Disputa entre Redes de Televisão e Empresas de TV paga: a remuneração pelo licenciamento de programação de televisão digital (TV aberta)

30/03/2017 às 11:16
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O desligamento do sinal de TV analógica desperta controvérsia sobre os preços pelo licenciamento do conteúdo dos canais da TV digital pelas empresas de TV por assinatura. O tema é objeto da regulação setorial do Direito da Comunicação.

O desligamento do sinal de TV analógica desperta controvérsia sobre os preços pelo licenciamento do conteúdo dos canais da TV digital pelas empresas de TV por assinatura. O tema é objeto da regulação setorial do Direito da Comunicação.[1]

As empresas de TV por radiodifusão pretendem cobrar remuneração pela cessão de sua programação digital às empresas de TV por assinatura. As redes de televisão SBT, Record e Rede TV, criaram a joint venture SIMBA, já aprovada pelo CADE[2], para explorar o direito ao licenciamento de sua programação digital perante as prestadoras do serviço de TV por assinatura. 

O fundamento jurídico para a criação da joint venture SIMBA das redes de televisão foi a própria Lei da Comunicação Audiovisual de acesso condicionado. As emissoras de televisão aberta informa que apenas uma das empresas de TV por assinatura (Vivo) estabeleceu negociação com as referidas redes de televisão, e decidiu por manter  a transmissão da programação da TV digital.

As redes de televisão alegam que as empresas de TV por assinatura recusam-se ao pagamento da remuneração pelo licenciamento da programação dos canais da TV digital. A Lei da Comunicação Audiovisual de acesso condicionado (Lei n. 12485/2011, SeAC), em seu art. 32, inc I, prevê a questão da remuneração da cessão da programação pelos canais de TV aberta às prestadoras do SeAC. O texto da regra legal dispõe sobre a obrigatoriedade de a empresa prestadora do serviço de comunicação audiovisual de acesso condicionado (SeaC), disponibilizar, sem ônus para o assinante, canais de TV aberta, transmitidos em tecnologia analógica.[3]

Mas, em relação à tecnologia digital, há também outra norma da lei da comunicação audiovisual de acesso condicionado (SeaC) que dispõe que a emissora de TV por radiodifusão poderá ofertar sua programação para as prestadoras de TV por assinatura, em condições isonômicas e não discriminatórias, conforme acordo comercial entre as partes.[4] Na hipótese de inexistir acordo comercial entre as partes, é facultado à geradora local de radiodifusão de sons e imagens exigir a distribuição gratuita de sua programação pelas prestadoras do SeaC, na área de prestação do serviço.[5]

Em síntese, da interpretação da lei da comunicação audiovisual de acesso condicionado conclui-se no sentido da faculdade de as empresas de TV por radiodifusão cobrar ou não remuneração pelo licenciamento do conteúdo de seus canais de televisão digitais. As empresas de TV por radiodifusão têm direito sobre o licenciamento de programação audiovisual, razão pela qual são protegidas pela legislação setorial, e, também pela legislação sobre direitos autorais. Com efeito, a rede de televisão realiza intensos investimentos na produção de sua programação (conteúdos artísticos e jornalísticos, entre outros), daí porque terceiros interessados no licenciamento da programação de televisão digital devem solicitar autorização às empresas de TV por radiodifusão, bem como efetuar o respectivo pagamento da remuneração negociada.    

Destaque-se que aguarda decisão final no Supremo Tribunal Federal, a ADI 4679/DF em conjunto com as ADIs 4.747, 4.756 e 4.923. O voto do Rel. Min. Fux,  foi no sentido da declaração da constitucionalidade da Lei n. 12.485/2011, ressalvada  a exceção de seu voto sobre a inconstitucionalidade do art. 25. Esta norma regula a contratação de agência de publicidade brasileira para veiculação de publicidade contratada no exterior.[6]

Na perspectiva das redes de televisão aberta, há o sério risco de perda de receitas com a diminuição da base de sua audiência, com a não transmissão do sinal de TV digital pelas empresas de TV por assinatura. 

Por sua vez, na perspectiva dos consumidores, com o desligamento do sinal analógico,  há o risco de ficarem sem o acesso aos canais digitais da TV aberta, no ponto de decodificação do sinal da TV por assinatura. Nesta hipótese de ausência de acordo empresarial sobre o licenciamento da programação, os consumidores acessariam ao sinal da TV digital, mediante antenas instaladas em seus televisores. Aliás, os consumidores, ao contratar os serviços de TV por assinatura, criaram expectativas legítimas quanto ao recebimento dos canais da TV digital.

A Anatel, segundo informações veiculadas pela imprensa, notificará as empresas de TV por assinatura, com fundamento no Regulamento de Defesa dos Direitos dos Assinantes de TV por assinatura, o qual dispõe que qualquer alteração no plano de serviços deve ser comunicada com antecedência de,  no mínimo,  30 (trinta) dias aos assinantes.

Possivelmente, se não houver negociação entre as redes de televisão e as empresas de TV por assinatura, poderá ocorrer a judicialização do tema. Ao final, o Poder Judiciário, no Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça,  fixará a interpretação constitucional e legal da referida lei da comunicação audiovisual de acesso condicionado.

NOTAS:

[1] Sobre o tema, ver: Scorsim. Ericson M. Direito das comunicações. Telecomunicações. Internet. TV por radiodifusão. TV por assinatura, 2016, disponível no site da Amazon.

2CADE (Ato de Concentração 08700.006723/2015-21).

3 Conforme Lei n. 12.485/2011:

“Art. 32.  A prestadora do serviço de acesso condicionado, em sua área de prestação, independentemente de tecnologia de distribuição empregada, deverá tornar disponíveis, sem quaisquer ônus ou custos adicionais para seus assinantes, em todos os pacotes ofertados, canais de programação de distribuição obrigatória para as seguintes destinações: 

I - canais destinados à distribuição integral e simultânea, sem inserção de qualquer informação, do sinal aberto e não codificado, transmitido em tecnologia analógica pelas geradoras locais de radiodifusão de sons e imagens, em qualquer faixa de frequências, nos limites territoriais da área de cobertura da concessão; 

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4 Conforme Lei n. 12.485/2011:

"Art. 32. (...)

§ 12.  A geradora local de radiodifusão de sons e imagens de caráter privado poderá, a seu critério, ofertar sua programação transmitida com tecnologia digital para as distribuidoras de forma isonômica e não discriminatória, nas condições comerciais pactuadas entre as partes e nos termos técnicos estabelecidos pela Anatel, ficando, na hipótese de pactuação, facultada à prestadora do serviço de acesso condicionado a descontinuidade da transmissão da programação com tecnologia analógica prevista no inciso I deste artigo. 

5  Conforme Lei n. 12.485/2011:

"Art. 32. (...)

§ 13.  Caso não seja alcançado acordo quanto às condições comerciais de que trata o § 12, a geradora local de radiodifusão de sons e imagens de caráter privado poderá, a seu critério, exigir que sua programação transmitida com tecnologia digital seja distribuída gratuitamente na área de prestação do serviço de acesso condicionado, desde que a tecnologia de transmissão empregada pelo distribuidor e de recepção disponível pelo assinante assim o permitam, de acordo com critérios estabelecidos em regulamentação da Anatel. 

6 Até o presente momento, no STF, o voto do Min. Relator das ADI’s sobre a Lei da TV por assinatura é seguido pelos Ministros Luís Roberto Barroso, saudoso Teori

Zavascki e Rosa Weber. O Min. Luiz Edson Fachin considerou a lei totalmente constitucional – inclusive o artigo 25. Aguardam-se os votos dos demais Ministros. Ver: Temas de Direito da Comunicação na Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, obra inédita.


Sobre o autor
Ericson Meister Scorsim

Advogado e Consultor em Direito Público, com foco no Direito das Comunicações (Telecomunicações e Internet). Sócio Fundador do Escritório Meister Scorsim. Mestre em Direito pelo UFPR. Doutor em Direito pela USP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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