Embargos infrigentes, de nulidade e revisão criminal

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Uma breve análise a respeito dos embargos infringentes, de nulidade e revisão criminal.

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE

A conceituação dos embargos infringentes e de nulidade está contida no parágrafo único do art. 609 do Código de Processo Penal, o qual afirma, in verbis:

Parágrafo único. Quando não for unânime a decisão de segunda instância, desfavorável ao réu, admitem-se embargos infringentes e de nulidade, que poderão ser opostos dentro de 10 (dez) dias, a contar da publicação do acórdão, na forma do art. 613. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto de divergência.

Em outras palavras, observa-se que os embargos infringentes e de nulidade é um recurso privativo da defesa que visa o reexame de decisões que não foram proferidas em unanimidade, em segunda instância, e desfavoráveis ao réu. Como bem explica Nucci, “é um recurso privativo da defesa, voltado a garantir uma segunda análise da matéria decidida pela turma julgadora, por ter havido maioria de votos e não unanimidade, ampliando-se o quórum do julgamento”.[1]

Assim, observa-se a necessidade de duas premissas básicas: que a decisão seja desfavorável ao réu e que a decisão não tenha sido proferida por unanimidade e, sim, maioria de votos. Além dessas, há outros requisitos para admissibilidade do recurso em comento, os quais serão tratados mais à frente.

Nota-se que ao conceituar os embargos infringentes e de nulidade falei que trata de um recurso privativo da defesa, pois apesar do nome parecer indicar a existência de dois recursos, trata-se apenas de um único, com dupla possibilidade de manejo, interposto perante o órgão do mesmo tribunal prolatador da decisão, como bem esclarece Nestor Távora.[2]

Desta feita, os embargos infringentes tem cabimento quando a não unanimidade dos votos recai sobre questão de mérito da apelação, recurso em sentido estrito ou do agravo de execução, enquanto os embargos de nulidade cabem quando a divergência recai sobre a admissibilidade recursal, matéria estritamente processual.

Nesse sentido, Grinover, Scarance e Gomes Filho destacam:

“Apesar da aparente dualidade (embargos infringentes e de nulidade), o recurso é um só e a distinção, sem maior significação prática, é explicada pela natureza da matéria nele debatida: material ou exclusivamente processual. Aliás, essa denominação era adotada pelo CPC de 1939, mas não foi mantida pelo atual estatuto processual civil, que no art. 530 fala tão somente em embargos infringentes”.[3]

Poderá, portanto, ocorrer de os embargos serem ao mesmo tempo infringentes e de nulidade, quando a divergência versar sobre matéria processual e material. Porém, poderá ocorrer a situação da divergência recair somente sobre um deles, havendo no caso “desacordo parcial”, quando os embargos serão restritos ao objeto da divergência, como preceitua o parágrafo único do art. 609 supratranscrito.

Para interposição do referido recurso, é preciso que seja encaminhada a petição acompanhada de razões, no prazo de 10 dias, a contar da publicação do acórdão, para o órgão indicado para seu julgamento, o qual deve, necessariamente, ter maior número de membros daquele que proferiu a decisão não unânime recorrida.

Segundo o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Maranhão, em seu art. 12, inciso I, alínea “b”, compete às Câmaras Criminais Reunidas processar e julgar os embargos de nulidade e infringentes dos julgados das Câmaras Criminais Isoladas. Ou seja, caso a decisão recorrida (não unânime) seja proferida pela 2ª Câmara Criminal do TJ/MA, caberá as Câmaras Reunidas Criminais, composta por no mínimo 05 desembargadores, além do seu presidente, julgar os embargos infringentes e de nulidade.

Da mesma forma, compete ao Plenário do TJ/MA processar e julgar tal recurso, originariamente, opostos a seus acórdãos e aos das Câmaras Reunidas, bem como os recursos de despachos que não admitirem os embargos (inciso IX, art. 6º).

Observa-se que a regra está sendo obedecida ao analisar os art. 5 e 10 do Regimento Interno, o qual afirma que as Câmaras Criminais Reunidas conterão no mínimo 05 desembargadores, além do presidente, pois as Câmaras Isoladas possuem apenas 03 desembargadores, tendo assim, a análise dos embargos infringentes e de nulidade apreciados por um órgão com maior número de membros. Além do fato que o Plenário é composto por todos os desembargadores, reunindo com a presença de no mínimo 12 desembargadores, além do presidente (art. 5º, caput, do R.I).

Como pressupostos básicos para interposição dos referidos embargos, temos a necessidade de anteriormente ter sido interposto, perante a decisão de primeiro grau de jurisdição, recurso de apelação, em sentido estrito ou agravo de execução. Ou seja, é preciso que o processo suba para a segunda instância, fato que aqui ocorre através dos recursos citados. O segundo pressuposto, já tratado, é que haja a sucumbência defensiva, ou seja, que a decisão não unânime seja desfavorável ao réu.

Além desses pressupostos, ainda é necessário para a admissibilidade dos embargos que o voto discrepante, vencido, seja favorável ao acusado, porquanto só a defesa tem legitimidade para ingressar com esses embargos. Há divergências doutrinárias acerca da admissibilidade do Ministério Público poder ingressar com esse recurso se for para melhorar a situação do réu, o que, a meu ver, é compatível com sua função, uma vez que não é somente órgão de acusação e, sim, priva pela adequada aplicação da lei, sendo também custos legis.

Ainda, para que o recurso seja admitido, é necessário que os embargos fiquem delimitados à divergência da votação, haja delimitação recursal apenas naquilo que cabe (não unanimidade de votação em uma decisão que não conhece da apelação, por exemplo). Além disso, é preciso se atentar pela taxatividade recursal, ou seja, que a divergência recaia sobre questão trazida por apelação, recurso em sentido estrito e, para alguns, agravo em execução. Entendimento este de Nestor Távora e Rosmar Rodrigues, o que vai de encontro com a jurisprudência, se analisarmos o acórdão abaixo transcrito, o qual admitiu embargos infringentes na revisão criminal, ação de impugnação autônoma originariamente da segunda instância. Por fim, é necessário que o acórdão seja proferido por tribunal, não sendo admitida decisão de turma recursal no âmbito dos juizados especiais criminais.[4]

Quanto ao processamento e julgamento dos embargos infringentes e de nulidade, observa-se, de acordo com o art. 613 do Código de Processo Penal, que o rito seguido é o da apelação. Dessa forma, interposto a petição com as razões pelo embargante, abre-se vista ao MP ou querelante para oferecerem contrarrazões em 10 dias. Assim, instruído o recurso, os autos vão ao relator, que tem 10 dias para emitir seu relatório, passando ao revisor que examinará o processo, verificando sua regularidade (juízo de prelibação), também em 10 dias para, assim, pedir dia para julgamento.

Nota-se que o recurso é dotado de efeito devolutivo apenas naquilo que se trata da divergência, análise do voto vencido e da decisão proferida, havendo efeito suspensivo apenas quando se tratar de decisão condenatória e quando houver impossibilidade lógica do andamento do processo.

No que toca ao efeito regressivo, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues entendem que é da natureza desse recurso oportunizar juízo de retratação, haja vista que envolvem “a participação, na turma julgadora, de juízes que já haviam, para aqueles, um juízo de retratação”. [5] Porém, o Regimento Interno do TJ/MA tenta evitar que haja nova participação do mesmo desembargador nos embargos, em seu art. 244, inciso XIV, o qual afirma “não se distribuirão, sempre que possível, ações rescisórias, embargos infringentes cíveis e embargos infringentes e de nulidade criminais a desembargador que tenha tomado parte no julgamento anterior”.

Quanto ao julgamento, observa-se que se inicia de maneira sistematizada, tendo, primeiramente os votos relativos às matérias pertinentes ao juízo de admissibilidade recursal e, depois, os votos referentes às matérias de direito material. Como assevera Julio Fabbrini Mirabete, o tribunal, ao apreciar os embargos, “pode ficar com os votos vencedores ou com os vencidos (ou vencido) ou adotar uma terceira solução intermediária, entre ambas”, tal qual como se dá quando “há um voto negando provimento total, outro dando total provimento e um terceiro dando provimento parcial”, devendo prevalecer este ultimo como “voto médio”. No caso de empate, deve prevalecer a solução mais favorável ao réu. [6]

Como forma de exemplificar o que foi anteriormente dito, transcrevo um acórdão com o voto proferido pela desembargadora Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz do Tribunal de Justiça do Maranhão, o qual trata sobre embargos infringentes em revisão criminal, no que concerne à divergência acerca da dosimetria da pena, além do reconhecimento da atuante genérica da “menoridade” na data do fato (art. 65, inciso I, do CP):

TJ-MA - Embargos Infringentes e de Nulidade : EI 0053272014 MA 0008109-96.2013.8.10.0000  Inteiro Teor

ÓRGÃO ESPECIAL

Sessão do dia 09 de Abril de 2014

Processo nº. 0008109-96.2013.8.10.0000

Embargos Infringentes nº. 005.327/2014 - São Luís/MA

Referentes à Revisão Criminal nº. 032.505/2013

Embargante: Valtermir Mendes Pereira Filho

Advogado: Adriano Wagner Araújo Cunha

Embargado: Ministério Público Estadual

Promotor: José Coelho Neto

Relatora: Desª. Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz.

Revisor: Desº. José Joaquim Figueiredo dos Anjos

Acórdão nº. ___________________________

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL - EMBARGOS INFRINGENTES EM REVISÃO CRIMINAL - VALORAÇÃO DAS

CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS - INIDONEIDADE DOS MOTIVOS DISCRIMINADOS PELO JUÍZO A QUO - COMPROVAÇÃO, NOS AUTOS, DA MENORIDADE RELATIVA DO RECORRENTE - APLICAÇÃO DA ATENUANTE QUE SE IMPÕE -EMBARGOS INFRINGENTES CONHECIDOS E JULGADOS PROCEDENTES, POR MAIORIA, PARA PREVALECER O VOTO VENCIDO.

I - Resta comprovado nos autos que, à época do crime - 20/03/2002 - o recorrente constava com 20 (vinte) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de vida, fazendo, pois, jus à aplicação da atenuante de menoridade relativa prevista no art. 65, inc. I, do Código Penal.

II - Acerca dos antecedentes criminais do recorrente, constata-se a ausência de informações sobre o trânsito em julgado de outras ações penais contra o réu, de sorte que a utilização de informação sobre processo em andamento para agravar a pena-base, utilizada pelo magistrado a quo, encontra óbice na Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça.

III - Os motivos aduzidos pelo Juízo a quo, acerca da conduta social do recorrente, se revelam inidôneos para o agravamento da pena-base, posto serem os mesmos alegados para o agravamento da pena com suporte nos antecedentes criminais.

IV - O fundamento lançado pelo juízo monocrático para agravamento da pena com base nas circunstâncias do crime não se revela idôneo porque o modus operandi utilizado não sinaliza a utilização de especialidade, artifícios ou astúcia do agente, ora embargante, não tendo o Juízo de base apontado qualquer peculiaridade que extrapolasse o normalmente esperado para a espécie criminosa.

V - Embargos Infringentes conhecidos e providos, para fazer prevalecer o voto divergente, exarado pelo Exmo. Desº. José de Ribamar Froz Sobrinho, em que se fixou, para o Embargante Valtermir Mendes Pereira Filho a pena privativa de liberdade em 06 (seis) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicialmente fechado. Maioria.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos dos Embargos Infringentes nº. 005.327/2014 - São Luís/MA, referentes à Revisão Criminal nº. 032.505/2013 ( Processo nº. 0008109-96.2013.8.10.0000)- São Luís/MA , em que figuram como partes os retro mencionados, acordam os Senhores Desembargadores do Órgão Especial , por maioria, e de acordo com o parecer ministerial, CONHECEU e DEU PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES , para prevalecer o voto divergente do Sr. Desembargador José de Ribamar Fróz Sobrinho, proferido nos autos da Revisão Criminal, nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Voto contrário do Des. Revisor, que negou provimento aos Embargos. Acompanharam o voto da Desembargadora Relatora os Senhores DesembargadoresJorge Rachid Mubarack Maluf, Jamil de Miranda Gedeon Neto , Nelma Celeste Sousa Silva Sarney Costa, Lourival de Jesus Serejo Sousa , Kleber Costa Carvalho e Ricardo Tadeu Bugarin Duailibe .

Acompanharam o voto do Desembargador Revisor os Senhores Desembargadores Benedito de Jesus Guimarães Belo, Raimundo José Barros de Sousa , e Ângela Maria Moraes Salazar . Ausentes, justificadamente, os Senhores Desembargadores Cleonice Silva Freire(Presidenta), Antônio Fernando Bayma Araújo , Antônio Guerreiro Junior e Cleones Carvalho Cunha. Presidência da Desª. Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz . Procuradora da Justiça: Drª. Terezinha de Jesus Anchieta Guerreiro.

São Luís/MA, 09 de abril de 2014.

Desª. Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz

RELATORA

Estado do Maranhão

Poder Judiciário

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Trata-se de Embargos Infringentes opostos por Valtermir Mendes Pereira Filho contra o Acórdão nº. 140.717/2014 ,prolatado nos autos da Ação Rescisória nº 026563/2009 , em que as Câmaras Criminais Reunidas , julgando parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo autor (ora recorrente), reconheceram a presença da atenuante de menoridade, redimensionando a sanção corporal fixada, tornando-a definitiva em 08 (oito) anos de reclusão (fls. 409/419).

Em suas razões recursais (fls. 484/489), o recorrente aduz que houve equívoco na análise (valoração) das circunstâncias judiciais do caso concreto, pois o julgador as examinou, com supedâneo no artigo 59 do Código Penal, sob a interpretação que melhor lhe aprouve, e, não, daquela que conduziria a decisão embargada a conclusões mais favoráveis ao réu, o que certamente culminaria com apenação próxima do mínimo legal para o crime em comento.

Alega que o voto divergente consignou que o juízo prolator da sentença usou de fundamentação parca e inidônea para considerar as circunstâncias judiciais negativas, no que pertine aos antecedentes criminais, à conduta social e às circunstâncias do crime, afirmando que o juiz exacerbou a aplicação da pena base do embargante; que a divergência repousa, principalmente, no quantum da pena base aplicada; que o voto divergente e a Procuradoria de Justiça são unânimes em recomendar uma reprimenda próxima da pena mínima, qual seja, 06 anos de reclusão, para os crimes capitulados no artigo 121, caput, do CP.

Sustenta que os presentes Embargos Infringentes não cuidam de reexame de prova, pois os fatos discutidos são as análises de circunstâncias judiciais valoradas equivocadamente e exacerbação no cômputo da pena base, fugindo da valoração mínima.

Pugna, ao final, pelo conhecimento e provimento dos Infringentes, para fazer prevalecer o voto divergente, reduzindo a pena ao patamar de 06 (seis) anos e 04 (quatro) meses. Suscita, também, o prequestionamento do artigo 59do CP, para fins de interposição de Recurso Especial junto ao Superior Tribunal de Justiça.

Os Embargos Infringentes foram admitidos pelo Exmo. Desº. José Luís Almeida (fls. 492/493).

Em contrarrazões de fls. 506/513, o Ministério Público sustenta que, em manifestação anterior (fls. 390/394), dissentiu acerca da análise das circunstâncias judiciais pelo magistrado a quo, por entender que somente a culpabilidade encontra-se adequadamente motivada, não se revelando idôneos os fundamentos lançados pelo juízo monocrático para a análise das demais circunstâncias analisadas no caso concreto (antecedentes criminais, conduta social e circunstâncias do crime), porque o modus operandi utilizado não sinaliza a utilização de especialidade, artifícios ou astúcias do agente, ora embargante, não bastando, destarte, para a valoração negativa atribuída na análise das circunstâncias do crime lançada na sentença monocrática.

Alega que é necessário que se proceda à reforma da decisão embargada por tratar-se a dosimetria de uma questão de ordem pública que deve observar estritamente o princípio do tratamento igualitário nas decisões judiciais; que, em observância ao princípio da igualdade, deve ser afastada da decisão embargada a contrariedade ao entendimento sumulado pelo STJ. Assevera, também, que o acórdão objurgado não é carente de fundamentos, não se verificando quaisquer afrontas à lei federal em questão.

Por fim, manifesta-se pelo conhecimento e acolhimento parcial dos Infringentes ora analisados, reduzindo-se a pena base, de 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de reclusão, para 6 (seis) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

É o relatório.

V O T O

Como se depreende do Relatório trata-se de Embargos Infringentes, opostos em face do Acórdão nº. 140.717/2014 , prolatado nos autos da Ação Rescisória nº 026563/2009 , em que as Câmaras Criminais Reunidas , julgando parcialmente procedentes os pedidos formulados pelo autor (ora recorrente), reconheceram a presença da atenuante de menoridade, redimensionando a sanção corporal fixada, tornando-a definitiva em 08 (oito) anos de reclusão.

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Dos autos exsurge que Valtemir Mendes Pereira Filho foi julgado pelo Tribunal do Júri Popular pela prática do crime de homicídio qualificado pelo uso de recurso que impossibilitou a defesa da vítima - artigo 121§ 2º, inciso IV, do Código Penal -, que vitimou Domingos José Amaral Ferreira, na noite do dia 20 de março de 2002, na Avenida da Babilônia do Alto da Conceição, Bairro Coroadinho, em São Luís do Maranhão.

Em breve síntese, a Denúncia relata que o autor praticou o crime a si imputado contra a vítima quando esta retornava do colégio, na companhia de sua namorada, sem oferecer qualquer oportunidade de defesa à vítima, que estava desarmada, evadindo-se em seguida[1].

Os jurados, por maioria dos votos, reconheceram a materialidade e a autoria do delito, afastando, todavia, a existência da circunstância qualificadora referenciada, condenando-o, destarte, pela prática de homicídio simples - artigo 121, caput, do CP .

O magistrado de base, considerando a culpabilidade do acusado, os antecedentes criminais, a conduta social e as circunstâncias do crime, fixou a pena-base em 12 (doze) anos de reclusão. Em seguida, reconhecendo a atenuante de confissão espontânea, reduziu a pena-base em 1/6 (um sexto), ou seja, dois anos, e, ante a ausência de causas de diminuição ou aumento,fixou a pena privativa de liberdade em 10 (dez) anos de reclusão, a ser cumprida no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, inicialmente em regime fechado[2].

Transitada em julgado a sentença, o réu ajuizou Revisão Criminal, pugnando pela fixação da pena-base no mínimo legal, bem como pela aplicação da circunstância atenuante da menoridade relativa, procedendo-se, dessa forma, à diminuição da pena[3].

Instada a manifestar-se, a Procuradoria Geral de Justiça opinou pela procedência parcial da Revisão Criminal, fixando-se a pena-base para próximo do mínimo legal de 06 (seis) anos de reclusão, ante a existência de uma única circunstância judicial desfavorável ao revisionado

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Poder Judiciário

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culpabilidade -, e pela aplicação da atenuante da menoridade relativa, vez que o réu contava com apenas 20 (vinte) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de vida à época do crime[4].

O Acórdão embargado [5], da Relatoria do Exmo Desº. José Luiz Almeida, consignou que:

"é possível observar que o juiz sentenciante valorou, negativamente, as circunstâncias judiciais referente à culpabilidade, antecedentes, conduta social e circunstâncias do crime, razão pela qual elevou a pena-base em 04 (quatro) anos além do mínimo legal" (...) "em que pese a existência de alguma divergência doutrinária acerca da motivação utilizada pelo julgador para concluir pela exasperação da reprimenda, devo dizer que não constatei a alegada contrariedade a texto expresso de lei, a amparar a sua correção com fulcro no art. 621, I, do Código de Processo Penal" (...) "a existência das duas circunstâncias atenuantes - confissão e menoridade -, conforme dicção do art. 65I IIId, do Código Penal"

Com base nessas premissas, a Colenda Terceira Câmara Criminal decidiu, por maioria, pela redução da reprimenda básica em 04 (quatro) anos de reclusão, e, à míngua de causas de aumento e diminuição de pena, tornou-a definitiva em 08 (oito) anos de reclusão .

Por sua vez, o voto divergente [6], exarado pelo Exmo. Desº. José de Ribamar Froz Sobrinho, consignou que:

"o requerente acertadamente fundamentou seu pedido revisional nos incisos I (contrariedade ao texto da lei) e III (circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena), do artigo 621, do Código de Processo Penal)"

(...)

"da análise da sentença, tem-se que o Juízo de base deixou de apresentar fundamentação idônea para negativar as circunstâncias judiciais atinentes aos antecedentes criminais, à conduta social e às circunstâncias do crime"

(...)

"ao considerar desfavoráveis os antecedentes do revisionando, o magistrado considerou que o próprio réu confessou já ter sido condenado por outro crime de homicídio referido na certidão de fl. 209 (...) ocorre, todavia, que na referida certidão consta, além desta ação penal, uma outra na 11ª Vara Criminal desta Capital, sem, contudo, haver qualquer informação acerca do trânsito em julgado desta última", que,"em consulta ao Sistema Jurisconsult deste Egrégio Tribunal, constatei que o paciente fora sentenciado pelo Juízo da 11ª Vara Criminal da Comarca de São Luís/MA em 11.12.2009, razão pela qual o magistrado jamais poderia negativar os antecedentes do ora requerente, posto que este, à época do crime, era detentor de bons antecedentes"

(...)

"nos disposto (sic) na Súmula 444 do STJ, somente condenações transitadas em julgado quando da prolação da sentença podem servir para elevar a pena-base do mínimo legalmente previsto"

(...)

"quando da análise da conduta social do revisionado, o magistrado sentenciante a considerou desfavorável sob a alegação de que o mesmo sempre se conduziu à margem da lei, já tendo praticado dois homicídios"

(...)

"a fundamentação externada mostra-se inidônea, na medida em que a conduta social guarda sintonia com o comportamento do agente no seio social, familiar e profissional, sem se confundir com os antecedentes e a reincidência, não podendo, pois, se referir a fatos criminosos (...) a própria fundamentação utilizada para refutar a negativação dos antecedentes mostra-se suficiente para demonstrar que a conduta social do revisionando deve ser tida como favorável"

(...) "reconheço a circunstância atenuante atinente a menoridade relativa, prevista no artigo 65, inc. I, do Código Penal, eis que, quando da prática do delito (20.03.2002), o revisionado contava com apenas 20 (vinte) anos 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de vida (fl. 48)"

Por tais razões, considerando como desfavoráveis apenas as circunstâncias judiciais relativas à culpabilidade e às circunstâncias do crime, reduziu a pena-base para 09 (nove) anos e 06 (seis) meses de reclusão, e, ante as atenuantes de confissão espontânea e de menoridade relativa, e porque inexistentes circunstâncias agravantes e/ou causas de aumento ou diminuição, fixou a pena privativa de liberdade em 06 (seis) anos e 04 (quatro) meses de reclusão , em regime inicialmente fechado.

Cinge-se, pois, a questão central destes Infringentes acerca da valoração das circunstâncias judiciais durante a dosimetria da pena, bem como sobre o reconhecimento/aplicação da atenuante de menoridade relativa ao caso concreto.

Concernente à aplicação da atenuante de menoridade relativa , constato deva prevalecer o voto divergente, pois resta comprovado nos autos que, à época do crime - 20/03/2002 - o recorrente constava com 20 (vinte) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de vida, fazendo, pois, jus à aplicação da atenuante prevista no art. 65, inc. I, do Código Penal.

Em análise dos critérios utilizados pelo magistrado de base para a fixação da pena-base , constato que não foram atendidos os critérios legais previstos nos art. 59 do Código Penal.

Com efeito, o magistrado de base, valorando os antecedentes criminais do recorrente, consignou que estes "não são dos melhores, pois ele mesmo confessa que já foi condenado por outro crime de homicídio, referido na certidão de fls. 209"[7].

No entanto, na certidão referenciada não consta informação sobre o trânsito em julgado de Ação Penal contra o embargante (que só ocorreu em 11/12/2009[8]), de sorte que a utilização da informação sobre processo em andamento para agravar a pena-base pelo magistrado a quo encontra óbice na Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

STJ Súmula nº 444 - 28/04/2010 - DJe 13/05/2010

Vedação - Utilização de Inquéritos Policiais e Ações Penais em Curso para Agravar a Pena-Base

É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.

Acerca da conduta social , consignou o Juízo de base que o recorrente "sempre se conduziu à margem da lei, já tendo praticado dois homicídios" [9].

Como consabido:

Estado do Maranhão

Poder Judiciário

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"por conduta social quer a lei traduzir o comportamento do agente perante a sociedade. Verifica-se o seu relacionamento com seus pares, procura-se descobrir o seu temperamento, se calmo ou agressivo, se possui algum vício, a exemplo de jogos ou bebidas, enfim, tenta-se saber como é seu comportamento social, que poderá ou não ter influenciado no cometimento da infração penal" [10] .

Para o exame da questão apresentada, mister se faz observar que a conduta social não se confunde com os antecedentes criminais , pois "nada obsta que o Réu, que responda a muitas ações penais, tenha uma conduta social positiva na comunidade onde vive, com família e vizinhos"[11]. Com efeito,"inquéritos policiais e ações penais em andamento não constituem maus antecedentes, má conduta social nem personalidade desajustada, porquanto ainda não se tem contra o réu um título executivo penal definitivo", não devendo, dessarte, serem considerados, como o foram na sentença de base, na avaliação/valoração da conduta social do recorrente, sequer dos antecedentes criminais , mormente se ponderarmos que "a dupla consideração de um mesmo fato para circunstâncias judiciais diversas constitui odioso bis in idem, repudiado pela doutrina e jurisprudência[12]".

No que atine às circunstâncias do crime , verifico que o voto divergente contradiz-se, pois, embora tenha consignado, às fls. 432, que a fundamentação para sua valoração era inidônea, não a afastou, afirmando, às fls. 435, que a mesma era desfavorável ao agente, e que deveria ser considerada na fixação da pena-base, contradição esta que não foi objeto de Aclaratórios pelo recorrente. Não obstante, corroboro com o entendimento esposado pela Procuradoria Geral de Justiça, em sede de contrarrazões, no sentido de que "entendese que o fundamento lançado pelo juízo monocrático não se revela idôneo porque o modus operandi utilizado não sinaliza a utilização de especialidade, artifícios ou astúcia do agente, ora embargante"[13], mormente se ponderado que o Juízo de base não apontou qualquer peculiaridade que extrapolasse o normalmente esperado para a espécie criminosa, não se revelando idôneo o aumento da pena-base unicamente por estar a vítima retornando do colégio junto com sua namorada[14].

Com essas considerações, e por tudo o que mais consta dos autos, CONHEÇO e, no mérito, de acordo com o parecer da Douta Procuradoria Geral de Justiça, DOU PROVIMENTO AOS PRESENTES EMBARGOS INFRINGENTES , para fazer prevalecer o voto divergente, exarado pelo Exmo. Desº. José de Ribamar Froz Sobrinho, em que se fixou, para o EmbarganteValtermir Mendes Pereira Filho a pena privativa de liberdade em 06 (seis) anos e 04 (quatro) meses de reclusão , em regime inicialmente fechado .

É como voto.

Sala das Sessões das Câmaras Criminais Reunidas do Palácio da Justiça Clóves Bevilácqua, em São Luís, Capital do Estado do Maranhão, aos nove dias do mês de abril do ano de dois mil e quatorze.

Desª. Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz

R E L A T O R A

No presente caso, observa-se a interposição de embargos infringentes em revisão criminal, o que não é citado pela doutrina como possibilidade, afirmando que os referidos embargos só podem ser interpostos quando se tratarem de apelação, recurso em sentido estrito e em agravo em execução. Ademais, figura como caso concreto em que os embargos infringentes foi conhecido e dado provimento, sendo acolhido o voto vencido, reformando a situação do réu, com base na maioria de votos das Câmaras Reunidas no julgamento de tal revisão criminal.

REVISÃO CRIMINAL

A revisão criminal está disposta nos artigos 621 a 631 do Código de Processo Penal, os quais discorrem sobre seu fundamento, cabimento, processamento, julgamento e define competência. Assim, temos que a revisão criminal é uma ação autônoma de impugnação manejada exclusivamente pela defesa, uma vez que visa o reexame de uma sentença ou decisão condenatória (própria ou imprópria) proferida por juiz monocrático ou por um tribunal, que tenha transitado em julgado.

Desta definição sucinta, retiramos que este “recurso” excepciona a coisa julgada em matéria criminal, abrindo a possibilidade de reapreciação, na tentativa de melhorar a situação do acusado, portanto, é permeado pelos princípios do favor rei e da verdade real (processual), visando reestabelecer o status dignitatis do acusado. [7]

É necessário fazer aqui uma breve diferenciação entre recurso e a ação autônoma de impugnação. É consagrada na doutrina a classificação dos meios de impugnação dos atos jurisdicionais em duas categorias: a dos recursos e a das ações autônomas de impugnação.[8] O primeiro possibilita o reexame da decisão dentro do mesmo processo em que foi proferida, antes da formação da coisa julgada; o segundo, como o próprio nome sugere, são processo novos, dos quais decorrem novas relações processuais. Na feliz síntese de Alexandre Câmara:

“Diferem-se entre si, basicamente, pelo fato de o recurso não provocar o aparecimento de um processo novo, sendo tão-somente um prolongamento do processo onde foi proferida a decisão atacada, enquanto a propositura de ‘ação autônoma de impugnação’ faz nascer uma nova relação processual, diversa daquela onde a decisão impugnada foi proferida”[9]

Assim, a revisão criminal é uma ação autônoma de impugnação manejada contra sentença condenatória eivada de vício de procedimento ou de julgamento, podendo implicar em quatro resultados práticos, os quais estão dispostos no caput do art. 626 do Código de Processo Penal, in litteris “Julgando procedente a revisão, o tribunal poderá alterar a classificação da infração, absolver o réu, modificar a pena ou anular a pena”, sempre em favor do acusado, conforme também disposto no RI do TJ/MA em seu art. 416.

O art. 621 do mesmo diploma discorre acerca do cabimento de tal ação, a qual será admitida somente quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos ou se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos, ou ainda, quando após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou da circunstância que determine ou autorize diminuição de pena.

Assim, não é cabível a revisão criminal tendente a reexaminar decisão absolutória própria ou que reconhece a prescrição, visando ver reconhecido motivo de absolvição mais benéfico ao acusado, como por exemplo, para mudar o fundamento da absolvição visando excluir a possibilidade de propositura de ação civil ex delicto, que busca reparação monetária do dano, conforme entendimento do doutrinador Nestor Távora.

Quanto ao prazo para a propositura da revisão criminal, observamos que não há estipulação em lei, afirmando, apenas, no art. 622 que “a revisão poderá ser requerida em qualquer tempo, antes da extinção da pena ou após”. Nesse segundo caso, em que o há a extinção da pena pelo seu cumprimento ou morte do acusado, há a figura da denominada “reabilitação da memória”, a qual visa interferir na lembrança que se tinha a respeito do acusado. Em arremate, impende destacar que a revisão criminal é cabível contra toda e qualquer decisão condenatória, mesmo aquelas proferidas pelo tribunal do Júri, conforme art. 418 do Regimento Interno do TJ/MA.

Quanto ao processamento e julgamento da revisão criminal, observamos que, com base no princípio da simetria e das leis de organização judiciária, no âmbito estadual, compete aos Tribunais de Justiça processar e julgar originariamente as revisões criminais contra seus julgados e os dos juízes de direito.

Da mesma forma como se dá nos embargos infringentes e de nulidade, o Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Maranhão, estabelece que é competência do Plenário, julgar os pedidos de revisão criminal dos acórdãos proferidos originariamente pelas Câmaras Criminais Reunidas, assim como é competência das Câmaras Reunidas, processar e julgar pedido de revisão criminal das sentenças e dos acórdãos proferidos pelas Câmaras Criminais Isoladas, conforme art. 6º, inciso XI, e art. 12, I, “a”, do RI.

Quanto à legitimidade ad causam, dispõe o art. 623 do CPP, que “a revisão poderá ser pedida pelo próprio réu ou por procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão”, uma vez que os sucessores além de terem interesses patrimoniais, também visam a já citada “reabilitação da memória” do falecido.

Há divergências doutrinárias acerca da admissibilidade do Parquet figurar como autor da ação de revisão criminal em favor do acusado. Paulo Rangel, Ada Pellegrini, Nestor Távora, entre vários outros doutrinadores, afirmam ser admitido, uma vez que o Ministério Público deve atuar como custos legis na defesa do ordenamento jurídico que foi “agredido” pelo judiciário, já Guilherme de Souza Nucci entende não ser cabível, raciocínio também aplicado pela Segunda Turma do STF, no julgamento do RHC 80796/2001, a qual entendeu ser ilegítima a propositura da revisão criminal pelo Ministério Público. [10]

Ademais, a doutrina e a jurisprudência admitem a postulação leiga da revisão criminal, tal qual se dá com o habeas corpus, abrindo possibilidade do apenado por si só, sem ter procurador habilitado, interpor tal ação autônoma de impugnação.

Recebida a petição, sem tenha sido indeferida liminarmente, abrir-se-á vistas dos autos ao Procurador-Geral, o qual dará seu parecer no prazo de 10 dias, seguindo sucessivamente, em igual prazo, para o relator e revisor, os quais analisarão os autos, para que seja julgado o pedido na sessão que o presidente designar, conforme a pauta do tribunal. Da mesma forma como ocorre no julgamento dos embargos infringentes e de nulidade, no caso de empate no julgamento da revisão, prevalece o voto mais benéfico ao acusado.

Concluído o julgamento da revisão criminal pelo tribunal, o acórdão é lavrado pelo relator que, nos termos do art. 625, caput, CPP, não deve ter proferido decisão em qualquer fase do processo rescindendo. Da mesma forma proclama o art. 420, caput, do RI do TJ/MA, que afirma “A inicial será distribuída a um relator, que não poderá ser desembargador que tenha proferido decisão em qualquer fase do processo em que se deu a condenação ou a imposição da medida de segurança, salvo inexistindo desembargador desimpedido, no caso de revisões de acórdão do Plenário”.

Por fim, a ação de revisão criminal pode conter a cumulação de pedido indenizatório pelo erro judiciário alegado e reconhecido pelo tribunal, como proclama o art. 630, caput, do CPP, que afirma que “se o interessado requerer”, poderá o tribunal “reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos”. Sem embargo, é possível ao Poder Público, ajuizar ação regressiva contra o particular que deu ensejo ao erro judiciário, para se ver ressarcido da indenização fixada na ação rescisória. [11]

TJ-PR - Revisão Criminal de Acórdão : RVCR 6796390 PR 0679639-0  Inteiro Teor

REVISÃO CRIMINAL Nº 679.639-0, DA COMARCA DE SANTO ANTÔNIO DOSUDOESTE – VARA ÚNICA

REQUERENTE: ALDIR CÂMARA FRANCO

REQUERIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

RELATOR ORIGINÁRIO:JUIZ SUBSTITUTO EM

2º GRAU TITO CAMPOS DE PAULA

RELATOR DESIGNADO:DES. ANTÔNIOMARTELOZZO

REVISÃO CRIMINAL DE ACÓRDÃO – REQUERENTE ABSOLVIDO EM PRIMEIROGRAU – CONDENAÇÃO EM SEGUNDO GRAU – CRIMES PREVISTOS NOS ARTS.12, CAPUT 14 DA LEI 6368/76 – ACÓRDÃO CONTRÁRIO À EVIDÊNCIA DOS AUTOS – PROCEDÊNCIA – AÇÃO DE REVISÃO CRIMINAL PROCEDENTE POR MAIORIA.

VISTOS , relatados e discutidos estes autos de Revisão Criminal sob o n.º 679.639-0, da Comarca de Santo Antônio do Sudoeste – Vara Única, em que é requerente ALDIR CÂMARA FRANCO e requerido o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.

ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Criminal, em Composição Integral, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em julgar procedente a presente revisão criminal, determinando-se o recolhimento do Mandado de Prisão. Vencido o Dr. Juiz Substituto TITO CAMPOS DE PAULA que declarará voto em separado.

Na condição de relator para lavrar o acórdão, reporto-me ao relatório lavrado pelo Dr. Juiz Substituto nominado, por brevidade, assim redigido:

RC nº 679.639-0 fl. 2

“I – ALDIR CÂMARA FRANCO, após ter sido denunciado juntamente com Alcides e Moisés, foi absolvido por sentença, mas condenado por acórdão, nos autos de Ação Penal n.º 03/2003, que tramitou perante a Vara Criminal da Comarca de Santo Antônio do Sudoeste, pela prática dos crimes previstos nos artigos 1214 ambos da Lei n.º 6.368/1976 (tráfico de drogas e associação para o tráfico), sendo-lhe fixada a pena total de 7 anos e 6 meses de reclusão e 100 dias multa (fls. 1.158/1.207 dos autos em apenso).

Contra o referido acórdão, houve oposição de embargos de declaração pelos réus Alcides, ALDIR e Moisés, sendo todos rejeitados (fls. 1.271/1.282).

Na sequência, os três réus interpuseram Recurso Especial e o réu ALDIR interpôs, ainda, Recurso Extraordinário, aos quais, segundo decisão de fls. 1.554/1.575, foi denegado seguimento.

Contra essa decisão, a defesa de ALDIR opôs Embargos de Declaração (fls. 1.592/1.600), bem como Agravo de Instrumento, ao qual foi negado provimento pelo STJ (fls. 1.728/1.730).

Na sequência, ALDIR interpôs Agravo Regimental (fls. 1.733/1.757),, que também teve o provimento negado (fls. 1.785/1.793).

Novamente houve oposição de embargos de declaração (fls. 1.810/1.823) e, pelo acórdão de fls. 1.825/1.834, foram os mesmos rejeitados.

À fl. 1.835 (30/03/2010) foi certificado o trânsito em julgado, baixando-se os autos.

Na presente Revisão Criminal, proposta mediante defesa técnica, elaborada em 65 laudas, por procurador constituído, o requerente ALDIR formulou, em preliminar, pedido de sustação do mandado de prisão decorrente do trânsito em julgado da condenação. No mérito, alegou, em resumo, que o acórdão condenatório foi contrário às evidências probatórias dos autos e que, em homenagem ao princípio do in dubio pro reo, deve ser absolvido.

Distribuído o feito, o pedido de liminar foi submetido à apreciação do Juiz Substituto em Segundo Grau Luiz Cezar Nicolau, que indeferiu o pleito, conforme decisão de fls. 1.841/1.846.

Contra essa decisão foram opostos Embargos de Declaração (fls. 1.848/1.862, com 15 laudas) pela defesa do ora requerente, os quais foram rejeitados conforme decisão monocrática acostada às fls. 1.865/1.866.

A Procuradoria Geral de Justiça, na pessoa do Procurador de Justiça Edilberto de Campos Trovão, apresentou o parecer de fls. 1.873/1.900, opinando pelo conhecimento e indeferimento do pedido revisional.

RC nº 679.639-0 fl. 3

Na sequência, o advogado do requerente apresentou nova petição, com 33 laudas (fls. 1.904/1.936) e dezenas de documentos (fls. 1.937/2.031, os quais foram juntados aos autos conforme determinação de fl. 1.902.

Submetido o feito à nova apreciação da Procuradoria Geral de Justiça, esta, na pessoa do mesmo Procurador de Justiça (Edilberto de Campos Trovão), apresentou novo parecer às fls. 2.038/2.046, opinando agora pela parcial procedência do pedido formulado pelo requerente, a fim de que a pena imposta ao delito de associação para o tráfico de drogas seja levemente atenuada para 3 anos de reclusão, permanecendo, no mais, inalterado o acórdão condenatório.

É a breve exposição” (fls. 2049/2051).

II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO:

Este julgador, ora relator, tendo sido seguido pela maioria dos integrantes do quorum (em composição integral), após pedido de vista, é que lavra o voto.

Analisa-se, em primeiro plano, a preliminar arguida pela defesa, consistente na sustação do cumprimento do mandado de prisão.

Foi a providência indeferida em decisão de fôlego (fls. 1841/1846), sob alguns fundamentos, sendo, dentre outros, que o ajuizamento da revisão criminal não tem efeito suspensivo, já que não se trata de recurso, e que ainda que seja direito do apenado manejar ação revisional, o ajuizamento em nada interfere na execução da pena.

Sua excelência o Dr. Juiz, relator originário, no ensejo da apreciação da preliminar, anotou:

“Com efeito, o ajuizamento de revisão criminal não tem efeito suspensivo, de sorte que não suspende a execução da sentença ou do acórdão condenatório, sob pena de se ofender a coisa julgada.

No caso dos autos, principalmente, não há que se falar em efeito suspensivo eis que não se vislumbra evidente erro judiciário.

o contrário, observa-se que o acórdão a que se busca revisão foi proferido por este Tribunal com decisão unânime no sentido de se reformar a sentença de primeiro grau e condenar o ora requerente ALDIR, apontando fundamentadamente nas provas dos autos as razões da condenação.

Depois de a defesa lançar mão de basicamente todos os instrumentos processuais cabíveis, o feito transitou em julgado, dando-se início, por consequência, à execução definitiva da pena.

RC nº 679.639-0 fl. 4

Portanto, não há efetivamente que se falar em sustação do mandado de prisão”.

Do Mérito

A defesa, com o ajuizamento da ação revisional com fulcro no art. 621, incisos I e III, do Código de Processo Penal, que se traduz, respectivamente, nos dizeres: “quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos”, e “quando após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena”, busca, a rigor, a cassação do acórdão rescindendo, com a consequente absolvição, a fim de que seja revertida a solução encontrada no segundo grau de jurisdição onde o requerente se viu condenado (em o primeiro grau, havia sido ele inocentado com fundamento no art. 386VI, do Código de Processo Penal, no ano de 2003 (fl. 747).

Prospera, s.m.j., a tese escudada no fato de o acórdão (a lei refere-se à sentença, mas o julgado de segundo grau também comporta) ter sido exarado contrariamente à evidência dos autos (CPC, art. 621, I, parte final).

Na doutrina, Fernando da Costa Tourinho Filho, ao discorrer sobre o instituto da revisão criminal escudada esta em sentença (o que vale também para acórdão) contrária à evidência dos autos, ensina que a condenação não pode ser arrimada “em nenhuma prova” (Código de Processo Penal Comentado, vols. 1 e 2, 13. ed., São Paulo: Saraiva, p. 621).

Guilherme de Souza Nucci, em sua obra: “Código de Processo Penal Comentado”, reportando-se à matéria, escreve: “Contrariando à evidência dos autos: entenda-se por evidência dos autos o conjunto probatório colhido. Para ser admissível a revisão criminal, torna-se indispensável que a decisão condenatória proferida ofenda frontalmente as provas constantes dos autos” (9. ed., São Paulo: Ed. RT, p. 1007).

A evidência dos autos, preleciona Borges da Rosa, citado por Heráclito A. Mossin, em “Comentários ao Código de Processo Penal”: “é a clareza que se manifesta no conjunto dos autos e resultante do exame ou apreciação da suas diversas peças, a saber: denúncia ou queixa, alegações ou razões, provas (principalmente), sentenças etc” (Barueri, SP: Manole, 2005, p. 1282).

O conjunto probatório autoriza que se acolha pleito

RC nº 679.639-0 fl. 5

do requerente, que fora condenado no segundo grau de jurisdição, volvendo o à absolvição.

Nenhuma testemunha ouvida no decorrer da instrução criminal, incrimina o.

A Drª. Juíza que proferiu a sentença – Sueli da Silva Neves -, após detido exame das provas colhidas, primeiramente em relação ao delito de associação para fins de tráfico de drogas (fl. 709), e na sequência, com relação ao delito de tráfico (fls. 712 e ss.), absolveu o requerente, cujo fundamento foi a ausência de provas contra o mesmo.

Oportuno é que se diga que quando o Ministério Público de segundo grau, na pessoa do Dr. Procurador de Justiça Jorge Guilherme Montenegro Neto, emitiu pronunciamento no recurso de apelação interposto pelo ‘parquet’, pelo desprovimento do mesmo (fls. 1091/1092). Entendeu ele que Aldir Câmara Franco não cometeu crime algum e que “o fato de haver uma ligação entre ele e o co apelado Moisés também não foi comprovado nos autos” (fl. 1091). [ ] entendo que decidiu com acerto a douta magistrada sentenciante em absolver o ora apelado, porquanto explicitou em sua motivação não existir provas seguras de que o mesmo participava ou estaria previamente ajustado com os demais corréus para a prática dos delitos” (fl. 1092).

Ninguém chegou a afirmar que o suplicante teria tido participação no cometimento do crime de tráfico de drogas (no caso, lança-perfumes), quer na modalidade de “transportar”, quer na modalidade de “ter em depósito”, ou outra, e mesmo que teria praticado o delito de associação para o tráfico.

As testemunhas arroladas pela Acusação: Celestino Dias (fls. 485/494), Clair Xavier Leite (fls. 495/502), Antônio Oliveira do Carmo (fls. 504/509), Volmar Oliveira do Carmo (fls. 510/515) e Volnei Carlos Schwaikart (fls. 516/520), não apontaram Aldir como tendo se envolvido nos fatos delituosos já mencionados.

Algumas delas reportam-se a que ele mantinha uma sociedade com o corréu Alcides, a quem este lhe “vendeu três ou quatro vezes cargas de erva-mate canchada” (fl. 462).

O barracão que foi alugado por Alcides possuía um compartimento anexo, onde, no dia dos fatos, o requerente nele se instalou para um programa amoroso, estando de posse das chaves, tanto

RC nº 679.639-0 fl. 6

desse anexo quanto do restante (do barracão, onde, numa câmara fria, foi localizada a droga ilícita – lança-perfume).

As chaves, segundo Aldir, eram entregues pelo mencionado corréu.

No dia em que os policiais flagraram a droga no barracão (galpão), ninguém com firmeza depôs dizendo que o requerente lá tivesse estado.

Quando da sentença, já a participação dele havia sido afastada, anotando, a respeito, a Drª. Juíza, primeiramente, no tocante o delito de associação:

“Quanto ao acusado Aldir, embora haja alguns indícios de que também participava da associação, pois é amigo de Alcides e no dia dos fatos foi surpreendido no “quarto” anexo ao barracão, fazendo um programa amoroso, tendo com ele as chaves do barracão, não ficou caracterizada a associação criminosa com os demais acusados, de forma que não havendo elementos suficientes nos autos para comprovar o delito a ele imputado, há que ser absolvido, em homenagem ao princípio do “in dubio pro reo”, vigente no direito penal.

[...]

Quanto à pessoa de Aldir, embora ele tenha laços de amizade com Alcides e estava no local dos fatos tendo um relacionamento amoroso clandestino, não há prova segura nos autos de que o mesmo participava da tal sociedade, devendo Aldir ser absolvido em relação a este delito” (fls. 711/712).

Sua Excelência a magistrada, quando apreciou, no decisum, o crime de tráfico ilícito de drogas – art. 12 da Lei nº 6368/76 -, assim se referiu:

“Quanto à participação do acusado Aldir Câmara Franco nos fatos denunciados pelo digno representante do Ministério Público, tenho que não restou comprovado.

Segundo consta, no dia dos fatos o acusado Aldir Câmara Franco foi surpreendido por policiais militares em um quarto, anexo o barracão aonde foram encontrados os frascos de “lança-perfumes”, juntamente com a jovem Elizângela Regina Ritzel, arrolada como testemunha de defesa (fls. 371/372), com a qual estava fazendo clandestinamente um “programa” amoroso” (fl. 730).

RC nº 679.639-0 fl. 7

[...]

“As testemunhas de acusação confirmam a versão apresentada pelo acusado Aldir e nada informam acerca da sua participação nos delitos a ele imputados” (fl. 733).

[...]

“Um fato é certo, Aldir estava no dia dos fatos no local aonde foram apreendidos os frascos de “lança-perfume”, no entanto, ele demonstrou que estava naquele local tendo um relacionamento amoroso e clandestino com Elisângela, tanto que fora denunciado juntamente com os demais, em razão dos fortes indícios que havia quanto à sua participação nos delitos, porém, nada há de concreto nos autos que comprove que o acusado Aldir tenha praticado os delitos juntamente com os demais denunciados, conforme relata a peça acusatória” (fl. 736).

[...]

“Assim, a absolvição do acusado Aldir Câmara Franco, é medida que se impõe, pois duvidosa se mostrou a autoria e/ou a coautoria nos delitos a ele imputados e na dúvida, impõe-se a sua absolvição, porque no Direito Penal não opera em situação duvidosa, valendo dizer que somente diante da certeza plena da autoria e da culpabilidade de quem é acusado de um delito é que o Juiz pode impor uma condenação criminal,homenageando dessa forma o princípio do “in dubio pro reo”” (fl. 737).

A tudo se soma que em o acórdão rescindendo se chega a ler que a convicção acerca da culpabilidade de Aldir nos fatos, provém da palavra dos envolvidos, o que, a rigor não procede, tendo os mesmos sido interrogados às fls.: Acides Colla (fls. 462/467) e Moisés de Oliveira (fls. 478/484). Ao que se constata, o que os réus revelaram não aponta o requerente Aldir como tendo, também, cometido os ilícitos (na verdade, entre esses dois, é que existiu a societas sceleris).

Diante do exposto, impõe-se dar por procedente a ação de revisão criminal ajuizada por Aldir Câmara Franco, para absolvê-lo dos crimes lhe imputados, já referidos.

Determina-se que em consequência se recolha o mandado de prisão expedido contra o mesmo.

RC nº 679.639-0 fl. 8

ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Criminal, em Composição Integral, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em julgar procedente a presente revisão criminal, determinando-se o recolhimento do Mandado de Prisão. Vencido o Dr. Juiz Substituto TITO CAMPOS DE PAULA que declarará voto em separado.

Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores, MIGUEL PESSOA , Presidente com voto, CARVILIO DA SILVEIRA FILHO e os Senhores Juízes Substitutos LUIZ CEZAR NICOLAU e TITO CAMPOS DE PAULA .

Curitiba, 10 de março de 2011.

DES. ANTÔNIO MARTELOZZO – Relator Designado

No tocante a este processo, observamos a procedência da revisão criminal, a qual foi formulada sob o fundamento do art. 621, inciso I, do Código de Processo Penal, tendo-se em vista a absolvição do acusado. Vislumbramos, portanto, a necessidade da “fundamentação vinculada”, alusiva “às hipóteses de cabimento da ação”, como bem afirma Eugênio Pacelli. [12]


[1] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e de execução penal. 3ª ed. São Paulo: RT,2007. Pág. 857.

[2] ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 9ª ed. Salvador-Bahia: Editora Juspodivm, 2014. Pág. 1136.

[3] GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antônio Magalhães; FERNANDES, Antônio Scarance. Recursos no processo penal. 6ª ed. São  Paulo: RT, 2011. Pág. 163.

[4] ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 9ª ed. Salvador-Bahia: Editora Juspodivm, 2014. Pág. 1138.

[5] Idem, pág. 1140.

[6] MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. Pág. 672.

[7] RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. Pág. 620.

[8] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 6a ed. Rio de Janeiro : Lumen Juris, v. 2, 2002. Pág. 04.

[9] Idem, pág. 05.

[10] ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. 9ª ed. Salvador-Bahia: Editora Juspodivm, 2014. Pág. 1324.

[11] Idem, pág. 1328.

[12] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. Pág. 846.

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