Princípio da boa-fé objetivo nos contratos eletrônicos

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O objetivo do presente artigo é o de procurar demonstrar como é necessária a presença da boa-fé nos contratos, principalmente nos chamados Contratos Eletrônicos, em que a proteção do consumidor no comércio eletrônico se torna vulnerável.

RESUMO

O objetivo do presente artigo é o de procurar demonstrar como é necessária a presença da boa-fé nos contratos, principalmente nos chamados Contratos Eletrônicos em que a proteção do consumidor no comércio eletrônico se torna vulnerável. Devendo então tal princípio, não constar apenas na concretização do contrato, mas em todas as fases do negocio jurídico, vale dizer, as fases ‘pré-contratual’, incluindo a negociação e formatação da proposta, fase ‘intra-contratual’, ou seja, seu aperfeiçoamento e ‘pós-contratual’ que ocorre depois de ultimada a fase negocial, quando da colheita de efeitos e consequente implemento das obrigações resultantes do acordo. Princípio este de uma grandeza, em que consiste no pressuposto de que ambas as partes estão agindo com lealdade e espirito de colaboração em todas as fases de formação. Visando ainda, mostrar a importância deste princípio no ordenamento jurídico vigente, fruto de um avanço legislativo relativo à proteção dos sujeitos nas relações obrigacionais, tendo em vista a necessidade de intervir nas relações individuais dos sujeitos que compõem a relação contratual, para assim possa ter um pacto de igualdade para ambas as partes contratantes.

Palavras-chave: boa-fé; contrato; partes contratantes; e, proteção.

INTRODUÇÃO

O contrato é a forma mais habitual e a mais relevante fonte obrigacional, devido às suas múltiplas formas e inúmeras repercussões no mundo jurídico, sendo fonte de obrigação o fato que lhe dá origem. Podemos conceituar o Contrato Eletrônico como uma forma de transação comercial entre ausentes, com a transmissão e a recepção bilateral de dados, informações, produtos, pagamentos, serviços e imagens de forma eletrônica, não se restringindo apenas as redes de computadores, ou seja, internet, embora seja esse o enfoque, mas também a linhas telefônicas, televisões a cabo (pay-per-view) e qualquer outra atividade em que se utilizam as redes eletrônicas. Assim, o comércio eletrônico é uma nova modalidade de relação comercial e de consumo, possibilitando a comunicação e a interação em velocidade real de pessoas com culturas, origens, etnias de todo o planeta.

O comercio exerceu uma colaboração muito importante em relação às sociedades, no desenvolvimento de novas tecnologias, técnicas e, principalmente, na responsabilidade de implantação de infra-estrutura como por exemplo as estradas, ferrovias, portos, pontes, com a intenção de facilitar o fluxo de mercadorias em nível mundial, até resultar no processo de globalização. Umas destas novas técnicas é a utilização do Comércio Eletrônico que surgiu com o advento da Internet que teve sua criação em meados de 1969, desenvolvida pela empresa ARPA (Advanced Research and Projects Agency) nos tempos remotos da Guerra Fria com o nome de ArphaNet para manter a comunicação das bases militares dos Estados Unidos.

A história da Internet no Brasil começou bem mais tarde. Somente em 1991 com a RNP (Rede Nacional de Pesquisa), uma operação acadêmica subordinada ao (Ministério de Ciência e Tecnologia).

O QUE É O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ

Um dos mais importantes instrumentos tecnológicos de implemento da racionalidade econômica e valores de justiça que cercam os conflitos de interesses entre as partes de um contrato são os princípios do direito contratual. Trata-se de normas de grande generalidade, expressas em dispositivos de direito positivo ou deles extraídos por via argumentativa, as quais ajudam a nortear os juízes na apreciação de demandas que versam sobre a existência, validade e cumprimento de contratos.

O contrato nada mais é do que uma conversão das vontades das partes em acordarem, visando-se a um fim em comum. Posto isto, se torna lógico que exista um pressuposto para ambas as partes, qual seja, a boa-fé com relação aos termos do contrato. O Princípio da Boa-fé previsto no artigo 422 do atual Código Civil é uma norma legal aberta, ou seja, uma norma cuja aplicação exige mais do que a simples subsunção do fato à norma, necessitando, para tanto, da utilização de uma técnica judicial apropriada para se valorar aquilo que deve ser entendido como lealdade de conduta, ou boa-fé, de acordo com as circunstancias especificas de cada caso. Observando-se essa definição simplificada do que é boa-fé objetiva, verifica-se tratar-se de uma norma que demanda certo esforço e perícia por parte do julgador quando de sua aplicação para solucionar uma determinada demanda.

BREVE HISTÓRICO

A noção de boa-fé, ao que consta historicamente, foi originada no Direito Romano, denominada de bona fides. Em Roma, partindo-se de uma acentuada amplitude semântica, pode-se afirmar que: a fides seria antes um conceito ético do que propriamente uma expressão jurídica da técnica. Sua “juridicização” só iria ocorrer com o incremento do comércio e o desenvolvimento do jus gentium, complexo jurídico aplicável a romanos e a estrangeiros.

Já o Direito Alemão, a noção de boa-fé traduzia-se na fórmula do Treu und Glauben (lealdade e confiança), regra objetiva, que deveria ser observada nas relações jurídicas em geral.

Também o Direito Canônico enfrentaria o tema, em termos semelhantes aos do Direito Alemão, embora introduzisse um poderoso polo de significados, a boa-fé era vista como ausência de pecado, ou seja, como o estado contraposto à má-fé.

O Código Civil brasileiro de 1916 tratou, unicamente, da boa-fé subjetiva, que era relacionada com um fato psicológico do sujeito, no qual este acreditava estar realizando um negócio jurídico em conformidade, ou seja, caracterizava-se pela simples ausência de má-fé. Nessa época, a boa-fé subjetiva aplicava-se, principalmente em matéria possessória. Ainda hoje essa concepção é válida no ordenamento jurídico brasileiro, sendo exemplo o artigo 1.201 do Código Civil brasileiro de 2002:

Art. 1.201. É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou o obstáculo que impede a aquisição da coisa.

Parágrafo único. O possuidor com justo título tem por si a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção.

O Código Civil de 2002 passou a adotar a boa-fé sob duas perspectivas: a subjetiva (ou psicológica) e a objetiva (ou ética). Em relação a esta, passou-se a considerar como um princípio norteador na estruturação e na formulação das regras do Direito Obrigacional e do Direito Contratual, deixando a boa-fé de ser unicamente um Princípio Geral do Direito.

Assim a boa-fé objetiva deixa de ser um conceito meramente ético, transmudando-se em conceito jurídico e econômico, graças à função social do contrato, à livre iniciativa e aos direitos do consumidor.

BOA-FÉ OBJETIVA E SUBJETVA

Antes, porém, de aprofundar-se neste Princípio da Boa-fé Objetiva aplicada nos Contratos Eletrônicos, faz-se necessário que se estabeleça uma diferença entre a boa-fé objetiva, também chamada de concepção ética e a subjetiva, também denominada pela doutrina de concepção psicológica da boa-fé.

A boa-fé subjetiva esteve presente no Código de 1916, com a natureza de regra de interpretação do negócio jurídico. Diz respeito ao conhecimento ou à ignorância da pessoa em relação a certos fatos, sendo levada em consideração pelo ordenamento jurídico para os fins específicos da situação regulada. Serve à proteção daquele que tem a consciência de estar agindo conforme o direito, apesar de ser outra a realidade. A expressão “boa-fé subjetiva” denota estado de consciência ou convencimento individual da parte ao agir em conformidade ao direito, sendo aplicável, em regra, ao campo dos direitos reais, especialmente em matéria possessória. Diz-se “subjetiva” justamente porque, para a sua aplicação, deve o interprete considerar a intenção do sujeito da relação jurídica, o seu estado psicológico ou íntima convicção.

Desde os primórdios do Direito Romano, já se cogitava outra boa-fé, aquela direcionada à conduta das partes, principalmente nas relações negociais e contratuais. Com o surgimento do jusnaturalismo, a boa-fé ganhou no Direito Comparado, uma nova faceta, relacionada com a conduta dos negociantes e denominada boa-fé objetiva. Da subjetivação saltou-se para a objetivação, o que é consolidado pelo ordenamento europeu. Com esse salto, alguns códigos da chamada era moderna fazem menção a essa nova faceta da boa-fé, normas estas que serviram como marco teórico para o Código Civil brasileiro de 2002.

Pois bem, como já destacado, tornou-se comum afirmar que a boa-fé objetiva, conceituada como sendo exigência de conduta leal dos contratantes, está relacionada com os deveres anexos ou laterais de conduta como, por exemplo, a proteção, a cooperação e a informação, que são ligados a qualquer negócio jurídico, não havendo sequer a necessidade de previsão no instrumento negocial. Os deveres de proteção impõem a cada parte o respeito à pessoa, à família e ao patrimônio da outra parte contratante, os deveres de cooperação obrigam as partes a auxiliarem-se mutuamente, afastando as dificuldades que estiver ao seu alcance e minimizando os custos para a outra, na busca da realização do adimplemento. Os deveres de informação e esclarecimento obrigam as partes à informação mútua de todos os aspectos atinentes ao vínculo de ocorrências que com ele tenham relação e, ainda, dos efeitos que da execução possa advir. Conforme explica Stolze (2011, p. 103):

É importante ressaltar que tais deveres são impostos tanto ao sujeito ativo quanto ao sujeito passivo da relação jurídica obrigacional, pois referem-se, em verdade, à exata satisfação dos interesses envolvidos na obrigação assumida, por força da boa-fé contratual.

Se as ações ou omissões de um sujeito denunciam ou sugerem desrespeito aos direitos do outro contratante, considera-se que ele descumpriu o dever geral de boa-fé objetiva. Imagine que, antes de anunciar a venda da casa, o vendedor mandou pintá-la com o único objetivo de disfarçar uma séria inflação; se ele não avisar os potenciais compradores do problema, configura-se a ausência de boa-fé objetiva.

Ao contrario ocorre na boa-fé subjetiva, conforme afirma Gonçalves (2004), deve o intérprete considerar a intenção do sujeito da relação jurídica, o seu estado psicológico ou íntima convicção.

COMO OCORRE A APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA NOS CONTRATOS ELETÔNICOS

É importante ressaltar que, tem que haver uma relação simultânea entre o contrato eletrônico e também uma colaboração mútua entre as partes, as quais devem guardar os conceitos de confiança, respeito e lealdade entre si, para fazer valer a segurança dos negócios jurídicos. Princípio este, que tem que estar presente desde a fase pré-contratutal até a finalização do contrato. Além do mais, o princípio da boa-fé objetiva, conforme dispõe o art. 422 do código civil, é a base de qualquer negócio jurídico, havendo a ausência deste princípio acima suscitado, haverá um vício na manifestação da vontade e, consequentemente, existirá uma relação contratual viciada.

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            Dentro dos contratos eletrônicos este princípio ganha certo destaque, pois tais contratos envolvem a complexidade das tecnologias digitais, as quais muitas pessoas ainda desconhecem seu completo funcionamento e ainda não estão habituadas a manejá-las. Portanto, estas pessoas se tornam vulneráveis a fraudes e poderiam ser induzidas ao erro ou fazer determinado acordo não condizente com sua vontade.

Assim, este princípio deve prevalecer principalmente quando houver uma elevada disparidade entre as partes, pois para que sejam respeitadas as vontades dos agentes contratantes é necessário que exista recíproca lealdade e honestidade desde o período pré-contratual até a fase posterior da execução dos contratos, quando este ainda puder gerar efeitos.

Para que se tenha a devida segurança jurídica nas relações derivadas de meio eletrônico, a aplicação do princípio da boa-fé objetiva é imprescindível, até mesmo pelo fato de não haver legislação específica regulando as práticas em meio virtual, logo, a honestidade dos agentes contratantes é indispensável para nortear eventuais contratos.

Quanto maiores forem as diferenças sociais e econômicas entre os contratantes, maior será o papel da boa-fé objetiva como instrumento de controle da vontade de contratante mais forte e, consequentemente, proteção do lado mais fraco da relação jurídica contratual.

De acordo com Nalin (2001, p. 196):

A aplicação do principio da boa-fé objetiva leva a que se espere do contratante, estando em curso a execução da prestação, que atue de modo diligente e leal vindo a satisfazer a confiança depositada na declaração de vontade originalmente emitida, quando da formação do negócio.

O princípio da boa-fé permeia todas as ações humanas, sendo regra aos próprios valores éticos e morais da sociedade. Sendo assim, pode-se afirmar que, dentre os princípios fundamentais do direito contratual também aplicados aos contratos eletrônicos, o princípio da boa-fé objetiva aparece como princípio vital do sistema tendo em vista a falta de legislação específica que regulamente as contratações em meio eletrônico, a boa-fé recobre-se de ampla condição de correção de abusos e injustiças, garantindo a segurança das relações jurídicas contratuais virtuais.

DESCRIÇÃO DO CONTRATO ELETRÔNICO

Os pressupostos e requisitos essenciais à formação dos contratos eletrônicos são exatamente os mesmos aplicáveis a todos os demais contratos: capacidade das partes, objeto possível, forma prescrita ou não defesa em lei e consentimento. Nos contratos eletrônicos estes requisitos se tornam difíceis de serem observados, principalmente no que tange a capacidade das partes. Ainda não existe uma legislação específica para disciplinar os requisitos de validade do contrato eletrônico, mas mesmo assim, alguns requisitos devem ser observados.

O conceito de contrato eletrônico não é unânime na doutrina, variando desde sua nomenclatura até os elementos característicos. Porém, quanto à nomenclatura utilizada, por ser a mais difundida no Brasil e na comunidade internacional, é mais apropriado utilizar o termo contrato “eletrônico” do que contrato “virtual”.

Deve-se lembrar de que “eletrônico” é o meio pelo qual as partes escolheram para efetivar o contrato, tendo em vista que, em geral, a lei não exige forma específica, o contrato pode ser realizado sob qualquer forma, desde que não contrária à lei.

Há que distinguir os contratos eletrônicos dos contratos da informática, pois esses não são necessariamente efetuados através do computador, mas o objeto de sua prestação é voltado para o ambiente de digital, tais como os contratos de desenvolvimento de websites e de divulgação de publicidade na internet. Da mesma forma, diferenciam-se os contratos concluídos pelo computador dos executados por computador. Nos primeiros, o computador é um instrumento para a formação do contrato, ou seja, ele é uma parte necessária para a formação da relação jurídica. Já nos contratos executados por computador, o contrato não é efetivado de forma eletrônica, mas a execução do objeto contratual é feita por meio do computador. O contrato fora firmado de forma comum, mas deverá ser executado eletronicamente.

A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NO COMÉRCIO ELETRÔNICO

O principal objetivo das relações de consumo é o atendimento das necessidades dos consumidores em geral, entretanto, deve-se preocupar também com a transparência e harmonia destas relações, a fim de tranquilizar e conciliar interesses que eventualmente esteja em conflito.

A proteção do consumidor é consequência direta das modificações havidas nos últimos tempos nas relações de consumo, motivo que deixou o consumidor vulnerável diante das novas situações decorrentes desta evolução.

Quanto maior forem as diferenças sociais e econômicas entre os contratantes, maior será o papel da Boa-fé Objetiva como instrumento de controle da vontade do contratante mais forte, e, consequentemente, proteção do lado mais fraco da relação jurídica contratual.

LEGISLAÇÃO APLICAVÉL AOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

Os contratos eletrônicos ainda não se encontram regulamentados por lei no Brasil. Dada a vulnerabilidade do mundo virtual, há exposição de riscos aos contratantes que possibilitam os mais variados tipos de fraudes, mas a aplicação das normas consumeristas e do Princípio da Boa-fé Objetiva aparecem como meio vital para corrigir fraudes, abusos e injustiças, a fim de garantir maior segurança nas relações jurídicas contratuais virtuais.

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) regula as relações de consumo e sua abrangência esta voltada às relações negociais, das quais participam, obrigatoriamente, o consumidor e fornecedor, transacionando produtos e serviços, excluindo destes últimos os gratuitos e os trabalhistas.

O princípio da boa-fé objetiva está presente no CDC em seu artigo 4º, inciso III, e 51, inciso IV:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

(...)

III- harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;

(...)

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

IV- estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.

(...)

Até que o Congresso Nacional aprove uma legislação referente ao comércio eletrônico, o que prevalece nas relações de consumo é o Código de Defesa do Consumidor, o qual embora não tenha um capítulo específico para negócios virtuais, tem sido adaptado a essa realidade por nossas autoridades jurisdicionais, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça.

CELEBRAÇÃO DO CONTRATO ELETRÔNICO DE CONSUMO

Os contratos eletrônicos de consumo são aqueles nos quais a manifestação de vontade das partes (oferta e aceitação) ocorre, exclusivamente, em meio eletrônico, à distância, objetivando relações jurídicas de consumo, tendo em um pólo o fornecedor e em outro o consumidor transacionando produto ou serviço.

Na internet se produz um processo especial de contratação, denominado de on line ou também conhecido como comércio eletrônico assemelhando-se a compra e venda entre ausentes.

No estagio atual, a obrigação do empresário que se vale do comércio eletrônico para vender os seus produtos ou serviços para com os consumidores é a mesma que o Código de Defesa do Consumidor atribui aos fornecedores em geral. A transação eletrônica realizada entre brasileiros está, assim, sujeita aos mesmos princípios e regras aplicáveis aos demais contratos celebrados.

O direito de resolução, ou seja, o arrependimento da celebração do contrato eletrônico é permitido no Direito brasileiro. Os contratos eletrônicos realizados via Internet equiparam-se aos contratos a distância, fora do estabelecimento comercial, sendo assim, aplica-se o disposto no artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único: se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

A dificuldade dos contratos eletrônicos é definir o local de sua formação, visto que estes contratos não são realizados num espaço físico determinado, mas sim em um meio virtual. Contudo, à esta modalidade contratual é aplicado a regra geral, existente no Código Civil e na LICC, onde se considera o local de formação do contrato o lugar onde reside o proponente, ou seja, quem realizou a proposta.

FORMAÇÃO E CONCLUSÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS

A manifestação da vontade é o primeiro e mais importante requisito de existência do negocio jurídico. Porém de acordo com Gonçalves (2011, p. 717) “o contrato resulta de duas manifestações de vontade: a proposta e a aceitação. A primeira, também chamada de oferta, policitação ou oblação, dá início à formação do contrato e não depende, em regra, de forma especial”.

Nem sempre, no entanto, o contrato nasce instantaneamente de uma proposta seguida de uma imediata aceitação. Na maior parte dos casos, a oferta é antecedida de uma fase, às vezes prolongada, de negociações preliminares caracterizada por debates, conversações, sondagens. Embora as negociações preliminares não gerem, por si mesmas, obrigações para qualquer um dos participantes, elas fazem surgir, entretanto, deveres jurídicos para os contraentes, decorrentes da incidência do Princípio da Boa-fé, sendo os principais deveres de lealdade e correção, de informação, de proteção e cuidado e de sigilo. A violação desses deveres durante o transcurso das negociações é o que gera a responsabilidade do contraente, tenha sido ou não celebrado o contrato.

Em relação aos contratos eletrônicos, dentre os tipos de resposta, a mais conhecida é a oferta de produtos e serviços provenientes de sites, a qual, via de regra, é considerada uma oferta permanente ao público. Além dessa, existem ofertas realizadas pelo envio de mensagens eletrônicas, muitas vezes caracterizadas como spams, e os casos em que duas pessoas contratam através de comunicação direta e instantânea.

É comum, por exemplo, sites comerciais venderem produtos que não mais dispõem em estoque, descumprindo o prazo de entrega. Isto pode ocorrer, quer pela falha do sistema que atualiza o banco de dados de produtos, ou por mera negligencia dos responsáveis de páginas, incorrendo o comprador a erro, pois a proposta diverge da real possibilidade de cumprimento.

Os contratos em geral, assim como nos demais negócios jurídicos, tem também um ciclo, em que se inicia com o acordo de vontades, produzem seus efeitos que lhe são próprios e por fim se extinguem.

O momento da conclusão do contrato observar-se-á duas regras, a primeira se ele for celebrado entre ausentes ou ainda se for formado entra presentes.

Se o contrato for celebrado entre presentes, a proposta poderá estipular ou não prazo para a aceitação, caso isto não ocorra, deverá ser manifestada imediatamente, sob pena de perder a força vinculativa. Se estipular o prazo, a aceitação deverá operar-se dentro dele, podendo se desvincular o proponente.

Quando o contrato é celebrado entre ausentes, por correspondência ou intermediários, a resposta leva algum tempo para chegar ao conhecimento do proponente e passa por diversas fases. O artigo 434 do Código Civil acolheu expressamente a Teoria da Expedição em neste sentido define Gonçalves (2011. P. 725) “não basta a redação da resposta, sendo necessário que tenha sido expedida, isto é, saído do alcance e controle do oblato”, ao afirmar que os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida. Proclama, com efeito, o aludido dispositivo:

Art. 434. Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto:

I- No caso do artigo antecedente;

II- Se o proponente se houver comprometido a esperar resposta;

III- Se ela não chegar no prazo convencionado.

A extinção contratual, em regra se dá pela execução, seja ela instantânea, diferida ou continuada. O cumprimento da prestação libera o devedor e satisfaz o credor, sendo este o meio normal de extinção do contrato. A quitação do contrato se da através de instrumento particular, em que constara todas as características dos contratantes e da correspondente obrigação.

CONCLUSÃO

A Internet revolucionou quanto à forma de negociação entre as empresas e os consumidores, incentivando, desta forma, o grande crescimento do comércio eletrônico. A tecnologia cada vez mais elimina as distâncias físicas entre consumidor e fornecedor, procurando facilitar a vida da sociedade. Nesse sentido, os contratos eletrônicos vêm em encontro com as necessidades atuais.

A manifestação da vontade pode valer-se agora de meios eletrônicos para manifestar-se. Nestes contratos interativos, ou seja, os eletrônicos, pelo fato de não haver possibilidade de discussão ou alteração de condições, são caracterizados como contratos de adesão, pelos quais somente uma das partes contratantes, em que por regra será o fornecedor, onde este estabelece o termo e o conteúdo das cláusulas dos respectivos contratos.

Os contratos eletrônicos são caracterizados por sua própria forma, composta de informações transmitidas virtualmente através da internet, porém, utilizam-se dos mesmos requisitos de validade e eficácia, dos contratos tradicionais, diferenciando-se apenas em virtude dos meios virtuais em que são celebrados.

A estes contratos, são aplicadas as regras do Código de Defesa do Consumidor, quando figurarem como contratos de consumo. Concluímos, portanto, que o meio digital vem ganhando seu espaço e logo passará a ser o meio mais utilizado para manifestação de vontade. Sendo necessária uma legislação específica e sensível aos anseios da comunidade virtual.

O Princípio da Boa-fé, objeto de estudo, atualmente, com o seu amparo constitucional, assenta se na cláusula geral de proteção da pessoa humana, cedendo-se o velho espaço do dogma da autonomia da vontade para boa-fé objetiva, visando coibir praticas contratuais abusivas, possibilitando a revisão contratual por onerosidade excessiva, protegendo a parte mais vulnerável do contrato.

Por ser ainda uma modalidade contratual, da qual ainda não se encontra regulamentada no Ordenamento Jurídico brasileiro, percebe-se que quanto maior for as diferenças sociais e econômicas entre as partes, maior será o papel da boa-fé objetiva como instrumento de controle da vontade do contratante mais forte, e, consequentemente, proteção do lado mais fraco da relação jurídica.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Código Civil. 46º ed. São Paulo. Saraiva, 1995.

BRASIL, Código de Defesa do Consumidor. 15º ed. São Paulo. Saraiva, 1990.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. São Paulo. Saraiva, 2011. V. 3.

NALIN, Paulo. Do Contrato: Conceito Pós Moderno. Curitiba. Juruá, 2001.

STOLZE, Pablo. Novo Curso de Direito Civil. Vol. IV. 7º Ed. Editora Saraiva. 2011.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Vol. Único. Editora Método. 2011.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil para Concursos Públicos. Vol. 2. 3º Ed. Editora Método. 2008.

Sobre o autor
João Márcio Fernandes dos Reis

Advogado especialista em Direito do Consumidor, Ações Indenizatórias em geral, Ações de Família, Ações Trabalhistas, Revisionais etc...

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo elaborado para Trabalho de Conclusão de Curso de Direito no ano de 2015.

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