Competência para o julgamento de crimes contra a honra praticados na internet

26/10/2016 às 22:16
Leia nesta página:

Este é um artigo que pretende solucionar um importante problema causado com a introdução das redes sociais no cotidiano das pessoas.

Uma das maiores dificuldades que a legislação de um país enfrenta é justamente acompanhar a evolução de seu povo. Uma lei que era justa com o tempo pode deixar de ter esta qualidade, assim como uma lei que garantia uma segurança jurídica pode se tornar obsoleta.

E por isto o presente artigo tem por objetivo analisar, de forma sucinta, uma situação que está bastante próxima do cidadão moderno.

Por meio das redes sociais existem incontáveis relações que se criam, amizades que se formam e casamentos que se celebram, tudo por causa da facilidade na intercomunicação neste plano existencial tecnológico, onde a distância física entre as pessoas não é mais um empecilho.

Mas, como a evolução tecnológica cria rotineiramente situações jurídicas novas e o Poder Legislativo é incapaz de regulamentar todas elas em tempo hábil, criando-se uma lacuna legislativa.

E uma destas lacunas pode ser verificada quanto aos crimes contra a honra praticados no ambiente virtual.

Não há uma legislação clara, por exemplo, que estabeleça de quem é a competência para julgar este tipo de crime, no caso dos sujeitos envolvidos morarem em diferentes lugares do Brasil.

E, em decorrência da ausência de regulamentação, sobre o assunto há bastante controvérsia na doutrina e jurisprudência brasileira, pois há correntes que defendem que a competência, neste caso, seria do lugar onde se encontra o responsável pela publicação das ofensas, como há corrente que entende que a competência seria de onde são recebidas as mensagens eletrônicas e há, ainda, uma terceira corrente que entende que o foro competente seria a do local em que se encontra sediado o provedor de acesso ao ambiente virtual.

Para facilitar a compreensão, tal questão será exposta por meio de um exemplo: Imagine que João, que mora em Aracaju - Sergipe, decide publicar um texto em uma rede social com o objetivo de ofender a  personalidade de Maria, que mora em Curitiba – Paraná.

Neste caso, o juiz de qual comarca judiciária iria julgar o suposto crime, de Aracaju ou Curitiba?

Como objetivo de solucionar esta insegurança, este artigo defende a corrente que considera como foro competente, para o deslinde desta questão, o local de onde supostamente partiu a publicação do conteúdo, ou seja, o foro competente deve ser o domicílio do réu.

O que, segundo a relação jurídica material hipotética ocorreu em Aracaju - Sergipe, local de domínio do João,  porquanto é ali que o titular do domínio alimenta o seu conteúdo, independentemente do local onde se hospeda o sitio eletrônico.

Isso porque o Código de Processo Penal não fixou o domicílio da suposta vítima como critério de fixação de competência (Título V – Livro I), e mesmo que não conhecido o lugar da infração, o vetor seria o domicílio do réu (CPP, art. 72). 

E nos casos de exclusiva ação privada, o legislador processual penal deixou ao querelante a faculdade de optar pelo domicílio do réu (CPP, art. 73).

Enfim, por qualquer ângulo que se pretenda apreciar o tema (Código de Processo Penal ou Lei 9.099/95), não seria a residência do ofendido o fator determinante à fixação da competência criminal.

A corrente que entende como foro competente a do domicílio da vítima vai de encontro com entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme verifica-se abaixo:

Informativo de Jurisprudência Nº: 0434 Período: 10 a 14 de maio de 2010.

Terceira Seção

COMPETÊNCIA. INTERNET. CRIMES CONTRA HONRA.

A Seção entendeu, lastreada em orientação do STF, que a Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/1967) não foi recepcionada pela CF/1988. (...)Quanto aos crimes contra a honra praticados por meio de reportagens veiculadas na Internet, a competência fixa-se em razão do local onde foi concluída a ação delituosa, ou seja, onde se encontra o responsável pela veiculação e divulgação das notícias, indiferente a localização do provedor de acesso à rede mundial de computadores ou sua efetiva visualização pelos usuários. Precedentes citados do STF: ADPF 130-DF , DJe 6/11/2009; do STJ: CC 29.886-SP , DJ 1º/2/2008.CC 106.625-DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 12/5/2010.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIMES CONTRA HONRA PRATICADOS PELA INTERNET. COMPETÊNCIA.  VEICULAÇÃO DO CONTEÚDO OFENSIVO. FIXAÇÃO NO LOCAL DO TITULAR DO PRÓPRIO DOMÍNIO E QUE CRIOU A HOME PAGE ONDE É ABASTECIDO SEU CONTEÚDO.

1. Tratando-se de crimes contra a honra praticados pela internet, a competência deve ser firmar de acordo com a regra do art. 70 do Código de Processo Penal, segundo o qual "A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução". Isso porque constituem-se crimes formais e, portanto, consumam-se no momento de sua prática, independentemente da ocorrência de resultado naturalístico. Assim, a simples divulgação do conteúdo supostamente ofensivo na internet já é suficiente para delimitação da competência.

2. Esse local deve ser aquele de onde efetivamente partiu a publicação do conteúdo, o que ocorre no próprio local do domínio em que se encontra a home page, porquanto é ali que o titular do domínio alimenta o seu conteúdo, independentemente do local onde se hospeda o sitio eletrônico (provedor).

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3.  No caso, a veiculação da reportagem que deu ensejo ao inquérito policial partiu de sítio eletrônico cujo domínio era de empresa situada no Mato Grosso, razão pela qual a competência é do Juízo Federal da 5ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso.

(CC 136.700/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/09/2015, DJe 01/10/2015)

Assim, na tentativa de solucionar esta questão, este artigo fundamenta que, tratando-se de crimes contra a honra praticados pela internet, a competência deve ser firmar de acordo com a regra do art. 70 do Código de Processo Penal, segundo o qual "A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução.

E esse local deve ser aquele de onde efetivamente partiu a publicação do conteúdo, o que ocorre no próprio local de domicílio do suspeito de cometer crime contra a honra, que, no exemplo dado neste artigo, seria de Aracaju – Sergipe.

Sobre o autor
Atila Cunha de Oliveira

Advogado militante deste 2011, pós graduado pelo Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP em Direito Tributário.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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