Um transexual na família: implicações jurídicas

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O direito á família está sendo assegurado ao transexual, analisar as inúmeras situações, no âmbito do direito de família, que pessoa trans se insere e como a alteração dos dados no registro civil pode afetar as relações interpessoais.

Resumo: O presente esboço tem por escopo discorrer a cerca do transtorno de identidade de gênero, essa desordem psíquica onde o indivíduo repudia seu sexo morfológico; os procedimentos disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Verificar como o direito á família está sendo assegurado ao transexual, analisar as inúmeras situações, no âmbito do direito de família, que pessoa trans se insere e como a alteração dos dados no registro civil pode afetar as relações interpessoais, criando, modificando e extinguindo institutos familiares pré-existentes e ou futuros. As conseqüências jurídicas que a redesignação acarreta ao indivíduo, aos familiares e a sociedade e ainda segurança jurídica nas relações inter-pares. É somente pela porta do judiciário que a pessoa trans consegue resgatar a sua cidadania, e exerce seu direito de personalidade, trabalhista, educacional, previdenciário, direito a família, enfim, Direitos Fundamentais assegurados pela Constituição a qualquer pessoa, no território nacional, além dos direitos transnacionais reconhecidos mundialmente, e inerentes a toda pessoa humana.

Palavras-chave: Transtorno de Identidade de Gênero.. Direitos fundamentais e transnacionais . Direito a família. Registro civil.

Sumário: Introdução. 1. Metodologia. 2. A transexualidade. 3. Tratamento pelo SUS. 4. Registro civil. 5. Direito a família. 5.1. Direito de Família – aspectos jurídicos. 6. Discussão e resultado. 7. Considerações finais. 8. Referencial bibliográfico.


INTRODUÇÃO

De nada vale o direito se ele está apenas positivado, torna-se letra vã, morta para sociedade, de que vale o direito empoeirando prateleiras, encadernado, emoldurado em capas grossas, se nada, cria, modifica ou extingue. A norma é viva quando aplicável, mutável pelos fenômenos sociais que inserem o ser humano nessa esfera chamada vida. Uma sociedade que não muda, também não evolui, não cresce não se adapta, não amadurece Não é a norma que cria o fenômeno, mas sim criada por ele, regula-o, dele se alimenta, se adapta, por ele nasce, muda e morre.

O direito surge da premente necessidade da norma regular os novos fenômenos criados pelo dinamismo dos grupos sociais; negligenciar esses grupos é caminhar na contramão da evolução da raça humana. Não se é a mesma pessoa que se foi ontem, não há como impedir o processo, apenas retardá-lo.

Locke (1999) já vislumbrava que o Estado deve ser regido fundamentalmente pelas leis e não pelos homens, ao mesmo tempo em que o poder soberano pertence ao povo que nunca poderá renunciar completamente a ele. O poder está no Parlamento, onde tem assento os representantes do povo (..) e como tal, deveriam promover a coletividade, regulando a convivência social de maneira impessoal e altruísta, através dos mecanismos legais a que são legitimados.

Bem, enquanto o Congresso trabalha em benefício estranho a sua finalidade, cabe ao judiciário solucionar as demandas legais, carentes de resolução normativa. O estudo demonstrará a morosidade dos processos judiciais para alteração de prenome e gênero litigada por transexuais, projetar algumas conseqüências jurídicas no âmbito civil-familiar, e a insegurança jurídica que pode acarretar a terceiros, e ainda, possíveis soluções.

Por todo o país saem decisões, a passos lentos permitindo que transexual possa obter seus documentos pessoais readequados a sua nova situação. Com a cidadania vem os direitos e os deveres também. Como essa nova realidade afeta aqueles que lhe são mais próximos, como se processam os relacionamentos existentes e vindouros?

O objetivo geral é comprovar a premente necessidade de regular os direitos trans, através de um Estatuto multi-normativo, que de forma célere, permita o acesso aos mecanismos que viabilizem o pleno ajuste “legal” sua nova condição. E Assim, usufruir da proteção estatal, disponível a toda população, readquirindo sua capacidade de sujeito de direitos e obrigações.


1. METODOLOGIA

O trabalho foi desenvolvidos utilizando meios metodológicos de pesquisa dentre eles a o método dedutivo: racionalista, que pressupõe a razão com a única forma de chegar ao conhecimento verdadeiro; utiliza uma cadeia de raciocínio descendente, da análise geral para a particular, até a conclusão; utiliza o silogismo: de duas premissas retira-se uma terceira logicamente decorrente. Nas palavras de Pasold (2002, p.110) trata-se de “ pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral.

A pesquisa desenvolveu-se sob a forma bibliográfica em jurisprudências, artigos científicos e livros doutrinários, bem como na análise da legislação aplicável para uma melhor compreensão do tema proposto. Assim descreve Gil (2006, p. 44) “A pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado constituído principalmente de livros e artigos científicos” e ainda a pesquisa documental elaborada a partir de material que não recebeu tratamento analítico;

A pesquisa documental - É aquela realizada a partir de documentos, contemporâneos ou retrospectivos, considerados cientificamente autênticos (não-fraudados); tem sido largamente utilizada nas ciências sociais, na investigação histórica, a fim de descrever/comparar fatos sociais, estabelecendo suas características ou tendências. (UFRGS, 2009)

Utilizou-se o método dedutivo para se chegar às principais conclusões, tendo em vista que a sua base é a verificação da aplicação da relativização da coisa julgada e sua repercussão no ordenamento jurídico brasileiro e ainda técnicas de pesquisa documental e legislativa que englobam os artigos de revista e internet, além de vários outros meios e técnicas de pesquisa direta e indireta (CERVO, et. al., 2010).

O objetivo geral concentrou-se em verificar os reflexos jurídicos após a retificação de nome e gênero da pessoa trans, basicamente, na seara do direito de família.

Segundo DOXSEY & DE RIZ (2002-2003, p. 25), o objetivo geral da pesquisa esclarece o que se pretende alcançar com a investigação. Explicita, também, o caráter da pesquisa: se ela é exploratória, descritiva ou explicativa pela maneira como o pesquisador determina os objetivos de sua investigação.


2. A TRANSEXUALIDADE

Transexualidade ou transexualismo?

Transexualidade significa condição de ser transexual. Segundo Maria Helena Diniz “o transexual é portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência a automutilação ou auto-extermínio.”

Transexual é um indivíduo que se identifica psicologicamente e socialmente com o sexo oposto. Ele tem todas as características físicas do sexo constante da sua certidão de nascimento, porém se sente como pertencente ao sexo oposto. Em síntese, o transexual masculino, é uma mulher vivendo em um corpo de homem e o feminino uma mulher em um corpo masculino.

Para Peres (2001, p. 125) caracteriza-se como uma desordem de identidade de gênero, uma vez que sua principal característica [“...] consiste na incongruência entre o sexo atribuído na certidão de nascimento e a identidade psíquica de gênero do indivíduo”

Transexualismo é o termo utilizado para definir a patologia que consta no cadastro CID da Organização Mundial da Saúde e Conselho Federal de Medicina, regulada pela Resolução 1.955/2010: “ paciente transexual portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência à automutilação e/ou autoextermínio”.

O transexualismo ainda é identificado como uma patologia classificado no Dicionário de Saúde Mental (DSM-5)1 como: “transtorno de identidade de gênero ”, trata-se de uma desordem psíquica;

Definir como patologia não é o suficiente, mas entender como o indivíduo se SENTE, o que melhor esclarece tal circunstância está nos dizeres Souza (2015, 18) que esclarece, de forma bastante precisa, o que ocorre com o individuo:

O indivíduo convive com uma sensação desconfortável de estar preso a um corpo que é estranho a todos os sentidos, estímulos e desejos pessoais, parece que em algum momento ao despertar desse pesadelo, o espelho mostrará a identidade, que a mente insiste em projetar.

Esse transtorno causa no transexual um sentimento abominação pela sua identidade e aparência e seu órgão genital, assim, seguem buscando adequar seu biótipo às características do sexo oposto.

Desde a infância, homens e mulheres transexuais passam por um processo de desconstrução psicossocial que fragiliza diretamente sua saúde integral. É comum observamos as diferenças de comportamentos de uma criança transexual, que se contrapõe ao gênero inato ou ao que se espera dos padrões sociais (Chopelly Glaudystton Pereira dos Santos)

Travestis e transexuais sempre estiveram na ponta de lança dos preconceitos e das discriminações existentes no Brasil com a população LGBT. Isso ocorre porque essa população ostenta uma identidade de gênero diversa da imposta pelos padrões heteronormativos, em que homem é homem e mulher é mulher, e qualquer coisa que fuja dessa norma é encarada com estranhamento. (BRASIL, 2015)


3. TRATAMENTO PELO SUS

O Conselho Federal de Medicina, no artigo 3°, da Resolução n° 1.652/2002 define que o [diagnóstico] de transexualismo deverá obedecer, no mínimo, aos seguintes critérios:

a) desconforto com o sexo anatômico natural;

b) desejo expresso de eliminar genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto;

c) permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos;

d) ausência de outros transtornos mentais

Os requisitos elencados pelo CFM estabelecem um pré-diagnóstico que permitirá o inicio do tratamento que se principia pela terapia hormonal, que poderá ser a partir dos 16 anos, o SUS fornecerá o estrógeno ou testosterona, acompanhamento clínico e multidisciplinar no processo transexualizador, antes e após a operação.

Um dos grandes avanços se deu ao fato da publicação da Portaria nº 2.803 do Ministério da Saúde, em 2013, que reformula e regulamenta o Processo Transexualizador. O destaque nessa Portaria é que ela trabalha as e os transexuais (mastectomia e histerectomia para homens trans), assim como as travestis, no que diz respeito ao tratamento psicológico e endocrinológico.

Mas o tempo que os hospitais e os ambulatórios levam para serem habilitados, e também para os já habilitados se estruturarem e executarem o processo, faz com que muitas pessoas trans, que há muito esperam pela tão sonhada e desejada cirurgia, desenvolvam uma ansiedade e uma angústia que se reflete na fase adulta.

É possível que, no fim de todo esse processo de reestruturação dos hospitais e dos ambulatórios, muitas transexuais desistam da cirurgia (mesmo ainda existindo o desejo) por causa de um longo processo depressivo e exaustivo ocasionado pela espera. Porém, esse fato pode não acontecer com os homens trans que, em qualquer fase de sua vida, querem a histerectomia e a mastectomia (BRASIL. 2015)

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4. REGISTRO CIVIL

Findo todo o procedimento terapêutico, ainda cabe ao indivíduo ser introduzido na sociedade, adequar seu registro civil a nova realidade, assegurando seu direito a personalidade, identidade e ao nome.

"Toda pessoa tem direito a um prenome e aos nomes de seus pais ou ao de um deles. A lei deve regular a forma de assegurar a todos esse direito, mediante nomes fictícios, se for necessário". O direito ao nome está regulado pela Lei de Registros Públicos, protegido e reconhecido pelo CC /2002 e pelo Pacto de San Jose da Costa Rica: (SOUZA, 2014, p 25).

Na lição de Monteiro (2005, p. 106), o nome é o mais importante dos atributos da personalidade, pois é o elemento identificador da pessoa. O indivíduo recebe-o ao nascer e conserva-o até a morte. Em todos os acontecimentos da vida do homem (individual, familiar e social) e em todos os atos jurídicos, ele tem que apresentar-se com o nome que foi registrado. E o professor define o nome da seguinte maneira: “[...] o sinal exterior pelo qual se designa, se identifica e se reconhece a pessoa no seio da família e da comunidade.” (MONTEIRO, 2005, p. 106)

A regra geral é da inalterabilidade do nome, porém, relativizada pelo art. 55, parágrafo único da Lei de Registros Públicos, em situações excepcionais: Quando expuser o titular ao ridículo ou à situação vexatória (LRP).

A Lei de registros públicos prescreve a alteração de pronome quando dele o indivíduo for submetido a situação vexatória. O nome civil é um atributo da personalidade. É um direito que visa proteger a própria identidade da pessoa (Venosa, 2002).

A Ministra Nancy Andrighi atuando como relatoria em um julgamento (REsp n º 1.008.398 - SP (2007/0273360-5)­ proferriu em seu voto “não faz sentido o Brasil permitir cirurgia no Sistema Único de Saúde (SUS) e não liberar a modificação no registro civil. Para Nancy, um conjunto de fatores sociais e psicológicos devem ser considerados para que "o indivíduo que passou pela cirurgia tenha uma vida digna", lembrando que a troca do registro é prática permitida em diversos países”.

Concluiu ainda, que se após a alteração da Certidão, fosse mantida observação sobre a modificação, a exposição da pessoa ao constrangimento e a discriminação continuariam, (...) (STJ, 2012).

A renomada Maria Helena preza pelo mesmo pensar, para ela não se deve mencionar nos documentos, a situação anterior quanto ao gênero do indivíduo “... a legislação só admite a existência de dois sexos: o feminino e o masculino e, além disso, veda qualquer discriminação. Além disso, finalizou:

Com a entrada em vigor da Lei n. 9708/98, alterando o art. 58. da Lei n. 6015/73,o transexual operado teria base legal para alterar o seu prenome, substituindo-o pelo apelido público notório, com que é conhecido no meio em que vive”. (DINIZ, 2002, p. 48)


5. DIREITO A FAMILIA

O direito a constituição de família encontra-se fundamentado nos preceitos jurídico constitucionais, pautados no respeito à liberdade de constituição, na convivência e dissolução, na auto-responsabilidade, na igualdade irrestrita de direitos, na igualdade entre irmãos biológicos e adotivos, no respeito a seus direitos fundamentais, no forte sentimento de solidariedade recíproca entre outros. (MOTA, ROCHA, MOTA, 2011)

A Constituição Federal de 1988, ao lado do casamento, trouxe o reconhecimento da União Estável e da Família Monoparental. A família é a base da sociedade e recebe especial proteção do Estado, conforme artigo 226, caput, da Constituição Federal .

A realidade social subjacente obriga a todos, principalmente a quem se dedica ao seu estudo, a pensar e repensar o ordenamento jurídico para que se aproxime dos anseios mais importantes das pessoas. A Constituição atribui a todas as entidades familiares a mesma dignidade, sendo merecedoras de igual tutela, sem hierarquia. (Sem. LÍDICE DA MATA – PLS 470/2013)

O PLS 470/2013 que tramita no Congresso nacional sob a denominação de “Estatuto das Famílias”, propositadamente, trata a família no plural, para contemplar os diversos arranjos familiares hoje presentes na sociedade. O reconhecimento dos vários tipos de família, independentemente de gênero ou orientação sexual do casal, busca preservar a dignidade da pessoa humana e o direito à busca da felicidade.

O fato é que o conceito de família mudou. E onde procurar a sua definição atual? Talvez na frase piegas de Saint-Exupéry: a responsabilidade decorrente do afeto. (Maria Berenice)

5.1. DIREITO DE FAMÍLIA – ASPECTOS JURÍDICOS

A respeito dos reflexos que adequação jurídica da pessoa trans possam ter no direito de família, apreciou-se algumas considerações. Alterado o registro civil adequando prenome e gênero, por se tratar de fato novo, os reflexos vindouros, permeiam a esfera do “achismo”, até porque não cabe ao judiciário esse papel, prevê-los, mas sim ao legislativo.

Souza (2015) acredita-se que a maiorias dos reflexos incidirão sobre o direito de família, tão simplesmente porque as relações interpessoais estão mais sujeitas a conflitos, envolve uma infinidade de emoções, tais como:

Quando o transexual for casado – não se poderá invocar anulação, pois o gênero não é motivo, tão pouco se pode alegar erro sobre pessoa. O divórcio seria uma possibilidade, haja vista que, realizada a cirurgia na constância do casamento, ou existe a aceitação do cônjuge, ou a vida em comum torna-se difícil.

Filiação: Os filhos havidos do casamento ou por adoção deverão ter seus registros retificados, adequados ao novo prenome do seu genitor. No intuito de evitar tantos entraves a adequação poderia ser concedida apenas ao transexual solteiro, viúvo ou divorciado, entretanto poderia tal condição ensejar clara violação ao princípio da igualdade. (VIEIRA, 2008, p. 305).

O Direito ao Casamento – este tema está perfeitamente pacificado com a decisão do STF em reconhecer a união estável e a convolação em casamento entre pessoas do mesmo sexo, entretanto, ventila-se na doutrina que poderia ocorrer o risco de uma pessoa contrair casamento com um transexual desconhecendo a sua condição. (SOUZA, 2015)

Há aqueles (doutrinadores) que defendem que o casamento seria válido, pois o gênero não daria causa para sua desconstituição litigiosa, tão pouco a incapacidade reprodutiva (DIAS, 2009, p.249-250). Outros tantos são contrários á validade do casamento:

“O casamento tem como pilar o pressuposto fático da diversidade de sexos dos nubentes, embora não haja nenhuma referência legislativa a respeito, ante a sua evidência essa condição impõe-se por si mesma. Se duas pessoas do mesmo sexo, como aconteceu com Nerus e Sporus, convolarem núpcias, ter-se-á casamento inexistente, uma farsa”. (DINIZ, 2002, p. 40)

Outra uma situação, que pode ser a mais grave pela possibilidade de desencadear inúmeras emoções negativas seria a alegação de Erro essencial .

O código Civil regula que o erro essencial sobre a pessoa do cônjuge, capaz de caracterizar o aliciamento da vontade e por fim anular, o casamento diz respeito à identidade ou qualidade essencial da pessoa, in verbis:

“Art. 139.O erro é substancial quando:

[...]

II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;

[...]”

“Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.”

Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:

I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;

II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;

III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência. (grifo nosso)

O “defeito” para o cônjuge (enganado) pode ensejar repulsa sexual inibitória, Além do sentimento de traição, por ter sido levado, de boa-fé a contrair matrimônio com alguém que, em tese depositara sua confiança. O estado psicológico do cônjuge é que vai orientar seu grau de tolerância, considerando ainda suas convicções religiosas, seu constrangimento social e seu grau de preconceito.

O erro essencial, neste caso, concerne à identidade do cônjuge, que tornaria a vida conjugal impossível, conforme dispõe o artigo 1.557 do Novo Código Civil

Além das complicações já elencadas, tal situação ensejaria em crime tipificado no Código Penal, artigo 236 que trata do Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento, in verbis:

Art. 236. Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior.

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

Parágrafo único. A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não pode ser intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo de erro ou impedimento, anule o casamento.

Uma solução que possivelmente poria fim a toda essa celeuma, seria à averbação obrigatória da alteração ocorrida, no livro do Cartório de Registro Civil, assegurando o direito dos transexuais e do terceiro, com o qual se relacionasse. Neste caso, em especial, durante o processo de habilitação, exigir-se-ia a declaração do nubente, reconhecendo estar ciente da situação do cônjuge transexual, sendo um dos documentos de habilitação obrigatório, que deverá constar do rol taxativo do artigo 1.552 do Código Civil.

Assim a pessoa trans teria resguardada sua intimidade, pessoalidade e dignidade, mantendo o sigilo de tal informação e apenas trazendo ao conhecimento, de boa-fé, ao seu futuro cônjuge. (SOUZA, 2015)

Sobre a autora
Karla Cristina de Oliveira Cruz

Atuante na área Jurídica, na avaliação de provas documentais e orais, realização de audiências Trabalhistas e Cíveis, elaboração de recursos e contestação de ações. Responsável por promover a defesa de clientes em todas as ações, reunir os documentos correspondentes, instruir testemunhas e prepostos e elaborar as ações a favor. Exposição de pareceres, acompanhamento de processos e realização acordos e ou promoção de ações judiciais. Diligência com primor pelos desígnios do cliente bem como, na manutenção e integridade dos seus bens, viabilizando negócios, preservando interesses individuais e primando pelos princípios éticos. Desenvolvimento de teses e documentos para defesa do cliente Disponibilidade para viagens. FORMAÇÃO ACADÊMICA/TITULAÇÂO Mestrado – Docência Em Ensino Superior – Cursando Especialização – Direito Do Trabalho e Processo do Trabalho Especialização – Direito Previdenciário Especialização – Direito De Família e Sucessões Especialização – Direito Processual Civil MBA Em Recursos Humanos Graduação Em Direito

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada ao Instituto Educacional Alfa como trabalho de conclusão do Curso de Pós-graduação em Direito Processual Civil.

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