. 17, de 1989, e alterado até a Resolução n. 17, de 2016 . – 17. ed. – Brasília : Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2016. – (Série textos básicos ; n. 136)

Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição.htm>.

GALAN, G. Relações Governamentais e Lobby. Aprendendo a fazer: as melhores práticas das melhores empresas. São Paulo: ABERJE, 2012.

MANCUSO, W. P. § GOZETTO, A. C. O. Lobby: instrumento democrático de representação de interesses? Organicom: Revista Brasileira de Comunicação Organizacional e Relações Públicas. Ano 8, No. 12. 2011.

PL No. 1202/2007 do Dep. Carlos Zarattini. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=353631

 

Sobre o autor
Leonardo Nesso Volpatti

Cientista Político e Estudante de Direito - UnB.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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