O princípio da autotutela no ordenamento jurídico brasileiro

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Reflexão, tendo por base estudo doutrinário e jurisprudencial acerca dos temas que envolvem o princípio da autotutela no ordenamento jurídico brasileiro. Observa-se que as funções de Estado possuem competências típicas que, contudo, não são absolutas.

RESUMO

Reflexão, tendo por base estudo doutrinário e jurisprudencial acerca dos temas que envolvem o princípio da autotutela no ordenamento jurídico brasileiro. Observa-se que as funções de Estado possuem competências típicas que, contudo, não são absolutas. Desse postulado, advém o princípio da autotutela que permite à Administração, sobretudo a Pública, exerça controle sobre seus atos. São apresentados conceitos e jurisprudências pertinentes ao mencionado princípio. Delineia-se a fundamentação normativa do mesmo no ordenamento jurídico brasileiro, observando-se sua importância e consagração no direito pátrio. Por fim, analisam-se as limitações do mencionado princípio.

Palavras-chave: Autotutela. Funções de Estado. Administração Pública. Direito Administrativo. Autoridade Administrativa.

PRINCIPLE OF "AUTOTUTELA" IN BRAZILIAN LAW

ABSTRACT

Reflection, based on doctrinaire and jurisprudential studies about the themes which involve the principle of “autotutela” in Brazilian law. We noted that the functions of State have tipical competences, but they aren’t absolutes. This postulate bring forth the idea that the “autotutela” principle allows to Administration, mostly the Public one, prosecutes control over their actions. We show concepts and case law relevant to the mentioned principle. We outline the normative basis of the principle in the Brazilian legal system , noting its importance and recognition in the parental right . Finally , we analyze the limitations of that principle .

Keywords: Principle of “Autotutela”. Functions of State. Public Administration. Administrative Right. Administrative Authority.

1. INTRODUÇÃO

Em seu artigo 2° a Constituição Federal de 1988 traz os três poderes do Estado (verdadeiramente, funções) como independentes e harmônicos entre si. Por força do artigo 60, §4º, III, tal disposição é elevada à categoria de cláusula pétrea, não podendo o constituinte reformador ao editar emendas constitucionais abolir essa previsão.

Decorrente dessa forma de distribuição de competências, são elencadas funções típicas e atípicas, para cada um dos Poderes. Exemplifica-se, de modo típico, o Legislativo se encarrega de legislar; o Judiciário, de julgar; e o Executivo, de administrar. Sob um viés atípico, o Legislativo pode julgar (art. 52, I, CF); o Executivo legislar (art. 61, §1º, I, CF) e o Judiciário administrar (art. 93, X, CF). Essa figuração reflete um sistema de freios e contrapesos, onde apesar da harmonia e independência, esses poderes exercem funções alheias as suas e intervenções, mesmo que mínimas, nas esferas de atuação uns dos outros.

Com base no artigo 5º, XXXV, da CF, o Poder Judiciário tem competência para decidir com força de definitividade quaisquer litígios trazidos à sua apreciação, inclusive os de caráter administrativo. Entretanto, não é exclusiva essa competência, uma vez que com base no princípio da autotutela é cabível que a própria Administração Pública exerça controle sobre seus atos, tendo a possibilidade de anular os ilegais e de revogar os inoportunos, o que se deve à vinculação existente entre a Administração e a lei, podendo inclusive exercer o controle da legalidade de seus atos.

Tem-se assim que a autotutela administrativa é mais ampla que a tutela jurisdicional: em primeiro lugar, pela possibilidade de a Administração reapreciar seus atos de ofício, sem necessidade de provocação do particular, ao contrário do que ocorre no Judiciário, cuja atuação pressupõe necessariamente tal manifestação (princípio da inércia), em segundo pelos aspectos do ato que podem ser revistos, já que a Administração poderá reavaliá-los quanto à sua legalidade e ao seu mérito, ao passo que o Judiciário só deve apreciar, em linhas gerais, a legalidade do ato administrativo.

O presente trabalho tem como objetivo o estudo doutrinário e jurisprudencial sobre o princípio norteador dessa função atípica da Administração: o Princípio da Autotutela. Inicia-se com uma breve explanação sobre o mencionado princípio, seguindo-se com considerações sobre sua fundamentação normativa. Ato contínuo analisam-se suas limitações.

2. PRINCÍPIO DA AUTOTUTELA

Consiste este princípio no poder-dever que a Administração Pública tem de controlar seus próprios atos, revendo-os e anulando-os quando houverem sido praticados com alguma ilegalidade. Dessa forma, a autotutela funda-se no princípio da legalidade administrativa: se a Administração Pública só pode agir dentro da legalidade, é de se considerar que os atos administrativos que dela fujam devam ser revistos e anulados, sob pena de afronta ao ordenamento jurídico.

Tutelar funda-se em proteger e zelar algo. Em via de regra a busca pela tutela de direitos se dá através do Poder Judiciário. Porém, ao outorgar o direito-dever de autotutela ao Poder Administrativo, dispensa-se a obrigatoriedade da intervenção judicial, havendo assim, a proteção dos interesses públicos pela própria Administração ( MAZZA, 2014, p. 115).

No exercício deste poder-dever a Administração, atuando por provocação de particular ou de ofício, reaprecia os atos produzidos em seu âmbito, análise que pode incidir sobre a legalidade do ato ou no que tange seu mérito.

Quando da análise do ato quanto à sua legalidade, a decisão administrativa pode ser no sentido de sua conformidade com a ordem jurídica, caso em que será o ato terá confirmada sua validade, ou pela sua desconformidade, caso em que o ato será anulado.

Nas palavras de Maria Sylvia Zanella di Pietro, "é uma decorrência do princípio da legalidade: se a Administração Pública está sujeita à lei, cabe-lhe, evidentemente, o controle da legalidade”.

Já na análise do ato quanto ao seu mérito, poderá a Administração decidir que o ato permanece conveniente e oportuno com relação ao interesse público, caso em que permanecerá eficaz, ou que o ato assim não se mostra mais, caso em que será ele revogado pela Administração.

É nesse viés que apresenta-se o seguinte julgado do Supremo Tribunal Federal:

“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. INCORPORAÇÃO NO SERVIÇO ATIVO DA AERONÁUTICA APÓS A EDIÇÃO DA PORTARIA 1.104/GM3-64. AUSÊNCIA DO DIREITO À ANISTIA. PODER DE AUTOTUTELA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TEMPESTIVIDADE. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. I - Em razão do poder de autotutela, a Administração Pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos, quando eivados de vícios que tornem ilegais, ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade. II - Agravo regimental improvido.” (RMS 25596, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. RICARDO LEWANDOWSKI (ART. 38. IV, b, do RISTF), Primeira Turma, julgado em 01/04/2008, DJe-104 DIVULG 04-06-2009 PUBLIC 05-06-2009 EMENT VOL-02363-02 PP-00389) (grifo nosso)

Assim sendo, a autotutela abrange o poder de anular, convalidar e, ainda, o poder de revogar atos administrativos. Importando considerar que, mais que um poder, o exercício da autotutela afigura-se como um dever para a Administração Pública, reitere-se, dever de rever e anular seus atos administrativos, quando ilegais.

3. FUNDAMENTAÇÃO NORMATIVA

Observado no seio da Administração Pública, o princípio da autotutela encontra-se consagrado na Lei 9.784/99 em seu artigo 53, “A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos”.

Trata-se de um princípio infraconstitucional que decorre da supremacia do interesse público, visando uma maior celeridade na composição da ordem jurídica afetada pelo ato ilegal, bem como, buscando dar prestimosidade à proteção do interesse público, quando violado pelo ato administrativo inconveniente.

Nesse sentido, dispõe a Súmula 346, do Supremo Tribunal Federal que “A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”.

Segue mesmo rumo a Súmula 473, também da Suprema Corte, quando versa nos seguintes termos:

A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial. (STF Súmula nº 473 - 03/12/1969 - DJ de 10/12/1969, p. 5929; DJ de 11/12/1969, p. 5945; DJ de 12/12/1969, p. 5993. Republicação: DJ de 11/6/1970, p. 2381; DJ de 12/6/1970, p. 2405; DJ de 15/6/1970, p. 2437). Administração Pública - Anulação ou Revogação dos Seus Próprios Atos.

Isto posto, mostra-se consagrada no ordenamento jurídico brasileiro, a autotutela administrativa e sua importância ante aos institutos da segurança e da ordem jurídica.

4. LIMITES AO PRINCÍPIO DA AUTUTELA

Conquanto tal poder-dever seja de índole constitucional, seu exercício não pode se dar de forma absoluta e irrestrita, porquanto a invalidação de atos administrativos não garante, ela só, a restauração da ordem jurídica.

Não sendo a noção de autotutela ilimitada, questões de ordem objetiva, como o decorrer do tempo, ou subjetiva, como a boa-fé dos destinatários, restringem o exercício desse poder-dever. Um dos fundamentos mais controvertidos na limitação da autotutela administrativa deriva do princípio da segurança jurídica e das teorias que dele emanam.

Em sua concepção tradicional, a segurança jurídica é tida como um princípio geral do ordenamento jurídico, que, embora não tenha previsão constitucional expressa, é inerente ao Estado Democrático de Direito. Sua compreensão, antes de se vincular ao regime jurídico de Direito Administrativo, está submetida à concepção desse próprio Estado Democrático e do papel nele desempenhado pelos princípios jurídicos, como forma de garantir o exercício de direitos e liberdades fundamentais.

Trata-se do princípio da segurança jurídica, em seu conteúdo material impondo limites à autotutela administrativa. Portanto, do princípio da segurança jurídica vão emanar algumas regras de atuação para a Administração Pública que limitarão o poder-dever do Estado de exercício da autotutela, entre as quais se passa a analisar o dever de proteção à confiança legítima, a teoria dos atos próprios e o dever de respeito aos precedentes, sejam eles administrativos ou judiciais.

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Em nome da segurança jurídica e da estabilidade destas relações, a Lei n°9.784/99 traz em seu artigo 54 que excetuando a comprovação de má fé, que o direito de a Administração anular atos administrativos que tenham irradiado efeitos favoráveis aos seus destinatários, decai em cinco anos.

A matéria em questão também é tratada perante o Superior Tribunal de Justiça, ainda que sob o enfoque do princípio da segurança jurídica, como se depreende da seguinte ementa de um julgado da relatoria do Ministro Luiz Fux:

PROCESSUAL CIVIL – ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA – ANULAÇÃO DE LICITAÇÃO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA APÓS A CONCLUSÃO DAS OBRAS PELO PARTICULAR – AUSÊNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL – AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO – IMPOSSIBILIDADE – DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA – CINCO ANOS – PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS 1. O princípio da autotutela administrativa aplica-se à Administração Pública, por isso que a possibilidade de revisão de seus atos, seja por vícios de ilegalidade, seja por motivos de conveniência e oportunidade, na forma da Súmula nº 473 do eg. STF, que assim dispõe: “A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”. 2. Mandado de segurança impetrado contra ato do Delegado Geral de Polícia (publicado no DOE 18.08.1998), consubstanciado na anulação do procedimento licitatório – efetuado com vistas à reforma da Delegacia de Polícia e Cadeia Pública de Capão Bonito/SP – e invalidação do respectivo contrato celebrado com a empresa vencedora do certame em 06.12.1991, devidamente cumprido e executado. 3. A prerrogativa de rever seus atos (jurídicos), sem necessidade de tutela judicial, decorre do cognominado princípio da autotutela administrativa da Administração Pública. 4. Consoante cediço, a segurança jurídica é princípio basilar na salvaguarda da pacificidade e estabilidade das relações jurídicas, por isso que não é despiciendo que a segurança jurídica seja a base fundamental do Estado de Direito, elevada ao altiplano axiológico. Sob esse enfoque e na mesma trilha de pensamento, J. J. Gomes Canoltilho: “Na actual sociedade de risco cresce a necessidade de actos provisórios e actos precários a fim de a Administração poder reagir à alteração das situações fáticas e reorientar a prossecução do interesse público segundo os novos conhecimentos técnicos e científicos. Isto tem de articular-se com salvaguarda de outros princípios constitucionais, entre os quais se conta a proteção da confiança, a segurança jurídica, a boa-fé dos administrados e os direitos fundamentais” (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina). 5. A Corte Especial deste Tribunal, no julgamento dos Mandados de Segurança nºs 9.112/DF, 9.115/DF e 9.157/DF, na sessão realizada em 16.02.2005, decidiu que a aplicação da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, deverá ser irretroativa. Logo, o termo a quo do quinquênio decadencial, estabelecido no art. 54 da mencionada lei, contar-se-á da data de sua vigência, e não da data em que foram praticados os atos que se pretende anular. 6. O art. 54 da Lei nº 9.784/1999 dispõe sobre o prazo decadencial para a Administração Pública anular os seus atos, explicitando que: “O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé”. 7. In casu, além da prescrição ocorrente, consoante se infere do acórdão hostilizado à fl. 238, o ato anulatório não obedeceu o devido processo legal e as obras foram concluídas pelo vencedor da licitação, ora recorrido, o que revela a inviabilidade de a Administração anular a própria licitação sob o argumento de ilegalidade, mormente pela exigência de instauração do devido processo legal, em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 8. Deveras, a declaração de nulidade do contrato e eventual fixação de indenização também pressupõem observância ao princípio do contraditório, oportunizando a prévia oitiva do particular tanto no pertine ao desfazimento do ato administrativo quanto à eventual apuração de montante indenizatório. 9. O Supremo Tribunal Federal assentou premissa calcada nas cláusulas pétreas constitucionais do contraditório e do devido processo legal, que a anulação dos atos administrativos cuja formalização haja repercutido no âmbito dos interesses individuais deve ser precedida de ampla defesa (AgRg-RE 342.593, Rel. Min. Maurício Corrêia, DJ 14.11.2002; RE 158.543/RS, DJ 06.10.1995). Em consequência, não é absoluto o poder do administrador, conforme insinua a Súmula nº 473. 10. O Superior Tribunal de Justiça, versando a mesma questão, tem assentado que à Administração é lícito utilizar de seu poder de autotutela, o que lhe possibilita anular ou revogar seus próprios atos, quando eivados de nulidades. Entretanto, deve-se preservar a estabilidade das relações jurídicas firmadas, respeitando-se o direito adquirido e incorporado ao patrimônio material e moral do particular. Na esteira da doutrina clássica e consoante o consoante o art. 54, § 1º, da Lei nº 9.784/1999, o prazo decadencial para anulação dos atos administrativos é de 5 (cinco) anos da percepção do primeiro pagamento. 11. Ad argumentandum tantum, a teoria das nulidades, em sede de direito administrativo, assume relevante importância, no que pertine ao alcance dos efeitos decorrentes de inopinada nulidade, consoante se infere da ratio essendi do art. 59 da Lei nº 8.666/1991: “[...] A invalidação do contrato se orienta pelo princípio do prejuízo – vale dizer, aplica-se o princípio da proporcionalidade, para identificar a solução menos onerosa para o interesse público. Na ausência de prejuízo ao interesse público, não ocorre a invalidação. Suponha-se, por exemplo, que a contratação direta (sem prévia licitação) não tenha sido precedida das formalidades necessárias. No entanto e posteriormente, verifica-se que o fornecedor contratado era o único em condições de realizar o fornecimento. Não haveria cabimento em promover a anulação, desfazer os atos praticados e, em sequência, praticar novamente o mesmo e exato ato realizado anteriormente [...]”

(JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002). 12. Recurso especial desprovido. (STJ, REsp 658.130/SP, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, J. 05.09.2006, DJ 28.09.2006, p. 195 – grifos nossos)   Tais julgados demonstram, assim, que a autotutela e o poder-dever da Administração Pública de anular ou revogar seus próprios atos não pode ser exercido em detrimento da confiança dos administrados, a qual deve ser sopesada, diante do caso concreto, para delimitar a responsabilidade do Estado por seus atos e a possibilidade de salvaguardar tais atos ou seus efeitos, preservando a estabilidade das relações jurídicas firmadas.

Para mais da limitação temporal imposta, e também em respeito à segurança jurídica, a atuação da Administração Pública está subordinada às restrições impostas por seu próprio comportamento, não podendo contradizer as suas decisões anteriores em casos análogos, além também, de submeter-se às deliberações definitivas do Judiciário.

Sendo a jurisdição pátria una e não podendo nenhuma lesão ou ameaça de lesão a direito ser excluída da apreciação do Judiciário (art. 5º, XXXV, Constituição da República de 1988), os precedentes judiciais determinam a atuação da Administração Pública e servem de fundamento para o controle dos atos administrativos e consequentemente para a limitação do exercício da autotutela.

Sendo assim, uma vez fixado de forma coesa e pacífica um determinado entendimento pelo Judiciário, a Administração Pública deve acatá-lo, buscando preservar os institutos democráticos (e principiológicos), da segurança jurídica e da confiança legítima. Logo, não é possível que o Poder Público anule ou revogue atos administrativos que foram praticados em consonância com o entendimento consolidado do Judiciário.

São, pois, os precedentes judiciais, ao mesmo tempo, limites à autotutela administrativa e uma espécie de controle dos atos da Administração Pública, uma vez que a sua inobservância pode conduzir, de acordo com o caso concreto, à invalidação desses atos. Isso em função da inafastável subordinação da atuação administrativa às decisões do Judiciário, principalmente quando essas decisões são tomadas em processos de controle concentrado de constitucionalidade de normas ou quando se tornam enunciados vinculantes, nos termos da Constituição Federal.

Embora necessária ao equilíbrio e à harmonia dos Poderes, essa obediência não desobriga a Administração Pública do seu dever de decidir, todas as questões que lhe surgem.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Consoante ao exposto demonstra-se consagrado o princípio da autotutela no Ordenamento Jurídico Brasileiro em específico à Administração Pública.

Ao abranger o poder de anular, convalidar e, ainda, o poder de revogar atos administrativos, a autotutela administrativa contribui para não só para a estruturação da Administração Pública, mas também para o regular funcionamento dos demais poderes e do ordenamento jurídico.

É válido ressaltar que, mais que um poder, o exercício da autotutela afigura-se como um dever para a Administração Pública, reitere-se, dever de rever e anular seus atos administrativos, quando ilegais.

Entretanto, não sendo a noção de autotutela ilimitada, encontra contrapontos no lapso temporal, na boa-fé dos destinatários e no princípio da segurança jurídica e da estabilidade destas relações. Tratando-se pois de um poder-dever fundamental para o equilíbrio das relações administrativas-sociais, na busca pela primazia dos interesses públicos.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n°346. Administração Pública - Declaração da Nulidade dos Seus Próprios Atos. Disponível em: <http://. Acesso em 02 nov. 2014.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n°473. Administração Pública - Anulação ou Revogação dos Seus Próprios Atos. Disponível em:<http://. Acesso em 02 nov. 2014.

BRASIL. Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Diário Oficial da república Federativa do Brasil. Brasília, DF. Disponível em: http://www.in.gov.br. Acesso em: 02 nov. 2014.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002.

MAZZA, Alexandre. Manual de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.


Sobre os autores
Danielle Costa Tinoco

Acadêmica de Direito da Universidade Federal do Maranhão - UFMA.

Ana Izabel Miranda Coelho

Acadêmico do 7° período do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão.

Drissana Emília da Silva Cunha

Acadêmico do 7° período do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho apresentado à disciplina Direito Administrativo II do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão - UFMA sob orientação do Professor Raimundo Nonato Serra Campos Filho, professor do curso de Direito da referida universidade, para obtenção da 3° nota avaliativa.

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