Experiência austríaca no controle de constitucionalidade

28/10/2016 às 09:31
Leia nesta página:

O presente artigo trata do sistema de constitucionalidade austríaco, idealizado por Hans Kelsen, no século XX. Demonstra como foi desenvolvido e expandido seu sistema, que foi adotado em vários países europeus.

Introdução

O sistema de constitucionalidade austríaco foi desenvolvido pelo intelectual Hans Kelsen, no século XX. Sua ideia foi elaborada com a Constituição austríaca de 1920, espalhando-se pelo continente europeu e, mais tarde, pelos outros continentes.  Fundava-se na competência exclusiva das Cortes Constitucionais para avaliar a concordância das normas com a Lei Superior.

O Sistema Austríaco

Totalmente oposto ao já conhecido sistema americano de constitucionalidade, em princípio, o novo sistema intentado por Kelsen fundava-se no ajuizamento de ações diretas em que tratava-se de controvérsia constitucional. Portanto, em tese declarar-se-ia a conformidade ou a desconformidade das normas infraconstitucionais com a Constituição. Neste sentido, a revisão de constitucionalidade era um pedido imediato, não havendo a possibilidade do pedido como incidente, ou seja, dentro do caso concreto já submetido a julgamento de um órgão do Poder Judiciário. A via de arguição do controle era a via direta.

No sistema de constitucionalidade austríaco, o controle da controle da constitucionalidade ou não das normas era direcionado a um órgão especifico, o chamado Verfassungsgerichtshof, e nenhum outro órgão teria jurisdição para exercer o controle, ficando para estes a competência de julgar casos concretos.

Acerca da função do Tribunal Constitucional na Austria, discorreu Raul Machado Horta:

"O constituinte austríaco de 1920, sob a inspiração de Hans Kelsen, optando pela organização federal, cuja adoção reclamou um lógico e racional processo técnico-jurídico de adaptação, (Lei de 10 de outubro de 1920) confiou ao Tribunal Constitucional a missão de defender a inviolabilidade do texto constitucional, ao qual se subordinavam tanto a legislação do governo provincial (landesregierung) como a do governo federal, para manter a efetiva supremacia jurídica e política da Constituição Federal" ( MORAES, Alexandre de, Jurisdição Constitucional e Tribunais Constitucionais. Garantia Suprema Da Constituição. São Paulo: Atlas S.A., 2000, p. 125. Apud, HORTA, Raul Machado. Estudos de direito constitucional. Belo Horizonte : Del Rey,1995, p. 173).

Subjetivamente, pode-se dizer que o sistema austríaco proposto por Hans Kelsen é concentrado, tendo em vista que a competência para julgar ações de inconstitucionalidade é direcionada a um único órgão, e também abstrato, pois o objeto principal da ação é a constitucionalidade.

A decisão proferida pelo órgão tem efeito erga omnes e as normas eram presumidamente constitucionais, de forma que o vício era anulável e os efeitos produzidos eram ex tunc.

Mais tarde, com a revisão da Constituição em 1929, a competência para julgamento de inconstitucionalidade passou a abranger outros dois tribunais, de modo que um tribunal inferior poderia deixar de aplicar a lei que entendesse inconstitucional. Eram os chamados Tribunais de Oberster Gerichtshof e Vewaltungsgerichtshof. Nestes casos, o controle seria incidental, analisando-se a constitucionalidade dentro de um caso concreto que seria desmembrado e suspenso, na medida em que e o julgamento de mérito aguardaria o julgamento preliminar da inconstitucionalidade.

Com isso, nos casos que anteriormente foram levados a Verfassungsgerichtshof por via incidental, passou-se a verificar a possibilidade de operar-se por meio do efeito ex tunc, de modo que a lei declarada inconstitucional não fosse aplicada aos fatos ocorridos anteriores a decisão, tendo em vista a segurança jurídica.

Expansão do Sistema Austríaco

Com o tempo, o modelo de controle de constitucionalidade austríaco foi espalhando-se pelo continente europeu e os países começaram a introduzir algumas regras ao seu ordenamento.

Em 1948 a constituição italiana e a constituição alemã ampliaram a competência para julgamento incidental do controle de constitucionalidade, conforme modificado com a Constituição austríaca de 1929. Esta mudança contribuiu para que os juízes de instâncias inferiores não fossem obrigados a aplicar uma norma que, no seu entendimento, fosse inconstitucional.

O sistema austríaco mostrou-se mais adequado e eficiente, principalmente nos países não adeptos ao “stare decisis”, ou seja, aqueles que não tem a figura do precedente ou do efeito vinculante com a importância vista nos países adeptos do sistema Common Law, por exemplo.

Conclusão

Assim sendo, é cediço que o sistema austríaco concentra a análise de constitucionalidade das normas num único órgão, desvinculando os outros desta parcela da jurisdição. Desta forma são também características do sistema austríaco: concentração da competência; efeitos erga omnes; efeitos ex tunc, ex nunc e até mesmo pro futuro; controle geral e abstrato.

A adoção deste sistema em outros países trouxe adaptações em seu bojo que foram introduzidas até mesmo pela própria Áustria. Conforme o sistema austríaco espalhava-se pelo continente, os pressupostos trazidos por Kelsen iam se esvaindo. Neste viés, o fato de a Alemanha e a Itália viverem um período entre guerras, ocasionou no fortalecimento do papel dos juízes ordinários, até mesmo no que tange o controle de constitucionalidade.
 

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Bibliografia

MORAES, Alexandre de, Jurisdição Constitucional e Tribunais Constitucionais. Garantia Suprema Da Constituição. São Paulo: Atlas S.A., 2000, p. 125. Apud, HORTA, Raul Machado. Estudos de direito constitucional. Belo Horizonte : Del Rey, 1995, p. 173

CAPPELLETTI, Mauro. O Controle Judicial de Constitucionalidade das Leis no Direito Comparado. 2. ed. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1999.


BARROSO, Luís Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. 4. Ed. São Paulo: 2009.

Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos