A transação no Direito Romano e no Direito Civil Brasileiro

12/06/2017 às 16:50

Resumo:


  • A transação no direito romano era um contrato inominado que visava extinguir uma obrigação contestada.

  • No direito clássico, a transação era um pacto nu acompanhado de uma stipulatio, enquanto no pós-clássico se tornou um contrato inominado.

  • Na atualidade, a transação civil é vista como um negócio jurídico bilateral que visa extinguir ou prevenir litígios, sendo indivisível e restrita em sua natureza.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O artigo traz discussão doutrinária sobre a matéria.

No direito romano, a transação era um contrato inominado, uma convenção pela qual uma pessoa, mediante um equivalente, renuncia a um direito contestado, quer um processo já iniciado, quer por iniciar.

A transação destinava-se a extinguir uma obrigação, por ser uma convenção em que alguém renunciava a um direito em litígio, recebendo, porém, uma retribuição. 

Afirmam os autores que a transação, no direito clássico, não era válida se feita post rem iudicatam, depois da sentença do juiz, mas o direito pós-clássico admitia a transação super iudicato, se feita entre a apelação e a sentença de última instância.

No direito clássico, a transação era um pacto nu que gerava ação apenas se acompanhada de uma stipulatio; era normalmente sancionada por uma exceção (exceptio negotti transacti) e uma réplica.

No direito pós-clássico era sancionada por uma actio praescriptis verbis e sob Justiniano se tornou um contrato inominado.

A partir do direito justinianeu surge a estrutura, tal qual se nos apresenta hoje, dos contratos inominados, classificados em quatro espécies, a saber:

a)"dou para que dês", ou ut des – tanto a prestação quanto a contraprestação estão vinculadas à entrega de uma coisa pela outra, ou seja, uma "troca";

b)"dou para que faças", ou ut facias - a prestação se vincula à entrega de uma coisa, e a contraprestação a um comportamento, uma "doação com encargo";

c)"faço para que dês", ou facio ut des – situação inversa da ut facias, isto é, a prestação está vinculada a um comportamento, e a contraprestação à entrega da coisa;

d)"faço para que faças", ou facio ut facias – nesta modalidade de contrato inominado, ambas obrigações se vinculam a um comportamento.

Os contratos inominados têm como requisitos o acordo de vontades quanto à prestação e a contraprestação equivalente, e a execução unilateral do acordo, que faz gerar a pretensão quanto à execução da contraprestação.

Modernamente a transação civil é vista como um negócio jurídico que se realiza por meio de um acordo de vontades e tem por objeto extinguir a obrigação. É visto como um acordo liberatório com a finalidade de extinguir ou prevenir litígios, por via de concessões recíprocas das partes. Seria então definida:

  1. Como um negócio jurídico bilateral;
  2. Que visa à extinção ou prevenção de um litígio, sem o que o negócio não constituiria uma novação, mas um ato constitutivo de direitos, ou um pagamento. Era a palavra de Ulpiano para o direito romano: “Qui transigit, quase de re dúbia et lite incerta neque finita transigit: qui vero pacistur, donationis causa rem certam indubitatem liberalitate remitit”(Digesto, Livro II, titulo XV, tr.1).
  3. Que tem reciprocidade das concessões, cuja falta importa em configurar-se uma doação, ou uma dação em pagamento, ou uma remissão de dívida, conforme o caso. Esse é o seu aspecto essencial;
  4. Pela existência de pretensões das partes, qualquer que seja o conhecimento da situação real dos interessados.

A transação além de ato convencional ou consensual é vista como indivisível e restrita. A ineficácia de qualquer das cláusulas da transação induz a nulidade do todo. O atual Código Civil de 2002, no artigo 848, parágrafo único, diz que a transação tem caráter de indivisível. 

Como tal é negócio juridico declaratório. 

Vigora o principio de que deve ser entendida de forma estrita.

Deve ser vista em sua dupla natureza, modernamente: ato extintivo da obrigação e ainda de negócio jurídico.

A transação pode ser judicial(se for realizada no curso do processo, recaindo sobre direitos contestados em juízo - artigo 842, segunda parte) ou extrajudicial. Se realizada em juízo, sentença de mérito,  fará a transação coisa julgada material e formal. Seu efeito é declaratorio, pois apenas declara e reconhece direitos existentes(artigo 843 do Código Civil). 

Seus vícios podem trazer a nulidade absoluta ou relativa do negócio juridico. 

Se versar, atualmente, no direito brasileiro, a transação envolvendo bens imóveis essencialmente virá na forma de escritura pública.

O objeto da transação é restrito aos direitos patrimoniais não se podendo transigir quanto a direitos não-patrimoniais, tais como os de família puros(legitimidade do filho, validade do casamento, regime de bens no matrimônio, direito a alimentos). Ainda não comportam a transação: condições de validade do testamento, proteção à economia popular.

A validade da transação não depende da equivalência das prestações, da correspondência dos sacrificios ou da igualdade das concessões; isto é, não implica proporcionalidade do dano, retirado ou prometido(RTJ 59: 923). 

Não cabe transigir sobre o status familiae.

A lei proíbe a transação, por importar renúncia de direitos: a) ao tutor e ao curador, referentemente a negócios do tutelado e do curatelado(artigo 1.748, III e 1.774), a não ser que a transação seja no interesse deles e desde que haja a autorização judicial expressa, decidindo a conveniência da transação; b) aos pais, quanto aos bens e direitos de seus filhos menores, salvo a prévia autorização do juiz(RT 146: 266; 236: 1.774), ao mandatário sem poderes especiais e expressos(CC art. 661, parágrafo primeiro do CPC de 1973, art. 38, com a redação da Lei 8.952/94, e parágrafo único, acrescentado pela Lei n. 11.419/2006); d) aos procuradores fiscais e judiciais das pessos jurídicas de direito público interno; e) ao representante do Ministério Público; f) à pessoa casada, exceto no regime de separação absoluta(CC, artigo 1.647), sem o consentimento do outro cônjuge, desde que a transação seja relativa a imóveis(RT 112: 639); g) ao sócio que não tenha administração da sociedade(CC, artigos 1.010 e 1.021); h) ao inventariante, no caso do art. 992, II, do Codigo de Processo Civil de 1973); i) ao administrador judicial sobre obrigações e direitos da massa falilda, salvo autorização judicial e audiência do comité e do devedor no prazo comum de dois dias(Lei n. 11.101/2015, artigo 22, parágrafo terceiro). 

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Por sua vez, a evicção da coisa recebida ou renunciada por um dos transatores gera-lhe o direito de reclamar perdas e danos, sem reviver a obrigação extinta. Teixeira de Freitas se pronunciava de  forma contrária(Esboço, art. 1211), encontrando apoio no direito romano: “Si tamen res ipsas apud  te constitutas, ob quarum questionem litis intercessit decisio, fiscus vel alius a te vindicavit; nihil potere potest”, reproduzido no código  civil da Argentina, artigo 854.

Com a transação previne-se ou extingue-se o litigio, havendo intenção de pôr termo à res dubio ou litigiosa. 

Será lícito adjetivar-lhe a cláusula penal pagável por aquele que a infringir(Código Civil, artgigo 847). 

No Código Civil de 2002 a transação é disciplinada como contrato típico, no Capítulo XIX, do Título VI do Livro I. Não é portanto, tratada como efeito das obrigações, como o era no Código Civil de 1916. 

Assim determina o artigo 840 do Código Civil de 2002: 

Art. 840. É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.

Por ser um negócio juridico bilateral a transação, como acordo de vontades,  exige capacidade genérica para a vida civil e capacidade de disposiçã e ainda: existência de litigio ou dúvida, intenção de pôr termo à res dubia ou litigiosa, reciprocidade de concessões e prevenção ou extinção do litigio. 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos