Doação de órgãos entre pessoas vivas e suas regras

Você sabe responder se pessoa vivas podem doar órgãos para qualquer outra pessoa?

28/05/2017 às 11:30
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Para que alguém doe um órgão ele precisa estar vivo. Depois da morte, deixe de existir capacidade civil e, por isso, o morto não poderá dispor sobre seu corpo, claro. Dessa forma, o corpo passa a ser um objeto, só que um objeto muito especial, porque nel

Você sabe responder se pessoa vivas podem doar órgãos para qualquer outra pessoa?


A maioria da população conhece medianamente a questão da doação e transplante de órgãos de pessoas mortas. 

O termo transplante é empregado no sentido de retirada ou remoção de órgãos, tecidos ou partes do corpo de um ser, vivo ou morto, para aproveitamento, com finalidade terapêutica.

Mas, para pessoas vivas, há regras para que uma doação possa ser feita?

Sim, há, é essas regras são estabelecidas pela Lei nº 9.434/97, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências.  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9434.htm

Mas mesmo se a pessoa for totalmente saudável, o médico não pode simplesmente pegar o órgão: a doação só pode acontecer com o consentimento do doador. Caso contrário não seria doação, seria a retirada forçado, clandestina e ilegal.

Dessa forma, é importante mencionar que um indivíduo não pode doar um órgão vital, como o seu coração ou seu cérebro, porque você só tem um de cada e sem eles não conseguirá viver. Mas você pode doar outros órgãos importantes, como um rim ou mesmo um pulmão, porque tem dois de cada. 

Logo, seria em teoria possível uma pessoa doar um de seus rins se isso não representar um risco acima do normal para sua saúde.

Para que alguém doe um órgão ele precisa estar vivo. Depois  da morte, deixe de existir capacidade civil e, por isso, o morto não poderá dispor sobre seu corpo, claro. Dessa forma, o corpo passa a ser um objeto, só que um objeto muito especial, porque nele já houve vida um dia. E, obviamente, ele representa algo emocionalmente valioso para os amigos e familiares do morto. Logo, ele precisa ser tratado com respeito.

E é por isso que quem viola uma sepultura está cometendo um crime chamado violação de sepultura, e quem tira os dentes de ouro do cadáver, por exemplo, está cometendo o crime de vilipêndio a cadáver.  Isso mostra como a Lei penal quiz proteger a memória que o morto deixou para familiares e amigos.

Mas isso não quer dizer que o cadáver é algo intocável. Tanto é assim que ele pode ser transformado em cinzas durante a cremação. Da mesma forma, a família do morto pode autorizar a doação de seus órgãos.

É importante mencionar que o processo de doação segue algumas regras muito claras. Entre elas, que o transplante só pode ser feito por uma equipe médica autorizada e depois de comprovada a morte encefálica da pessoa. 

E, além disso, a pessoa precisa estar morta. Se a pessoa não estava morta, os familiares não têm poder de doar os órgãos. Ainda que a pessoa esteja em estado vegetativo, os órgãos ainda são dela e só ela pode dizer se quer doar. E, ainda assim, ela só pode doar um órgão sem o qual ela possa sobreviver e se essa doação não aumentar o risco à sua vida de forma inaceitável.

Depois de sua morte, a doação precisa ser autorizada pela família (cônjuge ou parente até segundo grau) e ser realizada por médicos.

 

Doadores vivos

A doação de órgãos também pode ser feita em vida para algum membro da família ou amigo, após avaliação clínica da pessoa. Nesse caso, a compatibilidade sanguínea é primordial e não pode haver qualquer risco para o doador. Os órgãos e tecidos que podem ser retirados em vida são rim, pâncreas, parte do fígado, parte do pulmão, medula óssea e pele.

Em se tratando de doador vivo (transplante inter vivos), exige a lei que o mesmo seja juridicamente capaz, salvo na hipótese de transplante de medula óssea, caso em que os pais ou responsáveis deverão autorizar (art. 3.º, § 6.º). O doador não poderá ser gestante, salvo em se tratando também de transplante de medula, e desde que não ofereça risco à sua saúde ou a do feto.

Esse consentimento deverá ser também pleno e esclarecido, ou seja, o profissional responsável pela cirurgia de remoção deverá prestar ao doador, também de forma clara e compreensível, segundo a sua condição social, todas as informações acerca dos riscos do procedimento e das sequelas que poderão advir. Esse requisito reveste-se de grande importância ética, constando expressamente do Código de Ética Médica.

Na  Lei nº 9.434/97 consta um tópico sobre DISPOSIÇÃO DE TECIDOS, ÓRGÃOS E PARTES DO CORPO HUMANO VIVO PARA FINS DE TRANSPLANTE OU TRATAMENTO.

Assim estatui essa Lei sobre o assunto:

Art. 9º É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuge ou parentes consangüíneos até o quarto grau, inclusive, na forma do § 4o deste artigo, ou em qualquer outra pessoa, mediante autorização judicial, dispensada esta em relação à medula óssea. 

§ 3º Só é permitida a doação referida neste artigo quando se tratar de órgãos duplos, de partes de órgãos, tecidos ou partes do corpo cuja retirada não impeça o organismo do doador de continuar vivendo sem risco para a sua integridade e não represente grave comprometimento de suas aptidões vitais e saúde mental e não cause mutilação ou deformação inaceitável, e corresponda a uma necessidade terapêutica comprovadamente indispensável à pessoa receptora.

§ 4º O doador deverá autorizar, preferencialmente por escrito e diante de testemunhas, especificamente o tecido, órgão ou parte do corpo objeto da retirada.

Para doar é necessário:

• Ser um cidadão juridicamente capaz (maior de 18 anos ou menor de idade antecipado, com condições de saúde que não comprometam a manifestação válida da sua vontade);

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• Estar em condições de doar o órgão ou tecido sem comprometer a saúde e aptidões vitais;

• Apresentar condições adequadas de saúde, avaliadas por um médico que afaste a possibilidade de existir doenças que comprometam a saúde durante e após a doação;

• Querer doar um órgão ou tecido que seja duplo, como o rim, e não impeça o organismo do doador continuar funcionando;

• Ter um receptor com indicação terapêutica indispensável de transplante

Ser parente de até quarto grau ou cônjuge. No caso de não parentes, a doação só poderá ser feita com autorização judicial.


Pensamos que o sentido dessas regras para doação de órgãos entre pessoas vivas é o de evitar o comércio de de órgãos - tráfico de órgãos, termo mais utilizado corriqueiramente.

O artigo 199, § 4.º, da Constituição Federal veda a comercialização de órgãos, tecidos e substâncias humanas. O artigo 16 da Lei de Transplante considera crime a realização de transplante utilizando tecidos, órgãos ou partes do corpo humano obtidos em desconformidade com a lei, prevendo pena de reclusão, de um a seis anos.

O corpo humano é considerado um bem fora do comércio ou fora do mercado. Esse é um princípio adotado na quase totalidade das nações. No entanto, o comércio ilegal de órgãos é uma realidade degradante e cada vez mais presente na realidade e viola os direitos humanos fundamentais, sendo considerado hoje o novo crime do século XXI.

A comercialização de órgãos humanos denota a completa ausência de padrões mínimos de conduta ético-jurídica exigida pela lei aos profissionais de saúde aos doadores e suas famílias, pois atenta contra a dignidade da pessoa humana.

Por fim, a lei que trata do assunto no Brasil (9.434/97) diz que se o crime é praticado em pessoa viva e resulta em sua morte, a pena de reclusão vai de oito a vinte anos, além de multa (art. 14, §4º). Já o crime que chamamos normalmente de ‘tráfico de órgãos’, não existe. Isso é apenas um termo genérico sem sentido jurídico. O que existe são os crimes de compra e venda de órgãos, tecidos ou partes do corpo humano (art. 15), que tem pena de três a oito anos; e recolher, transportar, guardar ou distribuir essas mesmas partes (art. 17) - pena de seis meses a dois anos - ou realizar o transplante em desacordo com a lei (art. 16): pena de um a seis anos.

Sobre o autor
Tertius Rebelo

Advogado especializado e dedicado, principalmente, ao Direito Médico, coordena esta área de atuação do escritório, incluindo as ações de indenização pelo alegado erro médico envolvendo o profissional e os estabelecimentos de saúde, processos de sindicância e processos éticos no âmbito dos Conselhos Regionais de Medicina e Conselho Federal de Medicina.Tem atuação no gerenciamento dos riscos em questões ligadas à propaganda e publicidade em Medicina e demais normas éticas e administrativas. Ainda atua nas ações criminais envolvendo o ato médico, especialmente àquelas em que se discute a acusação de homicídio culposo, lesão corporal, dentre outras.- Membro da Comissão de Direito à Saúde da OAB/RN; - Integrante da Comissão de Revisão do Código de Ética Médica no RN; - Membro da European Association for Health Law; - Membro da World Association for Medical Law; - Diretor de Prerrogativas da Associação dos Advogados do RN – AARN; - Conferencista/Palestrante em Congressos e seminários sobre Direito Médico, Biodireito e Bioética; - Ex-Coordenador jurídico da secretaria municipal de saúde do Município de Guamaré Estado do Rio Grande do Norte, no período de janeiro de 2011 à de agosto de 2012 - Ex-Coordenador jurídico da secretaria municipal de saúde do Estado do Rio Grande do Norte, no período de abril de 2010 à de setembro de 2010; - Procuradoria da República no Rio Grande do Norte - Ministério Público Federal, atuando, no período de 15 de julho de 2005 até 11 de março de 2008, na função de assessor de gabinete do Procurador da República.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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