O vocábulo família, vem do Latim, e significa “família, grupo doméstico”, que inicialmente incluía os servos da casa, os FAMULI.[1] Mas sentido da palavra família possui significados diferentes nas diversas áreas das ciências humanas.
É inquestionável a importância da família para a vida em sociedade, os grupos familiares, podem inclusive, serem considerados o início da própria vida em sociedade, pois mesmo antes do período neolítico e do homem deixar de ser nômade, as pessoas com o ancestral em comum, permaneciam juntas em unidades sociais[2].
É possível entender claramente a força das entidades familiares com o surgimento dos clã, que eram grupos de pessoas unidas pela descendência de ancestrais comuns,[3] que tinham o domínio de regiões, chegando, inclusive, a ser uma força bélica impressionante, como ocorreu com o clã de Gengis Khan.[4]
Com as sociedades tornando-se cada vez mais numerosas e complexas, os laços sanguíneos ficaram cada vez mais dissolvidos, sendo praticamente fazer a conexão entre até um ancestral comum.
No antigo império romano, os juristas criaram a expressão família natural, que seria formada por um casal e seus filhos, sem levar em conta os ancestrais, como faziam os clãs. A família natural romana tinha sua origem pela relação jurídica estabelecida entre o casal no dia de seu matrimonio.
O casamento da Roma antiga era dividido em confarreatio, o equivalente ao nosso atual casamento religioso, restrito as pessoas de posses. Ocorria uma cerimônia onde eram feitas ofertadas aos deuses; coemptio, era o casamento dos plebeus, que se tarava de uma venta fictícia, onde o pai, vendia ao marido o poder sobre sua filha e o usos, que consistia na aquisição da mulher pela posse, após um ano de convivência marital[5].
Rodrigo da Cunha Pereira[6] resume a evolução da família ao mencionar três fases históricas, o estado selvagem, barbárie e civilização.
“No estado selvagem, os homens apropriam-se dos produtos da natureza prontos para serem utilizados. Aparece o arco e a flecha e, consequentemente, a caça. É aí que a linguagem começa a ser articulada. Na barbárie, introduz-se a cerâmica, a domesticação de animais, agricultura e aprende-se a incrementar a produção da natureza por meio do trabalho humano; na civilização o homem continua aprendendo a elaborar os produtos da natureza: é o período da indústria e da arte.”
A ideia da família natural romana foi modificada pela Igreja Católica, que transformou a união entre homem e mulher em um instituição sacralizada, indissolúvel, um ato solene e única de se formar um família cristã[7].
“Cânon 1055, §1º: A aliança matrimonial, pela qual o homem e a mulher constituem entre si uma comunhão da vida toda, é ordenada por sua índole natural ao bem dos cônjuges e à geração e educação da prole, e foi elevada, entre os batizados, à dignidade do sacramento.”[8]
Vale dizer, que é requisito para a convalidação do casamento, que os nubentes tenham relações carnais, podem o casamento ser anulado se a mesma não ocorrer. Tal preceito trás como fundamentação a associação feita pela igreja entre matrimonio e procriação, sendo esse o principal objetivo da união.
Entendia-se dessa forma que o fim do matrimônio enquanto instituição era a procriação e, por conseguinte, a educação da prole, o que tornava justificável a prática do ato sexual dos cônjuges, autorizado no seio dessa instituição como remédio (...)[9].
Outro ponto importante tratado pela igreja católica é impossibilidade de dissolução da união da união independentemente de haver ou não afeto entre os cônjuges, o Direito Canônico estabelece que o casamento é “indissolúvel, isto é, não se pode dissolver por vontade dos cônjuges, exceto pela morte[10]”. Tal ideia se perpetuou durante mundo tempo no ordenamento jurídico de vários países que tinham grande influência da religião católica, como o Brasil, por exemplo.
Aqui no Brasil, por muito tempo, a Igreja Católica foi titular quase que absoluta dos direitos matrimoniais; pelo Decreto de 3 de novembro de 1827 os princípios do direito canônico regiam todo e qualquer ato nupcial, com base nas disposições do Concílio Tridentino e da Constituição do Arcebispado da Bahia[11].
A Constituição Federal de 88 trouxe um tratamento especial ao Direito de Família, com um capítulo que trata apenas desse ramo do direito (Capítulo VII do Título VIII), implantando profundas mudanças. Ao contrário do modelo autoritário e patriarcal trazido pelo Código Civil de 16, o modelo de família trazido do texto constitucional é fundado em princípios como a igualdade, solidariedade e do respeito à dignidade da pessoa humana, fundamentos e ao mesmo tempo objetivos do Estado brasileiro[12].
Três grandes inovações foram o reconhecimento, como entidade familiar, da união estável entre o homem e a mulher, igualar o homem e a mulher na sociedade conjugal, e vedar quaisquer diferenças de direitos, de qualificação ou de tratamento entre os filhos havidos na constância do casamento, fora dele ou por adoção[13].
A Constituição de 1988 realizou enorme progresso na conceituação e tutela da família. Não aboliu o casamento como forma ideal de regulamentação, mas também não marginalizou a família natural como realidade social digna de tutela jurídica. Assim, a família que realiza a função de célula provém do casamento, como a que resulta da “união estável entre o homem e a mulher” (art. 226, §3º), assim como a que se estabelece entre “qualquer dos pais e seus descendentes”, pouco importando a existência, ou não, de casamento entre os genitores (art. 226, §4º)[14].
Ao colocar no mesmo patamar dos filhos de origem sanguínea, os adotados e reconhecer a união estável como família, a Constituição Federal de 88 foi o primeiro dispositivo jurídico brasileiro a reconhecer o afeto como formar de origem da família, sem distinção aos laços decorrentes do afeto ou de sangue.
Na transformação da família e de seu Direito, o transcurso apanha uma 'comunidade de sangue' e celebra, ao final deste século, a possibilidade de uma 'comunidade de afeto'. Novos modos de definir o próprio Direito de Família. Direito esse não imune à família como refúgio afetivo, centro de intercâmbio pessoal e emanador da felicidade possível (...). Comunhão que valoriza o afeto, afeição que recoloca novo sangue para correr nas veias do renovado parentesco, informado pela substância de sua própria razão de ser e não apenas pelos vínculos formais ou consangüíneos. Tolerância que compreende o convívio de identidades, espectro cultural, sem supremacia desmedida, sem diferenças discriminatórias, sem aniquilamentos. Tolerância que supõe possibilidade e limites. Um tripé que, feito desenho, pode-se mostrar apto a abrir portas e escancarar novas questões. Eis, então, o direito ao refúgio afetivo[15].
Após toda essa evolução no entendimento jurídico de família, alguns legisladores retrógrados e conservadores, tentam aprovar o chamado Estatuto da Família, que define como família, a união de pessoas de sexos diferentes e seus descendentes, numa tentativa clara de suprimir os direitos arduamente conquistados pelas famílias homoafetivas, chegando a atingir as famílias monoparentais, podendo prejudicar ainda mais o sistema de adoção brasileiro.
Bibliografia
https://www.significados.com.br/cla/
http://www.infoescola.com/historia/pre-historia/
http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/politica/170332
http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=2728
http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6792
http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6379
http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/familia/
http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/politica/170332
https://pt.wikipedia.org/wiki/Cl%C3%A3
https://pt.wikipedia.org/wiki/Gengis_Khan
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CASTRO, A. M. O. de. A família, a sociedade e o direito. In: ELESBÃO, E. C. (Coord.). Pessoa, gênero e família: Uma visão integrada do Direito. Porto Alegre: Livaria do Advogado, 2002.
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FACHIN apud CUNHA, M. E. de O. O afeto face ao princípio da dignidade da pessoa humana e seus efeitos jurídicos no Direito de Família. Instituto Brasileiro de Direito de Família, Belo Horizonte, jan. 2009. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=482>. Acesso em: 20 dezembro. 2016.
[1] http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/familia/
[2] http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/politica/170332
[3] https://pt.wikipedia.org/wiki/Cl%C3%A3
[4] https://pt.wikipedia.org/wiki/Gengis_Khan
[5]DINIZ, M. H. Curso de Direito Civil brasileiro: Direito de Família. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 5. p. 50.
[6] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família: uma abordagem psicanalítica. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 12.
[7] CASTRO, A. M. O. de. A família, a sociedade e o direito. In: ELESBÃO, E. C. (Coord.). Pessoa, gênero e família: Uma visão integrada do Direito. Porto Alegre: Livaria do Advogado, 2002. p. 90.
[8] CAPPARELLI, J. C. Manual sobre o matrimônio no Direito Canônico. São Paulo: Paulinas, 1999. p. 15.
[9] CAPPARELLI, J.C. Op cit. p. 20.
[10] CAPPARELLI, J. C. Op cit. p. 22
[11] DINIZ, 2008. p. 51
[12] LÔBO, P. Direito Civil: família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 5
[13] WALD, A. O novo Direito de Família. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. 712 p.24-25.
[14] THEODORO JÚNIOR, H. apud GOMES, 1998. p. 34.
[15] FACHIN apud CUNHA, M. E. de O. O afeto face ao princípio da dignidade da pessoa humana e seus efeitos jurídicos no Direito de Família. Instituto Brasileiro de Direito de Família, Belo Horizonte, jan. 2009. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=482>. Acesso em: 20 dezembro. 2016.