Fim do imposto sindical: de volta para o futuro

27/04/2017 às 18:29
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A correção da lacuna encravada na história brasileira por Getúlio Vargas começa, é inegável, pela retirada do Estado da relação entre trabalhador e sindicato, com a extinção da contribuição sindical obrigatória.

A representação sindical é uma das bases do equilíbrio de forças necessário em um ambiente capitalista de produção, visto que pretende relacionar, em paridade de armas, dois entes coletivos: um ente coletivo empregador, detentor do capital e dos meios de produção (empresa), e um ente coletivo empregado, que negocia sua força de trabalho (sindicato).

No Brasil, é durante o período da chamada “República Velha”, que compreende o período de instauração da República e o início dos movimentos políticos da década de 1930, que têm início os primeiros movimentos sindicais trabalhistas.

Nessa época, a força produtiva brasileira era essencialmente rural, de maneira que poucas categorias urbanas, tais como as de trabalhadores em ferrovias e em portos, iniciavam movimentos na direção associativa.

A partir dos bruscos movimentos políticos no caminho da urbanização e industrialização, notadamente capitaneados por Getúlio Vargas, é que se verificam mais concretamente mobilizações tendentes à reunião sindical.

Grande parte dos trabalhadores não entendeu, contudo, de imediato, o objetivo e a relevância da representação sindical. Assim, o crescimento dos movimentos associativos trabalhistas, especialmente em seu início, dependia de agressiva propaganda, de maneira a promover a educação, a conscientização e a persuasão da categoria.

É nesse ambiente, na gênese do movimento sindical brasileiro, que Getúlio Vargas resolve trazer à tutela do Estado os movimentos sindicais, garantindo que as tensões próprias dos embates entre capital e trabalho fossem minimizadas, permitindo uma transição suave entre a até então realidade rural brasileira e a pretendida industrialização do país.

Nesse sentir, passaram a ser tuteladas pelo Estado todas as regras de organização, reconhecimento e até mesmo de financiamento sindical.

Em 1930, foi criado, pelo Decreto 19.443, o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e, pouco tempo depois, através do Decreto 19.671-A, de 1931, foi instituído o Departamento Nacional do Trabalho. Nesse mesmo ano, através do Decreto 19.770/31, foi estabelecido o que seria a estrutura sindical oficial, baseada na unicidade sindical e submetida ao reconhecimento pelo Estado, que repousava sobre os sindicatos a honra de ser um colaborador estatal.

A obrigatoriedade da cobrança de contribuições em favor dos sindicatos surgiu com a Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937, que estabelecia o seguinte em seu artigo 138:

Art. 138. A associação profissional ou sindical é livre. Somente, porém, o sindicato regularmente reconhecido pelo Estado tem o direito de representação legal dos que participarem da categoria de produção para que foi constituído, e de defender-lhes os direitos perante o Estado e as outras associações profissionais, estipular contratos coletivos de trabalho obrigatórios para todos os seus associados, impor-lhes contribuições e exercer em relação a eles funções delegadas de Poder Público.

Pouco tempo depois, em 1939, o Decreto-lei nº 1.402 passou a regular as associações sindicais, aí incluída a contribuição obrigatória, expressamente fixada pelo Decreto-lei nº 2.377, de 1940, nos mesmos moldes levados por Getúlio Vargas, em 1943, através do Decreto-lei 5.452, à Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

Como se vê, no Brasil houve uma espécie de viagem para o futuro, estrategicamente manejada por Getúlio Vargas, que fez com que o desenvolvimento dos sindicatos no país pulasse a fase, tão necessária, de conscientização, educação e persuasão dos trabalhadores.

Esse salto, tutelado pelo Estado autoritário, fez com que a representação sindical brasileira se apresente frágil como é, sem representação e sustentação, de um lado, e sem fiscalização e cobrança por resultados, de outro lado.

Em pesquisa realizada por sítio na internet[1], concluída em abril de 2017, nada menos do que 98% (noventa e oito por cento) dos mais de 14.000 respondentes afirmaram que não se sentiam representados pelos sindicatos e que acreditavam que os sindicatos não defendiam efetivamente suas categorias.

Já é passada a hora da história do sindicalismo brasileiro ganhar novos contornos, de forma que tais associações efetivamente passem a desempenhar os papeis políticos, econômicos e sociais que lhe são ínsitos.

A correção da lacuna encravada na história brasileira por Getúlio Vargas começa, é inegável, pela retirada do Estado da relação entre trabalhador e sindicato, com a extinção da contribuição sindical obrigatória.

Para prover seus meios de subsistência, os sindicatos terão, inicialmente, que educar, conscientizar e persuadir os trabalhadores que ainda não tenham alcançado o quão necessária é essa forma de representação.

De outro lado, educados, conscientes e persuadidos, os trabalhadores sindicalizados certamente fiscalizarão e cobrarão resultados, conferindo aos sindicatos, que nesse ambiente vingarem, o poder de representação e sustentação que lhes garantirá a paridade de armas para negociar.


[1] http://www.oantagonista.com/posts/a-opiniao-dos-leitores-os-sindicatos-nos-representam

Sobre o autor
Thiago Paim

Advogado com mais de vinte anos de experiência, atuando na assessoria jurídica e gestão de equipes multidisciplinares em favor de grandes empresas e conglomerados nacionais e internacionais, públicos e privados, especialmente envolvendo Direito do Trabalho e Relações Sindicais, Direito Previdenciário, Direito Administrativo, Direito Societário e Empresarial com foco em M&A, Grandes Projetos Estruturados, Project Finance, Structured Loans, Contratos Administrativos e Licitações, Parcerias Público-Privadas, Abertura de Capital, Oferta Pública de Ações, Maximização de Valores, Mediação, Conciliação e Reestruturação e Recuperação de Empreendimentos, Dívidas e Ativos.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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