Análise crítica da natureza jurídica do acordo de leniência brasileiro

24/11/2016 às 12:22
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Discussão acerca da natureza jurídica do acordo de leniência no direito brasileiro.

Discute-se se o Acordo de Leniência seria um ato administrativo vinculado ou discricionário. Primeiramente, para diferenciar os institutos, ato administrativo vinculado é aquele que exige, para sua realização, certos requisitos, os quais uma vez preenchidos pelo particular, obrigam a Administração Pública a realiza-lo. Por outro lado, o ato administrativo discricionário é aquele que a Administração Pública, mesmo diante do preenchimento dos requisitos pelo particular, tem liberdade para determinar se irá ou não realizá-lo, com base em seu juízo de oportunidade e conveniência, que pode ser chamado de mérito administrativo. Cabe destacar que a discricionariedade não se confunde com arbitrariedade, visto que mesmo sendo ato discricionário, é necessário observar limites no que tange a competência, forma e finalidade do ato, motivo pelo qual o ato discricionário pode ser considerado como vinculado nesses aspectos específicos.

Apresentados os conceitos, o que se busca entender é se o acordo de leniência seria obrigatório para a Administração Pública, uma vez que os requisitos previstos em lei fossem preenchidos. Deve-se levar em consideração que o acordo de leniência, para ser um instrumento efetivo na prática, deve oferecer segurança aos lenientes. Para ser efetivo, portanto, deve ser um ato administrativo vinculado, pois os lenientes, dessa forma, se sentiriam seguros para buscar o acordo e preencher os requisitos necessários, sem arriscar que a Administração Pública negue o acordo de forma discricionária.

Sobre a vinculação e a discricionariedade do acordo de leniência, o professor Maurício Zockun (2016, p.1) entende que

[...] a Administração não goza de margem de liberdade para celebrar ou não o acordo de leniência uma vez constatada a ocorrência dos pressupostos necessários à sua formação. Isso porque a ordem jurídica elegeu este ato negocial como o meio mais adequado para tutela do interesse público, tanto mais porque sua formação também poderá se aperfeiçoar no transcurso de uma ação judicial que tenha por objeto os noticiados ilícitos[1].

Nesse sentido, o acordo de leniência seria um direito subjetivo daquela pessoa, física ou jurídica, que preencha os pressupostos necessários para sua celebração. No mesmo viés, Marlon Roberth Sales e Clodomiro Bannwart Junior (2014, p.31) apresentam a natureza jurídica do acordo de leniência estadounidense:

Se, em um primeiro momento, havia subjetivismo na celebração dos acordos de leniência, tornando-os desinteressantes, mais adiante, os Estados Unidos buscaram reduzir de forma drástica tal discricionariedade, notadamente no ano de 1993, com o aperfeiçoamento e revisão do programa (que passou a ser chamado de Amnesty Program). Naquele ano, o deferimento da leniência passa de ato discricionário para ato vinculado, desde que celebrados antes da investigação[2].

Destaca-se a ressalva, feita pelo próprio professor Maurício supracitado, de que há uma certa margem de liberdade na mitigação das penalidades. A legislação prevê a mitigação, mas não estabelece um critério objetivo para seu escalonamento. A ausência de um critério objetivo gera insegurança aos potenciais lenientes, o que pode impactar negativamente a efetividade do acordo de leniência.

A ideia do acordo de leniência não é tornar o agente que praticou ilícitos impune, mas sim premiar a colaboração do mesmo com o Estado, protegendo o interesse público. Assim, é um ato convencional, no sentido de que nenhum desses agentes será forçado a celebrar um acordo de leniência, bem como restritivo de direito, afinal, trata-se de uma modalidade de sanção a ser aplicada àquele que praticou os ilícitos. Ainda, sendo sanção, impede a imposição de sanções com base em outras legislações, já que punir duas vezes o mesmo ato configuraria bis in idem.


[1] ZOCKUN, Maurício. Vinculação e Discricionariedade no Acordo de Leniência. Revista Direito do Estado, ano 2016, número 142. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com.br/colunistas/Mauricio-Zockun/vinculacao-e-discricionariedade-no-acordo-de-leniencia>. Acesso em 29 de agosto de 2016.

[2] O Acordo de Leniência: uma análise de sua compatibilidade constitucional e legitimidade. Revista do Direito Público de Londrina, v. 10, n. 3, p. 31 – 50, set/dez/2015.

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Sobre a autora
Lilian Harada Coura

Estudante de Direito do 10º semestre da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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