I - A COMPENSAÇÃO NO DIREITO ROMANO
A compensação era modo ipso iure de extinção de obrigações, no direito justiniâneo.
Do que se sabe do Digisto, Livro 16, titulo II, fr.1, a compensação era assim definida por Modestino: "Compensatio est debiti et crediti inter se contributio".
Não vigia no direito romano pacificidade na maneira de sua atuação.
No direito clássico, especialmente, houve uma certa timidez no estabelecimento de sua extensão, operando ela como o resultado de uma convenção entre as partes, e não como forma de extinção legal.
Para Girard (Droit Romain, pág. 716) parece que a compensação realizava a extinção da obrigação por via de uma renúncia às respectivas ações.
Podia-se entender a compensação como o desaparecimento de duas obrigações pela circunstância de o credor de uma ser ao mesmo tempo o devedor de outra.
No direito antigo a compensação não podia surgir em virtude da autonomia da obrigação dentro do processo, pois que cada fórmula era peculiar a uma relação jurídica.
O devedor que já cumprira a obrigação podia não ser pago se o seu devedor era insolvente, o que constituía uma iniquidade, segundo os autores. Mas, somente a compensação convencional é que era admitida, oriunda que era de um acordo entre as partes.
No direito clássico permitia-se, entretanto, a compensação, sem convenção prévia, nas ações de boa-fé, sendo facultado ao juiz avaliar, ex bono et aequo, os pedidos das partes. Ele podia levar em conta o que o autor devia ao réu ex eadem causa, sendo da mesma natureza a relação ajuizada, e efetuar de ofício e livremente a compensação, não condenando o réu senão ao restante.
Havia um caso em que o autor era forçado a agere cum compensatione, a intentar a compensação apenas pela diferença entre o seu crédito e o seu débito, se eles tivessem o mesmo objeto, e fossem vencidos; era o caso do banqueiro(argentarius) que, se assim não procedesse, perderia a ação.
Havia um outro caso em que o autor devia agere cum deductione: era o do adquirente de todo o patrimônio(bono rum emptor) de um falido sem deduzir o que lhe devia, como sucessor deste; o juiz ainda operava o deductio de dívidas não vencidas, com objetos diferentes.
Um escrito de Marco Aurélio permitiu que se chegasse à compensação mediante a exceptio doli, nas obrigações de direito escrito, quando o pedido de todo o crédito se pudesse considerar doloso. Somente a diferença entre as duas dívidas poderia ser reclamada; a desobediência a essa regra acarretava a absolvição total do réu, ainda que o seu crédito fosse inferior à dívida. Segundo a doutrina, essa compensação funcionava para as dívidas vencidas e oriundas ex dispari causa, uma vez que as obrigações de direito estrito eram essencialmente unilaterais.
Justiniano generalizou o instituto da compensação a todas as ações reais e pessoais, no direito romano, dele fazendo um modo geral de extinção ipso iure da obrigação. Não era necessário invocar a exceptio doli para que a compensação tivesse lugar; a qualquer momento; o réu podia alegar o seu crédito contra o autor, a título de defesa, provocando a condenação de quem tivesse menos crédito ao pagamento da diferença. Ensinou Ebert Chamoun (Instituções de direito romano, 1968, pág. 322) que só não podiam fazê-lo o possuidor de má-fé e o depositário. Entendeu-se que, a essa época, chegou-se a encarar a compensatio como um meio extintivo da obrigação, independente da vontade dos sujeitos.
A compensação deve ser feita diante de dívidas vencidas e líquidas, ou, pelo menos, de fácil estimativa.
No direito de Justiniano o juiz é quem decidia sobre a admissibilidade da compensação.
II - A COMPENSAÇÃO NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO
No direito brasileiro a compensação pode ser legal e voluntária. A compensação legal se vê em oposição à compensação judicial, que era a romana, remontando aos glossadores, e chegou ao direito civil francês.
Define-se a compensação como a extinção das obrigações quando duas pessoas forem, reciprocamente, credora e devedora. E, com base na mesma doutrina legal, compunha-se dos seguintes requisitos: a) cada um há de ser devedor e credor da obrigação principal; b) as obrigações devem ter por objeto coisas fungíveis do mesmo objeto e qualidade; c) as dívidas devem ser vencidas, exigíveis e líquidas; d) não pode haver direitos de terceiros sobre as prestações, como ensinou De Page, Traité élementaire, III, segunda parte, n. 624.
Fala-se no princípio da personalidade, envolvendo o credor e o devedor. Na lição de Caio Mário da Silva Pereira(Instituições de direito civil, volume II, 21ª edição, pág. 288) não afronta o princípio da personalidade a cessão de crédito, razão por que o devedor cedido pode opor ao cessionário o crédito que tem contra o cedente, desde que seja anterior à transferência, e que, antes da cessão, já tenha as qualidades necessárias à compensação. Se, porém, tiver sido notificado e nada opuser, não pode opor ao cessionário a compensação que antes teria contra o cedente (Código Civil de 2002, artigo 377). Existe uma exceção ao princípio da personalidade, no caso de fiador que pode opor seu crédito contra o credor, da mesma forma que pleiteia a compensação do crédito do afiançado, nos termos do artigo 377 do Código Civil de 2002. Mas a recíproca não é, todavia, verdadeira: o devedor não pode opor ao seu credor o crédito do fiador.
Não se realiza a compensação se a compensação se fizer em prejuízo de direito de terceiros, não podendo o devedor que se torne credor de seu credor, depois de penhorado o crédito deste, opor ao exequente a compensação, de que contra o próprio credor disporia (Código Civil de 2002, artigo 380).
Devendo ser ambas exigíveis, não comporta compensação a obrigação natural, como ensinavam M.I. Carvalho de Mendonça, De Page, Ruggiero e Maroi.
Se a prescrição se completou antes da coexistência das dívidas, aquele a quem ela beneficia pode opor-se à compensação, sob o fundamento de que a prescrição extingue a pretensão, para outros, encobre a pretensão, faltando o requisito da exigibilidade para que aquela se efetue. Mas, se dois créditos coexistiram, antes de escoar-se o prazo prescricional operou a compensação ipso iure, e perimiu as obrigações; assim a prescrição que venha completar-se ulteriormente não mais atua sobre os débitos desaparecidos.
Fala-se na liquidez das obrigações.
A liquidez das obrigações não significa que a menção de soma precisa nos respectivos títulos, mas que sejam uma e outra certas, isto é, tenham a sua existência positivada independentemente de qualquer processo de duração, e determinado o respectivo quantum. Não importa que, pela alteração de situação econômica de uma das partes, reduzam-se as suas condições de solvência. O que deve ser indispensável, segundo a doutrina, é a liquidez da dívida.
Não afeta a liquidez do débito o fato de opor-lhe a contestação o devedor.
Quando as obrigações tiverem por objeto prestação de coisas incertas, somente serão compensáveis se a escolha competir aos dois devedores. Se couber aos dois credores, ou a um só deles na qualidade de devedor de uma e credor de outra, não poderia se falar em compensação.
A regra da compensação é aplicável quando ambos são credores e devedores principais.
Nas obrigações solidárias, o devedor pode compensar com o credor o que este lhe dever, mas somente pode invocar esta extinção com o que o credor deve ao seu coobrigado, até o equivalente da parte deste na dívida comum.
Por certo, o local do vencimento da obrigação não influi sobre a compensação, que tanto alcança as vencidas no mesmo lugar quanto em lugares diferentes, mas, neste último caso, devem-se deduzir as despesas necessárias à operação.
Afasta-se a compensação pela renúncia prévia de um dos devedores, pois a compensação é um benefício e de regra invito non datur beneficium. A renúncia pode ser expressa, quando a compensação é abolida pela declaração do devedor neste sentido; é tácita, quando o devedor, não obstante seja credor de seu credor, efetua espontaneamente o pagamento.
Um dos requisitos é o da fungibilidade das prestações.
Não são apenas as dívidas de dinheiro que se compensam, porém as de coisas fungíveis em geral. Mas não basta que sejam do mesmo gênero, sendo necessária ainda a identidade de espécie e qualidade, quando especificada no contrato(Código Civil de 2002, artigo 370). Excluem-se as obrigações que tenham por prestação coisa certa determinada.
Ha controvérsias se as obrigações de fazer comportam compensação, quando têm por objeto prestações fungíveis, posto que, se não fungíveis, todos acordam com a negativa. Na linha de Caio Mário da Silva Pereira(obra citada, pág. 289) tem-se que a melhor doutrina está com os que negam a compensabilidade, fundados não só em que não basta a fungibilidade das prestações, em si mesmas, porém, é necessário que sejam, entre si, fungíveis.
Para que haja a compensação, os débitos hão de estar vencidos. Assim, as obrigações a termo ou sujeitas à condição suspensiva, não sendo exigíveis, não podem ser objeto de compensação.
Não se fala em compensação:
a) se uma das dívidas provier de esbulho, roubo ou furto;
b) se uma delas originar-se de comodato, depósito ou alimentos, a não ser que tenha a mesma causa;
c) se uma delas for de coisa não suscetível de penhora, segundo o que dispõe a lei processual.
A compensação está, assim, prevista no art. 368 do Código Civil:
“Se duas pessoas forem aomesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem”.
Por sua vez, o art. 369 do Código Civil exige que sejam “…dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis”. Ou seja, para que haja a compensação é essencial que o devedor seja ao mesmo tempo credor da mesma pessoa, devendo as dívidas ser líquidas e estar vencidas.
III - A COMPENSAÇÃO NO DIREITO MERCANTIL
Fala-se aqui na conta corrente e nas câmaras de compensação.
No caso da conta corrente, mediante a qual são inscritas as partidas de débito e de crédito, a favor e contra cada uma das partes, gera-se a contínua e constante extinção recíproca, para, a qualquer tempo, prevalecer o saldo como expressão da posição de débito de um ou de outro; se os créditos perdem a sua individualidade, em função do respectivo lançamento, isso traduz uma maior extensão do contrato de conta corrente.
Por sua vez, as câmaras de compensação exercem uma função importante de controle das disponibilidades bancárias e de encaixe técnico, tendo na compensação a sua mola essencial, como ensinou Caio Mário da SIlva Pereira(Instituições de direito civil, volume III, 1976, pág. 217).
IV - COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA
O Código Tributário Nacional não estabelece a compensação como forma de extinção do crédito tributário. Apenas diz que a lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos e vincendos, do sujeito passivo com a Fazenda Pública. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará, para efeito de compensação, que se apure o montante do crédito, não podendo determinar redução superior ao juro de um por cento ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento.
Não se efetiva a compensação se tratar de dívida de natureza fiscal, exceto nos casos em que a legislação especial da Fazenda permita o encontro de contas de devedor para com o Fisco Federal, estadual ou municipal (Código Tributário Nacional, artigo 156, III). A Lei 10.677/2003 revogou, expressamente, o artigo 374 do Código Civil de 2002 que previa regras sobre as dívidas fiscais e o instituto da compensação.
As normas relativas à compensação fiscal aplicam-se às dívidas fiscais e parafiscais. Essa disposição foi revogada pela Medida Provisória n. 75, de 24 de outubro de 2002, rejeitada pelo Congresso Nacional, mas foi novamente revogada pela Medida Provisória n. 104, de 9 de janeiro de 2003.
É certo que o artigo 170 do Código Tributário cuida de compensação de créditos tributários com crédito de qualquer natureza, desde que líquidos e certos, vencidos e vincendos, do sujeito passivo com a Fazenda Pública. Objetos da compensação, neste caso, são, de um lado, um crédito tributário, que é por natureza líquido e certo, posto que constituído pelo regular procedimento administrativo de lançamento, e, de outro lado, um crédito de qualquer natureza que o sujeito passivo daquela relação tributária tem junto à Fazenda Pública.
A Lei Complementar n. 104, de 10 de janeiro de 2001, introduziu no Código Tributário Nacional o artigo 170-A, estabelecendo que é vedada a compensação mediante o aproveitamento do tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial. No entendimento de Hugo de Brito Machado (Curso de direito tributário, 23º edição, pág. 198), certamente esta norma não impede o deferimento de liminar, ou a antecipação de tutela, autorizando a compensação.
Ainda Hugo de Brito Machado(obra citada, pág. 198) considerou que, nos termos do artigo 74 da Lei 9.430/96, com a redação que lhe deu o artigo 49 da Lei 10.637/2002, o sujeito passivo de obrigação tributária que apurou o crédito relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele órgão.
A definição do critério para compensar débito quando o contribuinte tem crédito junto ao fisco cabe à Receita Federal, sem prejuízo do controle judicial da legalidade, segundo decisão da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
No voto acompanhado pela Segunda Turma, o ministro Herman Benjamin ressaltou que, em situações como essa, a legislação prevê ser “impositiva” a compensação de ofício, conforme o artigo 7º do Decreto-Lei 2.287/86, com a redação da Lei 11.196/05. Regulamentando essa norma, o parágrafo 1º, do artigo 6º, do Decreto 2.138/97 determina que a compensação de ofício seja precedida de notificação do contribuinte.
“O encontro de contas será realizado quando houver a sua anuência expressa ou tácita (artigo 6º, parágrafo 2º), e, em caso de discordância, o crédito do sujeito passivo ficará retido em poder do fisco até que o débito deste seja liquidado (artigo 6º, parágrafo 3º)”, explicou o ministro.
O ministro Herman Benjamin salientou ainda que a demanda foi ajuizada porque a Instrução Normativa 1.300/12 estabelece os critérios e define a ordem dos débitos pendentes para a compensação, enquanto o contribuinte alegava ter direito líquido e certo de eleger, unilateralmente, conforme sua conveniência, quais débitos compensar.
“Nesse passo, a invocação dos princípios da razoabilidade e da menor onerosidade não socorre a recorrente, pois, como se sabe, não é dado ao contribuinte eleger unilateralmente os critérios que lhe parecem mais convenientes, sobrepondo-se ao interesse público, resguardado pelo fisco”, justificou o ministro.
Em se tratando de relação tributária, era possível a aplicação do Código Civil (art. 374) à compensação de “dívidas fiscais e parafiscais”.
Na matéria, o Superior Tribunal de Justiça editou as seguintes Súmulas:
Súmula 464 (SÚMULA) DJe 08/09/2010
RSTJ vol. 219 p. 734 Decisão: 25/08/2010. A regra de imputação de pagamentos estabelecida no art. 354 do Código Civil não se aplica às hipóteses de compensação tributária.
Súmula 460 (SÚMULA) DJe 08/09/2010.
RSTJ vol. 219 p. 730 Decisão: 25/08/2010. É incabível o mandado de segurança para convalidar a compensação tributária realizada pelo contribuinte.
Súmula 213 (SÚMULA) DJ 02/10/1998 p. 250
JSTJ vol. 1 p. 443
RDDT vol. 39 p. 208
RSSTJ vol. 16 p. 11
RSTJ vol. 125 p. 45
RT vol. 758 p. 150 Decisão: 23/09/1998. O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária.
O Código Tributário Nacional, lei materialmente complementar, previa a compensação, mas deixou esta a depender do legislador ordinário. Apenas com a edição da lei 8.383/91 é que restou regulamentada a compensação em Direito Tributário.
O pedido administrativo de compensação de tributo suspende a exigibilidade do crédito tributário e impede o ajuizamento de execução fiscal, cabendo à executante os ônus de sucumbência.
Empresas não podem aproveitar créditos de tributos recolhidos pela Receita Federal para pagar débitos previdenciários, porque “o INSS e a União são pessoas diferentes, ainda que o sistema arrecadatório seja único”. Segundo a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, a legislação veda expressamente essa possibilidade.
A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manifestou-se no sentido da ilegalidade da compensação entre créditos provenientes de precatórios do Rio Grande do Sul com dívidas oriundas de tributos federais.
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu vedar a compensação de créditos ainda que o Supremo Tribunal Federal (STF) já tenha declarado o imposto indevidamente recolhido inconstitucional.
O Superior Tribunal de Justiça também vem admitindo a compensação de tributos de espécies distintas desde que atendidas as exigências dos dispositivos acima transcritos:
“Da atenta leitura dos autos, diante da data de propositura da ação, denota-se a vigência do art. 74 da Lei n. 9.430/96, sem as alterações determinadas na Lei n. 10.637/2002.Da exegese do citado diploma legal,sem a nova redação, conclui-se que é possível a compensação de tributos diversos, desde que sejam administrados pela Secretaria da Receita Federal, e que este Órgão, mediante prévio requerimento administrativo do contribuinte, autorize a compensação, o que não se verifica no caso”.
(REsp 860873/SP, Min. Humberto Martins, 02ª TU,DJ 30.10.2006).
“O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária” (Súmula 213 do STJ). “É incabível o mandado de segurança para convalidar a compensação tributária realizada pelo contribuinte” (Súmula 460 do STJ).
Em regra, veda-se a arguição de compensação nos embargos à execução fiscal (§ 3º do art. 16 da Lei n. 6.830/80). Contudo, a súmula 394 declara: “É admissível, em embargos à execução, compensar os valores de imposto de renda retidos indevidamente na fonte com os valores restituídos apurados na declaração anual”. Tornando a interpretação do dispositivo da LEF limitado.
Pode haver a compensação tributária referente ao pagamento indevido de multa tributária com crédito de tributo devido na íntegra:
STJ - EREsp 792628 / RS EMBARGOS DE DIVERGENCIA NO RECURSO ESPECIAL 2006/0200562-5 22/set/2008 EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. TRIBUTÁRIO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. MULTAMORATÓRIA. COMPENSAÇÃO COM VALORES RELATIVOS A TRIBUTO.POSSIBILIDADE. EMBARGOS PROVIDOS.
1. Na atual sistemática de compensação tributária, não há como preponderar a tese da impossibilidade de compensação entre tributo e multa.
2. Considerando a amplitude conferida à expressão "crédito relativo a tributo ou contribuição" (art. 74 da Lei 9.430/96), deve-se entender que ela abarca qualquer pagamento indevido feito pelo contribuinte a título de crédito tributário. Por outro lado, do exame sistemático das normas insertas no Código Tributário Nacional (arts. 113, §§ 1º e 3º, e 139), observa-se que crédito tributário não diz respeito apenas a tributo em sentido estrito, mas alcança, também, as penalidades que incidam sobre ele.
3. Embargos de divergência providos.
Os limites estabelecidos pelas Leis 9.032/1995 e 9.129/1995 são aplicáveis à compensação de indébito tributário, ainda que este decorra da declaração de inconstitucionalidade da contribuição social pelo STF. Isso porque a Primeira Seção do STJ consolidou o entendimento de que, "enquanto não declaradas inconstitucionais as Leis 9.032/1995 e 9.129/1995, em sede de controle difuso ou concentrado, sua observância é inafastável pelo Poder Judiciário, uma vez que a norma jurídica, enquanto não regularmente expurgada do ordenamento, nele permanece válida, razão pela qual a compensação do indébito tributário, ainda que decorrente da declaração de inconstitucionalidade da exação, submete-se às limitações erigidas pelos diplomas legais que regem a compensação tributária" (REsp 796.064-RJ, Primeira Seção, DJe 10/11/2008). Precedentes citados: EREsp 905.288-SP, Primeira Seção, DJe 6/11/2009; e EREsp 860.370-SP, Primeira Seção, DJe 6/11/2009. EREsp 872.559-SP, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 9/4/2014.
O disposto no art. 170-A do CTN, que exige o trânsito em julgado para fins de compensação de crédito tributário, somente se aplica às demandas ajuizadas após a vigência da LC 104/2001, a qual acrescentou o referido artigo ao CTN. Precedentes citados: REsp 1.266.798-CE, Segunda Turma, DJe 25/4/2012; e AgRg nos EDcl no REsp 1.100.424-PR, Segunda Turma, DJe 27/4/2011. AgRg no REsp 1.240.038-PR, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 8/4/2014.
É possível o creditamento do ICMS incidente sobre a energia elétrica consumida pelas prestadoras de serviços de telecomunicações para abatimento do imposto devido quando da prestação de serviços. O art. 19 da LC 87/1996, em âmbito legal, assegura o direito à não-cumulatividade para o ICMS, prevendo a compensação do que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços de transporte - interestadual e intermunicipal - e de comunicação com o montante cobrado nas operações anteriores pelo mesmo estado ou por outro. Por sua vez, o art. 33, II, "b", do referido dispositivo legal prevê a possibilidade de creditamento de ICMS relativamente à aquisição de energia elétrica, na hipótese em que o estabelecimento a utilize no processo de industrialização. A propósito, por força do Dec. 640/1962 - recepcionado pela Constituição atual e compatível com a legislação tributária posterior -, os serviços de comunicação são equiparados à indústria. Assim, em virtude da essencialidade da energia elétrica, como insumo, para o exercício da atividade de telecomunicações, induvidoso se revela o direito ao creditamento de ICMS, em atendimento ao princípio da não-cumulatividade. Precedentes citados: REsp 842.270-RS, Primeira Seção, DJe 26/6/2012, e AgRg no AgRg no REsp 1.134.930-MS, Segunda Turma, DJe 19/12/2012 . REsp 1.201.635-MG, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 12/6/2013.
O Fisco não pode proceder à inscrição do débito em dívida ativa e negar a CND ao contribuinte, desconsiderando a declaração e a compensação tributárias, efetuadas por ele via Declaração de Contribuições de Tributos Federais (DCTF), sem notificá-lo do indeferimento da compensação. Ao promover a compensação (CTN, art. 156, II), o contribuinte deve informá-la ao Fisco para que averígue a regularidade do procedimento e, então, homologue, ainda que tacitamente, a compensação efetuada, a partir da qual não se poderá recusar a expedição de Certidão Negativa de Débito (CND). Caso a autoridade administrativa discorde da extinção - por considerar inexistente ou insuficiente o crédito devido ao contribuinte, ou ainda por considerar inexistente o direito à compensação - deverá praticar ato manifestando essa discordância por meio de processo administrativo tributário (que suspenderá o crédito tributário), antes de propor ação fiscal contra o contribuinte. Precedentes citados: REsp 962.379-RS, DJe 28/10/2008; REsp 1.140.730-RS, DJe 21/6/2011; AgRg no REsp 892.901-RS, DJe 7/3/2008; REsp 999.020-PR, DJe 21/5/2008, e AgRg no REsp 1.228.660-RS, DJe 27/9/2011; REsp 1.157.847-PE, DJe 6/4/2010, e AgRg no REsp 1.126.548-RS, DJe 14/12/2010. AgRg no AREsp 227.242-CE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 9/10/2012.
A Constituição Federal permitiu que, no momento da expedição dos precatórios, o Poder Público abatesse unilateralmente o valor dos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em Dívida Ativa, constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, inclusive parcelas vincendas de parcelamentos (art. 100, § 9º, da CF/88).
Somente não podem ser objeto de abatimento os débitos tributários cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial.
A regra foi criada para resguardar os créditos fazendários. Trata-se de direito do Fisco e o particular sequer participa do trâmite prévio à expedição do precatório, que ocorre apenas entre o Executivo e o Judiciário. Vale dizer, a Fazenda informa ao Tribunal sobre a existência de débitos, dentro do prazo decadencial de 30 dias, para que se efetive a compensação.
O Ministro Herman Benjamin entendeu que, se o contribuinte optou pela execução judicial, fica automaticamente prejudicada qualquer possibilidade de compensação.O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem barrado uma prática comum de contribuintes: a compensação de valores a receber da Fazenda Nacional com tributos devidos enquanto ainda tramita processo de execução.
Para a Fazenda Nacional, a compensação nesse caso, concomitante à execução, fere a boa-fé objetiva.
E há outras decisões no mesmo sentido no STJ. Em 2012, o ministro Mauro Campbell Marques, também da 2ª Turma, ao analisar pedido da destilaria Miriri, que tinha valores referentes a repetição de indébito (tributo pago a maior) para receber, teve o mesmo entendimento.