O Direito de Família no Direito Internacional Privado e os casamentos de estrangeiros

20/04/2017 às 09:12
Leia nesta página:

O artigo estuda as relações de Direito de Família no Direito Internacional Privado.


I - CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO ENVOLVENDO DIREITO DE FAMÍLIA
O artigo 7º  da Lei de Introdução disciplina que a  lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. Afasta-se o nosso sistema juridico do elemento de conexão nacionalidade que é o preferido em países europeus.
O artigo 27 do Código Bustamante submete à lei pessoal tanto a capacidade de exercício como a de direito. Mas há as restrições de ordem pública que devem ser aplicadas.
A capacidade de direito ou de gozo que é inserida a quem possui personalidade jurídica, se define como sendo a aptidão genérica para aquisição de direitos e deveres, e a capacidade de fato ou de exercício que é a aptidão de exercer por si os atos da vida civil.
A determinação do início da personalidade natural será dada pela lex domicilii dos pais. A lex domicilii ainda determinará as normas sobre o fim da personalidade, as presunções de morte, a comoriência e a ausência.
Passemos a discutir a questão do casamento e seus efeitos no Direito Internacional Privado diante das regras de segundo grau estabelecidas.
A capacidade matrimonial rege-se pela lei domiciliar dos nubentes, como se explicita no Código Bustamante, artigo 36, primeira parte.
A lei do país em que for domiciliada a pessoa casada determinará as normas relativas ao direito de família.
Nas relações de paternidade, maternidade, filiação decorrente do matrimônio, reconhecimento e adoção, aplica-se no conflito de leis no espaço a lex domicilii das pessoas interessadas, dos pais.
Lembre-se que os filhos, havidos ou não, do casamento, têm os mesmos direitos, artigo 227, § 6º da Constituição de 1988, que é norma de aplicação cogente na matéria.
No Brasil, qualquer estrangeiro aqui domiciliado pode adotar, à luz do artigo 7º da Lei de Introdução, obedecidos os termos e prescrições legais na matéria, como se lê dos artigos 31; 39, parágrafo único; 46, § 2º; 51, § primeiro, primeira parte; 51, § 1º, segunda parte; artigo 51, § 2º; 51, § 3ª; 51, § 4º, todos da Lei 8.069/90.  
Na Alemanha, em Portugal, na Grécia, no Japão, China e Coréia deverá prevalecer o elemento de conexão da nacionalidade pelo qual se adotando e adotante tiverem nacionalidade diversa, a legislação que regulará a adoção será a nacional do adotante. Na França, se aplicará a lei nacional do adotando, e, se algum desses, adotando ou adotado, for francês, prevalecerá a lei francesa.
Em matéria de adoção, foi acatado pelos países do Common Law e da América Latina(Convenção Internacional sobre Conflitos de Leis em matéria de adoção de menores de 1964), o critério pelo qual se ambos tiverem o mesmo domicílio se aplicará a lei local, mas, se o adotando estiver domiciliado em ouro país, a sua lei deverá ser considerada. Se realizada a adoção no Brasil, a forma será aquela da lei brasileira e a capacidade para ser adotado será regida pela legislação do domicílio do adotando(Código Bustamante, artigo 73 a 77).
A Convenção Interamericana sobre conflitos de leis em matéria de adoção de menores, que foi elaborada em 1964, antecede à Declaração sobre princípios sociais e jurídicos, aplicáveis à proteção e ao bem-estar dos menores, tendo como escopo a Resolução da Assembleia Geral da ONU, de n. 41/85, bem como as normas de Beijing da ONU para a administração da justiça para menores e adolescentes(Resolução n. 40/33, da Assembleia Geral da ONU de 29 de novembro de 1985) Essas normas são acrescidas à Declaração sobre proteção às mulheres e crianças em períodos de guerra ou de urgência(Resolução n. 3.318, da Assembleia Geral de 14 de dezembro de 1974) que serviram de diretriz à Convenção relativa aos direitos da criança, adotada pelo governo brasileiro, em 26 de janeiro de 1990 e aprovada pelo Decreto Legislativo n. 28, de 18 de setembro de 1990. São normas imperativas de Direito Internacional Público.
O elemento de conexão apontado na Convenção é o do domícilio das partes, que melhor atender às adoções internacionais no âmbito das Américas.
. O casamento celebrado no exterior, segundo as formalidades legais, será reconhecido como válido no Brasil, ante o princípio do respeito do direito adquirido no estrangeiro, ressalvados os casos de ofensa à ordem pública brasileira e fraude à lei nacional, se não se observar os impedimentos dirimentes fixados legalmente, como se lê do artigo 40 do Código Bustamante.
O mesmo diploma legal de direito internacional privado determina em seu artigo 41 que se terá “em toda parte como válido, quanto à forma, o matrimônio celebrado na que estabeleça como eficazes as leis do país em que se efetua. Contudo, os Estados, cuja legislação exigir uma cerimonia religiosa, poderão negar validade aos matrimônios contraídos por seus nacionais no estrangeiro sem a observância dessa formalidade”.
Há impedimentos dirimentes absolutos, impedimentos dirimentes relativos e impedimentos impedientes.
Os impedimentos dirimentes absolutos impedem o casamento da pessoa com qualquer outra. São impedimentos dirimentes absolutos: a) a idade inferior a 16 anos; b) a demência notória e a interdição ou inabilitação por anomalia psíquica; c) o casamento anterior não dissolvido.
Os impedimentos dirimentes relativos impedem o casamento de uma pessoa com uma outra, mas não com qualquer outra. São impedimentos dirimentes relativos; a) o parentesco na linha reta; b) o parentesco no segundo grau da linha colateral; c) a afinidade na linha reta; d) a condenação anterior de um nubente, como autor ou cúmplice, por homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro.
Os impedimentos impedientes podem ser dispensados por quem de direito e nos termos da lei, tais como: a) a falta de autorização dos pais ou do tutor para o casamento de nubentes menores; b) o prazo internupcial; c) o parentesco no terceiro grau da linha colateral; d) o vínculo de tutela, curatela ou administração de bens; e) o vínculo de adoção restrita; f) a pronúncia do nubente pelo crime de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro, enquanto não houver despronúncia ou absolvição por decisão passada em julgado.
Até a celebração do casamento, qualquer pessoa pode declarar os impedimentos de que tenha conhecimento. Feita a declaração, o casamento só será celebrado se o impedimento cessar, for dispensado ou for julgado improcedente por decisão judicial com trânsito em julgado.

O critério ius loci celebrationis permite que se confiram efeitos ao casamento celebrado no exterior. A lei local, locus regit actum, rege os atos cumpridos.
Segundo o artigo 7º, § 2º, da Lei de Introdução, “o casamento de estrangeiros pode celebrar-se perante as autoridades diplomáticas ou consulares do país de ambos os nubentes”, no próprio consulado ou fora dele.
Assim, há uma facultatividade da locus regit actum, como ensinou Maria Helena Diniz(Lei de Introdução ao Código Civil, 1994, pág. 219), consagrando-se o critério da nacionalidade, pois permitido estará que os estrangeiros, casando-se fora de sua pátria, recorram ao agente consular ou diplomático do seu Estado, para, perante ele, unindo-se matrimonialmente segundo a forma pessoal, da lei do país do celebrante, subtraindo-se à ação da autoridade local e ás exigências legais do país em que se encontram, sob o fundamento de que não se justificaria o império da lei do local da celebração das núpcias em relação às pessoas sem qualquer dependência político-jurídica. Assim se os noivos não tiverem a mesma nacionalidade, o casamento deverá ser feito pela autoridade local segundo o princípio da lex loci celebrationis.
Pode acontecer a aplicação do reenvio.
O  reenvio é instituto pelo qual o Direito Internacional Privado de um Estado determina a aplicação das normas jurídicas de outro Estado, e as regras de Direito Internacional Privado deste indicam que a situação deve ser regulada pelas normas de um terceiro Estado ou pelo próprio ordenamento do primeiro Estado, remetente.
A depender do número de Estados envolvidos, então, fala-se em:
Reenvio de primeiro grauè O ordenamento jurídico de um Estado A indica a ordem jurídica de um Estado B como aplicável a um caso, e o Direito deste Estado B determina como incidente a ordem do Estado A;
Reenvio de segundo grau è O ordenamento jurídico de um Estado A indica a ordem jurídica de um Estado B como aplicável a um caso, e o Direito deste Estado B determina como incidente a ordem do Estado C.
II - O CASAMENTO CONSULAR
A teor do artigo 42 do Código Bustamante, o casamento consular celebrado no exterior, sob o critério da nacionalidade ou do domicílio dos nubentes, desde que atendidos os requisitos do país a que pertence o celebrante e do local da celebração, deverá ser tido como válido.
O casamento contraído perante agente consular será provado por certidão de assento no registro do Consulado. E se, nessa hipótese, um ou ambos os cônjuges vieram para o Brasil, o assento de casamento, para produzir efeitos no país, deverá ser transladado nos cartórios do 1º Ofício do domicílio do registrado ou no 1º Ofício do Distrito Federal, na falta de domicilio conhecido, como reza o artigo 32, § 1º, da Lei dos Registros Públicos, Lei 6.015/73.
Assim a regra é da aplicação da lex domicilii dos nubentes, se o tiverem em comum. Não o tendo, a invalidade matrimonial reger-se-á pela lei do primeiro  domicílio conjugal, ou seja, o estabelecido logo após o casamento.
Porém, se os nubentes tiverem domicílio internacional diverso prevalecerá para os requisitos intrínsecos do ato nupcial e para as causas de sua nulidade absoluta ou relativa, inclusive no que venha a atinar aos vícios de consentimento, a lei do primeiro domicílio conjugal estabelecido após o casamento. Aliás, o artigo 47 do Código Bustamante dita que “a nulidade do matrimônio deve regular-se pela mesma lei a que estiver submetida a condição intrínseca ou extrínseca que a tiver motivado”.
A invalidade matrimonial será analisada pela lei do domicílio comum dos nubentes ou pela lei do primeiro domicílio conjugal.
III - O CASAMENTO PUTATIVO E O DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO
E se houver casamento putativo? Casamento putativo é aquele em que a boa-fé suprime um eventual impedimento.
A matéria foi estudada pela doutrina, como se lê de Espínola e Espínola Filho(A  Lei de introdução ao Código Civil Brasileiro Comentada, 1943, volume II, pág. 296 a 301) que entende que os efeitos do casamento putativo determinar-se-ão pela lei que teria disciplinado a família se não tivesse ocorrido a declaração de invalidade matrimonial.
Maria Helena Diniz(obra citada, pág. 225) cita Prospero Fedozzi, em obra de 1897, quando concluiu que no caso de haver diversidade de leis pessoais, a norma aplicável será a do cônjuge de boa-fé, por se tratar de uma medida equitativa, em favor da boa-fé. Mas entende-se que os efeitos do casamento putativo relativamente aos cônjuges e prole são os mesmos que a lei pessoal reconhecer, seja ela a do domicílio comum, seja ela a do primeiro domicílio conjugal, havendo domicílio internacional diverso.
IV  - O CASAMENTO DO FUNCIONÁRIO DIPLOMÁTICO OU CONSULAR
Passo ao casamento de funcionário diplomático ou consular.
Os funcionários diplomáticos e consulares dependem de autorização para casar, em razão da disciplina imposta pela carreira. Como se lê da Lei 3.917/61  e pela Lei 1.542/52, artigo 1º; Decreto-lei 2/61, artigo 45, e Lei 7.501/86, artigo 36, não poderão casar-se com estrangeira, salvo com licença do Ministro de Estado, sendo que, se a estrangeira se naturalizar cidadã brasileira, não haverá restrição alguma.
Pelo artigo 37 da Lei 7.501/86, o funcionário do serviço exterior do Ministério das Relações Exteriores deve pedir autorização ao Presidente da República para casar com pessoa empregada no governo estrangeiro ou que dele receba comissão ou pensão. Ditou o Decreto-lei 9.202/46 que, no intuito de resguardar o interesse público, a servidora pública que se casar com diplomata deve se exonerar do cargo.
V  - O DIREITO INTERNACIONAL E O REGIME DE BENS DO CASAMENTO
A teor do artigo 7º § 4º da Lei de Introdução o regime de bens, legal ou convencional, obedece à lei do país em que tiverem os nubentes domicílio, e, se este for diverso, o do primeiro domicílio conjugal.
Os entes que compõem os Estados Unidos da América gozam de autonomia para legislar, de forma independente, acerca de Direito de Família. Em termos de regime de bens, há lá dois tipos de estados: (1) os “community states” (que são apenas 9 estados: Arizona, Califórnia, Idaho, Louisiana, Nevada, Novo México, Texas, Washington e Wisconsin), nos quais com o casamento passa a existir uma forma de comunhão de bens (vale dizer, em que alguns bens, mesmo registrados em nome de um cônjuge, são de propriedade comum do casal) e os (2) “separate states”, dentre os quais a Flórida, em que não há uma comunhão de bens com o casamento, pois no curso do casamento cada cônjuge continua a ter um patrimônio próprio, podendo alienar inclusive bens imóveis sem outorga marital (embora, findo o casamento, haja uma como que participação final nos aquestos).
No Brasil a situação legal é a que segue:
~Luciana Vitalma F. da Costa(Regime de bens no casamento) deixou acentuado:

“O Código Civil prevê os seguintes regimes:
a)    Comunhão parcial – arts. 1.658 usque 1.666;
b)    Comunhão universal – arts. 1.667 usque 1.671;
c)    Participação final nos aquestos – arts. 1.672 usque 1.686;
d)    Separação de bens – arts. 1.687 e 1.688
Dissertaremos sobre cada espécie.

.    REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL

Com a introdução da Lei do Divórcio (6.515/77) o regime de comunhão parcial de bens é o regime que vigora quando não há manifestação de vontade dos nubentes – chamado de regime legal (artigo 1.640 do CC).
Atualmente encontra-se previsto nos artigos 1.658 até 1.666 do Código Civil. Esse regime determina que se comunicam os bens adquiridos pelo casal na constância do casamento.
O regime de comunhão parcial faz surgir três massas distintas de bens:
a)    bens particulares do marido;
b)    bens particulares da esposa;
c)    bens comuns do casal.
O que significa que todos os bens adquiridos individualmente antes do casamento permanecem exclusivamente ao adquirente, inclusive aqueles bens que tem por título uma causa anterior (exemplo herança).
A esse respeito o artigo 1.659 do Diploma Civil arrola os bens que são excluídos da comunhão, a saber:
Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III - as obrigações anteriores ao casamento;
IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
Por sua vez os bens que entram na comunhão estão relacionados no artigo subsequente – 1.660 – vejamos:
Art. 1.660. Entram na comunhão:
I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;
II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Quanto aos bens móveis, à lei presume que foram contraídos na constância do casamento se não for possível comprovar que a aquisição antecedeu as núpcias.
A administração dos bens comuns compete a ambos os cônjuges (inteligência do artigo 1.663 do CC).
Alguns autores denominam esse regime como comunhão dos aquestos ou de adquiridos.

 REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL

Legalmente previsto nos artigos 1.667 a 1.671 do Código Civil. A opção por esse regime deve ser através de pacto antenupcial.
Por esse regime, todos os bens móveis ou imóveis adquiridos a qualquer tempo (antes ou depois do matrimônio) comunicam-se, mesmo que o bem esteja em nome de apenas um consorte. As dívidas também se comunicam nesse regime (artigo 1.667, parte final do CC).
 Todavia, há bens excluídos da comunhão que estão arrolados no artigo 1.668 do mesmo Diploma Legal, vejamos:
Art. 1.668. São excluídos da comunhão:
I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;
II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;
III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;
IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;
V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.
Cumpre lembrar que a cláusula de incomunicabilidade mencionada no inciso I do artigo citado anteriormente deve ser expressa e essa incomunicabilidade se estende aos bens sub-rogados no lugar daquele gravado com a mencionada cláusula.
É importante destacar que conforme disposto no artigo 499 do Código Civil é permitido a venda e compra entre cônjuges, com relação aos bens excluídos da comunhão.
Art. 499. É lícita a compra e venda entre cônjuges, com relação a bens excluídos da comunhão.
Conforme expressamente determinado no artigo 1.669 do CC a incomunicabilidade dos bens não se estende aos frutos quando percebidos ou vencidos na constância do casamento.
Assim como na comunhão parcial, a administração dos bens compete a ambos os cônjuges.

    REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQUESTOS

Trata-se de uma inovação do Código de 2002 e está previsto nos artigos 1.672 a 1.686 do CC.
Clovis Couto e Silva, elaborador do Anteprojeto da parte de Direito de Família no Código Civil, explica que:
Sob a denominação de “regime de participação final nos aquestos”, para distingui-lo do regime de comunhão parcial, que implica aquela participação desde a celebração do casamento, prevê-se um novo regime de bens que poderá atender a situações especiais, tal como se verifica nas Nações que vão atingindo maior grau de desenvolvimento, sendo frequente o caso de ambos os cônjuges exercerem atividades empresariais distintas).
Para adoção desse regime os cônjuges devem valer-se do pacto antenupcial.
Como muito bem ensina Caio Mário da Silva Pereira
A característica fundamental do regime de participação final nos aquestos consiste em que, na constância do casamento, os cônjuges vivem sob o império da separação de bens, cada um deles com o seu patrimônio separado. Ocorrendo a dissolução da sociedade conjugal (pela morte de um dos cônjuges, pela separação judicial ou pelo divórcio), reconstitui-se contabilmente uma comunhão de aquestos. Nesta reconstituição nominal (não in natura), levanta-se o acréscimo patrimonial de cada um dos cônjuges no período de vigência do casamento. Efetua-se uma espécie de balanço, e aquele que se houver enriquecido menos terá direito à metade do saldo encontrado.
O novo regime se configura como um misto de comunhão e de separação. A comunhão de bens não se verifica na constância do casamento, mas terá efeito meramente contábil diferido para o momento da dissolução.
Conforme define o artigo 1.673 do CC o patrimônio próprio de cada cônjuge é composto pelos bens que ele possuía ao casar e os bens adquiridos a qualquer título na constância do casamento.
Cada cônjuge tem a exclusiva administração de seus bens durante a constância de casamento, podendo livremente dispor dos bens móveis e necessitando de anuência do outro consorte para os bens imóveis.
No caso da dissolução da sociedade conjugal (artigo 1.674 do CC) deve-se apurar o montante dos aquestos, excluindo da soma dos patrimônios próprios (i) os bens anteriores ao casamento e os bens a ele sub-rogados, (ii) os que vierem a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade e (iii) as dívidas relativas aos bens.
Caberá a cada cônjuge a metade dos bens adquiridos pelo casal a título oneroso, na constância do casamento.
Por fim, o direito à meação, conforme disposto no artigo 1.682 do Código Civil “não é renunciável, cessível ou penhorável na vigência do regime matrimonial.”. Trata-se um princípio de ordem pública que não ser contrariado pela vontade das partes.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

   REGIME DE SEPARAÇÃO DE BENS

O Código Civil prevê dois tipos de regime de separação de bens: a separação legal ou obrigatória, que decorre expressamente da lei e a convencional, que decorre da manifestação de vontade dos nubentes.
Vejamos cada uma das hipóteses.

REGIME DE SEPARAÇÃO LEGAL

Os incisos do artigo 1.641 do Código Civil definem quais são as hipóteses em que é obrigatório o regime da separação de bens, são eles:
I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;
II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos;
III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
Por ser um regime obrigatório não é necessário celebrar o pacto antenupcial.
As causas suspensivas estão elencadas no artigo 1.523 do Diploma Civil. A restrição é eminentemente protetiva tanto para os maiores de 70 anos quanto para aqueles que dependem de suprimento judicial para casar, entenda-se os menores de 18 anos não emancipados, e objetivam evitar um casamento de interesse puramente material.

REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL

O regime de separação de bens convencional, como o próprio nome diz é aquele que decorre da manifestação de vontade dos nubentes e encontra-se previsto nos artigos 1.687 e 1.688 do Código Civil.
Para a adoção desse regime é necessário à celebração do pacto antenupcial.
Conforme previsto no artigo 1.687 do CC, a administração e a fruição dos bens permanecerá exclusivamente ao cônjuge, que poderá inclusive alienar ou gravar de ônus seus bens.
Nesse regime os cônjuges são obrigados a contribuir para a manutenção das despesas do casal na proporção dos seus rendimentos e de seus bens, podendo porém estipular de forma diferente no pacto antenupcial.
Na legislação brasileira outras observações podem ser feitas.
O cônjuge sobrevivente que era casado em regime de separação de bens, sem herdeiros necessários, ainda que o falecido tenha deixado testamento tem direito à metade da herança, porque é herdeiro necessário. A outra metade será destinada ao herdeiro necessário.
Na comunhão universal de bens as dividas são compartilhadas, isso porque elas são comunicáveis.
No caso do regime de comunhão universal são excluídos da comunhão(artigo 1668) os bens doados ou herdados com cláusula de incolumidade e os sub-rogados em seu lugar; assim se um imóvel doado com cláusula de incomunicabilidade vier a ser desapropriado, a indenização é paga pelo poder público(Decreto-lei 3365/41, artigo 31) ao donatário, em razão de sub-rogação real, não se comunicando ao seu cônjuge.
Ainda se excluem do regime de comunhão universal os bens de herança necessária a que se impuser a cláusula da incomunicabilidade; logo, pelo artigo 1848 a legítima de um consorte não se comunica ao outro.
Veja-se o caso de alguém que ganhou herança dos seus pais. Que regime de bens deverá escolher para que ele não seja da futura esposa em caso de divórcio?  Pode-se optar pelo regime da comunhão parcial de bens ou pelo regime da separação total de bens. O único regime que comunicaria esse bem seria o da comunhão universal de bens. Hoje em dia, poucas pessoas casam nesse tipo de regime. Os demais são bens anteriores, de doação ou herança, e eles não são comunicáveis.

No Brasil, o  antigo Código Civil impossibilitava a alteração do regime de bens escolhido por ocasião da celebração do casamento, ao dispor no artigo 230 que: "O regime de bens entre cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento, e é irrevogável". O atual Código Civil, ao contrário, em seu artigo 1.639, parágrafo segundo, dispõe que "é admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiro".
 É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando então o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com ressalva dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição da inexistência de dívida de qualquer natureza, exigida ampla publicidade”.
Para o STJ, é possível alterar o regime de bens do casamento, desde que respeitados os efeitos da opção anteriormente feita pelo casal.
O tema "Alteração do regime de bens na constância do casamento" possui 14 acórdãos. "É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando, então, o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com a ressalva dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de dívida de qualquer natureza, exigida ampla publicidade", diz um dos acórdãos.
Para os ministros do STJ, o Judiciário deve aceitar o desejo do casal de alterar o regime conjugal, uma vez que “a paz conjugal precisa e deve ser preservada”. No entendimento da Corte, diante de manifestação expressa dos cônjuges, não há óbice legal, por exemplo, de um casal partilhar os bens adquiridos no regime de comunhão parcial, na hipótese de mudança para separação total, desde que não acarrete prejuízo para ambos - entendeu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao reformar decisão Justiça do Rio Grande do Sul. No caso, o casal recorrente argumentou que o marido é empresário e está exposto aos riscos do negócio, enquanto a esposa tem estabilidade financeira graças a seus dois empregos, um deles como professora universitária.
Os magistrados de primeiro e segundo graus haviam decidido que é possível mudar o regime, mas não partilhar os bens sem que haja a dissolução da união. Assim, o novo regime só teria efeitos sobre o patrimônio a partir do trânsito em julgado da decisão que homologou a mudança.
O relator do recurso interposto pelo casal contra a decisão da Justiça gaúcha, ministro Marco Aurélio Bellizze, ressaltou que os cônjuges, atualmente, têm ampla liberdade para escolher o regime de bens e alterá-lo depois, desde que isso não gere prejuízo a terceiros ou para eles próprios. É necessário que o pedido seja formulado pelos dois e que haja motivação relevante e autorização judicial.
Bellizze ressaltou que ainda há controvérsia na doutrina e na jurisprudência sobre o momento em que a alteração do regime passa a ter efeito, ou seja, a partir de sua homologação ou desde a data do casamento. O ministro salientou, porém, que há hoje um novo modelo de regras para o casamento, em que é ampla a autonomia da vontade do casal quanto aos seus bens.
No STJ, tem prevalecido a orientação de que os efeitos da decisão que homologa alteração de regime de bens operam-se a partir do seu trânsito em julgado. A única ressalva apontada na legislação diz respeito a terceiros. O parágrafo 2º do artigo 1.639 do Código Civil de 2002 estabelece que os direitos destes não serão prejudicados pela alteração do regime..
Para que tal modificação ocorra, é imprescindível a autorização judicial, que se dará mediante o ajuizamento de procedimento próprio por ambos os cônjuges, por intermédio de advogado. O pedido deve ser comprovadamente motivado, cabendo ao juiz acolher tal motivação.
Além disso, deve-se também preservar os direitos e interesses de terceiros, o que, aliás, tem se mostrado a maior preocupação dos juízes em relação a estes pedidos.
Para tanto, recomenda-se demonstrar ao juiz, através de certidões negativas dos cônjuges e documentos, que os direitos de terceiros serão preservados, ou seja, que o pedido não é uma tentativa de fraudar eventuais direitos de terceiros, por exemplo, credores.
Na França, há alguns detalhes a discutir. Os casamentos celebrados antes de 1 de setembro de 1992 estão sujeitos ao direito comum, ao passo que os contraídos depois dessa data encontram-se ao abrigo da Convenção da Haia, de 14 de Março de 1978, sobre a lei aplicável aos regimes matrimoniais.
A lei aplicável ao regimes matrimoniais para cônjuges que casaram antes de 1 de setembro de 1992 é, em princípio, determinada pela localização do primeiro domicílio conjugal. A lei assim designada rege todas as relações patrimoniais entre os cônjuges, independentemente da localização dos seus bens. Este critério do vínculo de conexão é permanente: a lei do primeiro domicílio conjugal aplica-se ao longo de todo o casamento, mesmo que os cônjuges se mudem para outro Estado.
Para os casamentos celebrados depois de 1 de setembro de 1992, é a Convenção da Haia, de 14 de Março de 1978, que se aplica às relações patrimoniais entre os cônjuges, à exceção do regime primário, que continua a ser regido pelas disposições francesas aplicáveis nos termos das disposições imperativas (art.º 212.º-226.º do CC). Se os cônjuges não tiverem especificado uma escolha de lei antes do casamento, a lei aplicável é, em princípio, a da sua primeira residência habitual.
Ao contrário do direito comum, a Convenção da Haia prevê três casos em que a lei aplicável muda automaticamente (art.º 7.º, n.º 2): quando os cônjuges estabelecem a sua residência no Estado da sua nacionalidade comum; quando residem mais de 10 anos num Estado depois do casamento; para cônjuges que não tenham estabelecido a sua residência habitual no território do mesmo Estado depois do casamento (e cujo regime patrimonial estava consequentemente sujeito à lei do Estado de nacionalidade comum), quando estes estabelecem a sua residência habitual no mesmo Estado. Esta mudança automática tem efeitos apenas no futuro (contudo, o art.º 8.º permite que os cônjuges submetam todos os seus bens à nova lei, desde que esta escolha não prejudique os direitos de terceiros.
Quando não existe um contrato de casamento, os cônjuges ficam sujeitos ao regime legal da comunhão de bens: a comunhão de adquiridos ( art.º 1400.º-1491.º do CC ). Os bens adquiridos a título oneroso depois do casamento são comuns. No entanto, os bens que os cônjuges já possuíam no dia do casamento ou que adquiram por doação, legado ou herança, e os bens de "natureza pessoal", são bens próprios ( art.º 1404.º do CC ).
Os bens dos cônjuges são considerados comuns, se não for provado que são próprios (art.º 1402.º do CC).
As dívidas anteriores ao casamento são ressarcidas através do património próprio e dos rendimentos do cônjuge devedor ( art.º 1410.º e 1411º do CC ). As dívidas contraídas durante o casamento podem ser executadas contra o património próprio do cônjuge devedor e contra o património comum ( art.º 1413.º do CC ).
Sem o consentimento do outro cônjuge, as dívidas que resultem de empréstimos ou avais só podem ser executadas contra o património próprio e os rendimentos do cônjuge contratante e não contra o património comum (art.º 1415.º do CC).
Por fim, quando a dívida for contraída conjunta e solidariamente pelos cônjuges, pode ser executada contra todos os bens da família (art.º 1418.º do CC). É o caso, em particular, de todas as dívidas contraídas para a manutenção do lar e a educação dos filhos (art.º 1414.º do CC).
Passemos a situação na República da Itália.
O regime patrimonial automático estabelecido pela lei, caso os cônjuges não façam uma escolha diferente, é a comunhão legal, na qual recaem todos os bens adquiridos pelos dois cônjuges, juntos ou separadamente durante o casamento, exceto aqueles  considerados pessoais. Abrangem, portanto, as empresas que são administradas pelos dois cônjuges depois do matrimônio e também os frutos e os proventos de bens próprios e das atividades de cada um dos cônjuges (por exemplo, a renda de locação que um dos dois cônjuges recebe por um imóvel de sua propriedade).
Neste último caso, os frutos derivados dos bens próprios e proventos derivados da atividade serão re-incluídos na comunhão se, no momento da dissolução, não foram consumados. Os bens que, expressamente excluídos pela lei, não reentram na comunhão legal, preveem seis casos:

- Os bens de propriedade de um dos dois cônjuges antes do casamento;
- os bens de um dos cônjuges derivados de uma sucessão hereditária ou de uma doação;
- os bens de uso pessoal;
- os bens utilizados para o exercício da profissão desenvolvida pelos cônjuges (a menos que tais bens não são inerentes a uma eventual empresa administrada pelo casal);
- os bens obtidos a título de ressarcimento de danos e aqueles derivados da pensão devido a perda de capacidade de trabalho;
- os bens adquiridos com o valor que se obtém pela transferência de bens acima indicados, desde que seja expressamente indicado no ato de aquisição.

Em relação a administração de bens que recaem no regime de comunhão legal, a lei prevê que os cônjuges podem agir separadamente para os atos de ordinária administração (por exemplo, no caso de um imóvel em regime de comunhão, cada cônjuge pode providenciar o pagamento dos boletos), enquanto para os atos excedentes é necessário o consenso dos dois (ainda considerando o exemplo do imóvel, portanto, para a eventual venda será preciso o consenso dos dois cônjuges).

Os credores dos cônjuges podem se valer dos bens que recaem na comunhão legal, que constituem a principal garantia para os débitos contraídos.
O regime de comunhão legal pode ser modificado em separação legal seja no ato da celebração do matrimônio, com uma anotação que é feita a margem do ato, seja depois do casamento.

Em caso de divórcio, separação, anulação do matrimônio, morte de um dos cônjuges ou escolha de regime de separação dos bens, a comunhão legal se dissolve.
 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos